Páginas

14.11.16

COMO RHINE DELIMITOU O CAMPO DA PARAPSICOLOGIA?




O termo parapsicologia foi criado por Max Dessoir, um filósofo e psicólogo alemão, mas seu emprego sistemático como um conceito para agrupar um conjunto de fenômenos e designar uma nova ciência parece ter sido difundido a partir dos trabalhos de Joseph Banks Rhine, pesquisador norte-americano.

Rhine ficou conhecido por seus estudos com telepatia, clarividência, precognição e psicocinese, mas ao ler o livro “Extra-Sensory Perception”, originalmente publicado em 1964, encontrei um traçado do campo da parapsicologia, feito por ele, que compreende os fenômenos espirituais. Isto não significa que ele tenha aceitado as teorias espíritas, mas que insere a fenomenologia que usou Kardec para desenvolvê-las no campo da parapsicologia.

No livro ESP, Jopseph Banks Rhine, pai da parapsicologia moderna, escreve um capítulo para “clarificar o problema”, no qual delimita o campo da pesquisa psíquica e no qual pretende dividir de uma forma mais detalhada que a então conhecida divisão em fenômenos físicos e mentais.

Ele defende o uso do termo parapsicologia para o campo como um todo, que ele considera ser mais apropriado que “pesquisa psíquica” ou outros, porque a palavra situa os fenômenos ao lado do campo da psicologia, e não fora dele. Dessoir tem um segundo objetivo com o termo: situar os fenômenos entre os chamados normais e os patológicos (são incomuns, mas não se referem a doenças ou transtornos mentais) Como os fenômenos vão além da fronteira com a Psicologia, Rhine os dividiu segundo a tabela abaixo:

Fenômenos Parapsicológicos

A) Parapsíquicos: Telepatia e clarividência (experimentais e espontâneas), “dowsing” (procura de água ou minerais abaixo do solo, através de uma varinha, rabdomancia), sonhos ou alucinações preditivos e premonitórios, psicometria, comunicações espirituais “verídicas”.

B) Parapsicofísicos: Telecinese, levitação, “luzes psíquicas”, mudanças de temperatura, “apports” (mediunidade de transporte), etc.

C) Parapsicofisiológicos: Materializações, extrusões, “elongations” (alongamentos), estigmatização, mudanças extremas da temperatura do corpo.

D)  Parapsicopatológicos: “Patologia da possessão”, “cura psíquica” de doenças orgânicas, além do efeito da sugestão.

E) Parapsicoliterários (e outros parapsicoartísticos): Escrita criativa ou outra arte claramente impossível como resultado de treinamento natural, por exemplo, Patience Worth como foi relatada. (Esta classe pode ser adequadamente considerada como um sub-item de A).

Como se vê, embora suas pesquisas tenham se focalizado nos itens A e B principalmente, ele tinha uma visão bem mais ampla da fenomenologia parapsicológica, e, portanto, do seu campo de estudos.

Ao contrário do que dizem alguns, ele considera a existência das teorias que tratam de Espíritos, como se pode ler na página 8 do livro. Ele afirma que as ocorrências relatadas podem “ser supostamente devidas a agências (agentes) incorpóreos, chamados “controles”, “espíritos”, etc. ou supostamente produzidos por certos agentes corporais (quer dizer, vivos) que são especialmente sensitivos e capazes de desempenhos pouco usuais”.

Então ele desenvolve outra forma de classificar os fenômenos, na qual:

A) Um agente corpóreo influencia outro. (por exemplo: telepatia)

B) Um agente corpóreo pode ser apenas pessoalmente afetado (por exemplo: clarividência)

C) O agente incorpóreo (uma personalidade desencarnada que sobreviveu à morte) pode influenciar um corpóreo. (por exemplo: “experiências mediúnicas”)

D)  O agente incorpóreo pode produzir fenômenos sem a ajuda de um agente corpóreo com capacidades paranormais (por exemplo: assombrações)

Nesta última categoria, a explicação de Rhine colide com o entendimento de Allan Kardec, que explica que, mesmo nos casos de casas assombradas e nos fenômenos de efeitos físicos em geral, há sempre a atuação de um médium.

Mais uma vez, em meus estudos, vejo como é importante ler os autores originais, em lugar de seus divulgadores, comentaristas ou autores de “segunda-mão”.

Fonte: RHINE, Joseph Banks, Extra-sensory perception. 4th edition. Boston – USA, Branden Publishing Company, 1997. Capítulo 1: Clarification of the problem

1.11.16

VAMOS?



Uma expressão muito usada por aqui, nas terras mineiras, é o vamos, sempre seguido de interrogação. Na linguagem oral, se usa também o “vamo” e o “vão”. É uma expressão muito poderosa por aqui.

As casas espíritas anunciam suas tarefas em público, coletivamente, mas via de regra, a maioria das pessoas ouve como se fosse algo estranho a elas, ou algo chato, como a hora do intervalo comercial da televisão aberta. Talvez uma ou duas pessoas, em um grupão de cem, preste atenção no recado e pense, no recesso de sua alma: será que eu vou?

Lembro-me quando era muito jovem, lá pelos 13 anos, e assistia as reuniões de mocidade no Célia Xavier. Muitos de nossos colegas e eu chegamos ao Célia Xavier a partir de um convite de amigo ou familiar. Vamos? Disseram um dia.

Estava no meio do grupo, quando convidaram para o que se chamava de encontro fraterno. Por aqui, é uma leitura de texto espírita com comentários, seguida de um momento de descontração, com música, "comes e bebes", etc. Eu ouvi o recado como se não fosse direcionado a mim. Depois de terminada a reunião, a coordenadora (Thelma Rodrigues) veio conversar diretamente comigo, e me deu um “vamos”:

- "Quero vê-lo lá amanhã!" Só depois dele, eu me enchi de coragem para pedir ao meu pai para ir. Tempos curiosos estes...

Quando fazia o trabalho de tese, onde estudei os voluntários de uma das unidades de nossa casa espírita, uma das perguntas que direcionava parcialmente a entrevista era que contassem como se tornaram voluntários. Sete dos oito voluntários foram mobilizados pelo canto sonoro do “vamos”. Apenas um deles ouviu um recado dado a toda gente (e a ninguém em especial) e foi procurar alguém para oferecer-se.

Em visita à Mansão do Caminho, vi voluntários fazendo as tarefas mais diferentes possíveis, e alguns deles me explicaram que ouviram o “vamos” (não sei como é esta expressão na Bahia) diretamente de Divaldo Franco. Alguns estavam aposentados e mudaram de cidade e domicílio para atender ao convite.

Lembro-me de um episódio envolvendo Eduardo Carvalho Monteiro, que sabendo de uma pessoa que passou a frequentar o grupo, disse ao amigo. 

– Está na hora de lhe fazer um convite! Ou então: 

- Esta pessoa merece receber um convite para o trabalho.

Quando vejo dirigentes de reunião, que fazem bem o papel de “figurão[1]”, mas nunca usam a profunda força do “vamos”, penso que corremos o risco de igrejificar as casas espíritas, de ter multidões achando muito lindas as reuniões e muito tranquilizantes os passes, mas que lá estão presentes da mesma forma que estariam em um programa, um cinema, uma festividade ou uma obrigação social. Não pretendem se imiscuir, fazer parte, tornar-se membro, apenas estar presente e usufruir.

O “vamos” demanda de quem usa, a capacidade íntima de ouvir a negativa, o “não posso”, o “não agora”, o bem mineiro “de jeito nenhum”, e outras formas equivalentes. 

O “vamos”, se pensarmos bem, dividiu o calendário ocidental. Foi empregado por Jesus diversas vezes, como no momento após a pesca no Tiberíades, quando ele convidou Pedro a ser “pescador de homens”. Era um “vamos” radical, que exigiu uma mudança profunda, afetando a profissão, a família, o futuro... Ele também foi usado pelo Mestre com o “jovem rico”[2], que, infelizmente, tinha muitas propriedades...






[1] Figurão, é um termo empregado por teóricos do comportamento organizacional, que tem por sentido principal representar a organização. Um dirigente pode desempenhar bem esta função, vestindo-se adequadamente, falando bem, agindo segundo as normas de conduta do grupo, mas não se torna um líder apenas com o desempenho deste tipo de função.

[2] Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me. (Mateus, 19:21)