20.3.17

A CASA DE CHICO XAVIER







Domingo foi dia de ir a Pedro Leopoldo. Oportunidade de ver o Adriano Calsone falar sobre Amélie Boudet e Allan Kardec e de rever a Casa de Chico Xavier. Foi uma viagem grata ao coração, porque encontrei amigos antigos, que a vida levou para longe, mas que como a vida costuma ser como o mar, as ondas trouxeram de volta a Belo Horizonte. Encontrei amigos geograficamente próximos, mas que a vida absorveu, com suas obrigações, em outros espaços. Vizinhos, mas distantes. E reencontrei quem lá está, na cidade natal do Chico, mas que já morou na capital e conheceu papai.



A Casa de Chico Xavier é assim, você está no passado, mas também está no presente. O tempo-espaço se curva e permite que você transite entre os dois momentos, mercê da memória, com um passo, apenas. Com um passo você vê a Dona Nenem jovem, o Rolando Ramaiciotti perfilado com o médium de Pedro Leopoldo, o Peralva com seus óculos quadrados e eterno terno, capturados pelas fotografias que a informática faz aumentar ante o pedido nervoso dos dedos. Um passo, e quem já viu o filme preto e branco, preservado insistentemente do esquecimento pela nova dimensão chamada internet, entra em um quarto com os diplomas de cidadão honorário dados pelas câmaras municipais de cinco cidades paulistanas e pela intrusa Belo Horizonte, lugar de tantas amizades caras ao médium. Um passo atrás e o tempo muda novamente, o visitante vê a cama feita e o terno passadinho, pronto para ser vestido. 

Um lugar curioso da visita são os expositores do chão ao teto com uma cachoeira de livros, perfilados, à espera do olhar curioso dos visitantes. Do Parnaso ao último livro de Chico, eles estão lá, testemunhas incontestes de uma dedicação diária, que devorava o horário de descanso após o almoço, as noites que usamos para descansar da labuta e a madrugada que os jovens gostam de usar para as baladas. Recordei-me de Raul Teixeira dizendo:

- “Para acompanhar a doença do Chico é preciso ter muita saúde”!



Por fim, o visitante pode voltar a 1931. Geraldinho contou que o Chico participava da reunião mais estranha da história do espiritismo brasileiro. À mesa da casa espírita ele psicografava sob a influência de Emmanuel. Terminada a tarefa, ele lia em voz alta os textos para as cadeiras vazias, as paredes nuas pintadas, os pássaros no telhado do lado de fora, que pareciam não ter muito interesse nas palavras do Mestre iluminadas pelo pensamento de Allan Kardec. Lá fora a cidade ficava meio adormecida, em um ritmo lento, mas os vizinhos deviam ouvir a voz insistente do médium, e comentavam as estranhezas daquela doutrina nova que se erguia contra a milenar instituição representada localmente por uma pequena matriz no centro, com um coreto gracioso.

Chico Xavier é conhecido por sua perseverança teimosa, sua capacidade de continuar onde muitos nem mesmo teriam iniciado. William James diria que isto faz parte da psicologia dos grandes e notáveis religiosos. Toda muralha, contudo, tem suas rachaduras e incorreções, então, o povirello de Pedro Leopoldo queixou-se a Emmanuel.

- Meu irmão, vou encerrar a reunião. Apenas eu venho e trabalho sozinho. Fico lendo para as paredes e os vizinhos já me consideram louco. Não há sentido em continuar!

O orientador espiritual pediu-lhe que retornasse uma vez mais. Emmanuel pediria ao mestre que Chico pudesse ver mais, com os olhos da alma, e entender o que fazia.

Passada uma semana, chega o Chico, na reunião que seria a derradeira, como falam os mineiros, assenta a mesa, enche as folhas de papel e inicia as últimas leituras. Emmanuel aproximou-se, impôs as “mãos espirituais” sobre a cabeça do jovem médium, e seu campo de visão espiritual se abriu. Ao redor da mesa um anfiteatro, com espíritos “assentados” acompanhando com interesse a leitura dos textos evangélicos.

Chico olhou detidamente as fisionomias e não reconheceu ninguém. Não eram parentes dos filhos da terrinha mineira. Seus traços não lhe eram familiares. Perguntou então ao orientador.

- Quem são eles? Eu não os reconheço.

- São espíritos que estão em contato com o evangelho de Jesus explicado a partir dos novos conhecimentos trazidos pelo mestre lionês e que retornarão à carne para divulgá-los.

Geraldinho se referiu a eles como a Turma de 1931.



Voltemos à Casa de Chico Xavier. Influenciada pela narrativa, ao mesmo tempo em que criava os novos espaços de uma casa que seria museu e centro espírita, a arquiteta preservou o espaço da mesa em que Chico psicografava, quando estava em sua casa, e transformou os barracões, que eram quartos para receber os espíritas que vinham dos muitos lugares, especialmente de São Paulo, passar alguns dias com ele. Da mesa veem-se as fileiras desniveladas de cadeiras, envolvendo o espaço de grata lembrança com um anfiteatro pequenino, capaz de acolher uma centena de almas encarnadas, prontas a participar da simplicidade das reuniões, de leitura, comentários e preces.

Fui convidado à mesa, como acontecia no passado e as lágrimas escorreram no canto do olho. Ali também o espaço tempo fez duas dobras, e enquanto Adriano Calsone falava dos tempos áridos, mas laboriosos do mestre francês e nos fazia recordar/aprender sobre a “femme forte” do espiritismo, a mesa insistia em nos puxar para os tempos do lápis que corria solto pelas folhas de papel, um olhar ao lado nos levava aos anos oitenta do século passado, com a grata memória dos jovens da Comebh, alguns já senhoris, com os filhos crescidos, outros já sem o corpo físico, e nos assentos do anfiteatro viam-se os olhares interessados, perdidos no tempo, imaginando Rivail e Amélie enfrentando suas lutas, com um silêncio significativo, às vezes recortado por risos discretos, emoções denunciadas pelos olhos ou ternura estampada na face.

Voltamos para casa com uma sensação de paz na alma, de alegria suave, de satisfação pelos encontros e abraços, de surpresa pelo espaço tão mágico, preservado pelo afeto de pessoas que conheceram e valorizaram o jovenzinho pobre de Pedro Leopoldo.

18.3.17

LIVRARIA DA UNIÃO TEM LIVROS DA LIHPE



A Livraria da União Espírita Mineira está com todos os livros da Série Pesquisas Brasileiras sobre o Espiritismo para venda. Eles podem ser encontrados na Rua Guarani 313, no centro de Belo Horizonte - MG.

Esta série agrupa os trabalhos apresentados nos encontros da Liga de Pesquisadores do Espiritismo e revistos por seus autores após avaliação.

Os espíritas mineiros têm agora mais facilidade de acesso aos livros da LIHPE!

11.3.17

EC FAZ DEZ ANOS!



O Espiritismo Comentado completa hoje dez anos! Acima estão as bandeiras de todos os países que já acessaram o blog. Talvez alguns países tenham visto por acidente, mas agradeço as comunidades espíritas norte-americana, europeia, japonesa, sul americana e africana, que nesta ordem têm acessado o blog, às vezes com a ajuda do tradutor. O instrumento do Google encontra também muitos acessos da Rússia e países vizinhos, da China e da Índia. Seriam apenas rastreadores de tráfego?

Neste tempo, foram quase 900 mil visualizações de páginas de quase mil postagens! É como se tivéssemos uma reunião de estudos virtuais com frequência média de 900 pessoas.

Os textos que tratam de mediunidade intuitiva (http://espiritismocomentado.blogspot.com.br/2009/01/mediunidade-intuitiva.html) e da interpretação do ramo de videira encontrado em O livro dos espíritos (http://espiritismocomentado.blogspot.com.br/2009/05/que-significa-o-ramo-de-videira-que-os.html) são os mais lidos do blog, e já foram escritos há onze anos...

Uma vez vi um filme chamado "Nunca te vi, sempre te amei", que trata de uma amizade entre um inglês e uma norte-americana, sustentada por correspondência, desde o período da guerra. Não me lembro bem do filme, mas eles ficaram décadas sem nunca se terem visto, sempre presentes na vida uns dos outros. Agradeço as pessoas que se enquadram neste modelo e se tornaram mais que leitores ao longo destes dez anos. Um dia espero conhecê-las em "três dimensões". 

Hoje é dia do Seminário "Novos Estudos sobre a Reencarnação" na Sede Federativa da União Espírita Mineira, e estão todos convidados a participar. Acho que ainda há vagas (poucas) e as inscrições são gratuitas. Vamos autografar o último livro publicado pela LIHPE em parceria com o CCDPE-ECM e a USE-SP.

Com dez anos de trabalhos, acho que precisamos parar para pensar. Enviem sugestões para o blog no nosso grupo do Facebook https://www.facebook.com/groups/espiritismocomentado/?fref=ts  para que possamos melhorar nossos trabalhos. 

Muito grato, pessoalmente, por estar com vocês durante todo este tempo.




9.3.17

MEDIUNIDADE E CIRCUITOS ELÉTRICOS



Gerador de corrente contínua tipo shunt



O jornal de estudos espíritas acaba de publicar um artigo que explica a analogia que André Luiz fez entre circuitos elétricos e mediunidade no livro "Mecanismos da mediunidade", publicado originalmente em 1959. O livro foi psicografado por Chico Xavier e Waldo Vieira. Os capítulos pares foram psicografados pelo Chico e os ímpares por Waldo. Como muitos dos conceitos de eletricidade ensinados por eles não são estudados na escola em nível de ensino médio, o livro é de difícil leitura e interpretação pela maioria das pessoas de boa vontade que frequentam a casa espírita.

O autor do artigo, Alexandre Fontes da Fonseca, é físico e professor da Unicamp. Ele tenta explicar de forma didática e compreensível o que diz André Luiz sobre mediunidade em alguns dos capítulos do livro.

Sua primeira contribuição é mostrar que o livro faz apenas analogias com eletricidade e hipnose. Ele não faz física do  mundo espiritual, como pensam alguns leitores. Embora André Luiz fale de ondas mento-eletromagnéticas, ele não diz que a mente produz ondas eletromagnética, mas que algumas das características das ondas eletromagnéticas como a variedade de frequências, a transmissão sem a necessidade de fios, sua recepção à distância e sua capacidade de gerar correntes elétricas em condutores com características especiais são muito parecidas com um espírito comunicante que produz o fenômeno mediúnico pelo pensamento, sem que ninguém seja capaz de percebê-lo com os cinco sentidos.

Algumas das comparações explicadas por Alexandre no artigo

Diferença de potencial: a existência de pensamentos distintos entre espírito e médium, para que seja possível a comunicação.

Capacidade de junção: combinação de fluidos entre médium encarnado e comunicante desencarnado (conceito kardequiano)

Fios do gerador: atitude de aceitação ou adesão do médium

Circuito mediúnico: Na combinação de fluidos citada acima, circula uma "corrente mental" (isto também é uma analogia, e não uma descrição física)

Gerador "shunt": Tipo de circuito no qual uma bobina corretamente instalada aumenta a corrente do gerador, e instalada de forma errada, diminui a corrente do gerador. É uma analogia do papel da concentração do médium durante a comunicação, segundo o articulista. 


Quem estiver interessado em entender melhor o artigo dele, basta acessar o Jornal de Estudos Espíritas no link a seguir:
https://drive.google.com/file/d/0BwP5l2F8N4s3TWJoMmRKWTRQaVk/view

8.3.17

UMA HISTÓRIA DE AMÉLIE GABRIELLE BOUDET




Ao contrário do livro "Em nome de Kardec", fui obrigado a ler "Madame Kardec: a história que o tempo quase apagou" em migalhas. O texto de Adriano continua leve de se ler e agradável. Ele transforma a narrativa em uma espécie de seriado de suspense, no qual cada capítulo é uma história.

Conhecemos mais de Allan Kardec que de sua esposa, em função, talvez, do livro "Obras Póstumas" e pelo acesso à Revista Espírita. Obviamente a visibilidade do escritor é muito maior que a de seu editor ou revisor, o que é uma das primeiras surpresas do livro. Amélie participou ativamente de toda a obra kardequiana, revendo e relendo para o marido.

Sua história como mulher francesa no século XIX mostra que ela foi muito além do esperado pelas convenções sociais da época. Após a desencarnação de Rivail, ela se tornou (se é que já não era) administradora dos bens do casal, que não eram desprezíveis, em função de heranças recebidas das famílias.

Seu compromisso com o trabalho do marido e seu tirocínio quanto às decisões que os homens das instituições criadas para dar continuidade ao trabalho de Kardec são pacientemente recuperados por Calsone. Uma das principais fontes usadas são os escritos de Berthe Fropo, amiga de Amélia. Ela coloca no papel sua visão sobre as decisões da Sociedade Científica de Estudos Psicológicos, que, salvo engano, foi fruto de uma transformação da Sociedade para a continuação das obras de Allan Kardec.

Do ponto de vista da história, Calsone tenta mostrar, sempre que possível, a visão dos dois lados, mas não esconde sua simpatia por Berthe e Amélie. Sei por experiência própria que quando há conflito, as posições se polarizam, e mesmo quem tem razão, costuma exorbitar em algumas situações.

Calsone faz uma releitura do episódio do Processo dos Espíritas, e atribui aos interesses comerciais de Leymarie, sua associação inadvertida com o "médium" farsante, que produzia fotografias espíritas. Na medida em que se vai lendo, vê-se que Leymarie não tinha a formação necessária para entender o alcance do trabalho de Kardec. Entendendo o espiritismo mais como movimento a ser tornado público que como doutrina filosófica, sem o mínimo conhecimento das ciências, ele vai fazendo associações com Roustainguistas (Guérin), Teosofistas (Blavastsky) e outros espiritualismos, não importa seu método de desenvolvimento da teoria, nem suas contradições com o exposto por Kardec em seu trabalho. Não sei se exagero, mas Calsone parece perceber o efeito dos títulos que vão sendo concedidos a Leymarie, e de sua indiferença ante a adoção de adornos, como bandeiras cheias de imagens com significados simbólicos de Guérin. 

Tudo isso não passou despercebido aos espíritas com melhor formação, como Delanne e Denis, que se dispuseram à criação do órgão "Le Espiritisme" e da "União Espírita Francesa". Calsone mostra com perfeição que a criação de uma nova instituição espírita não foi bem vista pelos membros da Sociedade, muito menos a comercialização de um novo órgão de divulgação, visto como concorrente à Revue.

Na leitura do livro, entendi melhor o significado do apoio que a Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e Caridade, aqui do Brasil, deu à "União Espírita Universal" (elemento pré-textual de A Gênese, traduzida em 1882), bem como dos conflitos e divisões que foram descritos por Canuto Abreu no movimento espírita do Rio de Janeiro no seu livro "Bezerra de Menezes: subsídios para a história do espiritismo no Brasil até o ano de 1895". 

Não vou falar sobre os pais e a infância de Amélie, o processo de herança, sobre as acusações de destruição de documentos, nem sobre a sucessão de Leymarie e os processos judiciários que afetaram o movimento espírita profundamente. Isso fica para o leitor interessado, já que não quero ser acusado de fazer "spoiler"...

Livro: Madame Kardec: a história que o tempo quase apagou
Autor: Adriano Calsone
Editora: Vivaluz
282 páginas

6.3.17

O PAI NOSSO DE ANTONINA


Uma aula sobre oração? Ficou pensando Antonina com seus botões...

Ela se recordou de uma aula que assistiu quando tinha a idade de seus alunos. Engraçado como estas coisas vêm à cabeça, mesmo passados muitos anos.

Antonina tem poucos alunos, apenas cinco, mas o desafio de facilitar a aprendizagem não é menor. Conceitos abstratos, mesmo para crianças de 11 e 12 anos, que geralmente gostam de ser chamadas de pré-adolescentes, com uma experiência escolar limitada, aprovações forçadas e desempenho grupal baixo, são de difícil apreensão. Uma vez acreditando que não são capazes de aprender, desistem muito facilmente.

A ideia que ela teve foi associar Allan Kardec com Jesus Cristo... Kardec escreve em "O Livro dos Espíritos" que o objetivo da prece pode ser "louvar, pedir ou agradecer". Jesus ensinou aos apóstolos a oração dominical (do latim "dominus", significando senhor) como um exemplo de prece.

Ela imprimiu textos com a oração dominical, um para cada aluno. Imprimiu sete, por segurança. E montou um kit com três canetas marca-texto de cores diferentes. Amarelo para pedir, azul para agradecer e verde para louvar.

Chegado o grande momento, ela explicou a dinâmica da aula. Iriam estudar frase a frase a oração, e iriam identificar se a frase tinha o objetivo de louvar, pedir ou agradecer. Cada um iria marcar a frase com a cor respectiva, depois de conversarem em grupo.

As canetas fizeram um enorme sucesso. Os alunos nunca as tinham visto! Parecia mágica a história de colorir uma palavra para destacá-la...

As discussões foram longe. 

- Santificado seja o vosso nome! 

Depois de discutir, concluiu-se que se tratava de louvar a Deus.

- O pão nosso de cada dia nos dai hoje!

- Antonina! Ele está pedindo! Vamos marcar de amarelo?

Frase a frase foram analisando a oração. No final da tarefa alguém falou:

- Não tem nenhuma frase de azul... Falou Cícero.

- Ele não agradeceu nada? Perguntou Artur.

- Não é preciso usar as três classificações para se fazer uma prece. Como ela sai do coração, vai depender do que estamos sentindo e vivendo na hora. Explicou Antonina. E emendou:

- Vocês sabem de onde vem o Pai Nosso?

Ela mostrou um Novo Testamento.

- Uma Bíblia! Falaram os três meninos...

- Depois de Mateus, vem Marcos! Aqui passa de Mateus para Lucas. Esta Bíblia está errada? Perguntou Cícero.

- Não! Explicou Antonina. Você passou as páginas rápido demais. Explicou.

- Este livro não é a Bíblia inteira, é apenas o Novo Testamento...

Os meninos tinham um contato anterior com a Bíblia, talvez pela grande influência evangélica em sua comunidade.

Antes de terminar a aula, houve um apelo:

- Você vai trazer mais estas canetas?

E Antonina, tocada, deixou cada um ficar com um kit. 





20.2.17

SEMINÁRIO "NOVOS ESTUDOS SOBRE A REENCARNAÇÃO" NA UNIÃO ESPÍRITA MINEIRA


Espíritas de Belo Horizonte e redondezas, que não puderam estar no seminário Novos Estudos sobre a Reencarnação, na AECX, têm agora a oportunidade de participar de uma nova edição do mesmo, na União Espírita Mineira.

Além dos expositores do primeiro seminário, contamos com o médico Eric Ávila Pires, um dos autores do livro que originou o seminário, apresentando de forma compreensiva dos estudos do psiquiatra Ian Stevenson, um dos pesquisadores que trabalhou com "memória espontânea de crianças", uma das metodologias aceitas de pesquisa, que gerou grande número de artigos em periódicos indexados e livros, além de consolidar uma linha de pesquisa que continuou após o falecimento de seu criador.

Haverá oportunidade para adquirir o livro publicado em 2016 pela Liga de Pesquisadores do Espiritismo e para colher autógrafos dos autores presentes.

As inscrições são gratuitas, mas as vagas são limitadas. Inscreva-se pela internet, no endereço divulgado no cartaz e seja bem-vindo.


18.2.17

DOLORES BACELAR E O RISHI




O Correio Fraterno, jornal espírita de São Bernardo do Campo, está comemorando 50 anos de publicações com um número no qual homenageia a médium Dolores Bacelar.

Vez por outra citamos os livros que esta médium psicografou no Espiritismo Comentado. Dolores evitava a exposição pessoal, o que pode explicar, em parte, o pouco conhecimento de seus livros pelos espíritas, hoje.

Izabel Vitusso recuperou mais alguns episódios da vida de Dolores Bacelar na sua matéria no Correio. Um deles lembrou-me Yvonne A. Pereira. Dolores foi tida como morta após um de seus partos, saindo do estado inconsciente no qual se encontrava apenas no necrotério, na presença do seu "marido-quase-viúvo" e de uma vela de cabeceira. 

Entre os diversos espíritos que se comunicavam através da pena de Dolores Bacelar, sempre me impressionou o que se identificou como "um jardineiro" e que sempre achei semelhante ao Tagore psicografado por Divaldo Franco. Sua literatura de pequenos contos difere muito da que lemos na obra de Chico Xavier e do pouco de literatura brasileira que conheço.

Um de seus personagens centrais é um “rishi” (“alguém que alcança além do mundo físico através do conhecimento espiritual”. Os rishis teriam escrito os Vedas). Ele fala à alma do leitor com o apoio de imagens da natureza e de interações pontuais entre homens (como se lê no diálogo entre o rei e o jardineiro, p. 67).

Apesar das raízes indiana, o jardineiro flerta com os valores e imagens cristãs. Há um belíssimo texto no livro intitulado “O rouxinol e a lágrima” (p. 51)

Relendo os pequenos textos, que ficam entre a poesia e a prosa, encontrei outras imagens muito usadas nos evangelhos, como as sandálias, as sementes (usadas como símbolo das virtudes), os representantes das riquezas e poderes, como os reis, as pessoas simples, de profissões manuais, como um oleiro. Talvez seja principalmente nos valores que são discutidos nestas pequenas obras meio reflexivas e meio visuais que se encontra a conexão entre a estética oriental e as virtudes cristãs.

Recomendo a todos os leitores do Espiritismo Comentado a provarem deste néctar, sob a forma de pequenos textos.

3.2.17

JUANA DE LA CRUZ E O CONHECIMENTO

Juana Inés de La Cruz

Influenciado pela série sobre Juana de la Cruz, da Netflix, decidi ler alguns de seus poemas que comprei há mais de uma década. Tenho o volume 1 das Obras Completas, intitulado “Lírica Personal”. Um dos primeiros poemas trata do conhecimento, para minha surpresa.

Juana trata uma questão muito curiosa: o saber como vício. Ela fala de pessoas que vivem em busca do saber e pouco produzem com ele. Faz belas imagens em seu poema, como a dos campos floridos:
“Em amenidad inútil,
¿qué importa al florido campo,
Si no halla fruto el Otoño,
Que ostente flores el Mayo?”

Ela se indaga acima qual é a importância de um campo florir-se todo em maio, se não trouxer frutas no outono.

Creio que o raciocínio é muito semelhante a uma história que me foi ditada pelo Conselheiro, chamada “Os evangelhos de João Ângelo”, que cria um personagem que dedica a vida a pesquisar a interpretação dos textos evangélicos e negligencia seu próprio filho, em casa, não percebendo os sinais de socorro que ele lhe endereça.
Não creio que Juana, erudita como era, se ponha contra a aquisição do conhecimento, mas contra o vício de conhecer por conhecer, de acumular informações e teorias sem ser capaz de dar sentido à realidade ou, como diria Kardec, em ter conhecimento sem desenvolver sabedoria.

14.1.17

QUEM É O PRÓXIMO?

Fonte: http://iejusa.com.br/civilizacoesantigas/imagens/7_55.jpg


Na parábola do Bom Samaritano (Lucas 10:29-36) o doutor da lei pergunta a Jesus: “Quem é o meu próximo?”, esta pergunta havia sido feita após se ter conversado sobre a lei moisaica, mais especificamente sobre uma passagem do Levítico, na qual se fala para “amar ao próximo como a si mesmo” (Levítico 19:18)

Lendo mais detidamente a citação, no texto de Moisés, Yahweh está tratando da justiça no julgamento. Inicialmente ele fala para não tratar de forma diferente o pobre e o rico (19:15), depois fala do compatriota (irmão) e recomenda repreender, para que não se cometam crimes de vingança entre os israelitas. Então se escreve:

“Não te vingarás e não guardarás rancor contra os filhos do teu povo. (grifos meus) Amarás  o teu próximo como a ti mesmo” (Lev. 19:18)

Vê-se aqui que a lei mosaica tenta fazer que os israelitas se tratassem como irmãos, ou seja, que se aceitassem sem distinção de riqueza ou pobreza e que renunciassem à vingança de sangue entre si, para tratar suas diferenças dentro da lei. Neste contexto, o próximo a que se refere Yahweh são os compatriotas.

Se aceita esta acepção, faz sentido a questão proposta pelo doutor da lei a Jesus. Quando ele pergunta quem é o próximo dele, ele esta perguntando se o alcance da exigência da lei são os seus compatriotas, apenas, mas Jesus vai estabelecer que se deve amar as pessoas sem a distinção de nacionalidade.

Ao contar a parábola, Jesus elege como herói um samaritano. Ele toca em uma rixa antiga dos descendentes de Abraão. Após o reinado de Salomão, os hebreus se dividiram em dois reinos: Israel e Judá. O reino de Israel tem a Samaria como capital, mas foi conquistado pelo  assírio Sargão II em torno do século VIII a.C., o que gerou uma espécie de influência religiosa oriental nos costumes da região. Os samaritanos, contudo, continuavam aceitando os cinco livros da lei moisaica, mas os judeus, na época de Jesus, condenavam estas diferenças e alimentavam a separação. A rixa com os samaritanos ia ao ponto destes terem seu próprio templo, o que os isolava do templo de Jerusalém.

Habitantes do reino de Judá e habitantes do reino de Israel se viam como diferentes. Eles, por consequência, não se viam como "próximos", embora ambos vivessem sob as regras da lei moisaica.

Os Romanos dividiram a o antigo reino de Salomão, na época de Jesus, em regiões administrativas, entre as quais se encontram  a Judeia, a Samaria e a Galileia. Eles geralmente observavam as semelhanças culturais para que seu domínio fosse principalmente na esfera de governo, evitando controle militar ostensivo. Era uma ideia política herdada dos gregos: "Dividir para conquistar". Estas três regiões continuam sob a influência da lei de Moisés, mas a divisão deve ter evidenciado a percepção das diferenças.

Na história que Jesus conta, um suposto judeu, assaltado e deixado ferido para morrer, é socorrido por um samaritano, ao mesmo tempo em que um sacerdote e um levita judeus o deixaram no caminho. Então Jesus pergunta ao doutor da lei quem era o próximo da vítima de assalto, e seu interlocutor admite que é o samaritano, com as palavras “aquele que usou de misericórdia para com ele”.
Jesus propunha uma ampliação da noção de “próximo”. Ela incluiria até mesmo os estrangeiros, e mesmo os que fossem inimigos dos Judeus, como os romanos, por exemplo. É por esta razão que Jesus afirma no sermão da montanha:

“Ouvistes o que foi dito: “Amarás o teu próximo” e “odiarás o teu inimigo”.  Eu, porém, vos digo: Amai vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem, para que vos torneis filhos do vosso Pai [que está] nos céus, já que seu sol desponta sobre maus e bons, e cai chuva sobre justos e injustos” (Mateus 5:43-45)

Jesus propunha que culturas diferentes pudessem conviver sob uma lei maior, a do Pai. Que não houvesse xenofobia e preconceito no trato entre diferentes. Como alguém que morou a vida quase toda na Galileia, ele percebia que os galileus eram vistos pelos habitantes da Judeia como inferiores,  não importa o quanto vivesse de acordo com a lei.

A universalidade da noção de próximo possibilitou aos cristãos uma ampliação além dos limites da cultura e costumes hebraicos. Como estas questões regionais ficaram distantes no tempo, e passamos a estudar apenas superficialmente a época, a noção de próximo passou para o nível individual, e é geralmente interpretada, hoje, como “qualquer pessoa”, o que gerou um problema para o entendimento dos inimigos, que deixaram de ser inimigos do estado ou da cultura hebraica, e passaram a ser entendidos como inimigos pessoais. Allan Kardec percebeu a estranheza da frase “amai os vossos inimigos” no capítulo XII de O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Nos dias de hoje, em que o mundo, e especialmente a Europa, se vê diante da questão da xenofobia, decorrente das migrações oriundas de regiões de guerra e fome, o ensinamento de Jesus nunca foi tão atual.

10.12.16

30 ANOS DE MEDIUNIDADE





Há trinta anos, José Roberto Maia Pimentel, João Campolina Ferreira e Antônio Carlos Cortez e Silva dirigiam a Associação Espírita Célia Xavier. A mocidade da casa precisava de mudanças, e José Roberto pediu a ajuda do ex-diretor, Ysnard Machado Ennes, para ajudar a repensar o grupo.

Ysnard entendeu que com o tempo a mocidade foi ficando com membros adultos que involuntariamente direcionavam o grupo para interesses válidos, mas cada vez mais distantes das necessidades dos jovens.

Então foram formados grupos mediúnicos a partir destes jovens com idades superiores a 20 e poucos anos. À época, a mocidade computava mais de duzentas pessoas em três ciclos, divididos por idades. O antigo diretor entendia que eles deviam partir para o trabalho. Pessoalmente, eu não defenderia uma intervenção como esta nos dias de hoje, embora seja um desafio para as casas espíritas integrar jovens egressos das mocidades espíritas, que vêm com bagagem de estudo sistemático e conhecimento doutrinário.

Foram diversos grupos, com coordenadores já experientes em reuniões mediúnicas. Eles ficaram algum tempo estudando mediunidade e funcionamento de reuniões mediúnicas antes de iniciarem as experimentações mediúnicas. Alguns grupos se modificaram com o tempo e um grupo surgiu posteriormente no horário do fim da tarde de sábado. A mudança foi implementada no segundo semestre de 1986.

Agora em dezembro reunimo-nos para comemorar os 30 anos de existência e de bom relacionamento entre os grupos. São três os remanescentes. Aproveitamos para lembrar dos que se foram antes de nós e recordar dos desencarnados que participavam da casa e hoje se comunicam conosco.

Acima está uma foto dos que hoje compõem os grupos, há filhos de fundadores, novos membros, mas, principalmente, muitas pessoas que estão juntas há trinta anos, na tarefa mediúnica. Repasso a todos a saudação dos espíritos ligados ao grupo, que desejam que o trabalho perdure por mais trinta anos...

9.12.16

REVISTA INTEGRAÇÃO EXPLICA COMO FOI O 12o. ENLIHPE





A maioria dos leitores do Espiritismo Comentado sabe que participo da LIHPE - Liga de Pesquisadores do Espiritismo, uma rede de estudiosos, ligados ou não à universidade, que, entre outras coisas, organiza um encontro anual (ENLIHPE) que já está em sua 12a. edição.

Por que promovemos este evento anual?

O movimento espírita já oferece muitos encontros, confraternizações, seminários e outros eventos públicos. Por que fazer mais um evento? Por diversas razões:

1. A LIHPE é uma rede virtual. Os participantes a acessam quando desejam comunicar algum trabalho que estão fazendo ou solicitar algum tipo de auxílio. Esta forma de comunicação é muito acessível, o que permite a participação de pessoas do mundo todo, contudo, não possibilita que estas pessoas estabeleçam um vínculo pessoal, se conheçam mais profundamente e tenham a oportunidade de interagir integralmente. O encontro é uma ação que contribui para que as pessoas possam se conhecer melhor, avaliar melhor os trabalhos umas das outras, interagir.

2. A maioria dos eventos do movimento são dirigidas a públicos amplos, de simpatizantes ou trabalhadores das casas espíritas. Por esta razão, no mais das vezes, os expositores conhecidos local ou nacionalmente são convidados. Pessoas com capacidade, mas sem notoriedade, geralmente são preteridas em muitos destes encontros. O ENLIHPE tem mostrado ser um espaço para identificação de novos talentos do movimento espírita.

3. Muitos trabalhos realizados nas universidades sobre o espiritismo e o movimento espírita ficam à larga dos jornais e dos espíritas em geral, por falta de comunicação. Há um número substantivo de pessoas, espíritas ou não em sua vida pessoal, que empreendem estudos sérios e importantes para o conhecimento espírita, mas que estão condenados a ser lidos apenas por um pequeno círculo de pessoas. O ENLIHPE se presta a dar visibilidade a este tipo de trabalhos, que normalmente não seriam conhecidos e a publicá-los sob uma forma mais acessível às pessoas, como capítulos de livro ou artigos. Isto já gerou mal entendidos da parte de pessoas do movimento que interpretaram erradamente que a LIHPE não valoriza autores espíritas consagrados. Não é verdade, tanto é que temos homenageado estes autores, ligados ao estudo filosófico ou científico do espiritismo, em todas as edições de nossos encontros. Contudo, fazemos eventos que trazem informações pouco veiculadas no movimento espírita para a cena, foi a nossa opção a fim de não fazer "mais do mesmo".

4. Nos último evento nós incentivamos os membros da LIHPE a estudar na literatura acadêmica os trabalhos produzidos sobre o tema Reencarnação. Para o 13o. ENLIHPE, estamos incentivando os membros da LIHPE e mesmo os interessados em geral a produzir trabalhos com base na produção acadêmica sobre o tema "Passe e curas espirituais", que ultimamente tem recebido muitas publicações da medicina, psicologia, história, filosofia e ciências biológicas, dentro e fora do Brasil.

Qualquer um pode apresentar trabalho?

Se abríssemos o espaço para qualquer pessoa, correríamos o risco de programar trabalhos de pessoas bem intencionadas, mas mal informadas, o que desmotiva e gera conflitos com os participantes, assim como de pessoas mal intencionadas.

O ENLIHPE, então, conta com um grupo de analistas, geralmente com formação acadêmica, além do conhecimento do espiritismo, que avaliam os trabalhos submetidos, recomendam ou não sua apresentação e fazem sugestões aos autores. Eles não conhecem o nome dos autores dos trabalhos que analisam, avaliam apenas seu conteúdo, da mesma forma que os autores também não ficam sabendo que pessoas analisaram seu trabalho, o que evita parcialidade e conflitos interpessoais desnecessários.

Respondendo à pergunta, qualquer um pode submeter um trabalho, mas só serão apresentados os trabalhos escolhidos pela comissão avaliadora.

A LIHPE é uma elite do movimento espírita?

Não, a LIHPE é uma rede voluntária de pessoas que desejam estudar e conhecer o espiritismo. Muitos de seus membros têm estudos acadêmicos avançados, o que possibilita uma contribuição mais efetiva na área de fronteira entre o pensamento espírita e as áreas de conhecimento acadêmicas. 

Da mesma forma que procuramos um cirurgião se temos dúvidas sobre realizar ou não uma cirurgia, porque sabemos que ele deve ter mais conhecimento e experiência com este procedimento, deveríamos ouvir espíritas que têm um conhecimento profundo em física, se nossos interesses se voltam a problemas na fronteira entre a física e o espiritismo. Um espírita com muito conhecimento doutrinário pode cometer erros elementares quando trata da física, se não a conhece. Da mesma forma, um físico sem conhecimento espírita, pode cometer erros elementares sobre o pensamento espírita quando analisa uma teoria espírita sobre um fenômeno de materialização. 

Com o avanço e gradual complexificação das áreas de conhecimento das ciências, determinadas questões que são postas ao pensamento espírita não podem ser bem equacionadas sem o conhecimento da área científica respectiva. Allan Kardec pensava assim. A LIHPE pretende apenas dar voz às pessoas que têm formação avançada em questões que lhes dizem respeito, sem a pretensão de verdade a priori. Cabe ao movimento espírita analisar estas contribuições e tirar suas próprias conclusões, fazer suas próprias escolhas.

É possível ler os trabalhos selecionados nos ENLIHPEs?


Os melhores trabalhos foram organizados em livros-coletâneas e publicados pela LIHPE, com o apoio financeiro e logístico do Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo "Eduardo Carvalho Monteiro" - CCDPE-ECM. A coleção destes trabalhos se chama "Série Pesquisas Brasileiras sobre o Espiritismo" e já conta com sete volumes:

Pesquisas sobre o espiritismo no Brasil
A temática espírita na pesquisa contemporânea
O espiritismo visto pelas áreas de conhecimento atuais
O espiritismo na atualidade
O espiritismo nas ciências contemporâneas
O espiritismo, as ciências e a filosofia
Novos estudos sobre a reencarnação

Você pode adquirir os livros no site da Candeia:

http://www.candeia.com/J%C3%A1der%20dos%20Reis%20Sampaio

Ou diretamente na Livraria do Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo - Eduardo Carvalho Monteiro.

http://www.ccdpe.org.br/livraria

Você também pode assistir as apresentações do ENLIHPE gratuitamente no site Espiritualidades e Sociedade:

http://www.espiritualidades.com.br/liga.htm






7.12.16

SINAIS DO IMPÉRIO RUSSO NA PSICOGRAFIA DE DOLORES BACELAR



Há muitos anos fiquei conhecendo os livros psicografados por Dolores Bacelar, e me tocaram tanto, que adquiri todos os que pude. Já por algumas vezes tenho usado um conto atribuído ao Irmão Herculano, intitulado “Igor, o bolchevista”, em minhas palestras.

É uma história diferente que lembra as de Tolstói, psicografadas por Yvonne A. Pereira, por ambientar-se no Império Russo. Esta história gira ao redor de Igor, um proprietário de terras reduzido à miséria.

Chamaram-me a atenção, da última vez que preparei o texto para ser contado, os detalhes e regionalismos que o narrador espiritual insere no texto. Um deles é o sobrenome do personagem: Alexandrovich. Não encontrei nada grafado assim na pesquisa que fiz, mas o sobrenome Aleksandrovich (obviamente, uma forma ocidentalizada) é bem comum.

Igor está na aldeia de Grigorievo, que em princípio não encontrei na internet. Esta localidade não deve ser muito distante de Moscou, em função de uma viagem que o personagem faz até a grande cidade do Império Russo. Pedi ajuda ao Chrystian Lavarini, que localizou uma Grigoryevo no Google Maps. Depois, encontrei mais, e também uma Grigiškės, na Lituânia, que fazia parte do Império Russo na época do conto e que significa Grigoryevo. Encontrei Grigoryevos nos Oblasts de Vologda, Arkangelsk, Novgorod, Smolensky, Tver e Vladimir, em terras russas. Difícil identificar qual delas está no texto.

Na casa de Bóris Sergueievich, serve-se um kislischi[1], para Igor. Li em uma revista que na Ucrânia se faz um fermentado de malte ou painço, “melhor que a russa kvass[2]” que tem alguma semelhança com a bastante conhecida kislischi. Um personagem de um romance que encontrei é servido com kvass, kislischi e hidromel, e acha a bebida em questão muito parecida com a Mead[3] escandinava. No texto do irmão Herculano, explica-se que o kislischi é uma bebida feita de “pão fermentado, muito ácida”. Esta descrição parece-se mais com o kvass que com o kislichi que encontrei com muita dificuldade na internet e alguma ambiguidade.

A esposa de Igor fizera um kaftan (no texto está escrito caftã, encontrei também na internet a grafia caftan), que é uma espécie de sobretudo “mais usado por camponeses e mercadores”, mas que hoje é usado apenas por religiosos conservadores. Li também que havia um kaftan usado pelos nobres em casa, apenas, em função da ocidentalização de costumes imposta pelo imperador Pedro, O Grande, na primeira década do século XVIII.

Outras informações próprias da Rússia, mas mais conhecidas, encontram-se no texto, como a palavra “mamenka” (Маменька), que significa mamãe em russo; a palavra “pope” com o significado de padre, a referência ao “samovar”, que é uma peça para servir bebidas quentes como chás diversos.

Estas pequenas palavras não são uma prova definitiva de conhecimento da Rússia, mas, pela dificuldade em se encontrar, ou a médium conhecia bem a Rússia do tempo do império, ou sua faculdade permitiu a inclusão de conceitos desconhecidos pela imensa maioria de nós, brasileiros.





[1] Kislischi ou kislichi é Um tipo de cerveja (sourish) feita na Rússia, em alguns aspectos parecida com a cidra e espumante como o champagne. The Southland Times – 1st august 1883.

[2] O квас é uma bebida gaseificada de baixo teor alcoólico (cerca de 1,5%) preparada a partir da fermentação do pão de centeio, ou pão preto (чёрный хлеб) seco ou amanhecido, que leva também algumas ervas. Há algumas versões alternativas que contam ainda com frutas silvestres, outros grãos ou beterraba. Pode ser consumida também por crianças.

[3] Mead é uma bebida alcoólica criada a partir de mel fermentado com água, algumas vezes com várias frutas, especiarias, grãos ou lúpulo.

5.12.16

MORTALIDADE MATERNA: ABORTO OU EDUCAÇÃO?




O Dr. Alexander Almeida-Moreira, professor do curso de medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora, publicou há pouco no facebook, algumas informações para o debate acerca do aborto.

Um dos argumentos muito utilizados pelos ativistas pró-aborto, e que têm sido reproduzidos até mesmo por alguns jovens do movimento espírita, é que a aprovação da lei que regulamenta o aborto diminuiria a mortalidade materna das classes populares, porque estas mães não teriam acesso a cuidados médicos de qualidade para realizar abortos. Segundo as publicações abaixo, indicadas pelo Dr. Alexander:

"Clareando o debate sobre o aborto: o número de mulheres que morrem pelo aborto clandestino no Brasil é muito baixo e a liberação ou proibição do aborto não alteram a mortalidade materna. Abaixo, as pesquisas que demonstram isso:


Os experimentos naturais ocorridos no México (que liberou aborto em 2007) e no Chile (que proibiu aborto em 1989) indicam que a proibição ou a liberação do aborto não impactam as taxas de mortalidade materna. A queda da mortalidade materna se relaciona com as melhores das condições de saúde geral da população e, principalmente, com o melhor nível educacional das mães."


 Artigos:
http://journals.plos.org/plosone/article…

3.12.16

ISOLAMENTO DE GRUPOS NO CENTRO ESPÍRITA




Jáder Sampaio

O isolamento de grupos em um centro espírita de grande porte é um dos grandes desafios institucionais que precisa ser enfrentado, para que não haja ruptura do caráter associativo.

É mais fácil isolar-se em uma reunião (mediúnica, por exemplo) ou grupo, participar de atividades apenas com as pessoas deste grupo e contribuir com um valor da cota associativa, não se interessando pelas necessidades coletivas da associação, e apenas direcionando exigências para a diretoria, sob a justificativa de ser sócio regular e participar da organização há décadas.

Neste caso, sempre que as necessidades de muitos afetam a rotina dos trabalhos do grupo, este trata dos pedidos de mudança da direção como uma intervenção indevida.

Quando isto acontece, há uma inversão do pacto associativo. Os dirigentes são vistos mais como empregados ou prestadores de serviço da organização e não como lideranças, que abrem mão de seu tempo pessoal e familiar para contribuir com a associação a pedido e com voto de confiança de todos.

Neste cenário, é mais difícil mobilizar a contribuição dos associados para objetivos comuns, da associação como um todo, que demandam trabalho voluntário e envolvimento de todos. Os projetos externos a um grupo, como a construção de uma nova sede, a adoção de regimentos, o socorro a uma atividade considerada importante que está com falta de trabalhadores, a promoção de eventos para encontro dos membros da organização, sejam de caráter doutrinário ou administrativo e a participação de pessoas de diferentes grupos em atividades que não são vistas como “deles” por dirigentes e membros de grupos.

As escolhas de dirigentes e lideranças se tornam um trabalho muito difícil, porque, isolados, os valores de cada grupo não são conhecidos pela organização como um todo, faltando o vínculo da confiança e do respeito entre eles e o corpo dirigente. Os valores, quando identificados e convidados, necessitarão gastar mais energia e dedicação para superar as dificuldades criadas pelo isolamento e pelo desconhecimento das equipes novas com que trabalharão. Não raro, muitos se afastam precocemente, por motivos muitas vezes triviais, que não seriam causa deste tipo de atitude se já houvesse um relacionamento anterior.

Não há, portanto, uma relação orgânica entre o nível estratégico (a direção do centro), nível gerencial (a direção dos grupos) e trabalhadores (nível operacional). Começa a ocorrer uma estranha disputa de poder entre direção do centro e direção dos grupos, quando deveria haver um relacionamento de colaboração, principalmente porque os grupos e os associados em geral necessitam de um corpo diretor eficaz e são eles que o elegem e o conduzem a suas funções “nunca-remuneradas”.


Esta reflexão não exime os dirigentes dos centros espíritas de seus equívocos, do excesso de individualidade ou do cometimento de abusos em suas funções, mas este seria objeto de discussão de outro texto. O que observamos é a estranha inversão e competição, que possibilita o desenvolvimento de um clima organizacional na casa espírita muito bem descrito pelo espírito Irmão X, no livro Cartas e Crônicas, capítulo 29, intitulado “Bichinhos” ao qual remeto o leitor.