27.7.20

AMÁLIA DOMINGO SOLER: UMA MULHER MUITO A FRENTE DE SEU TEMPO




No afã de ler novos romances, os grandes autores espíritas vão ficando esquecidos pelo público espírita em geral. A história do espiritismo na Espanha é um capítulo especial, e deveria ser conhecido por todos.

Talvez a "pedra preciosa" da coroa do espiritismo espanhol seja Amália Domingo Soler. Uma mulher solteira, em uma sociedade na qual se desejava que ela casasse ou se tornasse freira, intelectual (mesmo que sem acesso à escolaridade formal), pobre, mas imensamente dedicada. Hoje, Amália é reconhecida como grande escritora espanhola de sua época, e há teses acadêmicas dedicadas a ela, como escritora e mulher.

Ainda hoje, o livro "Memórias do Padre Germano", ditado psicofonicamente pelo médium Eudaldo Pagés e escrito por ela, inicialmente em forma de contos, depois em forma de romance, é um dos mais impressionantes livros da literatura espírita.

O que ela escreveu? Como era o espiritismo na Espanha do século 19? Com quem debateu em sua época? Como se tornou uma mulher tão iminente em uma sociedade católica e masculina? Como lutou com a cegueira? Como se tornou um ponto de conexão entre o espiritismo na península ibérica e o nascente movimento espírita latino-americano? Ela era membro da maçonaria, mesmo sendo mulher?

Essas e muitas outras perguntas foram respondidas por Débora Zambalde Vitorino, tradutora dos textos ainda inéditos em português por Amália. São mais de dez anos recuperando material em língua espanhola, estudando, traduzindo, escrevendo e falando sobre Amália. Uma aula de erudição e recuperação da memória da jovem Sevilhana, cuja admiração pelos europeus superou o século, a cultura e até mesmo a religião. 

Assista abaixo a entrevista:




Segue abaixo o link para os anais do Congresso Espírita Internacional de 1888, na Espanha, citado no programa acima: 

21.7.20

INICIATIVAS BRASILEIRAS E FRANCESAS DE PRESERVAÇÃO DA MEMÓRIA ESPÍRITA





Depois do programa Conversa com Bial, diversos amigos, todos trabalhadores espíritas, vêm entrando em contato para ouvir a opinião do Espiritismo Comentado sobre a entrevista que o Bial fez com Dora Incontri e com Marcel Souto Maior.


Em nossa opinião, a entrevista como um todo projetou uma imagem racional e favorável do espiritismo para a população brasileira, muito diferente da imagem que ficou com o caso de João de Deus, que, mesmo não sendo espírita, era confundido como tal por se apresentar como médium. Na mentalidade de grande parte dos brasileiros “é tudo a mesma coisa”, e a multiplicidade de experiências religiosas não vem acompanhada com uma clareza na distinção de princípios, proposições e práticas.

Houve um sensacionalismo na mídia de divulgação do programa, feita pela própria emissora, ao falar de descobertas novas e atribui-las à Dora. Ao longo da entrevista, vê-se que ela não se colocou nesse lugar.

Um exemplo do sensacionalismo da mídia global, para quem quiser conferir: 


A entrevista foi muito rica em informações então vamos nos deter nos dois pontos mais questionados: as novas informações sobre a história do espiritismo e, especificamente, a família de Allan Kardec.

Dora Incontri fez menção a algumas descobertas já tornadas públicas por instituições que estão trabalhando com a conservação, transcrição e tradução da correspondência de Kardec e com os documentos copiados por Canuto Abreu na França no período entre guerras, que estava guardado e acesso vetado pelos seus herdeiros.

Além dessas duas iniciativas há uma grande pesquisa que vem sendo feita via internet. Ela se baseia no acesso digital aos arquivos, documentos e coleções europeias das mais diferentes instituições, como cartórios, bibliotecas e órgãos governamentais.

Achei curioso como um grande número de pessoas desconhece o trabalho que vem sendo feito na preservação da memória do espiritismo. As cartas de Kardec compradas dos descendentes de Leymarie e o acervo de Canuto Abreu, especialmente esse último, é quase uma novela com diversos capítulos. Paulo Henrique de Figueiredo nos explica em seu livro “Autonomia: a história jamais contada do espiritismo”, que o acervo de Canuto Abreu (documentos escritos à mão ou datilografados) estão sob os cuidados da Fundação Espírita André Luiz, em São Paulo.

Imagem do C.S.I: Imagens e Registros


Com relação às pesquisas pela internet, gostaria de destacar o Carlos Seth Bastos e seu C.S.I. (Codification, Séances, Investigation): Imagens e Registros Históricos do Espiritismo, pelas contribuições que vêm dando nessa frente de trabalho. O Carlos vem publicando seus achados em três espaços:

https://www.allankardec.online - clicar no canto inferior direito, imagem CSI

Uma das ilustrações que se encontra em allankardec.online

Outro espaço virtual em que se tem publicado documentos digitalizados referentes a Allan Kardec e sua época é o AllanKardec.online. Seu acervo tem por base a Librairie Leymarie e aquisições em outras livrarias especializadas. Seu curador se chama Adair Ribeiro. Eles trabalham em conjunto com o Carlos, citado acima, e o Charles Kempf (veja abaixo). O endereço digital já foi disponibilizado acima:


Há também uma página do Facebook:


As informações da família de Kardec, como a filha Louise e o pai, foram publicadas inicialmente por um espírita francês. Charles Kempf, em outubro de 2018, divulgou em português os achados referentes à correspondência pessoal de Rivail com Amélie que citam a menina Louise, possivelmente desencarnada enquanto os pais adotivos estavam vivos. Ele pode ser lido em http://ismaelgobbo.blogspot.com/2018/10/artigo-inedito-por-charles-kempf.html

Foi também o Charles quem publicou sobre o pai de Allan Kardec. O texto em português pode ser lido no site da Federação Espírita do Paraná com os endereços eletrônicos das fontes: http://www.feparana.com.br/topico/?topico=2255No entanto, posteriormente esta informação foi revisada, pois descobriu-se seu paradeiro, conforme explicado por Carlos Seth em https://www.facebook.com/HistoriaDoEspiritismo/posts/407144190049369

Pessoalmente, não há como negar que uma história de perdas de pessoas queridas pode vir a afetar os interesses de uma pessoa, mas acho ainda especulativo associar as desencarnações ao interesse pelos fenômenos espíritas. Principalmente porque conhecemos a grande maioria dos trabalhos públicos de Kardec, que são extensos, e ele sempre defende os interesses de cientista ante os fenômenos espirituais que estudou.

A posição de Dora contra a idealização de médiuns é muito correta e sensata. Nosso trabalho, como estudiosos do espiritismo, é sempre conhecer bem a doutrina e as afirmações dos espíritos, verificar onde se baseiam, confrontar diferenças e concluir na defesa do que está devidamente fundamentado, argumentado, lógico, venha de quem vier. Isso me fez recordar Sócrates, condenado à morte pela defesa racional de suas ideias, que desagradavam as elites gregas.

13.7.20

BEZERRA DE MENEZES NA "ESQUINA DO CÉLIA"


Livro do entrevistado sobre Bezerra de Menezes



No último sábado iniciamos o programa "Esquina do Célia". O nome estranho é bem conhecido dos membros e egressos da mocidade da associação, porque a sede da AECX é um sobrado que fica na esquina das ruas Chopin e Cel. Pedro Jorge. Após o término da mocidade, queríamos ficar conversando, mas o responsável pela casa tinha que fechar as portas. Então ficávamos conversando na esquina à luz da iluminação pública.

Nosso primeiro convidado foi o professor Luciano Klein Filho, historiador, que se encontra presidente da Federação Espírita do Estado do Ceará. Ele tem estudado seu conterrâneo, Bezerra de Menezes, há muitos e muitos anos, e já está com um novo livro sobre o médico cearense quase pronto. 

Conversamos sobre a vida, as esposas, a abolição, a ação política, a construção de um movimento espírita articulado, a medicina, o espiritismo, as publicações nos jornais públicos e, como diz Luciano, o xodó de Bezerra de Menezes que é "A loucura sob novo prisma". 

Luciano nos traz uma releitura e uma nova visão de Bezerra, mais humanizada e menos santificada. Ele nos mostra as escolhas do homem, o sofrimento da perda dos filhos, as relações de amizade e conflito de ideias com Torteroli e muitas outras informações que uma pessoa que leu as biografias disponíveis (incluindo a organizada pelo próprio Luciano) possivelmente desconhece.

Trazer o sotaque cearense às terras de Minas, numa conversa rica de informações, reflexões e propostas, muito nos enriqueceu. Deixo abaixo o link de incorporação da entrevista que passou muito rápido, lamentando a qualidade do sinal da operadora Vivo, que quadriculou a minha imagem e metalizou a voz, em alguns momentos da entrevista, apesar da conexão via cabo.


10.7.20

PEQUENAS EDITORAS, GRANDES AUTORES



Livro do espírito Alfredo psicografado por Dolores Bacelar

Em tempos de pandemia, quem está em isolamento social talvez tenha mais tempo para ler. E nós, espíritas, via de regra gostamos de ler bons autores espíritas. Cada um tem suas preferências de estilo literário, tema e até mesmo autor, mas em matéria de espiritismo, temos grandes autores, principalmente encarnados, que publicaram grande parte de sua obra em editoras menores, antes de terem acesso a selos de maior circulação no meio espírita, como a Federação Espírita Brasileira, por exemplo.

Nas últimas décadas surgiram muitas editoras, menores, mas algumas muito boas. Quando comecei a ler livros espíritas, aos 13 anos de idade, havia cinco grandes selos na nossa livraria espírita: a Federação Espírita Brasileira - FEB, a Livraria Allan Kardec Editora - LAKE, o Instituto de Difusão Espírita - IDE, O CLARIM e Correio Fraterno. Aos poucos, diversas novas editoras foram surgindo e gostaria de falar nesta matéria de alguns autores e editoras.

Uma médium pouco conhecida no meio espírita, hoje, mas com trabalhos literariamente muito importantes e doutrinariamente qualificados é Dolores Bacelar. Eu já havia lido praticamente tudo o que tive acesso dela, quando vi sua foto pela primeira vez, próximo à sua desencarnação. Já comentei aqui no Espiritismo Comentado um ou outro de seus livros: romances, páginas soltas, contos... Quem a publica é a Correio Fraterno, editora batalhadora situada na cidade de São Bernardo do Campo, São Paulo. 

De Raymundo Espelho, para conhecer Herculano Pires

Um gigante do pensamento filosófico espírita em São Paulo, com incursões pelos mais diferentes temas e áreas de conhecimento, é José Herculano Pires. Jornalista, ele nos deixou mais de oitenta títulos de livros espíritas, alguns muito conhecidos e outros nem tanto. Sua formação em filosofia influenciou muito seu estilo próprio de articular pensadores e pesquisadores contemporâneos seus a sua amada doutrina espírita. Ele foi um dos polemistas que agiu na defesa do pensamento kardequiano, penso que em decorrência da própria filosofia que valoriza a compreensão clara dos conceitos e afirmações dos autores inovadores de novas escolas. Hoje, a família de Herculano assumiu a Fundação Maria Virgínia e José Herculano Pires, que mantém a editora Paideia, uma das “artes” do autor ainda vivo.

Hermínio escreve sobre a médium Regina

Outro autor que nunca canso de divulgar é Hermínio Correia de Miranda. O “escriba”, como é conhecido na intimidade, fez um resgate importante de autores espíritas e espiritualistas das línguas inglesa e francesa, escreveu trabalhos originais em matéria de espiritismo, tratando de questões interessantes, como o autismo e o transtorno de dissociação de identidade. Hermínio mostrou suas próprias observações e fez incursões extremamente originais na história do cristianismo. Ele publicou por diversas editoras, mas a que ainda tem o maior número de seus títulos é a Lachâtre, fundada em Niterói e, agora, no estado de São Paulo.

Um dos livros mais conhecidos de Cairbar

Cairbar Schutel é um autor do início do século 20 que escreveu um grande número de livros entre os quais se destaca o estudo do evangelho à luz do espiritismo e diversos temas doutrinários, comuns a sua época. Ele estabeleceu-se em Matão, no interior de São Paulo, onde fundou o Jornal “O Clarim” (1905) e a “Revista Internacional de Espiritismo” (1925). 

Um dos últimos livros ditados por Irmão X (Humberto de Campos)

Quando o assunto é Chico Xavier, a maior editora de seus livros ainda é a Federação Espírita Brasileira, mas ele teve trabalhos específicos publicados por editoras menores. A editora do Grupo Espírita Emmanuel - GEEM, por exemplo, tem em seu catálogo um grande número de livros psicografados por Chico nos anos 70 e 80, tornando públicas as cartas que ele recebia para familiares em situação de luto. São cerca de 90 livros ditados médium mineiro em seu catálogo. Outra editora com uma linha de publicações muito interessante é Vinha de Luz, que vem recuperando textos não publicados do Chico, mostrando mais da história do médium em Pedro Leopoldo e trazendo a público o que estava condenado a ficar em gavetas ou em prateleiras de museus. Outra editora pequena é a Cultura Espírita União - CEU, que tem um número razoável de livros de Chico Xavier, psicografados nas últimas décadas de seu trabalho como médium.



Eduardo Carvalho Monteiro é outro autor interessante, com uma proposta diferenciada. Ele se interessou bastante pela história do movimento espírita, mesmo não sendo historiador por profissão. Empenhou-se na obtenção de livros e documentos que formaram a base do que hoje é chamado Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo – Eduardo Carvalho Monteiro (CCDPE-ECM). Boa parte de sua obra e pesquisas se acham publicadas pela editora do CCDPE-ECM. Os títulos de seus livros são encontrados em http://ccdpe.org.br/sobre-o-ccdpe/eduardo-carvalho-monteiro/


Um livro de reflexões sobre a teoria e a prática da mediunidade

Raul Teixeira é mais um médium e divulgador importante da atualidade. Algumas dezenas de livros em torno da sua obra se encontram sendo vendidos pela editora Fráter. Seus livros ditados pelo espírito Camilo têm por foco as reflexões sobre a vida à luz do espiritismo. Família, educação, prática da mediunidade e juventude são alguns de seus temas pela mediunidade do médium fluminense.

Por que estou divulgando as pequenas editoras espíritas? Por causa de coisas que a modernidade e o comércio fazem. Hoje temos distribuidoras espíritas, que adquirem os livros das diversas editoras e facilitam o pedido para as livrarias espíritas. Como têm finalidade comercial, escolhem os livros mais vendáveis, e deixam de adquirir livros com menor apelo comercial, o que tem por consequência a ausência dos livros desses e de outros grandes autores nas prateleiras das livrarias espíritas. Sem acesso aos livros, os autores vão ficando esquecidos, ou pior, desconhecidos.

Nessa época que vivemos, a compra de livros não se faz mais indo presencialmente ao centro espírita e escolhendo um dos livros. Então gostaria de recomendar aos que compram pela internet para dar uma olhadinha nos sites dessas editoras espíritas. Vale a pena  escolher alguns desses autores para ler e conhecer. 

Instituto Lachâtre – https://www.lachatre.com.br/loja/
CCDPE-ECM – http://ccdpe.org.br/

Agradeço a todos os que leram o artigo antes da publicação e me ajudaram a torná-lo melhor! Ajudem a divulgar.

7.7.20

"MEMÓRIAS DE UM SUICIDA" E YVONNE PEREIRA


LIVRARIA YVONNE: MEMÓRIAS DE UM SUICIDA | Fraternidade Espírita ...

A TV Célia Xavier, conjuntamente com a reunião de pais das tardes de sábado produziram uma live, na qual o prof. Sandro Márcio nos entrevistou sobre a médium Yvonne Pereira e, principalmente, seu livro "Memórias de um suicida". Depois veio a conversa com o público. Confiram! Se gostarem, não se esqueçam de avaliar.


Um errinho: o escritor português para quem Camilo Castelo Branco escreveu após sua desencarnação chama-se Silva Pinto, e não, Souza Pinto. É a idade...


6.7.20

LIVROS: YVONNE A. PEREIRA




 Cronologia dos livros de Yvonne Pereira



Livros de Yvonne A. Pereira

Literários

Memórias de um Suicida (Rio de Janeiro: FEB, 1956. 568p.) – atribuída aos espíritos Camilo Castelo Branco (com o pseudônimo de Camilo Cândido Botelho), que escreveu a parte narrativa e literária e Léon Denis, que redigiu as explicações doutrinárias dos eventos narrados. É a materialização do projeto do escritor português, que decidiu, durante seu atendimento, buscar médiuns para descrever como é a vida no mundo espiritual dos que voluntariamente se matam. Na primeira parte estão as descrições do sofrimento e confusão imediatamente após a morte. Nas partes seguintes o espírito descreve o Instituto Maria de Nazaré, as diferentes trajetórias e histórias de suicidas portugueses e brasileiros, sua assistência, recuperação, desenvolvimento e preparação para a reencarnação. 

Nas Telas do Infinito – apresenta duas narrativas curtas. A primeira, de Adolfo Bezerra de Menezes, que mostra a reencarnação da cortesã Palmira, do final do século 19, no Morro do Querosene, cidade do Rio de Janeiro, ao qual a médium é levada em estado sonambúlico. O segundo, de Camilo Castelo Branco, é uma narrativa na qual Yvonne, igualmente em estado sonambúlico (vale a pena a descrição de como ela sentia o corpo ao “se afastar” dele), em 1930, período em que está em Barra do Piraí, conta uma história ambientada em Portugal de 1640, na qual um nobre lega um Castelo e tudo o que se encontra dentro dele a uma prima que lhe fora afeto na juventude. 

Amor e Ódio (Rio de Janeiro: FEB, 1956. 553p.) – atribuída ao espírito Charles, enfoca o drama de um ex-aluno francês do Prof. Rivail (Allan Kardec), o artista Gaston de Saint-Pierre, acusado de um crime que não cometera. Após grandes padecimentos, recebe os esclarecimentos elucidativos por meio de um exemplar de O Livro dos Espíritos, à época em que este foi lançado pelo codificador.

A Tragédia de Santa Maria (Rio de Janeiro: FEB, 1957. 267p.) – atribuído ao espírito Bezerra de Menezes, ambientado em uma fazenda de café no Rio de Janeiro, trata da história de uma rica família escravocrata, na qual acontecerão eventos trágicos. O romance trata da reencarnação dos membros da família e analisa as conexões entre a nova vida e a anterior.

Ressurreição e Vida (Rio de Janeiro: FEB, 1963. 314p.) – um belo livro elaborado pelo espírito Tolstoi, com uma novela curta e cinco contos, apresenta diversos personagens que viveram na mãe Rússia, com descrições detalhadas e sempre um tema que lança luz em uma ou mais questões doutrinárias.

Nas Voragens do Pecado (Rio de Janeiro: FEB, 1960. 317p.) – “primeiro volume de uma trilogia atribuído ao espírito Charles, relata a trágica história do massacre dos huguenotes na Noite de São Bartolomeu (23 de Agosto de 1572), durante o que seria uma encarnação anterior da médium, na personalidade de Ruth-Carolina de la Chapelle.”

O Cavaleiro de Numiers (Rio de Janeiro: FEB, 1976. 216p.) – “segundo volume da trilogia, mostra outra suposta encarnação da médium, ainda na França, na personalidade de Berth de Sourmeville.”

O Drama da Bretanha (Rio de Janeiro: FEB, 1974. 206p.) – “terceiro e último volume da trilogia, ilustra como a médium, agora na personalidade Andrea de Guzman, não consegue suportar os embates de sua expiação e se suicida por afogamento.”

Dramas da Obsessão (Rio de Janeiro: FEB, 1964. 209p.) – atribuído ao espírito Bezerra de Menezes, compreende duas novelas abordando o tema obsessão. A primeira retrata os tempos da inquisição portuguesa e da perseguição aos judeus. A segunda mostra duas encarnações de um grupo de espíritos ligado ao período do Brasil-colônia.

Sublimação (Rio de Janeiro: FEB, 1974. 221p.) – “apresenta dois contos atribuídos ao espírito Charles (um ambientado na Pérsia e outro na Espanha) e três contos atribuídos ao espírito Leon Tolstoi (ambientados na Rússia).”

Memórias e Experiências

Devassando o Invisível (Rio de Janeiro: FEB, 1963. 232p.) – um livro autobiográfico, focalizando as diversas experiências com a mediunidade que a autora viveu.

Recordações da Mediunidade (Rio de Janeiro: FEB, 1966.) – a autora discorre sobre reminiscências de vidas passadas, arquivos da alma, materializações, premonição e obsessão.

Artigos e outros

À Luz do Consolador (Rio de Janeiro: FEB, 1997) – “coletânea de artigos da médium na revista Reformador, originalmente entre a década de 1960 e a de 1980.”

A Família Espírita (Rio de Janeiro, FEB, 1973) - o leitor será apresentado à família Vasconcelos, que vive em harmonia de acordo com os preceitos da Doutrina Espírita. Um livro de histórias muito simples voltadas a princípios e valores fundamentais espíritas, possivelmente pensada para o emprego em “Evangelho no Lar” ou no ensino do espiritismo para a infância.

Evangelho aos Simples (Rio de Janeiro, FEB) - o leitor será apresentado à família Vasconcelos, que vive em harmonia de acordo com os preceitos da Doutrina Espírita. Um livro de histórias muito simples voltadas a princípios e valores fundamentais espíritas, possivelmente pensada para o emprego em “Evangelho no Lar” ou no ensino do espiritismo para a infância.

As Três Revelações da Lei de Deus (Rio de Janeiro, FEB) - o leitor será apresentado à família Vasconcelos, que vive em harmonia de acordo com os preceitos da Doutrina Espírita. Um livro de histórias muito simples voltadas a princípios e valores fundamentais espíritas, possivelmente pensada para o emprego em “Evangelho no Lar” ou no ensino do espiritismo para a infância.

Contos amigos (Rio de Janeiro, FEB) - "com quatro histórias fundamentadas nos ensinos e exemplos de Jesus e explicadas, em espírito e verdade, pela revelação dos Espíritos"

Cânticos do Coração (Rio de Janeiro: Ed. CELD. 1994. 2 v. 246 p.) – “coletânea de artigos publicados no jornal Obreiros do Bem.”


Pelos caminhos da mediunidade serena – Pedro Camilo (organizador) (São Paulo-SP. Lachâtre, 2006) – Nesse livro Pedro Camilo apresenta sete entrevistas radiofônicas de Yvonne Pereira, transcritas e repletas de notas de rodapé. Além delas, algumas publicações em periódicos locais, menos conhecidas. Um aprofundamento sobre a teoria e prática da mediunidade segundo a médium fluminense de nascimento e mineira de criação.

Livros sobre Yvonne

Leila, A Filha de Charles: a obra não é de autoria de Yvonne, e sim de Denise Corrêa de Macedo pelo espírito Arnold de Numiers. Porém o romance retrata a penúltima reencarnação de Yvonne como Leila de Vilares Montalban Guzman, uma jovem espanhola que acabou por suicidar-se no rio Tejo. O Espírito Charles que acompanhou Yvonne seria seu pai quando a mesma era Leila e o espírito Roberto de Canallejas seria seu marido.

Yvonne Pereira: entre cartas e recordações – Pedro Camilo (Salvador-BA, Mente Aberta, 2016) – 38 cartas de Yvonne escritas para Domério de Oliveira, Dora Incontri e outros.

Yvonne Pereira: uma heroína silenciosa – Pedro Camilo (Bragança Paulista-SP, Lachâtre, 2004) – uma biografia incomum, que focaliza temas da vida de Yvonne, como suas faculdades mediúnicas, produções literárias, suicídio, obsessão, entre outros assuntos

Devassando a mediunidade: estudo da obra de Yvonne Pereira – Pedro Camilo (São Paulo-SP, Lachâtre, 2009) Este livro se constitui de diversas questões sobre a mediunidade respondidas a partir do “verbo” de Yvonne Pereira, muito pesquisado pelo autor. Destina-se aos que praticam a mediunidade e são atropelados pelas questões do nosso tempo.

Yvonne: a médium iluminada – Gérson Sestini (Rio de Janeiro – CELD, 2012) Um livro de crônicas escritas a partir do conhecimento e do convívio do autor com a médium, principalmente visitas na casa de sua irmã, Amália.

Tuti, a menina médium - Pedro Camilo (Salvador-BA, Mente Aberta, 2015) Escrito em versos para o público infantil, o livro conta a história de Tuti, apelido afetivo com que era tratada a médium Yvonne do Amaral Pereira na intimidade familiar. O livro nos fala de sua mediunidade, da presença de espíritos com Charles, Bezerra de Menezes e León Tolstói, do livro Memórias de um suicida e muito mais.

Vidas de Yvonne do Amaral Pereira - Denise Corrêa de Macedo (Capivari-SP,  EME) Denise fez uma pesquisa nos diversos livros e documentos disponíveis sobre as diversas encarnações de Yvonne Pereira. O leitor consegue acompanhar a sequência das encarnações de Yvonne com os recortes dos textos informativos. É uma espécie de scrapbook cuja leitura nos dá a visão de todo das encarnações da médium de alma mineira.

Yvonne do Amaral Pereira: o voo de uma alma - Augusto Marques Freitas (Rio de Janeiro, CELD) "Retrata a vida de Yvonne Pereira, dedicada ao bem e à doutrina espírita, mostrando o aspecto humano que mais caracterizou a grande trabalhadora."  

Triunfo de uma alma: recordações das existências de Yvonne do Amaral Pereira - Ricardo Orestes Forni (Capivari-SP, EME)

Livros atribuídos a Yvonne Pereira (espírito)

Encontros com Jesus – Wallace Neves (médium), (Bragança Paulista – SP, Lachâtre, 2018) – Narrativas de histórias evangélicas, aos moldes das que devem ter sido contadas por Aníbal de Silas a Camilo Castelo Branco no Memórias de um Suicida. 

(Observação - Os textos entre aspas foram transcritos da Wikipédia e dos sites das editoras. A lista não é exaustiva.)

3.7.20

KARDEC E HUSSERL: UM ANACRONISMO?





Publiquei no livro “O espiritismo, as ciências e a filosofia” um artigo no qual faço analogias entre os métodos da fenomenologia de Edmund Husserl e, bem pouco, da hermenêutica de Schleiermacher, aos trabalhos de Kardec[1]. Como Husserl é posterior a Kardec, cabe a pergunta: terei incorrido em anacronismo?

O meu companheiro Houaiss define anacronismo, no significado mais próximo que estamos empregando, como “erro de cronologia que geralmente consiste em atribuir a uma época ou a um personagem ideias e sentimentos que são de outra época, ou em representar, nas obras de arte, costumes e objetos de uma época a que não pertencem”.

Edmund Husserl começou a elaborar sua fenomenologia no início do século 20, décadas depois da desencarnação de Allan Kardec. Seguramente, Kardec não conhecia, nem leu Husserl, sendo impossível que os textos do autor alemão tivessem sido manuseados pelo fundador do espiritismo. Qual é o nexo entre estes dois autores que entrevimos em nosso trabalho?

Independente da questão da existência ou não dos espíritos, Allan Kardec decidiu estudar não apenas os fatos supostamente provocados por eles sobre a matéria, mas também o seu discurso através dos médiuns. As influências filosóficas de Kardec em sua época, que pretendeu dar um tratamento científico aos estudos que fez e aos dados que obteve, faziam uma clivagem entre ciência e filosofia. O positivismo de Comte, por exemplo, só considerava científico o que se referisse ao estudo da matéria e que compusesse uma explicação associativa entre acontecimentos materiais, cuja plena generalização era chamada de “lei”. A filosofia tornou-se serva desta forma de fazer ciência, muito bem-sucedida nos domínios das ciências naturais (física, química e biologia, com uma base matemática para a constatação das associações).

Allan Kardec, no entanto, não tinha acesso direto ao “mundo espiritual”, nem à “realidade espiritual” que desejava estudar. Assim como um psicólogo, ele precisava formular suas teorias sobre os espíritos, com base quase exclusiva naquilo que lhe diziam os médiuns. Pode-se dizer, portanto, que ele se propôs a estudar o discurso produzido pelos médiuns antes da formulação da psicologia como ciência e seus métodos, o que vai acontecer a partir da década seguinte à desencarnação do fundador do espiritismo.

Para fazer seu trabalho, ele teve que antecipar métodos que seriam elaborados futuramente pelas chamadas ciências humanas, e ainda sem autores que tratassem desse tipo de metodologia. Um exemplo que temos foi o chamado “controle universal do ensino dos espíritos”, que ele descreve na introdução de “O evangelho segundo o espiritismo”.

Na falta de instrumentos que permitissem a observação ou experimentação direta do mundo espiritual, Kardec tem por base de informação aquilo que os espíritos dizem através dos médiuns. Todavia, ele conhece as limitações da mediunidade, que estudou. Nem tudo o que é dito pelos médiuns é de origem espiritual, eles podem misturar suas próprias ideias aos conteúdos espirituais. Nem tudo o que é dito pelos espíritos pode ser considerado verdadeiro, porque alguns ignoram sua própria condição e estado, outros creem saber mais do que realmente sabem, e dão explicações fantasiosas para explicar suas experiências, outros ainda apresentam conhecimentos compreensíveis e racionais, tendo noção dos limites de sua capacidade de explicação. Allan Kardec pretende, então identificar esses últimos, distingui-los dos demais, e situar a doutrina espírita circunscrita ao que eles dizem e que pode ser verificado com o discurso obtido através de outros médiuns que desconheciam o que foi dito sobre o tema em estudo.

No parágrafo acima temos dois princípios de pesquisa similares aos que propôs Husserl futuramente. O primeiro é que ele sabe que não vai estudar diretamente os espíritos, nem o mundo espiritual. Ele vai estudar indiretamente, a partir do conteúdo do que dizem os médiuns. Em fenomenologia, se diz que se estuda a “consciência da realidade”, e não diretamente um objeto natural. Kardec estudou a “consciência da consciência da realidade”, ou seja, o que o médium interpreta sobre o discurso de um espírito sobre o mundo espiritual.

O segundo princípio similar é o da busca de explicações espirituais semelhantes, produzidas por espíritos capazes, através de diferentes médiuns, que de preferência não conhecem uns aos outros. Husserl denomina isso de “redução eidética”, a busca das essências, aquele conteúdo apreendido pela intuição do pesquisador após investigação fenomenológica com diversos sujeitos, cujos elementos centrais do discurso são similares. É com esse material que Kardec formula a doutrina espírita, ou, em linguagem científica, a teoria espírita.

Como Husserl, Kardec aceita que essa primeira formulação não é a definitiva. Novas incursões em relatos mediúnicos podem ser feitas e novos pontos podem ser encontrados, o que evita a “cristalização” do pensamento Kardequiano mas exige “integração” entre o já conhecido e o novo.

Essas semelhanças, entre outras, nos levaram a crer que, estudando “pessoas desencarnadas”, Kardec teve que sair das estritas proposições das ciências naturais, para adentrar um campo de pesquisa novo, fundamentado nos discursos mediúnicos e não exclusivamente na observação de fatos. Por essa razão, pela inexistência de uma epistemologia de ciências humanas na época de Kardec, não encontramos em seu texto senão uma tentativa de adaptação daquilo que se conhecia das ciências naturais para a explicação de sua metodologia pessoal de trabalho. Não há anacronismo nessa afirmação. O que dizemos, é que coisas como o “controle universal” não podem ser explicados com uma epistemologia de ciências naturais, que se constituíram em ruptura ao racionalismo (caro a Kardec), ao idealismo e a outras formas de busca da verdade no contexto filosófico. O que existe, portanto, é uma prática de pesquisa concreta, descrita ao longo do trabalho de Allan Kardec, sem termos epistemológicos vigentes em sua época, capazes de a explicarem de forma semelhante ao que fazia Lavoisier, Le Verrier e outros cientistas da natureza, de sua época.

O filósofo e psicólogo Wilhelm Wundt (1832-1920) ficaria conhecido por demarcar, em 1873, a criação de uma nova ciência em seu livro “Princípios de Psicologia Fisiológica, no qual situa a psicologia no domínio das ciências naturais. Ele tinha uma dupla formação:  médico e filósofo (as duas origens da Psicologia nascente do século 19). Seu discípulo, Titchener (1867-1927), iria propor como objeto de estudo da psicologia a investigação dos fenômenos “com base na experiência e observação pessoal”, denominando sua escola como estruturalismo. Ambos fazem ciência com base na consciência, assim como Allan Kardec, embora suas contribuições mais conhecidas envolvam bastante os pontos de contato entre o físico-biológico e o mental. A psicologia como área de conhecimento autônomo, portanto, ficou registrada na história após Allan Kardec.

Kardec não anteviu a fenomenologia, e nem poderia fazê-lo, mas trabalhou com o objeto das ciências humanas em um tempo que elas ainda não estavam formalizadas, e desenvolveu métodos próprios que depois o filósofo alemão explicaria com uma proposição ainda mais ampla de pesquisa.




[1] Sampaio, Jáder. Espiritismo e métodos de pesquisa em ciências hermenêuticas e fenomenológicas. In: Sampaio, J., Da Fonseca, A. F., Milani, M. O espiritismo, as ciências e a filosofia. São Paulo: CCDPE-ECM e LIHPE, 2014.

29.6.20

UM DIÁLOGO SOBRE CIÊNCIA E ESPIRITISMO





Quatro professores universitários com formações diferentes tratam da questão científica do espiritismo. Afinal, o que era considerado ciência na época de Kardec?  O espiritismo pode ser considerado ciência? Qual era a influência do positivismo na época de Allan Kardec? Por que Allan Kardec afirmou que o espiritismo e a ciência caminham lado a lado? Existem pesquisas sobre temas espíritas em curso?


Um diálogo entre Sílvio Chibeni, Marco Milani, Alexandre Fontes da Fonseca e Jáder Sampaio a partir de um convite da União das Sociedades Espíritas de São Paulo - Regional Campinas.


A partir dessas questões e das posições dos convidados, inicia-se um diálogo com os participantes do evento, que lançam luz em diversos pontos de ligação da ciência e das ciências com o espiritismo. 

Confiram!

26.6.20

VOCÊ JÁ ASSISTIU AO CANAL "ESPIRITISMO EM KARDEC"?


Logo do Canal Espiritismo em Kardec no YouTube


Tenho apreciado muito o trabalho realizado em um canal do YouTube denominado Espiritismo em Kardec, capitaneado pelo Eric Pacheco. Há décadas atrás o pessoal do cinema tinha uma expressão romântica: “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” era uma expressão usada para tratar do cinema novo no Brasil. 

No caso do trabalho do Eric, ele dá voz a estudiosos e trabalhadores do meio espírita que estão fazendo trabalhos interessantes, mas que não ganham as mídias espíritas ou a grande mídia brasileira, ficando na penumbra. 

Não entrem  no canal esperando uma imagem tipo “Rede Globo”, qualidade técnica impecável e recursos técnicos variados. O Eric fica ele próprio meio na “penumbra”, sem iluminação artificial, e faz uma fala com os olhos meio baixos, meio lendo, às vezes tropeçando nas palavras. Então, deve me perguntar o leitor, qual é o diferencial? Qual é o talento, ou como as gerações jovens dizem, o “superpoder” do Eric? Os roteiros.

O Eric é excelente na preparação das entrevistas. Ele parece ler, ouvir e pesquisar sobre os seus convidados. Ele é bom conhecedor da estrutura do espiritismo, que é Allan Kardec, então faz perguntas aos convidados sempre procedentes, centrais na compreensão do que ele tem a dizer, e que geram entrevistas originais e interessantes, que apresentam de forma geralmente clara e sintetizada, o que seu convidado tem a dizer.

Outro “superpoder” do Eric é a capacidade de encontrar convidados interessantes nos quatro cantos do mundo. Ele tem conseguido dar voz a espíritas em países que antes estavam atrás da cortina de ferro, da Europa e dos quatro cantos do Brasil. Ele encontra pessoas com conhecimento específico de um autor, questão ou característica do movimento espírita, e lhes dá voz.

No canal do Eric já assisti, agora no sofá da sala de estar, entrevistas com diversos pesquisadores da Liga de Pesquisadores do Espiritismo – LIHPE, nas mais diferentes áreas do conhecimento. Fiquei sabendo como o espiritismo chegou à Lituânia e à Estônia, o que fazem hoje e quais são suas lutas! Tive o prazer de conhecer o trabalho da Adriana Gomez, professora e pesquisadora de História, do Rio de Janeiro, que estudou o tempo em que o espiritismo foi criminalizado no Brasil. Via a Mary del Priori, do meio acadêmico, que notabilizou-se com um livro sobre o espiritismo, dar uns tropeções com dados e datas que são muito conhecidos pelos estudiosos espíritas (sem demérito ao trabalho dela). Vi o Tiago falando do Torterolli e da história do espiritismo. O Calsone falando de Dias da Cruz... E não vi nada. O Eric produz com qualidade e originalidade entrevistas deliciosas de se ouvir, e com uma produtividade que nos desafia a manter atualizados.

Outro ponto importante é a capacidade dele dar voz a pessoas com posições muito diferentes dentro do meio espírita. Ele encontra quem tem o que dizer, e deixa claro o que pensa e em que se fundamenta o pensamento do entrevistado. Não é um canal para quem não conhece Kardec e a fundamentação do espiritismo. Penso que um iniciante poderia ficar confuso diante de tanta informação. Ele produz para quem já conhece o espiritismo e gostaria de saber o que está acontecendo no meio espírita, polêmicas (de ideias), regionalismos,  história, filosofia...

Quem desejar ver por si mesmo, o canal dele pode ser acessado pela televisão ou smartphone no YouTube (Espiritismo em Kardec), ou ser acessado em notebooks e computadores via https://www.youtube.com/channel/UCb4RCch7vrsbPyO5x_0A3rw/videos
Vivemos uma época extraordinária. Não é mais necessário pedir aos grandes órgãos de comunicação que veiculem os trabalhos que nos interessam. Agora temos que sair em busca, na imensidade de opções disponíveis, o que vai de encontro às nossas preferências, gostos e cultura.

22.6.20

WALLACE FOI ESPIRITUALISTA?






Ontem falamos sobre os livros e a obra de Alfred Russel Wallace no Espiritismo.Net em rede com outros canais espíritas. Você sabia que o coautor da teoria da evolução das espécies era espiritualista? Quer saber mais? O vídeo está disponível acima, basta assistir.

20.6.20

ESTUDAR FILOSOFIA ESPÍRITA PELA INTERNET?




Minha geração estudou no Brasil em uma época na qual a filosofia e a sociologia não faziam parte do currículo do ensino médio. Talvez por isso tenhamos hoje membros do governo que confundem filosofia com ideologia e creem piamente que conhecimento verdadeiro está indissociavelmente ligado a matemática.

Essa lacuna de formação que se impôs a algumas gerações, tem um reflexo especular no meio espírita: a limitação de espaços para o conhecimento e o desenvolvimento da dimensão filosófica do espiritismo. Se considerarmos algumas exceções brasileiras  admiráveis, como boa parte do trabalho de Bezerra de Menezes, Herculano Pires, Deolindo Amorim e Carlos Imbassahy algumas iniciativas institucionais como os institutos de Cultura Espírita e o trabalho de Manuel São Marcos, os “flertes” de alguns oradores e escritores alguns trabalhos publicados pela Liga de Pesquisadores do Espiritismo na série “Pesquisas brasileiras sobre o espiritismo" e publicações/traduções de professores como Dora Incontri e Astrid Sayegh, as casas espíritas, de forma geral, não possuem espaços de formação ou debate com orientação filosófica. Perdoem-me aqueles que não foram citados, até por desconhecimento pessoal do autor dessas linhas.

Um dos riscos dessa omissão é lermos Kardec e as obras subsidiárias do espiritismo como textos religiosos, para se aprender e crer, ficando aquém da sua fundamentação filosófica, e apreendendo jargões para lidar com outras propostas religiosas e filosóficas. 

Um segundo risco, também presente em nossa sociedade, é a supervalorização das ciências, apreendendo-as como “verdade”.  e a tentativa de aproximar o conhecimento espírita ao conhecimento científico de forma apressada, desarticulada e hermética. Surgem espíritas usando o jargão da física, da psicologia, da medicina ou de outras áreas do conhecimento, baseado muitas vezes em textos de divulgação (ou seja, sem domínio das respectivas áreas) e tecendo ilações a um público leigo, incapaz de identificar ou criticar a impostura. Alguns respondem com mais hermetismo às justas críticas realizadas por quem entende, o que serve apenas como forma de impressionar os simpatizantes, que creem estar diante de um grande intelectual.

O terceiro risco, é o da construção de um discurso que só é reconhecido no contexto espírita, incapaz de dialogar com os autores do nosso tempo. Isso faz com que as próximas gerações de espíritas sejam facilmente influenciáveis por professores ateus ou agnósticos, ou ainda, incapazes de articular o conhecimento espírita com o que apreendem na universidade, passem a considerar o espiritismo como mera religião, fé de adeptos, baseada apenas nas relações sociais que os espíritas estabelecem entre si e na revelação de alguns ou de um espírito-médium“favorito”, ignorando o esforço de Allan Kardec.

Não foi com pouca satisfação que recebi o convite para participar de uma iniciativa de espíritas brasileiros (Sociedade Espírita Primavera) e ingleses (Spiritist Society of Bournemouth), capitaneada pelo competente professor Humberto Schubert, da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com sólida formação em filosofia e ciência da religião, como se pode ler em seu currículo (http://lattes.cnpq.br/5846607951367788), ele vem apresentando palestras de cerca de 40, 50 minutos sobre filosofia e espiritismo, seguidas de diálogo com os participantes. Na primeira conferência, Humberto advoga a tese da centralidade da filosofia para a compreensão do todo e da fundamentação filosófica do pensamento de Allan Kardec, ou seja, ele compreende o espiritismo como filosofia, coisa esquecida por muitos “advogados” e “críticos” do espiritismo que tratam dele como se houvesse um primado da religião para a apreensão da doutrina.

Quando o espiritismo chegou no Brasil, inexistia a universidade como entendemos hoje, com ensino, pesquisa e extensão, formadora de profissionais e técnicos de alto nível, mas também produtora de novos conhecimentos. O trabalho de Allan Kardec, que veio do meio acadêmico de sua época, chegou às mãos dos pioneiros, a quem admiramos, mas que tinham por instituições conhecidas no Brasil a Igreja Católica e faculdades independentes, de direito, medicina, engenharia e talvez educação, principalmente. Talvez por isso a leitura de Telles de Menezes e seu diálogo com Desliens, ao publicar o primeiro periódico espírita do Brasil, mostre um distanciamento da compreensão de franceses e brasileiros sobre o pensamento espírita, exposto nos livros de Allan Kardec. Entre Telles de Menezes e Bezerra de Menezes já se observa uma evolução do entendimento do espiritismo, e o “médico dos pobres” dava mostras de seu conhecimento filosófico na coleção intitulada “Estudos Filosóficos”, à época publicada em jornal de grande circulação, hoje encontrada em forma de livros organizados pela Edicel.

A iniciativa das duas sociedades espíritas aproxima pelo estudo grupos europeus e brasileiros, que passam a poder interagir mais pessoalmente, superando as distâncias geográficas e culturais. Ainda há a limitação do uso do português, o que dificulta a participação de espíritas europeus nativos de seus próprios países, sem domínio do idioma ibérico, mas quem pode prever o futuro?

Tendo sido levado a refletir bastante, após três sessões de “filosofia aplicada”, recomendo aos leitores do EC que se interessam pela área, essa iniciativa internacional, agradecendo ao impulso que o isolamento social deu para o desenvolvimento da educação à distância em nosso movimento.


5.6.20

A VISITANTE DESCONHECIDA

Madeleine Pelletier


O fim de tarde e início de noite de sábado, em época de pandemia, encontrou nosso grupo mediúnico reunido através de um aplicativo de internet, em respeito ao isolamento social. Resolvemos manter o encontro, o estudo, as preces e, caso algum dos três médiuns psicógrafos sentisse a influência espiritual, a escrita e leitura de textos ditados pelos espíritos.

Estamos estudando o livro “Memórias de um suicida”, atribuído a Camilo Cândido Botelho, pseudônimo de Camilo Castelo Branco. Uma vez por semana é atribuição de um dos membros preparar e apresentar uma síntese narrativa de um dos capítulos, e nessa semana a médium Ana iria fazer o estudo. Já estamos no capítulo 17, “Vinde a mim”, que narra as instruções de Aníbal de Silas na Cidade Universitária para Camilo e seus colegas, já bem recuperados das impressões iniciais após o ato violento contra a própria vida.

Ana lembrou-se do estudo do livro feito há 25 anos atrás, um quarto de século, quando outros membros de nossa reunião ainda estavam encarnados. Ela havia guardado pequenos cartazes com um esquema visual do Instituto Maria de Nazaré, suas seções e coordenadores.

Terminada a apresentação, inseriu-se uma música suave, “Meditação de Taís”, de Massenet, seguida da “Ave Maria” de Gounot, ambas instrumentais. Uma prece inicial, e os lápis correram sobre o papel em uma das nove residências participantes. Nossa coordenadora desencarnada enviou-nos uma mensagem, emocionada com os cartazes e as lembranças do grupo de estudos que houvera participado enquanto encarnada.

Ainda na terceira parte, a dirigente perguntou um a um sobre as percepções mediúnicas e imagens mentais dos participantes durante a prece e a música. O médium Gamaliel descreveu um espírito, denominado Pelletier, que ele percebia junto à médium Ana, durante a exposição. Para a mediunidade, a distância e o espaço diferem dos que percebemos com nossos cinco ou mais sentidos corporais. Pelletier se apresentou a ele como primeira médica do sexo feminino na França. Ela trabalhou como psiquiatra e Gamaliel lhe descreveu o cabelo curtinho, um corte quase masculino e uma espécie de casaca curta, roupa própria dos homens.

Ela acompanhava Ana durante a exposição, enquanto essa apresentava com clareza e concisão o capítulo de Yvonne. Ao final da narrativa, encontrou-se a imagem de Madeleine Pelletier, que temos acima, e o médium disse tê-la percebido como nessa imagem.

Madeleine Pelletier

Buscamos mais informações com Gamaliel após a reunião e, generosamente, ele nos informou que notou que ela atua “junto a profissionais que cuidam de crianças” como forma de reparação de alguma coisa. A impressão que a energia dela repassava era de compaixão e imensa entrega e dedicação ao trabalho, ou seja, causou uma boa impressão a ele. Ele igualmente percebeu um “séquito de enfermeiras por ela coordenada” que distribuía uma “chuva de luz prateada”, direcionada às cabeças dos doentes que se encontravam em uma possível enfermaria, com leitos lado a lado.

Como já vimos bastante na literatura espírita, e especialmente no livro que nos encontramos estudando, nossas reuniões não afetam apenas a nós, mas costumam ser úteis nas atividades espirituais de auxílio e recuperação de espíritos em estado de perturbação ou sofrendo efeitos negativos das escolhas que fizeram na última encarnação. O que falamos na reunião não fica apenas entre ouvidos humanos. Os estudos são úteis para um número indeterminado por nós de pessoas desencarnadas. Lembrei da expressão cunhada pelo autor materialista português: “Nossos amigos, os discípulos de Allan Kardec”.

Madeleine Pelletier (1874-1939), identificando-se, despertou nossa curiosidade usual. Buscando na internet, descobrimos que foi a primeira mulher a obter o diploma de psiquiatria na França.

Anne Pelletier teve uma vida complicada. Ficou órfã de pai aos dez anos de idade, sendo de família pobre, e abandonou os estudos na adolescência, época em que tinha muitos conflitos com a mãe cristã. Aproximou-se de grupos socialistas e anarquistas que a influenciaram a voltar a estudar aos vinte anos. Obteve o baccalauréat em 1896, equivalente ao nosso ensino médio, e inscreveu-se no PCN, um curso que certificava estudos químicos, físicos e naturais, pré-requisito para tornar-se médica. Não se sabe quando ao certo ela adotou o nome de Madeleine.

Achei curiosa a troca. Anne seria o nome da mãe de Maria, e Madeleine da apostola apostolorum, a mais reconhecida apóstola de Jesus. Haveria alguma relação na escolha do novo nome com a tradição cristã?

Depois do PCN, Madeleine se interessou pela antropologia, onde trabalhou com Letournou e Manouvrier nas teorias de Broca sobre o cérebro e o crânio. Observando que essas ideias eram usadas como forma de explicação da pretensa inferioridade intelectual da mulher, ela trocou seus estudos por um concurso para residência médica em asilos, para o qual teve que lutar, porque era necessário ter direitos políticos e mulheres não votavam na França, naquela época.

Ela conseguiu vencer as barreiras e, em 1903, defendeu a tese “A associação de ideias na mania aguda e no atraso mental”. Se a memória não me engana, o tema estava fervilhando na Europa, e foi estudado por Jung que fez publicações em psiquiatria com estudos experimentais de associação de ideias. O conceito de mania era diferente do atualmente empregado pelos psiquiatras.

Ela trabalhou então em dois “asilos” franceses, entrou na maçonaria e publicou artigos técnicos. Com um consultório pouco procurado, tornou-se médica de urgências, e passou a atender muitos pobres, acompanhada por um agente de polícia.

Na sua vida política, filiou-se a um movimento de mulheres (“Solidariedade das mulheres”), aproximou-se da Seção Francesa Internacional Operária (SIOF), mas os abandonou, desencantada, em 1910. Trabalhou na primeira guerra mundial pela cruz vermelha, auxiliando combatentes. Após mais um desencanto, tornou-se antimilitarista.

Ela teve uma incursão no Partido Comunista e viajou à Rússia pós-revolucionária, onde se desencantou das condições de vida da população e com a ação da polícia. De volta à França, suas publicações não agradavam muito ao partido, e ela acabou se afastando em 1926.

Ela se aproximou novamente de anarquistas e socialistas, vivendo como médica, e acompanhando a questão fascista que ganhava dimensão na Europa e mesmo na França. Em 1937, anos após ter sida acusada de praticar abortos (a acusação era sem comprovação) ela teve um AVC e ficou hemiplégica, tendo que aceitar a ajuda dos amigos. Dois anos depois, em um ambiente de “caça aos abortistas”, foi acusada de participar de um aborto de uma jovem de 13 anos, mas declarou-se inocente. Reconheceu-se que ela não poderia tê-lo realizado pela sua condição física, contudo, considerada um perigo “para si, para outrem e para a ordem pública”, foi internada em uma clínica psiquiátrica, onde desencarnou após um segundo acidente vascular cerebral. (A maioria das informações foi retirada da Wikipédia brasileira e francesa).

Ana é médica pediatra e intensivista, e atende a crianças pobres ou de classe média em um posto de saúde. Passados mais de oitenta anos da desencarnação de Pelletier, vê-la em uma reunião mediúnica, dedicando-se à infância e ao atendimento da pobreza não nos causa nenhum assombro. Sua dedicação aos pobres e à emancipação da mulher, assim como seu ideal de um mundo menos desigual, pesam na balança em seu favor.

Desnecessário dizer que Gamaliel não conhecia a história de Madeleine, que nos pôs a pensar bastante sobre nossas ações e sobre a sabedoria divina, sempre abrindo caminhos novos para seus filhos, mesmo os que não acreditam nEle. Madeleine Pelletier me fez lembrar também de outra mulher que teve passagem por organização comunista e que ficou famosa após a morte, através da mediunidade de Chico Xavier, dessa mesma época, só que brasileira e teosofista: Nina Arueira.