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20.9.14

CRISTÃOS PERSEGUIDOS POR ROMA


Pintura de jovem cristã martirizada sob Nero

Com a intolerância do judaísmo ao cristianismo nascente, a campanha militar de Tito contra os judeus e o ideal missionário dos apóstolos, o cristianismo foi levado a muitas cidades do império romano e, aos poucos, tornou-se uma religião com muitos adeptos. Alguns autores consideram o sistema de estradas que ligava as cidades do império um facilitador para a criação de comunidades cristãs em diversas localidades romanas.

Desde o começo, houve um conflito de valores com a tradição romana o que fez com que os cristãos fossem denunciados como ateus (por não prestarem culto aos deuses romanos e ao imperador) e fossem considerados uma espécie de corruptores da sociedade. Até denúncias de sacrifícios de crianças foram feitos. Eles sofreram perseguições, sendo algumas decretadas pelos imperadores.

Uma revisão de fontes do cristianismo e textos históricos que fizemos para discussão no 10o. Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo (ENLIHPE) nos permitiu fazer o levantamento abaixo dos decretos imperiais contra os cristãos em Roma até o século IV, época em que Constantino resolve cooptá-los aos império e faz diversas ações que culminarão na transformação do cristianismo em religião oficial do império romano.









27.6.14

A ESQUINA DE PEDRA DO CRISTIANISMO



Wallace Leal V. Rodrigues escreveu o livro A Esquina de Pedra para tratar, de forma romanceada das mudanças ocorridas no movimento cristão ante a aproximação do império romano. 

Alexandre Caroli Rocha me sugeriu a entrevista com o professor Jeferson Ramalho, feita pela RTV da Unicamp, especialista que comenta de forma clara e sintética o livro de Paul Veyne, "Quando o nosso mundo se tornou cristão".

Senti-me feliz em perceber que minhas esparsas leituras do cristianismo primitivo estão em sintonia com pensadores tão distintos. O vídeo tem apenas 15 minutos. Se você se interessa pelo assunto, vale a pena dar uma olhada.

http://www.rtv.unicamp.br/?video_listing=quando-o-ocidente-se-tornou-cristao#


23.2.14

OS PROFETAS ENTRE OS JUDEUS, OS CRISTÃOS E OS ESPÍRITAS



Estamos estudando, em nossa reunião mediúnica, o capítulo de "O evangelho segundo o espiritismo" que trata dos profetas (capítulo 21 – Haverá falsos cristos e falsos profetas).

O que é profeta?

O senso comum associou os profetas às profecias e entende, hoje, que seriam pessoas com o dom de desvendar o futuro. Na sociedade hebraica, os profetas seriam, de algum modo, um elo entre os homens e Deus, sendo, portanto, capazes de dar sinais da divindade, o que envolve curar doenças, saber de coisas que as pessoas comuns não sabem, e, como diz Kardec, eles seriam “todo enviado de Deus com a missão de instruir os homens e de lhes revelar as coisas ocultas e os mistérios da vida espiritual.” Jesus foi identificado como profeta pela mulher samaritana, no evangelho de João (4:19).

Os profetas estão presentes no cristianismo primitivo. A Bíblia de Jerusalém os identifica como homens que falam em nome de Deus sob a inspiração do espírito santo (pág. 2070) Isso seria um carisma especial, assim como haveria outros carismas, como o dos apóstolos, Perto destes últimos, os profetas teriam um “conhecimento imperfeito e provisório, em relação com a fé.”

O cristianismo primitivo aproxima o profeta do que o espiritismo, hoje, denomina médiuns. Não acreditamos que os médiuns percebam diretamente a Deus, nem ao chamado espírito santo, a não ser que esta denominação tenha o significado de espíritos superiores, identificados com o cristianismo, como muitos dos que se comunicaram à época de Allan Kardec.

Esta reverência respeitosa que desperta a figura do profeta (médium), seja no contexto judaico, seja no cristão primeiro ou no espírita, pode proporcionar uma aceitação quase acrítica do que ele diz, após ser reconhecido como tal. Isto faz com que pessoas sem caráter desejem ser vistos como profetas para obter todo tipo de vantagem dos ingênuos. Daí a preocupação em não se deixar enganar. Kardec dava aos médiuns um papel de intermediários, e não lhes incendiava o ego, cuidado muito importante para o espiritismo do século XXI.

Os profetas entre os cristãos dos primeiros séculos

Os cristãos primeiros tinham a preocupação de não ser enganados por quem se dizia profeta, desde as inúmeras advertências do próprio Jesus (Mateus 7:15-20, por exemplo). Encontramos alguns cuidados na Didaqué, um livro escrito entre 70-120 d.C., de autor desconhecido, mas possivelmente um judeu convertido, da escola de Tiago Menor que imigrou para a Síria. Ele se preocupa com os cristãos que ensinam o cristianismo (didáscalos ?) e com os profetas que viajam de comunidade em comunidade. Ele propõe que haja hospitalidade entre os cristãos, mas com discernimento.

“Se o hóspede estiver de passagem, deem-lhe ajuda no que puderem: entretanto, ele não permanecerá com vocês, a não ser por dois dias, ou três, se for necessário. Se quiser estabelecer-se com vocês e tiver uma profissão, então trabalhe para se sustentar. Se ele, porém, não tiver profissão, procedam conforme a prudência, para que um cristão não viva ociosamente entre vocês. Se ele não quiser aceitar isso, é um comerciante de Cristo. Tenham cuidado com essa gente.” (Didaqué 12:1-5)

Nesta época aceitava-se que o profeta fosse sustentado pela comunidade, se verdadeiro. Contudo, o autor da Didaqué tem o cuidado de estabelecer o que se daria ao profeta. Ele compara o profeta ao professor, e como o professor é digno do seu alimento, o profeta também seria. Neste ponto da história, parece já haver uma mistura entre a função de profeta e a de didáscalo. Como ninguém enriquece com o cristianismo primitivo, o profeta também não. A ele são destinados “os primeiros frutos de todos os produtos da vinha e da eira, dos bois e das ovelhas”. Este é um hábito semelhante ao judaico, de destinar estes bens aos sacerdotes. Gosto particularmente do versículo quatro:

“Se, porém, vocês não têm nenhum profeta, deem aos pobres.”

O Espiritismo e os profetas

Passados os séculos, Kardec retoma o debate dos profetas em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, porque sabe que tanto médiuns, quanto espíritos, podem equivocar e se equivocarem. Por isso, preocupa-se em instruir o movimento espírita que observe o caráter dos médiuns, assim como os cristãos primeiros se preocupavam com o caráter dos que se apresentavam como profetas.

“O fato de operar o que certas pessoas consideram prodígios não constitui, pois, sinal de uma missão divina, visto que pode resultar de conhecimento cuja aquisição está ao alcance de qualquer um, ou de faculdades orgânicas especiais, que o mais indigno não se acha inibido de possuir, tanto quanto o mais digno. O verdadeiro profeta se reconhece por mais sérios caracteres e exclusivamente morais.” (O Evangelho segundo o espiritismo, cap. XX!, item 5)


Sábias palavras, muito atuais em uma época na qual muitos ainda se deslumbram com o que parece sair da boca ou das mãos dos médiuns.

2.1.14

POLICARPO DE ESMIRNA, MÁRTIR CRISTÃO DO SÉCULO II




Meu primeiro contato com Policarpo de Esmirna foi através da carta que Inácio de Antioquia escreveu-lhe. Ao que tudo indica, Policarpo era um jovem bispo, quando Inácio estava rumo à execução, porque seria julgado e condenado em Roma como cristão. Inácio não temia a morte, e sentia-se honrado em desencarnar da mesma forma que Jesus e alguns de seus apóstolos.

Muitos anos mais tarde, Policarpo seguir-lhe-ia os passos. Os cristãos continuavam sendo minoria no império romano, e sua fé era vista como um desacato à autoridade dos imperadores. Curiosamente, eles eram vistos como ateus, por não aceitarem a divindade dos césares e o culto aos deuses romanos. O autor da história do seu martírio (Piônio de Esmirna? Márcion? Evaristo?) escreveu: “Felizes e generosos todos os mártires que surgem pela vontade de Deus.” (Martírio 2:1)

Este mesmo autor destaca que no meio cristão do segundo século, os cristãos não se entregavam às autoridades, mas uma vez presos e levados a sacrificar ao imperador e a negar sua crença, a grande maioria deles não titubeava. Os romanos os ameaçavam com torturas físicas, com as feras e com a fogueira. Tudo leva a crer que desejavam principalmente que os cristãos se submetessem publicamente a César, negando sua fé, para intimidar e humilhar os profitentes do cristianismo.

A perseguição de Policarpo é desencadeada pelo martírio do jovem Germânico, que foi levado às feras, e instigado pelo procônsul a abjurar, sob o argumento “que tivesse piedade de sua própria juventude” (Martírio 3:1) Germânico atiçou as feras para que se consumasse sua sentença e a multidão gritou: “Abaixo os ateus! Trazei Policarpo.” Diz a tradição que Policarpo seria o décimo segundo cristão a ser sacrificado em Esmirna).

Três dias antes de ser preso Policarpo sonhou com um travesseiro em chamas. Sua interpretação foi que seria queimado vivo. Ele foi levado a uma pequena propriedade, mas os romanos prenderam e torturaram “dois pequenos escravos”, que entregaram onde ele estava. Ele foi localizado pelo chefe de polícia (Herodes), desceu calmamente do piso superior da casa, conversou com seus perseguidores, que se espantaram com a idade avançada e a calma de Policarpo, e lhe permitiram orar durante duas horas. O esmirniota mandou servir-lhes o que comer e beber, enquanto fazia suas preces.

O procônsul, em julgamento público fez com que se anunciasse no estádio três vezes: “Policarpo se declarou cristão!” Romanos e judeus teriam dito: “Eis o mestre da Ásia, o pai dos cristãos, o destruidor de nossos deuses! É ele que ensina muita gente a não sacrificar e não adorar.” (Martírio 12:2) Eles pediram que fosse lançado um leão contra Policarpo, mas isso não foi considerado lícito, porque o combate com feras já havia terminado. Então, gritaram que fosse queimado vivo, confirmando aos olhos de Policarpo o significado de seu sonho.

Principalmente os judeus, segundo o narrador, recolheram lenha e feixes para a pira. Policarpo despiu-se e retirou os calçados. Seus executores desejavam pregá-lo, mas ele disse: “Deixai-me assim. Aquele que me concede força para suportar o fogo, dar-me-á força para permanecer imóvel na fogueira, também sem a proteção de vossos pregos” (Martírio 13:3) Então ele foi amarrado com as mãos atrás das costas, o que fez com que os conhecedores do judaísmo o vissem como o cordeiro do sacrifício. Policarpo fez uma prece a Jesus, da qual extraio algumas frases: “Eu te bendigo por teres me considerado digno deste dia e desta hora, de tomar parte entre os mártires, e do cálice de teu Cristo, para a ressurreição da vida eterna da alma e do corpo, na incorruptibilidadedo Espírito Santo.” (Martírio 14:2) Ele ainda louvou e bendisse a Deus.

Os executores tocaram fogo na pira, e o narrador diz que em vez de queimá-lo, as chamas envolveram o corpo, como uma “espécie de abóbada” e ele permaneceu no meio, como “pão que assa, como ouro ou prata brilhando na fornalha”. Sentiu-se um perfume de incenso. O povo, então, pediu que o carrasco o executasse com um golpe de adaga, uma vez que o fogo não o consumia, e, feito, o sangue jorrou e apagou o fogo. Os cristãos pediram-lhe o corpo, mas o magistrado negou, afirmando: “Não aconteça que eles, abandonando o crucificado, passem a cultuar esse aí.” (Martírio, 17:2) O centurião, então, fez queimar o corpo, e os cristãos recolheram depois os ossos, para colocá-los “em local conveniente” e celebrar o aniversário de sua morte.


Os relatos são atribuídos originalmente a Irineu, discípulo do bispo de Esmirna, mas são cópias de cópias. Independente do que é factual e do que é legendário, é indiscutível que a coragem destes cristãos primeiros nos legou o acesso aos ensinamentos de Jesus, passados mais de dois mil anos de seu nascimento.

Referência:

Martírio de São Policarpo, Bispo de Esmirna. in: Padres Apostólicos. São Paulo: Paulus, 1995.(Patrística)

1.8.12

HISTÓRIA DO CRISTIANISMO


Terminei a leitura do livro "Uma breve história do cristianismo", de Geoffrey Blainey. De fato, ele produziu um texto como historiador, embora seja uma narrativa corrida e sem a indicação de fontes, o que gera alguns pontos polêmicos e outros próprios da leitura do autor. Apesar da busca do lugar terceiro, o autor não consegue deixar de expor-se e posicionar-se, o que é esperado.

O livro é uma deliciosa leitura introdutória para quem se interessa pelo tema. De Jesus a João Paulo II, o autor dedica uma ou duas páginas para um grande número de designações e grupos cristãos e anticristãos, mundo afora. Surpresa agradável foi encontrar uma descrição das ideias de Emmanuel Swedenborg (médium sueco) e de Edward Irving, considerados antecessores do espiritismo por Arthur Conan Doyle.

Allan Kardec, o Evangelho Segundo o Espiritismo e o movimento espírita são uma grande omissão do autor, que chegou a inserir tendências atéias e de articulação entre o marxismo e o cristianismo em seu trabalho. A Teologia da Libertação brasileira é recordada, e os três milhões de espíritas esquecidos. Etnocentrismo do primeiro mundo?

Uma trajetória curiosa do autor é traçar a linha tênue entre o cristianismo e a política. A desconstrução do catolicismo pela revolução francesa, sua expoliação pelos revolucionários e o desrespeito a instituições cristãs como um todo, sem capacidade de distinguir os aliados da nobreza dos servidores do povo como um todo, causam quase indignação.

O autor também tem uma leitura muito diferente da historiografia brasileira com relação aos jesuítas. Foram perseguidos por serem competentes ou por interferirem nos bastidores do poder temporal?

Uma leitura interessante é a recuperação de cada uma das tendências oriundas do movimento protestantes que estão presentes no nosso dia-a-dia. Os Santos dos Últimos dias, a Assembléia de Deus, os Metodistas, os Batistas, o Exército da Salvação, os luteranos, a Torre de Vigia, a Ciência Cristã, os Quakers, todos têm suas origens, principais ideias e percurso esboçados no texto e contextualizados.

O cristianismo é um opositor do capitalismo democrático? Do comunismo? Do fascismo? O tema, apesar de tratado de forma breve, faz parte da proposta da obra. Muitos ativistas políticos ateus de hoje tratam as diversas designações cristãs como adversárias ou inimigas, com intolerância incomum.

Blainey trata também de um assunto curiosíssimo. A crença de ateus e agnósticos no conhecimento considerado científico e tecnológico e sua cegueira quanto às questões do humano, nestas estreitras abordagens epistemológicas do conhecimento. Ele aponta uma certa ingenuidade de propostas como a de Dawkins e a de Hawking e um esquecimento dos episódios negros das guerras mundiais e seu racionalismo anti-humanista.

O livro, apesar de expressar a leitura do autor, lança luz e questões sobre as representações do cristianismo na sociedade, hoje, talvez surpreendendo muitos dos que se encontram identificados com o movimento cristão e ignorantes das ações e concepções de ateus e políticos materialistas. Recomendo a leitura crítica do mesmo.

5.11.11

O ESPIRITISMO É UMA DOUTRINA CRISTÃ?

João, o apóstolo


Giovanni Reale e Dario Antiseri (2011) escreveram e publicaram uma coleção intitulada História da Filosofia. No Brasil, a Paulus fez a empreitada de traduzir para a língua portuguesa e trazer a público.

No segundo volume, os autores apresentam a filosofia patrística e escolástica. Com mais de 300 páginas, eles podem se dar ao luxo de apresentá-las com mais cuidado. Um tema desenvolvido por eles vem de encontro às nossas pesquisas sobre a identidade do cristianismo.

O Cristianismo é trinitário?

Minha filha entrou em debate com seu professor de religião, que afirmou que embora os espíritas acreditem ser o Espiritismo uma doutrina cristã, o resto da cristandade não compartilhava desta posição. Ele se justificou: na sua concepção de cristianismo a doutrina trinitária (Deus-Jesus-Espírito Santo são uma só pessoa) é o marco central. Quem não aceita este dogma, não é cristão.

A Construção do Trinitarismo

O Trinitarismo não é um ponto pacífico entre os cristãos dos primeiros séculos. Reale e Antiseri entendem que alguns problemas enfrentados foram centrais: a conciliação do Antigo Testamento com o Novo Testamento, os problemas textuais (a multiplicação de textos) e os problemas teológicos (que têm por centro a questão da trindade).

Comecei uma leitura dos textos dos chamados Padres Apostólicos (os que foram discípulos dos apóstolos e deram sequência ao movimento cristão). Em Clemente Romano, por exemplo, não há clareza alguma do trinitarismo. O tema não parece ser relevante em suas preocupações, que envolviam as discórdias internas do movimento e o ethos cristão.

Esta questão vai tornar-se relevante aos poucos, no confronto entre o pensamento cristão, que se desenvolve a partir dos "padres apologistas", debatedores com os filósofos e que aos poucos absorvem alguns dos instrumentos do pensamento filosófico. 

Os filósofos italianos afirmam: "A formulação definitiva do dogma da Trindade só ocorreu em 325, no Concílio de Nicéia, depois de longas discussões e polêmicas, quando foram identificados e denunciados os perigos opostos do adocionismo (...) e do modalismo (...), bem como uma série de posições relacionadas a estas de diversos modos." (pág. 29-30)

A pergunta que não quer calar

Publicamos há alguns meses uma matéria sobre o Concílio de Nicéia, suas interferências políticas e os interesses que o cercaram, bem como sua composição e como foram votadas suas conclusões. 

Independente deste relato, se o trinitarismo como conhecemos só foi formulado no século IV, e se as posições do movimento cristão iam da indiferença à oposição a esta tese, dar-se-á que os cristãos dos primeiros séculos fossem heréticos, todos heréticos? Penso que não, assim como nós espíritas, nos dias de hoje.

O trinitarismo não é o pilar central do cristianismo, é só uma ideia dos cristãos dos séculos III e IV que se tornou majoritária no futuro. Uma esquina de pedra.

12.7.11

REENCARNAÇÃO E CRISTIANISMO

Figura 1: Constantino queimando livros de Arius. Ilustração de um compêndio de lei canônica . Fonte: Wikipedia (inglês) verbete "First Council of Necaea"


Vez por outra recebo a visita de leitores evangélicos e católicos no blog. Eles deixam alguns comentários que nem sempre publico, por fugirem totalmente ao tema tratado ou por entender que se prestam a um diálogo de surdos.

Recentemente recebi um comentário no qual o autor afirma que o espiritismo "nega pelo menos 40 verdades da fé cristã" e que "a crença na reencarnação é incompatível com o cristianismo ou doutrina cristã". Ele questiona por que o movimento sonega ou esconde este fato dos seus adeptos.

Também recentemente um professor de religião de uma de minhas filhas ensinou que o espiritismo não faz parte do cristianismo, porque, entre outras coisas, não acredita na doutrina da trindade, embora os espíritas se considerem cristãos.

1. A Questão da Trindade

A questão da trindade não era pacífica no início do cristianismo, tanto é que foi convocado um concílio no ano 325 para tratar do tema, o Concílio de Nicéia. Se a trindade foi objeto de discussão, em um encontro de representantes do cristianismo, é sinal que se tratava de um tema polêmico. Desconheço um concílio ou sínodo católico para discutir se a existência de Deus é um princípio cristão, posto que é ponto pacífico e universal.

Ário ou Arius (ou ainda Arrius, como prefere Rodrigues) foi um dos membros da escola de Alexandria que negava que Deus e Jesus participassem de uma mesma substância. Sobre o Concílio de Nicéia, pode-se ler o livro "A Esquina de Pedra", escrito por Wallace Leal V. Rodrigues, editora O Clarim, que entremeia uma narrativa romanceada a informações sobre o concílio e a época. Ao final deste livro ele insere uma nota na qual faz referência ao livro "History of the First Council of Nice", de Hilton Hotema, e cita o seguinte:

"Além de Constantino e Eusébio de Cesaréia, apenas 300 bispos votaram no esquema de Constantino e que estes eram ... 'homens iletrados e simples, incapazes de compreender o que se passava'... Esses prelados ignorantes, aflitos de refressarem às suas cidades e temerosos de serm tomados por hereges, concordaram com o imperador, ansiosos de ver terminado o Concílio." Segundo o autor, 1800 bispos participaram do Concílio.

Outra afirmação do Prof. Hotema é com a vitória de Constantino, Arius foi considerado herege e excomungado. Seus escritos se tornaram escassos porque foram destruídos, como era habitual à época. Isto se pode ver na figura 1.

O que se pode concluir é que a trindade não era doutrina oficial da igreja antes do ano 325. Se ela for considerada condição sine qua non para ser considerado cristão, muitos dos cristãos, mártires e talvez pais da igreja dos primeiros séculos serão considerados hereges.

O livro "Cristianismo, a mensagem esquecida", de Hermínio Miranda o tema é abordado e ele faz referência a um teólogo contemporâneo, Hans Küng, que propõe seja Jesus considerado homem e que haja entendimento entre as religiões, e que a adesão ao credo niceano não seja o critério para a identificação do cristão. Nesse livro, o tema também é tratado, ao contrário do que afirma nosso crítico. E a reencarnação, pode ser considerado um ponto polêmico da comunidade cristã dos primeiros séculos?
2. A Questão da Reencarnação

A reencarnação, tão contrária a alguns dogmas católicos, é ainda mais bem tratada na literatura espírita que a questão da trindade. Kardec, em O Evangelho Segundo o Espiritismo, dedica um capítulo inteiro a explicar passagens que sugerem: que a reencarnação era conhecida pelos judeus e que pode-se interpretar diversas passagens envolvendo os ensinos de Jesus como sendo favoráveis à tese reencarnatória.

Dois dos discípulos de Kardec escreveram livros sobre a reencarnação (Denis e Delanne), mas Denis acrescenta muita informação ao debate, ao mostrar em seu Cristianismo e Espiritismo, como a reencarnação era crença conhecida em meio aos judeus (através de citações de textos originais), com muitos exemplos, e defender a tese da doutrina secreta, ou do sentido oculto dos evangelhos. Ele cita passagens dos pais da igreja favoráveis à reencarnação, e a famosa dúvida de Santo Agostinho. Nele vemos a questão da reencarnação presente na comunidade e nos teólogos de Alexandria, antes do século IV.

Fosse a reencarnação um fenômeno pontual, não teríamos o episódio medieval dos cátaros, que foram vítimas de genocídio em função dos interesses da igreja, como nos mostra Hermínio Miranda em seu livro "Os Cátaros e a Heresia Católica"?

Outra fonte que trata desta questão é o livro "A reencarnação segundo a Bíblia e a Ciência", escrito por José Reis Chaves. Este mesmo autor trata rapidamente do concílio de Nicéia no seu "A Face Oculta das Religiões".

3. Concluindo

Se admitirmos uma visão histórica, o espiritismo é uma releitura do cristianismo, em sintonia com muitos estudiosos do pensamento e vida de Jesus, de dentro e fora da igreja católica. Desta forma, não se trata de sincretismo, posto que desde o seu primeiro livro ele se propõe a fazer uma leitura racional dos evangelhos e elege o cristianismo como uma referência ética.

Se reduzirmos o cristianismo à igreja e seus dogmas, entendemos que teremos o catolicismo, que é algo muito menor que o pensamento e a comunidade cristãos. Com certeza, há tensões diversas entre o pensamento espírita e o católico, ou seja, espiritismo não é catolicismo; contudo, o cristianismo não se subsume ao catolicismo e às doutrinas evangélicas queiram seus membros admiti-lo ou não.

Por fim, não se oculta nada da comunidade espírita. Via de regra, o espiritismo é um conhecimento público, e cada vez mais acessível, mas cabe ao que se diz espírita e ao que se diz crítico do espiritismo estudá-lo.

21.3.10

JUDEUS E HELENISTAS NO CRISTIANISMO NASCENTE EM JERUSALÉM

FIGURA 1: O MARTÍRIO DE ESTÊVÃO
Recentemente fiz a leitura dos Atos dos Apóstolos, atribuído a Lucas, para apreender a visão do médico cristão sobre o nascimento do movimento cristão.

O Caminho
É conhecido por todos que os discípulos de Jesus de Nazaré inicialmente se identificavam ou eram identificados como os “do caminho”. O tradutor da Bíblia de Jerusalém entende que há uma referência direta a Jesus, que se intitulou “o caminho” (João 14:6). Não encontrei uma menção a uma construção ou lugar que se pudesse intitular a “Casa do Caminho” em Lucas, o que não quer dizer que não tenha existido. Há uma forte referência a uma comunidade identificada com os ensinos de Jesus, que inicialmente surgiu no povo judeu.

Os Helenistas
Os helenistas no livro dos Atos são os judeus que viveram longe da Judéia, geralmente em terras de influência grega, e que adotaram hábitos como o estudo da Lei e dos Profetas em grego, o que não era bem aceito pelos judeus autóctones. Os helenistas que se converteram ao Cristianismo parecem ter sofrido discriminação dos cristãos de hábitos judaicos, como é narrado no episódio da distribuição de víveres entre as viúvas helenistas, o que fez os apóstolos nomearem como o que seria conhecido por diáconos a sete jovens helenistas, dentre eles Estêvão. (Atos 6)

A pregação vigorosa de Estêvão e possivelmente sua condição de Helenista fez com que os judeus quebrassem a tolerância proposta por Gamaliel (Atos 5:38 e 39) e o denunciassem ao Sinédrio. Os Atos dos Apóstolos trazem sua defesa, que é uma belíssima peça de oratória e um ato de coragem, que culminou em seu apedrejamento (Atos 7).

A Dispersão

A dilapidação de Estêvão gerou medo em meio aos do Caminho, e muitos se dispersaram pela Palestina e pelos países ao redor, levando consigo suas convicções cristãs. Penso que a execução de Estêvão teve o efeito de fundar novas comunidades que serão chamadas de cristãs em meio a povos não judeus, considerados por estes como gentios ou gentes. Este é o nascedouro da ampliação do movimento cristão e a origem de uma de suas primeiras crises, que não tratarei nesta publicação: o do cristianismo para os gentios.

16.2.09

João, Filho de Zacarias - Nazireu

Figura 1: Ícone de João criado por Mary Katsilometes (http://www.anastasisicons.com)
Duas palavras muito próximas em nossa língua, mas com significados distintos: Nazareno e Nazireu.

Nazareno, na Bíblia, é quem nasceu na pequena cidade de Nazaré, na Galiléia.

Nazireu é qualquer israelita que fez um voto de consagração para Iahweh, temporário ou permanente, e se dispõe a cumprir as restrições, repletas de simbolismo, propostas no sexto capítulo do livro de Números, do pentateuco moisaico.

As principais restrições de um Nazireu são as seguintes:

1. Não beber vinho, bebidas fermentadas ou embriagantes, nem comer uvas. O nazireu deve ficar mentalmente são. (Parece que as uvas entram na lista com um significado tabu)

2. Não cortar o cabelo, deixá-lo crescer livremente. Os cabelos sem corte simbolizam a sujeição à vontade de Iahweh.

3. Não tocar nem se aproximar dos mortos. O nazireu deve ficar cerimonialmente puro, e o contato com os mortos no moisaísmo era uma das muitas regras relacionadas à pureza e impureza.

João, chamado "o batista", fez o voto permanente de nazireato, seguindo a orientação dada a seu pai, Zacarias, por Gabriel, considerado pelos espíritas como um espírito superior ligado ao nascimento do cristianismo no mundo.

Jesus foi chamado de Nazareno, por ter nascido (para quem considera improvável o episódio de Belém) ou ter passado sua infância na cidadezinha galiléia.

Cabe, portanto, uma revisão na tradução do texto da introdução de "O Evangelho Segundo o Espiritismo", feita por Guillon Ribeiro.

27.12.07

Mensagem Natalina


Gostaria de compartilhar com os leitores do blog uma mensagem ditada pela via da psicografia intuitiva ao autor do blog em dezembro de 1999, na Associação Espírita Célia Xavier. O autor espiritual adotou o nome de "Companheiro de Trabalhos".



Figura 1: Natividade de Gustave Doré

“Entrando onde ela estava disse-lhe:
‘Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo! (...)
Eis que conceberás no teu seio e darás à luz um filho,
e tu o chamarás com o nome de Jesus’.”
(Lucas 1: 28 e 31)
A humanidade comemora dois mil anos de uma mensagem: nasceu Jesus, Jesus de Nazaré, criança humilde, filho de pessoas simples do povo. Ele não tem poderes, não tem riquezas, não tem nobreza no sangue, apenas uma referência distante a Davi.

Nasceu Jesus, Jesus de Nazaré. Não é romano, não é patrício, é filho de um povo escravo, os judeus, que lutam e sonham com liberdade política e aguardam um enviado de Iavé cuja mão forte dirigir-lhes-á os exércitos.

Nasceu Jesus, Jesus de Nazaré, não em Jerusalém... Nasceu no interior, foi criado em cidade pequena, aprendeu a ser carpinteiro, e não rei; conviveu com pescadores, mais que com sacerdotes. Nasceu pequeno entre os pequenos.

Nasceu Jesus, Jesus de Nazaré. Tornar-se-á homem, varão do povo de Israel, mas não terá duas túnicas, nem uma pedra onde descansar sua cabeça, viajará a pé, conversará com todos, escolhidos e apartados, patrícios e plebeus, ricos e pobres.

Nasceu Jesus, de Nazaré, com uma missão: transmitir uma mensagem. Alguns se recordam de feitos milagrosos, outros dos sinais dos céus, outros das vozes de outro mundo, mas esse homem tem por legado apenas palavras.

Nasceu Jesus, de Nazaré. Considerado malfeitor pelos seus compatriotas, esquecido pelos representantes da justiça romana, condenado à pena máxima.

Foi-se Jesus, de Nazaré, mas suas palavras, seus atos, continuam em meio a nós. Não foi rei, mas seus feitos dividiram a História. Não foi guerreiro, mas conduziu-nos à luta interior. Não foi homem de letras, mas originou as páginas mais lidas pelos seus semelhantes. Não construiu monumentos, mas sua lembrança resiste ao tempo. E depois dele, sob sua palavra, os homens ficam diferentes.

Companheiros de trabalho, nós lhes desejamos um feliz natal, pleno da presença da mensagem do homenageado."

13.12.07

Textos e Apresentações do Ciclo de Estudos Sobre Passes

Figura 1: Eduardo, O Confessor curando escrofulosos através do toque


Foram publicadas no site Espiritismo Comentado (http://www.jadersampaio.uaivip.com.br/) alguns dos textos e apresentações utilizados no Ciclo de Estudos sobre Passes, realizados de setembro a dezembro na Associação Espírita Célia Xavier.

Os textos estão em pdf e as apresentações no formato powerpoint. Estão disponíveis aos interessados para download.