3.3.20

A EDIÇÃO DE 1869 DE A GÊNESE É CLANDESTINA?




Desde quando Carlos Seth Bastos publicou a descoberta de um exemplar de A Gênese publicado em 1869, e Samuel Magalhães publicou imagens de propaganda do mesmo em um exemplar de O Livro dos Médiuns, do mesmo ano, surgiu uma acusação feita pelo estudioso Paulo Henrique de Figueiredo, que denominou a edição de clandestina. Diversos leitores do EC me enviaram o texto desse autor. Carlos já fez comentários ao texto, estou publicando minhas observações. 

Como se pode ver, a ideia de uma edição clandestina é especulativa, inconsistente com as informações publicadas na capa e atingiriam não apenas os diretores da Sociedade Anônima da Caixa Geral e Central do Espiritismo, como a própria Amélie Boudet, que era dona dos direitos autorais do livro e participou da fundação da Sociedade e a partir de julho de 1869 como membro do Conselho Supervisor. 

Segue abaixo o texto de Paulo Henrique e meus comentários em cor vermelha.

Agradeço aos colegas que me auxiliaram com o texto. 

Jáder Sampaio, 03 de março de 2020

SOBRE A 5ª EDIÇÃO CLANDESTINA DE A GÊNESE DE 1869

Esclarecimentos do Pesquisador e Historiador Espírita
Paulo Henrique de Figueiredo

Foi encontrado um exemplar da 5ª edição de La Genèse, les Miracles et les Prédictions selon le Spiritisme, que possui em sua capa o ano de 1869. Uma relevante descoberta, que está relacionada com a questão da adulteração da obra em 1872. (A ideia da adulteração de A Gênese é especulativa).
Já sabíamos da existência dessa edição desde o ano passado e passamos a estudar profundamente o contexto desse fato novo.

Todavia, seria impossível para a Simoni Privato Goidanich citar essa edição em sua obra O Legado de Allan Kardec, (Se ela tivesse encontrado, a citaria e possivelmente reinterpretaria o material de estudo) quando pesquisou os documentos na França, pois ela é não só uma adulteração, mas também clandestina! (Afirmação especulativa; se fosse levada a sério, deveríamos considerar clandestinas outras edições de livros de Kardec, conforme aponta a pesquisa do Carlos Seth) Vamos demonstrar.

Compare a 4ª edição e a 5ª edição de A Gênese, ambas de 1869. Simplesmente analisando os detalhes das duas capas, já se pode deduzir informações importantes.

O pedido de impressão da 4ª edição foi feito em 4 de fevereiro de 1869. Allan Kardec pediu que fizessem 2.000 exemplares. Todavia, por desencarnar em 31 de março, no mês seguinte, não pode anunciar essa reimpressão na Revista Espírita. Ele morreu antes (um dia antes) do estabelecimento da Livraria Espírita, em seu novo endereço. Por isso, indica na capa, como em todas as suas edições: “bureau de la Revue Spirite, 59, rue et passage Ste-Anne”.

Veja agora a 5ª edição de 1869 agora encontrada, na capa: “Librairie Spirite et des Sciences Psychologiques”, em “7, rue de Lille”. Isso registra que essa edição foi publicada pelos continuadores responsáveis pela livraria após a morte de Kardec, ou seja, em data posterior à sua morte. (Possivelmente) Assim sendo, não foi publicada por Allan Kardec! (Possivelmente)

E quanto aos documentos legais desta 5ª edição que confirmariam oficialmente todas as informações sobre ela, existem? Não existem. (Especulativo, pois os documentos levantados comportam mais de uma interpretação) Simplesmente, após uma pesquisa minuciosa tanto na Biblioteca Nacional quanto nos Arquivos Nacionais da França, empreendidos por mais de uma vez este ano, por pessoas diferentes, confirmam que NÃO existe (não encontraram) nem pedido de impressão nem depósito legal. (Carlos Seth Bastos mostra que isso aconteceu em outra oportunidade na qual Kardec estava vivo. O Resumo da Lei dos Fenômenos Espíritas, nova edição aumentada, de 1865, não consta no registro dos depósitos legais.) 

Como se trata de conteúdo novo em relação à edição original, seria obrigação legal fazer tanto o pedido ao Ministério do Interior como depositar um exemplar na Biblioteca. (Na Biblioteca, não, na Prefeitura de Polícia) Temerariamente, nada disso foi feito! (Especulação) Trata-se de uma edição clandestina! (Uma edição cujos registros não foram encontrados até o momento) Poderíamos até dizer, criminosa. (Segundo a lei vigente à época, não há crime, deixar de registrar é contravenção. Só há crime se houver a intenção de atacar a França ou o Imperador)

Nada foi noticiado na Revista Espírita sobre essa nova edição revista, corrigida e aumentada. Nem uma nota. Quando seria fundamental avisar aos espíritas sobre isso! (Houve diversos pedidos de publicação de novos livros em 1869, além dos problemas da constituição da nova Sociedade) Kardec não o fez, pois foi posterior à sua morte. Os responsáveis pela livraria não o fizeram, pois se tratava de uma edição adulterada e clandestina. (Mega-especulação. A gráfica que trabalhou anos a fio com Kardec colocou seu nome em uma obra clandestina, correndo o risco de incorrer no artigo 41 da lei de Napoleão I, e de ser acionada judicialmente pela livraria? Como diz Carlos Seth Bastos, foram feitas quase 400 mudanças no período entre 31 de março e junho de 1869, mudados os clichês, impresso, em um período no qual se estava praticamente fundando a Sociedade  Anônima da Caixa Geral e Central do Espiritismo?)

Há uma menção a essa edição clandestina de A Gênese de 1869. E é a única. Está na referência das obras de Allan Kardec em Le Livre des Médiums, edição 11ª. na contracapa foi grafado: “ La Genèse, les miracles et les prédictions selon le Spiritisme, 1 vol., in-12, 5e édition”. (Então ou houve um erro do tipógrafo, ou a Livraria é responsável pela edição)

Temos a declaração do impressor e depósito legal dessa edição de O Livro dos Médiuns: Declaração de impressor em 09/07/1869 e depósito legal em 16/07/1869. Ou seja, a única menção sobre essa quinta edição clandestina de A Gênese de 1869 foi feita somente em julho (feita em julho, mas referente a junho, segundo a Revista Espírita) de 1869, quatro meses após a morte do professor Rivail. Pelos mesmos responsáveis por essa edição clandestina de A Gênese! (Diretoria aclamada em abril: Levent, Canguier, Ravan, Desliens, Delanne, Tailleur e Mallet – este último presidente. Diretoria eleita em julho de 1869 na residência de Amelie Boudet: Desliens, Tailleur, Monvoisin, Guilbert, Bittard e Joly, sendo que Amélie Boudet e Guilbet eram membros do Conselho Supervisor)
Como essa edição de A Gênese de 1869 foi, além de adulterada (especulação), também clandestina (especulação), o que fez Leymarie quando precisava publicar uma edição nova da obra em 1872? Ele sabia que a 5ª de 1869 era falsa (especulação), pois, tratando-se de um conteúdo novo, teve que fazer um depósito legal em 23/12/1872. Deveria ter declarado tratar-se de uma sexta edição. Revela sua culpa, ao repetir a numeração, omitir o ano na capa e publicar essa nova como sendo novamente 5a edição! (No registro, consta 5ª edição e 2ª edição, segundo Simone Privato. O que entendo é que foi registrado que era uma reimpressão (ou segunda impressão) da quinta edição. A explicação de Simone não faz sentido. Ela diz que é quinta edição porque veio após a quarta e que é segunda porque foi a primeira a conter alterações. Pág. 164-166 do livro O Legado de Allan Kardec)

A garantia da autenticidade da obra e de que seu conteúdo de fato espelha a vontade do autor repousa sobre o preenchimento dos requisitos formais de autorização de impressão e do depósito legal. (Sem o depósito legal, não há como provar que a obra foi publicada na data do registro, e se cria a possibilidade de alguém registrar a obra em seu nome. Não é o caso.) Sem isso, seu conteúdo é falso, apócrifo, (Mais uma dedução incorreta, sem isso fica mais complicado provar a autoria) segundo a legislação da época. (Não está escrito isso na lei) Alguém imagina, por absurdo, que o professor Rivail, tão cuidadoso com todos os seus documentos e sem nunca ter incorrido em qualquer ilegalidade em suas publicações, faria uma edição sem registro oficial? (Quem fez a edição foi A Livraria Espírita, em um período de extrema influência de Mme Kardec.)

Portanto ilegal, clandestina e toda modificada? (Frase de efeito, vimos que não há como provar isso. Atribuir crime à Livraria Espírita, sem provas, é calúnia) Sem avisar ninguém pela Revista Espírita? Está claro que Kardec pretendia fazer modificações nesse livro segundo os seus manuscritos, mas não o fez até a sua morte. (A FEAL tem os manuscritos, mas não deu ainda acesso às pessoas. Sem uma análise desses documentos, é também uma especulação) Nem foram certamente essas falsas que encontramos nas edições adulteradas. (Outra especulação)

Conclusão: tudo o que a Simoni Privato Goidanich afirmou em sua obra está vigente e intocável. (O trabalho dela é muito bom, especialmente a recuperação de informações e documentos. As conclusões e análises que ela faz se baseiam neles. Quando surgem novos documentos, há que se rever as análises. Não há nada de errado nisso, e nenhum demérito para ela.)  Apenas se acrescenta que a conspiração para adulterar a obra de Allan Kardec já se iniciou logo após a sua morte, (uma metaespeculação: especulação fundamentada em especulações)  alguns meses depois, por aqueles, como Desliens, que passariam o bastão do desvio (um ataque sem provas, que atinge a esposa de Kardec, que era membro do Conselho Supervisor, como nos mostra Privato) para Leymarie desde 1871.

Temos muitas outras informações e documentos sobre o caso. (Que não estão públicas, por isso, não se constituem como documentos a serem verificados. Nós temos que confiar que o argumentador tem acesso privilegiado e que por isso está interpretando corretamente os documentos a que teve acesso, ainda que Carlos Seth também tenha acesso aos mesmos documentos e tenha chegado a diferente conclusão) Mas uma investigação adequada deve ser divulgada publicamente somente quando todos os fatos e detalhes estão apurados e esclarecidos ao máximo. (Então poderemos rever nossas posições) Uma conclusão precipitada serve apenas para causar dúvidas, polêmica e divisão. (É o que está acontecendo, e esse seu texto se presta a isso, ao fazer acusações sem provas documentais) Nada disso interessa à divulgação do Espiritismo. (Concordamos) Portanto, vamos voltar ao assunto somente daqui a algumas semanas, quando vamos apresentar trabalho completo, como já havíamos planejado anteriormente. (Aguardamos)

Esperamos, assim, contribuir com os estudos desta Doutrina libertadora que não nos pertence, mas sim aos Espíritos Superiores que deram seus ensinamentos. Nós, espíritas, somos todos estudantes, e devemos divulgar e restabelecer a teoria original de Allan Kardec, com o objetivo de colaborar com a Regeneração da Humanidade. Os tempos estão chegados!

Paulo Henrique de Figueiredo, 2 de março de 2020.

SOBRE A LEI DE PUBLICAÇÃO NA FRANÇA DE ALLAN KARDEC



Napoleão I decretou uma lei em 05 de fevereiro de 1810, que é considerada uma “lei de censura” em nossos dias. Ela pode ser vista em https://archive.org/details/dcretimprialcont00fran_1/mode/2up

Nessa lei, os impressores e as livrarias ficavam sob o controle de um diretor geral, ligado ao Ministro do Interior francês. A lei designa seis auditores sob o controle do diretor geral. No ano seguinte à publicação da lei, Napoleão reduziu o número de impressores para sessenta, possibilitando que cada auditor cuidasse das publicações de dez impressores.

O artigo 10 considera crime “imprimir qualquer coisa que possa afetar os deveres do sujeito com relação ao soberano”, ou seja, um Estado sem liberdade de imprensa.

O controle da imprensa se faria com um livro, rubricado pelo prefeito da região, no qual se registra por ordem de data, cada livro que se deseja imprimir e o nome do autor. (art. 11) As livrarias seriam “juramentadas e licenciadas”. Essas licenças seriam aprovadas pelo Ministro do Interior! (art.29) Para ser licenciados, os livreiros teriam que demonstrar “sua boa vida e seu apego à pátria e ao soberano”. (art. 33)

A lei controla a entrada de livros do exterior e estabelece um imposto “não inferior a cinquenta por cento do valor das obras”. (art. 35). Napoleão assinou um decreto imperial que estabelece como cobrar os impostos de livros importados em 14 de dezembro de 1810. 

A lei estabelece confisco e multa se o livro sair sem o nome do autor e da gráfica, se “o autor ou o impressor não tiver efetuado o registro e a declaração do artigo 11”, se a obra for pedida para exame e a impressão não tiver sido suspensa enquanto se faz, se a obra for publicada sem a autorização do ministro da polícia geral, se for uma falsificação ou se for impressa “sem o consentimento e em detrimento do direito do autor ou do editor."

O artigo 39 assegura o direito de propriedade ao autor e à sua viúva, e aos filhos por vinte anos.

Por fim, no artigo 48, se decide sobre a guarda dos livros impressos: 

“Cada impressor deverá depositar na prefeitura da polícia cinco cópias de cada obra, a saber: duas para a biblioteca imperial, uma para o Ministro do Interior, uma para a biblioteca de nosso Conselho de Estado, uma para a diretor administrativo das obras de impressão.”

Após ler a lei como um todo, o que podemos concluir? Que a lei foi criada para evitar que ideias em conflito com o regime fossem veiculadas sem controle do Estado. Escrever era considerado “caso de polícia” na França, e a maior preocupação da lei não é com a preservação dos direitos de autor e editores, mas com o uso da imprensa contra o Estado estabelecido e o imperador.

O registro cuidadoso visava evitar a veiculação de ideias contra o regime político vigente (principalmente o imperador), e até as livrarias seriam objeto de licença especial do Estado para funcionamento. 

Esta legislação estava em vigor no período de 1857 a 1869, enquanto Allan Kardec estava encarnado e publicando sua obra espírita.

Uma lei baseada na liberdade de imprensa, que garante a livre circulação dos jornais, sem regulamentação governamental foi aprovada em 1881 e está em vigor até hoje.

2.3.20

MAIS UM DOCUMENTO TRATA DA QUINTA EDIÇÃO DE A GÊNESE EM 1869



Samuel Magalhães acaba de publicar imagens de O Livro dos Médiuns, de 1869, fazendo propaganda, na quarta capa, da quinta edição de A Gênese, os milagres e as predições segundo o espiritismo. O livro custava 3 francos, então.


A capa do livro original.

 A folha de rosto do mesmo livro. O Samuel informa que essa edição de O Livro dos Médiuns foi publicado em junho de 1869, três meses após a desencarnação de Allan Kardec.

1.3.20

NOVAS INFORMAÇÕES SOBRE A 5ª EDIÇÃO DE A GÊNESE




O CSI – Codification Séances Investigation: Imagens e Registros Históricos do Espiritismo encontrou um exemplar da quinta edição de A Gênese - revista, corrigida e aumentada, publicada em 1869 - catalogado na biblioteca da Université de Neuchâtel, na Suíça. Carlos Seth Bastos entrou em contato com o bibliotecário, pedindo imagens dos dados bibliográficos do livro e recebeu o arquivo de imagem em pdf acima.

As informações desse livro sugerem que foi Allan Kardec quem fez as modificações que foram posteriormente publicadas em 1872, no que seria uma espécie de reedição da quinta edição. Possivelmente, Simoni Privato não encontrou a autorização dessa edição nos livros de registro franceses, uma vez que considero como pessoas de boa-fé tanto as que concluíram que Leymarie poderia ter feito as alterações quanto as que nos apresentam essa imagem. Cada uma concluiu com base nas informações que obteve.

Considerando correta a informação do bibliotecário suíço, Kardec teria feito as anotações das modificações de A Gênese depois da primeira edição, tendo um período de alguns meses para a revisão. Quando e como foram modificadas as placas matrizes, não o sabemos.

Observe nas marcas da imagem que o livro já sai com o nome da Livraria Espírita e de Ciências Psicológicas, na Rue de Lille, no. 7, para a qual Kardec iria fazer sua mudança quando desencarnou.

Outra curiosidade: as notas tipográficas, na página anterior à da folha de rosto, apontam que a tipografia que fez a quinta edição foi a mesma que fez a primeira edição (e as outras três).

O leitor interessado pode acessar as páginas de Facebook abaixo para obter as informações sobre este novo capítulo da pesquisa de A Gênese, os milagres e as predições segundo o espiritismo, de Allan Kardec.


https://www.facebook.com/HistoriaDoEspiritismo/posts/650310282399424  Link da publicação sobre a pesquisa de A Gênese (5ª edição).

Acho que toda essa polêmica chamou a atenção do movimento espírita para as mudanças realizadas por Kardec ao longo das edições de suas obras, e também nos convida a sermos ainda mais prudentes com as fontes de informação do passado.

27.2.20

AVALIAÇÃO DE REUNIÕES MEDIÚNICAS



No Seminário oferecido em Contagem-MG, em 2019, foi feita uma pergunta sobre avaliação de reuniões. Passamos a experiência do nosso grupo mediúnico:

Que você pode nos falar sobre as avaliações periódicas da reunião e dos médiuns?

Todas as sessões temos um tempo reservado à análise das comunicações e das percepções de todos os membros da reunião durante a parte mediúnica. Como ela é feita imediatamente após o encerramento das comunicações, ficou conhecida como “terceira parte” pelos membros do grupo, mas poderia ter outro nome mais formal.

Nessa parte da reunião, como realizamos comunicações simultâneas, as duplas médium-atendente narram de forma objetiva e resumida como foram as comunicações que aconteceram. Os médiuns podem falar ao grupo os sucessos e insucessos das escolhas do atendente durante sua atividade, os atendentes podem explicar o que não entenderam bem do relato durante a comunicação, outros membros podem falar de suas percepções enquanto a comunicação se dava e que podem estar associadas a ela, e, sem criar constrangimentos ou censurar, das sugestões para os participantes da reunião. Outra coisa que pode ser feita é o próprio médium falar ao grupo de suas inseguranças quanto à comunicação e das suspeitas de animismo ou do que consideram ser suas influências sobre a comunicação.

Se essa atividade não for realizada logo após as comunicações, passados alguns dias, tendemos a esquecer o que aconteceu, perder detalhes e falar de eventos que os demais membros não se recordam bem.

Além da “terceira parte”, fazemos avaliações mais amplas, semestrais ou anuais. Nessas avaliações colhemos a opinião dos membros do grupo para decidir a necessidade ou não de mudanças, seja de função, seja do ambiente material, seja da rotina da reunião (preces, leituras, estudos, parte mediúnica, terceira parte), seja da troca de funções na reunião (geralmente a troca de dirigentes), seja a análise de insatisfações e de aspectos positivos ou realizações importantes feitas pelo grupo. Os encontros de cunho social fora do centro espírita são discutidos nessas oportunidades, e a participação em campanhas da casa, atividades sociais e outras. Sempre realizamos mudanças, preferencialmente a partir de consensos do grupo.

24.2.20

PRIMEIRO CONTATO DE CHICO XAVIER COM O LIVRO MEMÓRIAS DE UM SUICIDA





Ontem estivemos conversando sobre a trajetória de Camilo Castelo Branco, desde sua vida em Portugal até sua notícia de reencarnação em um centro espírita da capital mineira. Entre outras coisas, apresentamos a comparação entre as descrições dadas por ele de sua desencarnação a Yvonne Pereira, a partir de 1926 e a Chico Xavier em 1936, que foi publicada no livro O Martírio dos Suicidas, da editora da Federação Espírita Brasileira - FEB, compilado por Almerindo Martins de Castro.

Na saída, Danilo chamou minha atenção para o livro Testemunho de Chico Xavier, escrito pela Suely C. Schubert, que analisa a correspondência entre o Chico e os dirigentes da Federação Espírita Brasileira. Foi muito boa a referência.

Encontramos duas cartas escritas pelo médium mineiro, que tratam da médium fluminense. As duas referem-se aos dois primeiros livros publicados pela FEB. 

A primeira carta escrita pelo Chico data de 28/11/1955. Ele recebeu um exemplar do livro Nas telas do infinitoassinado pela Yvonne, e ficou curioso quanto ao contato da médium com o espírito Léon Denis. O Chico confessa que não conhece o “estilo camiliano”, não se colocando em condições de analisar a pequena novela O tesouro do castelo, que é uma das duas narrativas que compõem o livro, mas gosta muito do conteúdo doutrinário do texto. Esta carta nos permite supor que ele não conhecia pessoalmente a médium, já que pedia notícias que poderiam ter sido dadas por ela, pessoalmente.

A segunda foi escrita em 12 de dezembro do mesmo ano e trata do livro Memórias de um suicida. Faz sugestões muito pontuais para o texto do livro, o que dá a entender que a FEB teria enviado uma prova do livro ou cópia do texto datilografado para obter as impressões do médium mineiro. Ele antevia o sucesso do livro, que realmente aconteceu.

Agradeço ao Danilo a lembrança que contribui com o trabalho que publicamos no livro O espiritismo, da França ao Brasil, ano passado. Mais uma evidência de que o Chico não conhecia pessoalmente Yvonne, nem teve acesso ao texto do Memórias quando psicografou Camilo Castelo Branco em 1936.

22.2.20

OS LIVROS SOBRE OS CRISTÃOS PRIMITIVOS


Fragmento de papiro do século 4, escrito em Copta, língua do antigo Egito. Fonte: https://brasil.elpais.com/brasil/2014/04/12/sociedad/1397258047_321465.html

Um leitor interessado me pediu as fontes bibliográficas do seminário “Os cristãos primitivos e o espiritismo”, que fizemos no Cenáculo Espírita Thiago Maior. Confesso que a ressonância do trabalho foi muito maior do que imaginávamos. Atendendo aos estudiosos de plantão, sempre interessados em conhecer mais, vou fazer uma pequena lista das principais obras utilizadas.

Não estou apresentando livros cujo objetivo principal é a interpretação dos evangelhos, o que pode parecer desconhecimento ou restrição de autores importantes deste tipo de atividade, mas não é.

Como o leitor pode ver, não é uma lista feita por especialista para seus pares, mas um registro do percurso amador pela questão em estudo, feito por um espírita, compartilhada para um grupo de interessados.

Livros espíritas

Allan Kardec. O evangelho segundo o espiritismo. Diversas editoras.

Allan Kardec. A Gênese. Diversas editoras.

Allan Kardec. Revista Espírita. (1858-1869) Edicel.

Léon Denis. Cristianismo e espiritismo. FEB.

Hermínio Miranda. Cristianismo: a mensagem esquecida. O Clarim.

Hermínio Miranda. O evangelho de Tomé: texto e contexto. Arte e Cultura. (Publicado hoje pela Lachâtre com o título: O evangelho gnóstico de Tomé)

Hermínio Miranda. Os cátaros e a heresia católica. Lachâtre.

Wallace Leal V. Rodrigues. A esquina de Pedra. O Clarim.

Wesley Caldeira. Da manjedoura a Emaús. FEB.

José Lázaro Boberg. O evangelho de Maria Madalena. EME.

Severino Celestino da Silva. O evangelho e o cristianismo primitivo. Ideia.

Cairbar Schutel. Vida e atos dos apóstolos. O Clarim

Amélia Rodrigues psicografada por Divaldo Franco. Quando voltar a primavera. Leae.

Amélia Rodrigues psicografada por Divaldo Franco. Luz do mundo. Leae.

Amélia Rodrigues psicografada por Divaldo Franco. Primícias do reino. Leae.

Amélia Rodrigues psicografada por Divaldo Franco. Há flores no caminho. Leae.

Amélia Rodrigues psicografada por Divaldo Franco. Trigo de Deus. Leae.

Amélia Rodrigues psicografada por Divaldo Franco. A mensagem do amor imortal. Leae.

Humberto de Campos psicografado por Chico Xavier. Boa Nova. FEB.

Emmanuel psicografado por Chico Xavier. Paulo e Estêvão. FEB.

Emmanuel psicografado por Chico Xavier. Há dois mil anos. FEB.

Emmanuel psicografado por Chico Xavier. Cinquenta anos depois. FEB.

Emmanuel psicografado por Chico Xavier. Ave Cristo. FEB.

Mauro Camargo. Ombra e Lutz (Romance) Lachâtre (Trata dos cátaros)
Pinheiro Martins. História da formação do Novo Testamento. CELD.

Canuto Abreu. O evangelho por fora. Edições LFU.

A Editora da Federação Espírita Brasileira publicou recentemente uma coleção de livros intitulada “O Evangelho por Emmanuel”. É uma compilação de todos os textos publicados, encontrados pela equipe. Foi organizada por Saulo Cesar Ribeiro da Silva e cada livro do Novo Testamento é precedido por informações históricas, literárias e hermenêuticas. Às informações encontradas em livros acadêmicos seguem-se as informações encontradas em livros ditados por espíritos, a maioria deles citados acima.

Emmanuel psicografado por Chico Xavier. Interpretação dos textos sagrados. In: Caminho, verdade e vida. FEB.


Autores de Filosofia Patrística (Pais da Igreja)

Eusébio de Cesareia. História eclesiástica. Paulus.

Diversos autores. Padres apologistas. Paulus. (Inclui a Carta a Diogneto, de autor desconhecido).

Diversos autores. Padres Apostólicos. Paulus. (Inclui as epístolas de Clemente Romano, as de Inácio de Antioquia, Policarpo de Esmirna, O pastor – atribuído a Hermas – Carta de Barnabé e Didaqué).

Orígenes. Tratado sobre os princípios. Paulus.

Orígenes. Contra Celso. Paulus.

Philip Schaff. The early church fathers collection: the ante Nicene Fathers. (Tertulian, Minucius Felix, Commodian, Origen). (e-book)

Autores diversos

Da Terra aos Povos: A difusão do cristianismo nos primeiros séculos. Mostra arqueológica em painéis. Centro Cultural Presença.

Elaine Pagels. Os evangelhos gnósticos. Cultrix.

Henry Virkler. Hermenêutica avançada. Vida acadêmica.

Paul Veyne. Quando o nosso mundo se tornou cristão. Texto & Grafia.

Tim Dowley. Os Cristãos: uma história ilustrada. Martins Fontes.

Tim Dowley. Atlas da Bíblia e da História do Cristianismo. Vida Nova.

Bart D. Ehrman. Quem foi Jesus? Quem Jesus não foi? Ediouro. (e-book)

Bart D. Ehrman. Jesus existiu ou não? Agir. (e-book)

Henry Percival. The seven ecumenical councils. (e-book)

Flavius Josephus. Complete Works. Annotated Classics. (Translated by William Whiston). (e-book)

The gnostic gospels of Thomas, Mary and John. Dancing Unicorn Books. (e-book)

Carlos Verdete. História da igreja: das origens ao cisma do oriente (1054) Paulus. (e-book)

Giovani Reale e Dario Antiseri. História da filosofia: patrística e escolástica. Paulus.

Cassiano Floristán Samanes e Juan-José Tamayo-Acosta. Dicionário de conceitos fundamentais do cristianismo. Paulus.

Simone Resende Mendes. Paulo e a Ekklesia de Corinto: conflitos sociais e disputas de autoridade no período paleocristão. Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em História da UFES.

Bíblias

O novo testamento. (Tradução do grego para o português de Haroldo Dutra Filho) Edicei.

A Bíblia de Jerusalém. (Tradução por equipe de tradutores do Hebraico e do Grego para o português). Edições Paulinas.

Bíblia do Peregrino. (Edição Brasileira) Tradução original e notas de Luis Alonso Schökel. Paulus.

A Bíblia Sagrada (Edição Brasileira) Tradução de João Ferreira de Almeida. Imprensa Bíblica Brasileira.

Bíblia Sagrada. (Traduzida da Vulgata e anotada pelo Padre Mattos Soares). Edições Paulinas.



17.2.20

OS TEXTOS CRISTÃOS NOS TEMPOS DE PAULO DE TARSO, SEGUNDO EMMANUEL.




No último dia 09 de fevereiro, oferecemos o seminário “O espiritismo e os cristãos primitivos” no Cenáculo Espírita Thiago Maior, em Belo Horizonte-MG. 

Como o tema é vasto, escolhi alguns assuntos e autores que são pouco lidos pelo movimento espírita local, como Léon Denis, Hermínio Miranda, Wallace Leal Rodrigues, os autores de origem acadêmica e os autores da filosofia patrística, além, claro, dos Evangelhos que compõem o cânone que gerou a vulgata, alguns textos que fizeram parte do cânone e textos antigos considerados heréticos ou pseudoepígrafes ao longo da história da Igreja. Tudo isso sem esquecer de Allan Kardec.

Sobre a origem dos textos, especialmente os que foram reconhecidos por São Jerônimo, criando a Vulgata, há informações precisas no livro Paulo e Estêvão, que nosso amigo Carlos Malab teve o cuidado de separar e nos enviar. 

Percebendo que poderíamos ter exposto de forma mais clara as posições de Emmanuel, passo publicar no Espiritismo Comentado os recortes feitos pelo Malab. 

1. Sobre a autoria do Evangelho Segundo Mateus, e a hipótese de este ter sido escrito por alguém ligado a ele, e não por ele.

“Por dois dias ali permaneceu, em suave embevecimento. Sem revelar-se, procurou Levi, que o recebeu de boa-vontade. Mostrou-lhe sua dedicação e conhecimento do Evangelho, falou da oportunidade de suas anotações. O filho de Alfeu alegrou-se ao contágio daquela palavra inteligente e confortadora. ”

(Emmanuel. Paulo e Estêvão. FEB, página 241 do ebook publicado pela Amazon.com).

Nessa citação fica claro que Emmanuel entende que Mateus (Levi) era alfabetizado, sabia escrever e fez anotações que foram lidas por Paulo. Essas anotações podem não ser o texto que hoje temos com o nome de Evangelho Segundo Mateus, mas com certeza vão além de meras fontes orais que alguns especialistas consideram ser a origem dos textos dos quatro evangelhos. Essas anotações podem compor o que alguns especialistas denominam de Q (do alemão quelle, que significa fonte) e que teriam sido consultadas pelos autores do Evangelho Segundo Marcos, que hoje é considerado pela maioria dos especialistas como o primeiro evangelho a ser publicado.

2. Sobre a existência de textos sobre Jesus consultados por Paulo. Na narrativa de Emmanuel, Paulo e Barnabé são assaltados em viagem.

“Reparando nos pergaminhos do Evangelho que os missionários consultavam à luz da tocha improvisada, um dos ladrões interrogou desconfiado e irônico:

- Que documentos são esses? Faláveis de um príncipe opulento... Ouvimos referências a um tesouro... Que significa tudo isso?

Com admirável presença de espírito, Paulo explicou:

- Sim, de fato estes pergaminhos são o roteiro do imenso tesouro que nos trouxe o Cristo Jesus, que há de reinar sobre os príncipes da Terra.

Um dos bandidos, grandemente interessado, examinou o rolo das anotações de Levi.”

... “Os ladrões guardaram o Evangelho cuidadosamente”

... “nos subtraíram também as anotações evangélicas que possuíamos. Como recomeçar nossa tarefa?”

Paulo desabotoa a túnica e diz a Barnabé:

“- Enganas-te, Barnabé – disse com um sorriso otimista - , tenho aqui o Evangelho que me recorda a bondade de Gamaliel. Foi um presente de Simão Pedro ao meu velho mentor, que, por sua vez, mo deu pouco antes de morrer.” 

(Emmanuel. Paulo e Estêvão. FEB, páginas 312 - 313 do ebook publicado pela Amazon.com)

Nesta narrativa de Emmanuel temos diversas informações. Ele nos mostra que as anotações foram feitas em pergaminhos. Mostra também que Paulo e Barnabé sabiam ler, o que é considerado dúvida por estudiosos não espíritas, como Bart Ehrman. Emmanuel chama as anotações de Evangelho, mas se refere a elas também como anotações evangélicas, o que sugere que podem não ser um exemplar do Evangelho Segundo Mateus, mas as anotações realizadas por Levi, que podem ter a forma de logia, como supõe Hermínio Miranda (Cristianismo, a mensagem esquecida, O Clarim, 1988, p. 159-160).

Imagino que o tema seja polêmico, mas me admiro ainda mais com o texto psicografado por Chico Xavier e sua precisão, como falei no seminário. Que possamos continuar estudando sobre os evangelhos sem fanatismos.

6.2.20

CARIDADE NÃO É ESMOLA





Vídeo da União Espírita Mineira, inspirado na SAPSE, distingue caridade de esmola. 

Kardec distingue a caridade material da moral, em O Evangelho Segundo o Espiritismo. Em "O Livro dos Espíritos", sem reprovar a esmola, publica a seguinte orientação espiritual:

O homem condenado a pedir esmola se degrada física e moralmente: embrutece-se. Uma sociedade que se baseia na lei de Deus e na justiça deve prover à vida do fraco, sem que haja para ele humilhação. Deve assegurar a existência dos que não podem trabalhar, sem lhes deixar a vida à mercê do acaso e da boa-vontade de alguns. (LE, questão 888)

Há uma imensa diferença entre esmola e inclusão social. A inclusão é um esforço para que pessoas e grupos que ficariam à margem da sociedade, possam fazer parte dela. Não apenas ajudar a cuidar, alimentar ou vestir, mas também ajudar a estudar, obter trabalho e ser membro da sociedade.

Ser membro da sociedade é conhecer seus códigos e costumes, partilhar seus valores dentro da esfera da diversidade, ter acesso aos direitos e compromisso com os deveres de cidadão. Um morador de rua alimentado, continua à parte da sociedade. O pão que lhe damos ainda é uma forma de esmola.

Como ajudar as pessoas que desejam a serem autossuficientes? Este ainda é um desafio para a comunidade espírita em geral.


4.2.20

SENSAÇÕES DE ESPÍRITOS COMUNICANTES




Reunimo-nos em Contagem - MG para o seminário "Conversando com os espíritos". Após a parte de diálogo, foram feitas perguntas sobre o tema e nem todas puderam ser respondidas. Hoje publicaremos a resposta de duas das questões.

1. O que fazer em uma reunião na qual se manifesta um espírito que se considera morador de rua, queixa-se de frio e pede ajuda?

O que entendemos com base nas explicações de Allan Kardec é que a sensação de frio e outras sensações orgânicas são recordações de experiências vividas pelos espíritos quando encarnados. A sensação em si não é problema para o espírito comunicante. A questão que nos preocupa é um espírito desencarnado não ser capaz de entender sua condição, o que sugere uma perturbação espiritual. O papel do atendente é inspirar confiança e conversar para que o comunicante possa entender o que aconteceu consigo e ser capaz de perceber o mundo espiritual e sua condição imediata de espírito comunicante.

Muitos atendentes creem que seu papel é diminuir o desconforto do comunicante, e atuam fazendo sugestões, preocupados com a sensação de frio. Isso pode tranquiliza-lo momentaneamente, mas não é a contribuição mais relevante que o atendente pode dar.

Fazendo uma comparação, é como se déssemos um medicamento antitérmico (dipirona, paracetamol...) para uma pessoa que se queixa de febre, mas que é portadora de uma doença infecciosa. O remédio diminuirá momentaneamente o sintoma, e pode mascarar para o paciente a necessidade de tratar sua doença.

2. Considerando que os espíritos mantêm sensações orgânicas, é legítimo que os mesmos recebam tratamentos (até mesmo alimento ou água) para suas necessidades apresentadas?

Da mesma forma que a pergunta anterior, as sensações orgânicas como fome e sede não são o objeto central do atendimento espiritual. Cabe ao atendente escutar o espírito para que ele seja capaz de contar sua história pessoal e como chegou à condição em que se encontra. Na medida em que ele reflete o que aconteceu com ele, consequentemente a influência das memórias de sensações orgânicas passa para um segundo plano, tornam-se menos urgentes.

É necessário cuidado com o entendimento de que o papel do atendente é apenas tratar das necessidades imediatas que os espíritos apresentam via médium, mesmo porque, não sabemos se realmente somos capazes de “oferecer água” a quem relata uma sensação de sede. É apenas uma sugestão, no sentido próximo ao da hipnose.


Agradecimentos: a Lourenço e Waldemar K. Duarte pela troca de ideias.

30.1.20

CAMPANHA PARA OS DESABRIGADOS DA CHUVA




A Associação Médico-Espírita de Minas Gerais tem se notabilizado por dois belos trabalhos de cunho social: o apoio aos moradores de rua e a participação direta nos projetos do Fraternidade sem Fronteiras.

Considerando a situação de extrema vulnerabilidade que atingiu a milhares de pessoas na região metropolitana de Belo Horizonte, em função do período de chuvas, a mesma instituição está se mobilizando para auxílio dos desabrigados.

O maior valor que a AMEMG pode agregar às iniciativas do estado e da defesa civil, é o caráter e a competência dos que dela participam. Os doadores podem ter certeza que seu ato de desprendimento, seja qual for, irá atingir pessoas necessitadas.

Por este motivo, agradeço a compreensão dos leitores do Espiritismo Comentado, que abriu excepcionalmente o seu espaço para apoiar essa instituição específica. Oferecemos outros espaços, como o instagram e o facebook para outras instituições espíritas interessadas na mesma finalidade. 

Que possamos nos servir dos serviços já organizados para auxiliar quem precisa, evitando dispersar esforços.

23.1.20

DEVEMOS REGULAR O USO E A PUBLICIDADE DE BEBIDAS ALCOÓLICAS NO BRASIL?


Fernando Báez e seus pais. O jovem foi assassinado por jogadores alcoolizados na Argentina.


O jornal argentino  “Clarín” publicou hoje um artigo na coluna assinada por Pablo Vaca (https://www.clarin.com/opinion/miopia-tomar-bien-visto_0_ikTYCRsH.html), sobre o uso de bebidas alcoólicas. No dia 18 de janeiro, o jovem Fernando Báez Sosa, de 19 anos, foi vítima de espancamento por jogadores de rugby, alcoolizados, ao sair de um estabelecimento de um balneário, e veio a óbito por traumatismo crânio-encefálico. Onze jogadores estão detidos. Eles o cercaram e golpearam até depois dele estar inconsciente, no chão.

Pablo Vaca informa em sua coluna que os jogadores estavam bêbados. E abre o debate sobre a relação que os argentinos têm com o álcool.

Pablo afirma que a cultura do país incentiva beber. “Basta que alguém diga que não bebe para ser visto como um doente terminal”. É visto como “legal para os homens e feminino para as mulheres”. Um sinal de idade adulta, mas que começa antes dela.

O jornalista levantou diversas informações para a questão do álcool na Argentina, que transcrevo abaixo:

- O chefe de toxicologia do Hospital Fernández, Carlos Damin, recomenda a regulação da publicidade das bebidas alcoólicas.

- Nos Estados Unidos é proibida a venda de bebidas alcoólicas a menores de 21 anos (e não de 18, como na Argentina e no Brasil, agravada a nossa situação com o desrespeito habitual à lei pelos mais diversos pontos de venda, que não pedem identificação de menores).

- Na Austrália, os garçons fazem cursos para servir bebidas e são instruídos a não servir pessoas bêbadas, sendo passíveis de ser multados.

- Na Finlândia, o álcool custa 82% a mais que nos outros países europeus, e seu uso vem baixando.

- Na Rússia, proibiu-se a propaganda de bebidas alcoólicas.

Pablo se queixa do silêncio das autoridades argentinas acerca do acontecido.

Esse tipo de situação já aconteceu no Brasil, e vimos como houve a diminuição da violência nos estádios de futebol com a proibição da venda de álcool, lei que foi desrespeitada por ninguém menos que a FIFA, durante a Copa do Mundo. Os interesses econômicos falaram mais alto.

Nossos hospitais psiquiátricos mantém alas exclusivas para os dependentes de álcool e drogas (lícitas e ilícitas). São casos que envolvem às vezes o sofrimento dos familiares, atingidos não só pelos momentos de perturbação em que seus afetos estão alcoolizados, mas muitas vezes, pela violência, pela erosão da capacidade produtiva e do comprometimento dos vínculos afetivos com os cônjuges e filhos.

Diversos eventos trágicos envolvendo o abuso de álcool (espancamentos e outros atos de violência, ofensas raciais e religiosas, por exemplo) são tratados pela imprensa sem o devido esclarecimento do que teve por fator a alteração da consciência, exceção feita aos acidentes de trânsito envolvendo veículos, mercê das nossas leis de “tolerância zero”, relativamente recentes. Há uma banalização e aceitação das pessoas alcoolizadas em público em nosso país, o que não é permitido em alguns estados norte-americanos.

Por que um blog sobre espiritismo trata desse assunto? Desde há muito os espíritos nos falam dos problemas decorrentes do alcoolismo, e, aos poucos, o tema tem sido deixado de lado, como se fosse apenas uma herança católica da nossa sociedade, uma implicância que deveria ser abandonada com a a mudança de hábitos da contemporaneidade. 

Aos poucos, os jovens espíritas param de falar do assunto, em função do uso associado à pertença a seus grupos fora da comunidade espírita, que dão festas com livre acesso ao álcool ainda no ensino médio, por exemplo.  Algumas casas espíritas aceitam o comércio de fermentados e até de destilados em seus eventos de finalidade filantrópica ou de obtenção de recursos com fins de manutenção institucional, passando uma mensagem contraditória aos frequentadores e trabalhadores.

Penso que o editorial do jornal argentino, em tempos de Mercosul, devia ser levado a sério em nosso país também. Não esperemos um acontecimento trágico em nosso país para começar esse debate que não deve ser mais ignorado.

18.1.20

O QUE FOI CONSIDERADO DIFÍCIL EM O LIVRO DOS MÉDIUNS?


Allan Kardec

Na última publicação do Espiritismo Comentado, analisamos uma pesquisa realizada com participantes de reuniões mediúnicas em sociedades espíritas. Outra questão que foi levantada aos participantes: “Que assunto você considera mais difícil a compreensão?”

Cerca de 9% dos respondentes disseram que não têm dificuldade na leitura de O Livro dos Médiuns por causa, principalmente, da participação em grupos de estudo e dedicação.

Cerca de 12% disseram que todos os temas do livro são difíceis, devido à sua complexidade e por serem iniciantes.

Dos 264 participantes da pesquisa, 249 respondentes identificaram alguma parte de O Livro dos Médiuns que consideram difícil.

Vou apresentar em ordem decrescente de indicações de dificuldade:

O capítulo “Dos Médiuns” foi considerado o mais difícil por cerca de 16% dos participantes da pesquisa. Os respondentes disseram achar difícil identificar e classificar os médiuns. Allan Kardec estabeleceu diversos critérios de classificação, o que significa que um médium pode corresponder a diversas das categorias apresentadas. Outro problema que podemos levantar, é a adoção de nomes criados  pelo movimento espírita, diferentes dos adotados por Kardec, com o passar do tempo, em função das influências de autores não espíritas. Médium de desdobramento, por exemplo, é uma classificação que Kardec não utilizou, mas que é amplamente empregada no meio espírita brasileiro. Kardec utilizou para esse fenômeno médium sonambúlico, quando atua como médium de um Espírito estranho, e sonâmbulo, um fenômeno de emancipação da alma, no qual a pessoa tem percepções da realidade sem o uso dos cinco sentidos.

O segundo assunto mais difícil foi “O papel dos médiuns nas comunicações espíritas”. Os respondentes que identificaram motivos, referiram-se principalmente à questão do animismo, que também é um termo não empregado por Allan Kardec om o sentido contemporâneo. Alguns levantaram a questão da distinção entre animismo e mistificação. O próximo assunto menos compreendido foi o capítulo “Das contradições e mistificações”.

O capítulo “Dos sistemas”, que trata das explicações possíveis a fenômenos mediúnicos e similares, é o próximo em grau de dificuldade e foi considerado complexo.

O capítulo “Da obsessão” o próximo a receber queixas dos participantes. Ele também foi considerado complexo.

O outro capítulo pouco entendido por cerca de 6% dos respondentes foi “Da bicorporeidade e da transfiguração”. 

Segue o assunto “Da identidade dos espíritos”. Os participantes consideraram difícil identificar mistificadores, o que talvez não seja bem uma questão de entendimento do conteúdo do capítulo, mas da prática mediúnica.

Por fim, 4% dos respondentes consideraram complexo o capítulo “Do laboratório do mundo invisível”.

Com base nos resultados, algumas ações podem ser pensadas. Alguns desses deveriam ser de conhecimento geral por parte dos espíritas, como os tipos de médiuns, a questão das mistificações, as diversas explicações possíveis para fenômenos aparentemente mediúnicos, os tipos e mecanismos das obsessões, a identificação dos espíritos e como os espíritos realizam fenômenos de efeitos físicos. Os temas em questão merecem um estudo cuidadoso e uma apresentação clara por parte dos expositores e dos participantes de grupos de estudo das casas espíritas.

Os grupos mediúnicos em atividade e as casas espíritas poderiam avaliar entre os participantes de reuniões mediúnicas que assuntos são considerados difíceis e promover leituras, estudos e eventos para torna-los mais acessíveis a todos.

14.1.20

O LIVRO DOS MÉDIUNS: ESSE DESCONHECIDO



Uma instituição espírita regional fez uma pesquisa com 264 participantes de reuniões mediúnicas, cujo tema central era “O Livro dos Médiuns”.

O subtítulo do livro é “Guia dos médiuns e dos evocadores”, e foi escrito por Allan Kardec porque muitas pessoas o procuraram após a publicação de “O Livro dos Espíritos”, perguntando sobre a parte prática, sobre o exercício da mediunidade. Kardec, então, publicou um primeiro livro chamado “Instruções práticas sobre as manifestações espíritas” (1858), cujo desenvolvimento gerou “O Livro dos Médiuns” (1861).

O Livro dos Médiuns está para a prática da mediunidade assim como as leis de Newton estão para a física. Ninguém pode dizer-se físico ou estudante de física e ignorar essa formulação do pesquisador inglês, publicada em 1687. Mesmo com todo o desenvolvimento e pesquisa investidos nessa disciplina, o conhecimento considerado básico é fundamental para que se possa ser capaz de entender seus avanços.

O resultado da pesquisa foi que 67% dos membros de reuniões mediúnicas responderam ter lido todo o livro. Quando se perguntava se o livro foi estudado em grupo, o número cai para 28%. Na terceira pergunta, ou seja, se o livro foi estudado mais de uma vez em grupo, o número cai para 7%. 

Não se trata de frequentadores de centros espíritas em geral, mas membros de reuniões mediúnicas, que, segundo Kardec, deveriam se instruir antes de procurar a prática.

Essa pesquisa merece ser ampliada. Se você participa de um grupo de prática mediúnica, levante os números. Se eles forem como os da pesquisa, está na hora de estudar “O Livro dos Médiuns”.

7.1.20

ESPIRITISMO E TOTALITARISMO: HISTÓRIA DO ESPIRITISMO NA HUNGRIA


Júlia Gyimesi, psicóloga húngara

Recentemente a psicóloga Júlia Gyimesi publicou um artigo em língua inglesa no qual faz uma síntese de seus estudos de história da psicologia e do espiritismo em seu país: a Hungria.

Pode parecer preciosismo estudar a história do espiritismo na Hungria, mas a trajetória que a autora nos apresenta tem muitas similaridades com a do espiritismo no Brasil, e põe em questão algumas afirmações que autores da antropologia francesa atribuem ao espiritismo com relação à cultura brasileira.

O espiritismo na Hungria

Gyimesi nos mostra que o espiritismo chegou à Hungria na década de 1860. Ele teve por iniciadores, o médico János Gárdos, o médico Adolph Grünhut e a baronesa Adelma Vay.

Adelma era católica, avessa ao espiritismo por questões religiosas, mas desenvolveu uma enxaqueca e procurou o Dr. Grünhut, que sugeriu que ela desenvolvesse a escrita automática. Adelma começou a psicografar o espírito Tamás, que promete deixa-la livre de sintomas. Ela desenvolve a faculdade, e Julia narra um caso em que ela diagnostica e prescreve tratamento correto para um paciente de seu médico. Rompendo com a igreja católica, que não aceita uma médium entre seus adeptos, em 1869 ela publica o livro “Espírito, Poder e Matéria”.


Adelma Vay

Grünhut irá ser um dos fundadores da Associação dos Investigadores Espíritas de Budapeste, com o seguinte objetivo:

“Pesquisar os fenômenos das revelações espirituais e examiná-las à luz das ciências éticas, históricas, psicológicas e físicas. Seu propósito é examinar a doutrina do espiritismo e provar a ressurreição pessoal da psique humana /espírito/ após a morte do corpo; seu objetivo indicado é a perfeição moral dos seres humanos”. (p. 7)

A principal influência teórica desse grupo é a obra de Allan Kardec. Júlia explica que o espiritismo húngaro acabou tendo uma grande influência religiosa e moral, mais que científica. A associação fala em “espiritismo evangélico” e considera seu objetivo primário “o autodesenvolvimento em uma fé cristã unificada, seguindo os ensinamentos do Cristo”. (p. 8)

As duas primeiras revistas da associação foram publicadas em alemão. A primeira se chamava “Reflexões sobre o mundo espiritual” (1873-1876) e a tradução da segunda parece ser “Folha da reforma” (1878-1880). O conteúdo desses periódicos era composto principalmente de comentários de passagens evangélicas, pelos espíritos dos evangelistas e de Paulo de Tarso, se entendi bem o texto.

A década de 1880 trouxe estudos experimentais com Adelma Vay, feitas pelo Barão Von Hellenbach.
Na década de 1890, a Associação publicou a primeira revista em húngaro, cuja tradução do título seria “Luz Celestial”. O jornalista responsável era Titusz Tóvölgyi, a revista foi publicada entre 1898 e 1944 e seu conteúdo era composto de mensagens mediúnicas e artigos teóricos.

Com o fim da segunda guerra mundial e a influência soviética na Hungria, os espíritas, que lutavam com diferenças internas no grupo, começaram a sofrer restrições do regime comunista e, em 1949, tiveram sua sede desapropriada pelo Ministério do Interior (ou de Assuntos Internos) húngaro.

O espiritismo entre o Brasil, a Península Ibérica, a França e a Hungria

Ao acompanhar a linha histórica entre a Hungria e o Brasil, a primeira semelhança que encontramos é a influência do pensamento de Allan Kardec nos primeiros grupos. O mesmo aconteceu na França e na Península Ibérica.

Ao contrário do que afirmam alguns autores da antropologia francesa e brasileira, a influência do cristianismo estudado pelo espiritismo, está em todos esses lugares. Como vimos na biografia de Allan Kardec, a moral cristã, independente da leitura católica ou protestante, era vista como a referência ética de todas essas sociedades. A ética cristã era estudada na França como a referência ética da formação dos cidadãos, mesmo após a revolução francesa. “O evangelho segundo o espiritismo” possivelmente influenciou todos os espíritas que estudaram os livros de Allan Kardec.
Esse texto nos traz novas luzes sobre o desenvolvimento do espiritismo na Europa. A Hungria também sofreu influência do período experimental, e possivelmente dos estudos ingleses e franceses das décadas de 1880-1890. Esta influência, contudo, se justapôs a um movimento já existente, com influência doutrinária kardequiana, o que significa um interesse pelo estudo dos evangelhos. 

Possivelmente houve algum estranhamento interno dos interesses, mas não algo que justificasse uma autofagia do movimento espírita europeu.

A outra questão que o texto nos traz é a relação do espiritismo com os regimes totalitários. Na península ibérica, a história do espiritismo começa em franco conflito com a influência da igreja na política. A queima de livros espíritas em Barcelona, sob as ordens de um bispo, é apenas um dos incidentes do movimento com o governo espanhol. A desapropriação de imóveis aconteceu em Portugal e na Espanha, e agora vemos o regime comunista húngaro proceder da mesma forma. Externas ao movimento espírita, surgiram pressões de governos, especialmente no campo ideológico.

O pensamento espírita, ao não se alinhar com o fascismo nem com o comunismo, em regimes de exceção, tornou-se um incômodo relativamente fácil de ser eliminado. Toma-se o patrimônio e, no caso Ibérico, proíbem-se as reuniões. Júlia Gyimesi não se aprofunda nas relações entre o governo e os espírita húngaros, mas seria bem útil à compreensão da história do movimento espírita europeu.
No caso francês, temos três eventos importantes. O ruidoso caso do “processo dos espíritas”, que foi além da punição de um suposto médium que possivelmente produzia fraudes, a rejeição sumária do meio acadêmico ao pensamento e evidências espíritas, e, por fim falta ainda entender melhor o papel da ocupação nazista durante a segunda guerra mundial no movimento espírita. Houve retirada de documentos, como dizem de oitiva os amigos de Canuto Abreu? 

Quanto às semelhanças, temos o catolicismo em todos esses países, o que deve ter facilitado a aceitação de trabalhos como “O evangelho segundo o espiritismo” e a consequente valorização do estudo dos textos evangélicos. Temos também um periódico húngaro com a ideia de reforma, em seu título, assim como o Reformador, da Federação Espírita Brasileira, não sei se com o mesmo intuito (o das reformas do homem e da sociedade?).

O aspecto religioso e cristão do espiritismo não é uma invenção brasileira. O espiritismo nasceu cristão na obra kardequiana, e se não se manteve assim na Europa, além dos conflitos internos do movimento espírita, há um fator ligado à política europeia e aos conflitos ideológicos que ainda não se encontra devidamente esclarecido.

Fonte Bibliogáfica

GYIMESI, Júlia. Between religion and science: spiritualism, science and early psychology in Hungary. International psychology, practice and research. 2014, v. 5, p. 1-23.