24.2.21

PANDEMIA E SUICÍDIO DE MULHERES NO JAPÃO


 

O jornal Estado de São Paulo publicou hoje uma matéria sobre o aumento de suicídios de mulheres no Japão, durante a pandemia. Foi uma alta de 15% em 2020, com relação ao ano anterior. https://internacional.estadao.com.br/noticias/geral,com-pandemia-suicidio-de-mulheres-aumenta-no-japao,70003625957

As relações de trabalho no Japão vêm mudando, mas ainda espelhariam a ideia de que o salário do marido sustenta a família e o salário da mulher é exclusivamente para ela. Como resultado, é usual que o vínculo do trabalho feminino seja mais precário (meio horário, por exemplo), a remuneração menor (nos anos 90, era legal pagar menos para uma mulher que para um homem que ocupasse o mesmo cargo) e as mulheres ocupam postos de trabalho mais precários que os homens. Em outras palavras, as relações de trabalho no Japão espelhavam uma sociedade na qual a mulher adulta era criada para o casamento.

Outra característica que estudamos na nossa dissertação de mestrado é o papel exacerbado da vergonha da cultura japonesa. Não corresponder às expectativas, pode gerar muito sofrimento no Japão. Vez por outra vemos notícias de autoridades japonesas descobertas praticando corrupção, seguido de autoextermínio. 

Mais uma característica do povo japonês destacado pelo autor da matéria é o estoicismo, ou seja, o enfrentamento das dificuldades com tentativa de imperturbabilidade e uma aceitação resignada do que é visto como destino. Como consequência, os quadros de transtorno mental, sem tratamento, se agravam.

Uma última característica cultural que complica ainda mais a situação: "infelizmente a tendência atual é culpar a vítima", afirma uma professora de ciência política, Michiko Ueda.

Some-se a essa cultura os problemas da pandemia. Com o isolamento social, muitos negócios demitiram ou fecharam, e as mulheres sofreram mais o desemprego, seja porque tinham vínculos mais frágeis de trabalho (trabalho temporário ou de meio horário), seja porque trabalhavam em segmentos da economia muito atingidos, "como restaurantes, bares e hotéis". 

Algumas mulheres ficaram, então, sozinhas em casa, como mostram no artigo. Solidão, culpa, desesperança juntos, além de uma concepção de suicídio como saída honrosa, estão todos associados ao aumento do suicídio feminino na pandemia.

Por que estou escrevendo sobre o suicídio feminino no Japão em um blog sobre espiritismo? Inicialmente porque podemos orar por elas. Aprendemos com Yvonne Pereira a importância da prece para o suicida. 

Outra razão, é refletirmos sobre as pessoas que estão sozinhas e especialmente muitos espíritas que adotam uma posição estóica e não aceitam ajuda psicológica e psiquiátrica, acreditando, ingenuamente, que bastam os recursos do centro espírita para lidar com o sofrimento psíquico. Os passes e as reuniões são realmente úteis, assim como a relação de proximidade que nós espíritas estabelecemos entre nós, mas, na pandemia, e os centros espíritas respeitando as políticas de isolamento social, muitos desses recursos não ficaram acessíveis, principalmente aos grupos de risco.

Precisamos, então, usar dos recursos à distância nas casas espíritas, como muitas têm feito, e incentivar as pessoas a buscaram auxílio psicológico ou psiquiátrico quando começam a apresentar a ideação suicida (imaginar como suicidarem-se) e queixarem de não "dar conta" do peso dos conflitos em casa ou da solidão. O acolhimento fraterno das casas espíritas pode ser realizado por telefone, por exemplo. A prece direcionada às pessoas em sofrimento também pode ser feita. As reuniões mediúnicas, como já o dissemos antes, mesmo que reduzidas a encontro, prece, estudo e irradiação, empregando aplicativos, podem ser mantidas. Palestras ao vivo ("lives") com participação dos que assistem, mesmo que apenas através dos "chats", são um recurso importante contra a rotina e a solidão.

Faço um apelo para que os espíritas japoneses pensem em alguma forma de auxiliar os que se encontram sozinhos, presos em casa, em seu país. Muito pouco pode fazer a diferença entre suicídio e sobrevivência.

Precisamos também aceitar que somos frágeis, não somos "completistas", nem superiores aos nossos irmãos que apresentam outras crenças, e que podemos necessitar de "ajuda psi" para lidar com situações que nos tiram de nossa "zona de conforto" 

Meditemos sobre o que está ao nosso alcance e o que podemos fazer, além de aceitar nossas fragilidades e jamais evitar buscar ajuda profissional ou não quando necessário.

15.2.21

MEDIUNIDADE E TIPOS PSICOLÓGICOS

 

Figura 1: Windbridge Research Center é o nome do grupo dirigido por Beischel que faz pesquisas profissionais sobre mediunidade.

Hoje uma amiga psicóloga me perguntou sobre a relação entre mediunidade e psicologia. Lembrei de imediato das pesquisas de Julie Beischel. No livro “Among Mediuns”, ela publicou resultados de pesquisas com médiuns norte-americanos. No capítulo 5 ela apresenta resultados de estudos sobre como se dá o fenômeno mediúnico. Como ela deseja fazer pesquisa empírica (e não empiricista, ou sem teoria) ela aplica testes psicológicos nos médiuns em estudo.

Um teste muito conhecido nos Estados Unidos é o Myer-Briggs Type Indicator. Ele tem por base a teoria junguiana de tipos psicológicos. Após a aplicação o sujeito estudado é analisado a partir de quatro dicotomias:

1. Extraversão/Introversão (E/I) (ou  ele é extrovertido ou introvertido)

2. Que usa principalmente os sentidos / Que usa principalmente a intuição (S/N)

3. Que principalmente pensa / que principalmente usa os sentimentos (T/F)

4. Que emite julgamentos / que percebe o outro (sem julgar) (J/P)

Depois disso, segundo Beischel, se classifica o sujeito em um de 16 tipos:

1. ESTJ (extravertido, que usa os sentidos, que pensa e julga)

2. INFP (introvertido, que usa a intuição, que sente e que percebe)

E segue-se alternando as dicotomias até formar as 16 possíveis. Cada sujeito teria quatro características preferenciais.

Resultados Encontrados

1. 83% dos médiuns estudados foram categorizados como intuitivos (N) e que usa sentimentos (F). (apenas 16% da população norte-americana tem esse perfil).

2. Ela apelidou os médiuns de NFs

3. Os grupos profissionais com grande incidência de NFs nos Estados Unidos são: clérigos (55%) e professores de arte, teatro e música (54%)

4. Os profissionais que apresentam menor número de NFs são: policiais e investigadores (4% de NFs)

5. Ela entende que talvez isso explique o mau relacionamento entre forças armadas e policiais com os médiuns. “Os dois grupos simplesmente interagem psicologicamente com o mundo externo de formas inteiramente diferentes”. (isso nos leva a crer que os militares e policiais são predominantemente STs ou seja usam os sentidos e pensam, principalmente).

Infelizmente, ela não apresenta mais informações no seu livro. 

Você é médium? Quais seriam suas classificações nas quatro dicotomias?


Beischel, Julie. Among Mediuns: a scientist's quest for answers. Tucson-AZ: The Windbridge Institute, 2013.  (Acessível via Kindle)

2.2.21

QUANDO ACONTECEU O PRIMEIRO ENCONTRO DA LIGA DE HISTORIADORES E PESQUISADORES ESPÍRITAS (ENLIHPE)?

 

Eduardo Carvalho Monteiro

Sempre me fazem a seguinte pergunta: Quando aconteceu o primeiro Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo?

O que foi considerado “1º Enlihpe”, na verdade foi uma mesa realizada no primeiro Congresso Espírita Brasileiro, realizado em Goiânia nos dias 1 a 3 de outubro de 1999.

A mesa se chamava “Pesquisas históricas no movimento espírita”, e foi coordenada por Eduardo Carvalho Monteiro.

Ela teve como expositores do tema “Metodologia para pesquisas históricas: organização e conservação de dados históricos nas instituições espíritas” Washington Luiz Nogueira Fernandes e Luciano Klein Filho. O tema Memória do movimento espírita e valorização de vultos espíritas” foi apresentado por Geraldo Campetti Sobrinho. Por fim, foi realizado um intercâmbio de experiências, discussões e pesquisas. (Fonte: Reformador, agosto 1999, p. 25)

Como se pode ver, a Liga de Pesquisadores do Espiritismo tem por origem a preservação da história e da memória, sob a direção consequente do Eduardo. Foi posteriormente que se abriu para outras áreas do conhecimento, deixando de ser Liga de Historiadores e Pesquisadores Espíritas e se tornando Liga de Pesquisadores do Espiritismo, mas isso é história para outra publicação.

26.1.21

REUNIÕES MEDIÚNICAS À DISTÂNCIA: PSICOGRAFAR OU NÃO?

 

Chico Xavier psicografava na casa de Rômulo Joviano, às quartas-feiras, nos anos 1930 e posteriores


Com a pandemia e as políticas de isolamento social vieram novos desafios para as sociedades espíritas. O desafio central é: como funcionar com os cuidados para que não haja contágio? Uma das formas de adaptação que mais se desenvolveu foram as reuniões através da internet, nas quais cada um se mantém em sua residência, mas consegue interagir com os demais.

Talvez o maior desafio tenha sido as reuniões mediúnicas. Há muitos anos, no Brasil, os grupos deixaram de ser familiares, criaram “centros espíritas” ou “sedes de sociedades espíritas” para seu funcionamento e vêm praticando a mediunidade de forma coletiva (em grupos) nos centros espíritas. Obviamente, isso não acontecia em épocas e em países onde não há uma rede de centros espíritas. 

Em “O Livro dos Médiuns”, no capítulo XVII da segunda parte (Da formação dos médiuns), Kardec sugere à pessoa que esteja desenvolvendo a psicografia, que o faça em solidão, silêncio e afastamento de tudo o que possa ser causa de distração. E sugere que renove “todos os dias” a tentativa, por dez minutos ou um quarto de hora, por meses. Em outras palavras, ele recomenda que os que desejam verificar se têm a capacidade da psicografia que façam esse exercício de forma particular, se necessário em casa. (segunda parte, capítulo XVII, §204)

Isso não significa que Kardec não observasse vantagens no trabalho mediúnico em grupo ou equipe. Ao falar da reunião de pessoas com o objetivo de desenvolver a mediunidade, ele argumenta que ao se reunir com um intento comum, os membros “formam um todo coletivo, cuja força e sensibilidade se encontram acrescidas por uma espécie de influência magnética, que auxilia o desenvolvimento da faculdade.” (segunda parte, capítulo XVII, §207)

Na história do espiritismo brasileiro, podemos registrar a existência de reuniões familiares nas quais um médium psicógrafo permitia a comunicação de um espírito familiar ou um espírito superior. Talvez, o maior registro impresso que tenhamos na atualidade, seja o livro “Sementeira de Luz”, todo psicografado por Chico Xavier nas reuniões de evangelho no lar da residência dos Joviano. Wanda Amorim Joviano guardou as mensagens que foram psicografadas na casa de seu pai desde os anos 1930, semanalmente, às quartas-feiras. Trata-se de um livro de 669 páginas, em sua grande maioria ditadas por Arthur Joviano, avô de Wanda, já desencarnado. 

Divaldo Franco, no livro “Diretrizes de Segurança” (questão 47), que foi fruto de um simpósio realizado em Belo Horizonte em conjunto com Raul Teixeira, desaconselha a prática mediúnica como hábito em reuniões domiciliares, mas “não impede que, excepcionalmente, ocorra o fenômeno com a anuência de um médium sob a inspiração dos bons espíritos”. Em outras palavras,  ele limita essa prática, mas não a proíbe. Na questão 48, ele recomenda de forma contundente que se realizem as reuniões mediúnicas nos centros espíritas, comparando-o a um centro cirúrgico e perguntando de forma retórica: “Já que temos o Centro, por que desrespeitá-lo, fazendo reuniões mediúnicas noutro lugar, se ele é o determinado para tal?”

Considerando todas essas informações, entendemos que no momento, e não sabemos até quando, a reunião mediúnica presencial nos centros espíritas se encontra interditada por razão de saúde pública, mas isso não significa que não possamos psicografar, durante as reuniões que se fazem através da internet, na qual se encontra reunido o grupo, comunicações de espíritos orientadores ou familiares. Em nossa experiência, a maioria dos médiuns psicógrafos dos centros que conhecemos é intuitivo, não havendo automatismos. Não vemos consequências mais graves para esse conjunto de fatores: médium intuitivo psicografando espíritos familiares ou superiores, em encontro à distância com os demais membros de reunião mediúnica. Neste caso, a interrupção pelo médium de uma comunicação importuna ou inadequada é fácil e voluntária não havendo outros inconvenientes.

Com esses cuidados, é aceitável que se mantenha a prática da psicografia de espíritos benfeitores ou familiares nas reuniões mediúnicas à distância, além das preces, dos estudos e das chamadas “irradiações”, que não são senão uma prece dirigida a um ou mais beneficiários. Temos obtido bons resultados em nosso grupo, sem incidentes dignos de registro até o momento.

24.1.21

DELANNE FALA DE KARDEC APÓS ANALISAR NOVOS FENÔMENOS E AVANÇOS DA CIÊNCIA

 

Gabriel Delanne

“Rendamos justiça ao espírito eminente de Allan Kardec, que nos tem instruído, que nos tem indicado a boa direção, mostrando, com uma segurança maravilhosa, o caminho que nós devemos seguir. Nosso dever é o de render homenagens para este iniciador e, ao passar pelo crivo da razão e da experiência seus ensinos, saibamos lhe pagar o justo tributo de admiração que lhe é de direito, e reconhecer que ele tem o seu lugar no panteão dos benfeitores da humanidade.”

Gabriel Delanne, Revista Científica e Moral do Espiritismo, 1896, p. 209 e 210. 

Homenagem escrita após o término do artigo “Os raios X e a dupla vista dos sonâmbulos e dos médiuns, na referida revista.


14.1.21

PRINCÍPIOS DO ESPIRITISMO



Ainda na entrevista da PUC Minas, a entrevistadora perguntou:  Quais são os princípios do espiritismo? 

O espiritismo baseia-se na existência e sobrevivência da alma, cujas manifestações se dão através de uma faculdade denominada mediunidade, na reencarnação, na pluralidade dos mundos habitados (não apenas na Terra reencarnam espíritos) e na existência de Deus, com base no axioma “um efeito inteligente (ser humano) há de ter uma causa inteligente”.



Traduzimos da New World Encyclopedia, o seguinte verbete: https://www.newworldencyclopedia.org/

"Princípio em filosofia e matemática significa um pressuposto ou lei fundamental. A palavra "princípio" é derivada do latim "principium" (começo), traduzida por Cícero do grego "arché" (ἀρχή); o começo, o primeiro princípio. 

Um princípio é fundamental, no sentido que ele geralmente não pode ser derivado de outros."

"Principle in philosophy and mathematics means a fundamental law or assumption. The word "principle" is derived from Latin "principium" (beginning), translated by Cicero from Greek "arche" (ἀρχή; the beginning, the first principle).

A principle is fundamental in the sense that it generally cannot be derived from others... "

A questão proposta pela Rosângela, da PUC, não tem uma resposta exata. Algumas das ideias espíritas são propostas pelos espíritos e analisadas racionalmente pelos espíritas, a começar de Allan Kardec. Dada a complexidade do espiritismo, sempre é possível analisar suas ideias centrais buscando seus princípios ou pressupostos, e o analista pode chegar a diferentes propostas ou conjuntos de princípios. 

Reduzindo o conceito de princípio ao de pressuposto, a existência de Deus, por exemplo, se fundamenta no axioma de que "um efeito inteligente tem uma causa inteligente", que foi inscrita no túmulo de Allan Kardec no cemitério Père Lachaise. Em outras palavras, o espiritismo fundamenta a ideia de Deus em um princípio racional, e não em uma afirmação que o crente deve aceitar independente da razão.

11.1.21

CARTA DE HERMÍNIO C. MIRANDA À LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO - LIHPE

Hermínio C. Miranda


Agora há pouco o amigo Pedro Nakano pediu que eu recuperasse a carta escrita por Hermínio C. Miranda à Liga de Pesquisadores do Espíritismo, por época de seu 7º encontro nacional. O tempo é pródigo em enevoar as memórias, e quando finalmente consegui, no portal "Espiritualidade e Sociedade" não consegui não reler o documento.

Ele foi obtido pela amiga e trabalhadora de sempre, a Dra Nadia Luz Lima, que teve contato mais próximo do "escriba" quando utilizou alguns de seus conceitos, como o de "simetrias históricas", em sua tese de doutoramento em história.

São curiosos a modéstia e o afeto do escritor pela proposta do Enlihpe. Como estamos em época de "chamada de trabalhos" para o 16º encontro, após um ano sem evento, devido à pandemia, gostaria de relembrar aos leitores do Espiritismo Comentado essa mensagem curiosa, de coração para corações.

Jáder Sampaio


Aos estudantes e participantes do 7º Encontro da Liga de Pesquisadores do Espiritismo


Meus jovens amigos e amigas de ontem, de hoje, de amanhã e de sempre:

Gostaria de estar pessoalmente aqui, para viver este momento com vocês. De certo modo, contudo, é bom que eu não esteja. Sou um sujeito emotivo e até a minha cardiopatia é tida pelos médicos como de natureza emocional. Como iria eu administrar minhas emoções, ao partilhá-las com vocês?

Alegra-me sobremodo ver vocês trabalhando na realização do impossível. Digo isto ao me lembrar de Sir Winston Churchill, que costumava dizer mais ou menos assim: “Difícil é aquilo que a gente pode fazer imediatamente. O impossível é que demora um pouco mais.”

As leis divinas me concederam generosamente, tempo para realizar algumas impossibilidades pessoais, superando pretensos obstáculos e supostos limites, que misteriosamente desmaterializavam-se e me deixavam passar.

Foi assim que me tornei até um escritor. Imaginem só: eu, escritor!

Somente agora estou percebendo que os “impossíveis” começaram a acontecer, depois que tomei conhecimento da abençoada Doutrina dos Espíritos, nos idos de 1957.

De algum tempo para cá passei a perceber algo singular. Ou seja: como é que a gente assiste em certo nível de indiferença ao doloroso espetáculo do estrangulamento do processo evolutivo da humanidade pelos implacáveis punhos do materialismo dominante? É claro que, no decorrer de tal ditadura ideológica, avançamos consideravelmente nas badaladas e

sofisticadas conquistas tecnológicas. Mas, não é a esse aspecto que me refiro. Desejamos mais do que isso, muito mais. E para toda a comunidade humana onde quer que ela esteja pelas dobras infinitas do espaço imenso.

Será que não podemos mudar – pacificamente e sem dores, pelo amor de Deus! --os modelos políticos, sociais, econômicos, religiosos e culturais? Claro que sim. Não apenas podemos, mas devemos mudá-los.Temos de mudá-los.

Vocês já estão trabalhando no projeto de reformatação do mundo em que vivemos e no qual, viveremos ainda, não sei quantas vidas. Estão levando para o autorizado foro de debates do meio acadêmico, a desprezada realidade de que não somos meros corpos físicos perecíveis, mas espíritos imortais, pré-existentes, sobreviventes e reencarnantes.

Convém lembrar, ainda, que, ao separar didaticamente o território das coisas materiais, do espaço reservado às imateriais, Mestre Aristóteles certamente não pretendeu demonizar a Metafísica. Quis apenas chamar a atenção para o fato de que esses vetores de conhecimento exigem abordagem e tratamento diferenciados e despreconceituosos de gente que se disponha honestamente a aprender com os fatos.

Decorridos mais de dois milênios, ainda ouvimos dizer que os componentes metafísicos da vida são, crendices e fantasias pré-científicas, indignas da atenção de intelectuais que se prezam. O que desejamos é presença de gente qualificada que nos ouça e ajude a retirar o estigma que pesa sobre realidade espiritual. O resto virá por acréscimo.

Parodiando o ex-Presidente Kennedy, não aspiremos ao que mundo pode fazer por nós, mas ao que podemos fazer pelo mundo.

Que Deus nos abençoe. E nos inspire sonhos como este, dado que, se não sonharmos, como é que nossos sonhos vão se realizar?

Eis o singelo recado do velho escriba.

Hermínio C. Miranda

Agosto de 2011

1.1.21

TRANSIÇÃO: UMA VISÃO RACIONAL



Há alguns meses fui convidado pela direção da reunião pública da Associação Espírita Célia Xavier para dialogar com o público sobre o tema “Papel do espírita em uma sociedade em transição”. Nesse trabalho, preparado originalmente para um encontro no C.E. Thiago Maior, também de Belo Horizonte, recuperamos o pensamento de Allan Kardec nos capítulos 16, 17 e 18 de “A Gênese, os milagres e as predições” de Allan Kardec.

A análise de Kardec sobre as predições é que elas não são uma espécie de “filme do futuro”, em que o “profeta” ou “médium” vê como se fosse um cinema o que vai acontecer. Ele associa a teoria da presciência a um agrônomo, por exemplo, que conhece o tempo da floração e do surgimento dos frutos de uma determinada plantação. Ele sabe quando deve acontecer, mas não é capaz de prever incidentes inesperados, como uma chuva de granizo que impeça o surgimento das flores e dos frutos. Quanto maior o conhecimento de um espírito, maior a capacidade dele falar de coisas que virão, embora não possa prever as escolhas das pessoas 

Isso é muito importante para entendermos a visão de transformação e de transição no pensamento de Allan Kardec. Ele faz uma interpretação do discurso apocalíptico de Jesus, o chamado Sermão Profético, como contendo descrições fortes para sensibilizar um povo com mentalidade rude. As guerras, os cataclismos e outras coisas descritas no sermão seriam apenas símbolos de conflitos de valores e de princípios que deveriam ser compartilhados no mundo, no futuro. Jesus defende uma sociedade regida pela fraternidade e solidariedade, ou seja, um mundo no qual todas as pessoas se tratam como merecedoras de respeito e que compartilham o mesmo status de sujeitos de direito, ou seja, como se diz, são iguais diante da lei (dos homens e de Deus).

Kardec chama a nossa atenção para o progresso material e moral do mundo. Reafirma que o progresso material, que tem por base o desenvolvimento do conhecimento, antecede o progresso moral. As transições podem ser lentas e graduais ou bruscas. Ele também diz que algumas partes do mundo podem avançar mais rapidamente que outras. 

O que se conclui é que a transição defendida por Allan Kardec não é a espera de um momento mágico a partir do qual se declara que o mundo deixou de ser de expiações e provas e se tornou um mundo de regeneração. Não é uma data. Não é uma declaração de entidade espiritual. É um processo de transformação das pessoas e das sociedades, uma mudança de mentalidades que gera transformações nas leis e na forma que vivemos.


21.12.20

O 16º ENLIHPE SERÁ EM SÃO PAULO, EM 2021 - CHAMADA DE TRABALHOS


 

16º ENCONTRO NACIONAL DA LIGA DE PESQUISADORES DO ESPIRITISMO

Tema central: 160 anos de O Livro dos Médiuns
28 e 29 de agosto de 2021
São Paulo - SP


CHAMADA DE TRABALHOS

Apresentação

O Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo (ENLIHPE) é um espaço privilegiado no contexto brasileiro para apresentação e discussão de propostas e trabalhos de investigação científica sobre a temática espírita. O sucesso alcançado nos anos anteriores tem atraído pesquisadores de todo o Brasil, interessados na divulgação e discussão de seus estudos.

Um dos diferenciais do ENLIHPE é o seu formato, o qual incentiva a formação de redes de pesquisa e promove a aproximação de estudiosos de diferentes áreas do conhecimento.

Instruções aos autores

A data final para submissão de trabalhos é 30 de abril de 2021. A confirmação do recebimento e o parecer da Comissão Científica sobre o artigo serão enviados eletronicamente ao email do remetente.

A avaliação será feita utilizando-se o sistema Double Blind Review, no qual o trabalho é avaliado anonimamente por 2 por membros da Comissão Científica do encontro.

Os trabalhos devem ser, prioritariamente, relacionados à temática central do evento, em forma de artigo científico, conforme procedimentos definidos a seguir:

Artigo científico

•O artigo deverá ser gravado em 2 arquivos:

ARQUIVO 1 – contendo o nome do(s) autor(es), o título do trabalho e o resumo;
ARQUIVO 2 – contendo o título e o texto integral do artigo sem qualquer identificação de autoria.

Submissões de trabalhos

Por e-mail, envie os arquivos 1 e 2 na mesma mensagem para: submissao@lihpe.net

Formato do Trabalho:

Editor de textos: Word 97 ou Posterior
Número máximo de páginas: 15 (quinze)
Configuração das páginas
Margens: superior 3cm; inferior 2 cm; esquerda 3cm; direita 2 cm.
Tamanho do papel: A4 (largura 21 cm; altura 29,7 cm)
Fonte: Times New Roman, tamanho 12
Formato do parágrafo: Recuo especial: primeira linha 1,25 cm
Espaçamento entre linhas: simples.
Figuras, tabelas e gráficos: Fonte Times New Roman, tamanho 8 a 12
Resumo: Mínimo de 1150 caracteres (aproximadamente 10 linhas), máximo de 1750 caracteres (aproximadamente 15 linhas)

Revisão ortográfica a cargo dos autores

Informações adicionais: Envie uma mensagem para 16enlihpe@lihpe.net

Local do evento: União das Sociedades Espíritas do Estado de São Paulo – USE-SP. Rua Dr. Gabriel Piza, 433, São Paulo/SP



20.12.20

FREDERICO JÚNIOR, BEZERRA DE MENEZES E YVONNE PEREIRA

Foto: Frederico Júnior

Terminamos no ano passado a leitura do livro “A Tragédia de Santa Maria”, escrito por Yvonne Pereira e ditado por Bezerra de Menezes à médium. Uma coisa interessante foi a inserção do médium Frederico Pereira da Silva Júnior na trama.

A principal fonte que temos da vida do médium Frederico Pereira da Silva Júnior são os textos de Pedro Richard em Reformador, escritos em 1914, ano de sua desencarnação. Há muitos outros na revista Reformador, mas as informações são todas baseadas na narrativa de Richard.

Frederico nasceu em 1857, o ano do lançamento de “O Livro dos Espíritos” por Allan Kardec. Como Yvonne, tinha poucos estudos. Ainda jovem foi à “Sociedade Deus, Cristo e Caridade” conhecer o espiritismo no Rio de Janeiro e descobriu que era médium em 1878. Ele desejava notícias de um amigo desencarnado.

Pelo que diz Richard, Frederico tinha uma mediunidade composta de faculdades diversificadas. No texto de Bezerra, ditado a Yvonne, Frederico Júnior participa como médium de efeitos físicos, possibilitando a materialização de Esmeralda, já desencarnada, para Barbedo, seu pai inconsolável.

Como a grande maioria dos espíritas daquela época, Frederico Júnior deve ter sido conhecedor de Roustaing, que estudou com Bittencourt Sampaio , uma das expressivas lideranças espíritas da época. Sampaio, Frederico e outros romperam com a Sociedade Acadêmica “Deus, Cristo e Caridade” e fundaram a “Sociedade Espírita Fraternidade”.



Foto: Bittencourt Sampaio

Após a desencarnação de Bittencourt Sampaio, Frederico Júnior passou a psicografá-lo. Sua obra  tratava dos evangelhos com a influência dos livros psicografados por Madame Colignon: Os quatro evangelhos. Com tempo, a crítica a algumas de suas ideias mais polêmicas e contraditórias ao pensamento de Kardec, fez com que os livros psicografados por Roustaing fossem criticados no Brasil por espíritas estudiosos, como Herculano Pires. Hoje são objeto de estudo por poucos espiritas no Brasil, e por analistas com interesse histórico.

Bezerra, contudo, através da mediunidade de Yvonne Pereira, mostra a importância da mediunidade de Frederico Júnior para sua época e não poupa elogios.

“... existia na capital do país um médium portador de peregrinas qualidades morais e vastos cabedais psíquicos, que dele faziam, sem contestação possível, um dos mais preciosos intérpretes da Revelação Espírita no mundo inteiro, em todos os tempos.” 

Bezerra descreve o encontro do médium com o médico-fazendeiro da seguinte forma:

“Subitamente, o precioso veículo mediúnico, a quem eu tivera o cuidado de não informar do assunto a ser tratado na reunião, tornou-se como que espiritual, extático, olhos dilatados como em desdobramento, e exclamou, a voz transtornada grave como longínqua:”

Pedro Richard, ao tratar do desenvolvimento das faculdades do médium, afirma:

“De dez anos para cá, nova faculdade mediúnica se desenvolveu em Frederico Júnior: a mediunidade estática.”[1]  (p. 301)

Ele explica que era “difícil saber quando ele falava e quando era um espírito” que por ele se comunicava. Na introdução do livro “Jesus perante a cristandade”, Pedro Sayão o classifica como médium sonambúlico.



Foto: Pedro Richard

A descrição que Bezerra de Menezes faz da comunicação de Esmeralda, filha do consulente, é impressionante. Inicialmente o médium a descreve com um ramo de flor de laranjeira, símbolo das noivas à época. 

“Logo após vimos, respeitosos, algo chocados e muito enternecidos, que, na penumbra que se estabelecera, a mão de Esmeralda, reconhecida por seu próprio pai, como também por mim, oscilou gentilmente sobre a mesa, acariciando as cãs prematuras que ornavam a cabeça do antigo senhor de escravos, para, em seguida, dominar com graça e singeleza, a destra rude de Frederico, fazendo-a escrever ligeiramente...” (p. 226-227)

Essa é uma informação importante, porque não encontrei no texto de Richard ou nos demais nenhuma menção à faculdade de efeitos físicos de Frederico Júnior, mas sabemos que à época nos anos 80 e 90 do século 19, esse tipo de mediunidade era praticada e estudada no mundo ocidental.

O próprio Bezerra assina no final de “Jesus perante a cristandade”, junto com seus colegas de reunião mediúnica o texto “Últimas palavras”, no qual se tornam testemunhas da origem mediúnica do texto e da semelhança impressionante de estilo com o do falecido Bittencourt Sampaio. Alguns dos colegas foram esquecidos pela história, até mesmo pela história do espiritismo, mas alguns ainda chegam aos nossos dias, como Antônio Luiz Sayão e Pedro Richard, além do “médico dos pobres”. Esse livro foi publicado em 1898, dois anos antes da desencarnação de Bezerra. O que entendi é que o livro é fruto de psicofonia, e foi organizado e publicado por Pedro Luiz de Oliveira Sayão, a pedido de Bittencourt Sampaio, espírito. Não tenho como ter certeza.


[1] Kardec não usa as expressões mediunidade estática ou médium estático, mas trata do êxtase como uma forma de emancipação da alma, e uma forma de percepção do mundo espiritual. Ele assim diz no livro “Instruções práticas das manifestações espíritas”: ÊXTASE – do. gr. ekstasis, transbordamento do Espírito, do verbo existemi, ferir a admiração. Paroxismo da emancipação da alma durante a vida corpórea, de onde resulta a suspensão momentânea das faculdades perceptivas e sensitivas dos órgãos. Em tal estado a alma não se prende mais ao corpo senão por frágeis laços, que procura romper; pertence mais ao mundo dos Espíritos, que entrevê, do que ao mundo material. No mesmo livro ele coloca na categoria de médiuns inspirados, os que recebem, em estado normal ou em êxtase, pelo pensamento, comunicações ocultas, estranhas às suas ideias.


18.12.20

PAULO SÉRGIO DESENCARNA EM NITERÓI.

 



Foto: Paulo Sérgio 

 

Acordei hoje com a sensação de que faltava algo, e que não poderia ser reposto, dentro do coração.

Conheci o Paulo Sérgio no Célia Xavier. Era o dia do 3º Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo, em Belo Horizonte. 2004! Ele chegou pela manhã com uma quantidade enorme de banners sobre a história do espiritismo. Pediu para colocar no local, e como não tínhamos suportes para banner, ele trocou de roupa, colocou sua “roupa de trabalho”, que era uma bermuda, uma camiseta e um par de havaianas e começou a decorar o ambiente da casa.

Daí a uns momentos, ele me perguntou:

- Aqui pode se usar bermuda?

Eu respondi:

- Não é usual, mas fique à vontade. Não se preocupe.

Quando o presidente da casa chegou, ele ficou encantado! Depois ele acertou com o Paulo Sérgio de deixar os banners por uma semana no Célia Xavier e enviar depois, para que todos da casa pudessem ver.

Paulo Sérgio falava com uma imensa naturalidade, fora a empolgação de contar com detalhes seu empenho na aproximação entre espíritas lioneses e brasileiros. Fotos de reuniões dos espíritas europeus que ele participara. Até do filho político ele falou, para nossa surpresa, em sua participação no Enlihpe. O Paulo era a encarnação do entusiasmo.

Anos depois eu trabalhei com o Paulo Sérgio no Encontro França-Brasil, no Rio de Janeiro. Ele fez contato com os espíritas franceses e europeus. Acho que o Paulo acreditava no que chamamos de “corpo a corpo”, na proximidade pessoal como forma de unificação. Ele, o Alexandre Rocha e a Nadja Couto Valle não mediam esforços para fazer um encontro que ficasse à altura do espiritismo. Como entrei na comissão organizadora tardiamente, vi todos os esforços que ele fez para trazer e receber bem os espíritas franceses e os brasileiros. O evento, para ele, fechava um ciclo. A cidade de Niterói se tornava cidade-irmã de Lyon, e dois monumentos foram erguidos em homenagem a Kardec: um em Lyon e um em Niterói, em cuja inauguração não me foi possível estar presente por causa das limitações que a hemodiálise nos impõe. Demorei a chegar na abertura, em função de um problema nos voos e o trânsito do Rio de Janeiro na sexta à noite, mas assisti com alegria o Pedro Nakano representar a Liga de Pesquisadores do Espiritismo – LIHPE, na mesa de abertura.

Conseguimos trazer, não sem muito trabalho, uma equipe muito representativa de interessados na história do espiritismo de diversos lugares do Brasil e da Europa. Os telefonemas de Paulo Sérgio, ao mesmo tempo empolgado e zeloso, duravam 50 minutos, no afã de nos informar de cada detalhe para que pudéssemos tomar as melhores decisões nas reuniões da comissão organizadora.

No intervalo, no “olho do furacão” que foi organizar um evento no auditório maior da UERJ, para pelo menos 400 pessoas, ele me procurou para me passar uma lembrança. Trouxe uma coruja de metal da Grécia, atencioso. A coruja é o símbolo da LIHPE. Eu agradeci, meio sem graça, porque estava de mãos vazias.


Foto 2: Coruja da Grécia


Passou o evento, e a LIHPE estava mais próxima do Paulo e do Rio de Janeiro. Também pudemos trabalhar juntos com o Marcelo Gulão e com o Alexander. Os fios eram tecidos, e nos intervalos, ficamos conhecendo os franceses e os “franco-brasileiros” que trabalham pelo espiritismo na Europa. Uma cultura muito diferente da nossa no Brasil, mas uma identidade profunda, do coração, baseada no interesse legítima pelo espiritismo e pelas pessoas que trabalharam por ele. O Paulo, mais uma vez, conseguiu reduzir distâncias, nos colocando próximos, uns aos outros, e acreditando que nossas semelhanças falariam mais alto que nossas diferenças.

Nos preocupávamos com a forma apaixonada que ele se dedicava ao espiritismo. Ele levava às últimas instâncias a afirmação dos espíritos em “O Livro dos Espíritos” que diz que o limite do trabalho era o limite das forças. Nosso amigo comum, o médico português Paulo Mourinha, passando uns dias com o Paulo Sérgio, o viu cochilar na direção e se colocou à disposição para dirigir enquanto ele cochilava seguro no banco do “carona” do seu próprio carro. Eu cheguei a conversar sobre isso com os familiares, na condição de profissional de saúde e amigo, preocupado com os exageros do Paulo. O filho sorriu do lado de lá do telefone, e me explicou que eles sabiam de tudo. Ficou imp lícito que o Paulo era “difícil de parar”, que não adiantava conversar ou advertir, ele faria as coisas “do jeito dele”.

Eu cheguei ao Enlihpe de Fortaleza, no Ceará, um pouco atrasado pela perda de um voo, e quem estava lá? O Paulo Sérgio. Ele participou de todo o evento, com a alegria de sempre, assentou conosco na reunião administrativa da LIHPE e espontaneamente auxiliou o secretário na redação da ata. Era o jeito dele, desejava contribuir, auxiliar, participar. Conversando com Júlia e Pedro Nakano, fiquei sabendo da visita dele ao Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo. A foto tradicional na fachada com os amigos de São Paulo documenta a iniciativa.

Eu ainda conversaria com o Paulo por duas vezes. Ele organizava um evento em Niterói e desejava a presença da LIHPE. Já era a época da pandemia, essa ceifadora de corpos. Eu não poderia atender ao convite dele, e indiquei o amigo comum, Pedro Nakano. Conversei sobre o livro que estava lendo acerca dos mártires de Lyon, e ele queria marcar uma palestra o mais rápido possível. Como bom mineiro, pedi a ele que esperasse o final da leitura, que não aconteceu até o momento porque fui atropelado por outros encargos. Ele me deu notícias do Luiz Carlos Veiga, amigo comum desencarnado há anos, agora registrado pelos “radares mediúnicos” dos companheiros espíritas do estado do Rio de Janeiro.

Depois não falaria mais pessoalmente com o amigo de Niterói. Recebi pelo Alexandre Rocha a notícia da internação em decorrência da COVID. Já estava em tratamento intensivo. Eu realmente me preocupei, e na tentativa de ajudar de alguma forma, divulgamos a condição médica do Paulo no último programa “Esquina do Célia” e nosso presidente, o Humberto Cerqueira, pediu aos telespectadores e ouvintes que se unissem em prece por ele. Pedro Nakano me enviou há poucos dias os esforços dos espíritas de Niterói, que mentalizavam sua melhora e lhe davam forças para continuar a luta contra a doença insidiosa.

Ontem recebi a notícia pelo Pedro Nakano da desencarnação do Paulo. Avisei os amigos comuns. Hoje recebi um texto belíssimo e pessoal do Alexandre, se lembrando do “mais próximo da onipresença” que conhecemos, e recebi um agradecimento da família pelo facebook. Paulo Sérgio nos antecedeu na grande viagem. O Gepar perdeu um grande dirigente espírita e ganhou uma nova presença espiritual. Eu imagino que passado o período de perturbação, nem bem recuperado ele esteja, já estará em busca de trabalho, dos amigos, bem como querendo se enturmar com os espíritas de lá e com os que contribuem com o movimento espírita de Niterói, bem como com os trabalhadores do plano espiritual do Gepar, seu trabalho do coração.

Sei que a vida continua, mas aprendi com o Freud que não devemos recalcar nossos sentimentos. Eu me sinto triste, como se tivesse perdido alguém da família, que aprendemos a estimar com a convivência e a aceitar a personalidade marcante e dedicada, as ideias e projetos audaciosos que ele conseguia materializar. Se ele causa esse sentimento em mim, que convivi muito pouco, imagino os irmãos espíritas e os familiares.

27.11.20

LIDERANÇAS DO ESPIRITISMO NA FRANÇA E NO BRASIL

 


Mais uma pergunta da entrevista feita pela aluna da PUC MINAS.


03- Quais são os fundadores e principais líderes do espiritismo?


Resposta de Jáder Sampaio


"A pessoa que teve um papel central na elaboração do espiritismo foi o professor H.L.D. Rivail, que adotou o pseudônimo de Allan Kardec para a obra espírita em geral. Ele era tratado pelos espíritas franceses como mestre, e pelos espíritas brasileiros como codificador, por ter realizado estudos com diversos médiuns, analisado as comunicações de diversos espíritos e escrito seus livros, além da publicação da Revue Spirite, que publicava os estudos de espíritas da França e de diversos países.

Na França, após o falecimento de Allan Kardec, outros autores se tornaram importantes para o movimento espírita, como Léon Denis, Gabriel Delanne e o astrônomo Camille Flammarion. 

A Europa passou por diversas dificuldades que afetaram o movimento espírita em geral. Regimes autoritários, como o de Franco, o de Salazar ou o da Hungria na época da cortina de Ferro proibiram a prática do espiritismo e desapropriaram imóveis. O espiritismo francês passou pelo que foi chamado de “processo dos espíritas” em decorrência de um médium que praticava fraudes, o que afetou a imagem no país de Napoleão.

As universidades francesas recusaram-se a aceitar os trabalhos de observação realizados pelos espíritas, e alguns autores europeus oriundos da psiquiatria, principalmente, tentaram explicar os fenômenos espirituais pela via da psicopatologia. As exigências feitas para o espiritismo, e depois para a metapsíquica francesa (uma corrente de pesquisas que aceita a existência de fenômenos como a telepatia, mas põe em suspenso a existência de médiuns) não foram feitas para outras áreas do conhecimento, e o espiritismo francês, após as duas guerras, ficou limitado a uma minoria e preocupado com a aceitação pela comunidade acadêmica.

No Brasil há um grande número de lideranças, expositores, autores e médiuns espíritas conhecidos, mas destacarei dois: Adolpho Bezerra de Menezes (médico e político nascido no Ceará, mas que se tornou espírita no Rio de Janeiro) e Chico Xavier (funcionário público, conhecido por sua mediunidade prolífica e pelo trabalho com as pessoas em vulnerabilidade social)."

21.11.20

ESPIRITISMO OU KARDECISMO? ENTREVISTA PARA A PUCMINAS 2


 


Dando continuidade à entrevista feita pela aluna da PUC Minas.


02- Espiritismo kardecista é a mesma coisa que espiritismo?

Resposta de Jáder Sampaio

"A palavra espiritismo foi criada em língua francesa por Allan Kardec que desejava distinguir a doutrina que ele publicava a partir de “O Livro dos Espíritos”, do spiritualism (espiritualismo ou espiritualismo moderno), que é um movimento mediúnico norte-americano que foi difundido na Europa.

No Brasil, contudo, o senso comum aproximou o espiritismo dos cultos afro-católicos, ambos recebidos com restrições por um país oficialmente católico. É uma aproximação estranha, porque o espiritismo foi desenvolvido filosoficamente e os cultos afro são tradições trazidas pelos povos africanos, essencialmente orais. 

Para que não houvesse confusão entre as práticas, algumas pessoas começaram a se referir ao espiritismo como “centros de mesa”, “centros de linha branca” ou “kardecismo”, mas essas designações não são aceitas pela maioria dos espíritas brasileiros, que preferem que se distinga o espiritismo, de umbanda, do candomblé e de outros cultos de matriz africana."

19.11.20

QUAIS SÃO AS DIFERENÇAS ENTRE "O EVANGELHO SEGUNDO JOÃO" E OS TRÊS EVANGELHOS SINÓTICOS?

 


Encontrei hoje no texto de Milton Torres, professor da Universidade Adventista de São Paulo, um bom conjunto de explicações, acessíveis a todos nós, interessados no estudo dos evangelhos. Vou retirar literalmente as explicações dele, e interpolo meus comentários entre colchetes:

    1. “... ele [o evangelho de João] não faz nenhuma tentativa de se passar por uma biografia de Jesus.”

    2. “[O evangelho de João] não demonstra interesse por uma cronologia exata dos feitos de Cristo.”

    3. “... os longos discursos de Jesus ali registrados apresentam semelhanças formais com as preleções de Sócrates nos diálogos platônicos”

    4. “... como no caso de Platão, seu método é determinado pelo propósito que persegue, pois lança as ideias de Jesus em metáforas surpreendentes, dramatizando os momentos históricos para que alcancem uma sugestibilidade supra-histórica, para isso empregando símbolos e analogias”.

    5. “... o termo logos aparece, no prólogo de João, em íntima associação com outras expressões de longo pedigree filosófico: panta (“todas as coisas”, isto é, o “universo”); kosmos (“mundo”); sarx (“carne”); en archêi (“no princípio”), etc.

Com esses argumentos, ele tenta mostrar que o escritor de "O evangelho segundo João" produz um texto que é voltado não apenas aos hebreus e descendentes, mas também aos gregos e outros estrangeiros com acesso e influência da cultura helenista, e, dentro dela, de elementos da filosofia grega. É como se esse evangelho fosse uma produção em sintonia com a proposta de Paulo de levar a mensagem cristã para os gentios, através de um texto que é capaz de levar o cristianismo mais próximo à cultura dos membros das comunidades fundadas em cidades gregas e romanas.

Para quem desejar ler o texto todo, que se preocupa com o conceito de lógos, segue a fonte: 

TORRES, Milton R. A retórica joanina do Logos, Revista Caminhando v. 21, n. 2, p. 147-167 jul./dez. 2016. 

https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/Caminhando/article/viewFile/6992/5506


15.11.20

UM INDIANO NA REUNIÃO MEDIÚNICA

Rabindranath Tagore - 1909 (Fonte: Wikipédia)


Ontem estudávamos, em nossa reunião mediúnica, o capitulo 2 da terceira parte do livro “Amor e Ódio”, de Yvonne Pereira. O capítulo trata de um plano para incriminação de um personagem importante do livro. 

Na parte de comentários, alguns membros deixaram escapar sua impressão sobre a perversidade do malfeitor, causada por orgulho e egoísmo. Outro companheiro se incomodou com o mal que a influência pessoal pode causar em um processo jurídico, quando este não corre segundo as regras estritas do direito processual. Tocou-nos a impiedade do nobre, capaz de mobilizar influências e manipular pessoas para obter nada mais que uma vingança pessoal.

Passadas a leitura e os comentários, veio a parte mediúnica. Como a reunião se faz via um aplicativo, em decorrência dos cuidados com a COVID-19, não temos manifestação psicofônica, apenas psicográfica, preces em favor de terceiros e o relato das percepções mediúnicas (ou anímicas, quem vai saber?) na nossa terceira parte.

A médium “Carla” (nome fictício) relatou sua percepção. Viu um espírito de um indiano, com barbas, descreveu sua percepção com algum detalhe, que lhe dizia, apenas:

“Se o ódio pode tanto, imagine o amor!”

Ela percebia com os olhos da alma o espírito passando por um campo, com uma mão espalmada, e à medida em que passava sobre a vegetação, que chegava à altura do quadril, as flores se abriam. É uma espécie de "poesia visual" uma imagem que reforça a frase e lhe dá significado.

De fato, uma nova perspectiva da leitura vinda de um espírito superior a nós, despertando nossa atenção para outra ótica do texto.

As emoções não terminaram aí. O colega “Jacques” pesquisou no smartphone e perguntou à médium, mostrando uma fotografia:

- O espírito é esse aqui?

Com alguma dificuldade, por estar passando uma imagem digital por uma câmera de vídeo, sem nome, Carla, após analisar um pouco, disse: 

- Parece-se com ele. É sim. 

Era Rabindranath Tagore, que estava sendo estudado por Jacques no início do dia. A frase única lembra sua prosa como o espírito “Um Jardineiro”, psicografado por Dolores Bacelar e publicado pela editora Correio Fraterno.

Passada a reunião, encontrei o seguinte capítulo do livro, que passo a reproduzir:


RESUMO


- A Vida?

- É o Amor.

- E o Amor?

- Vida.


Um Jardineiro (Tagore), psicografia de Dolores Bacelar.

Livro: A Rosa Imortal

Editor: Correio Fraterno 

São Bernardo do Campo, 3ª. Edição - 1981

8.11.20

ENTREVISTADO PELA PUC MINAS

 

Questions!


Uma aluna da PUC Minas nos entrevistou sobre o espiritismo. Foram feitas diversas questões básicas. Acho que as respostas podem ser úteis aos leitores. Vou começar a publicar a partir de agora. Confiram.


01- Qual a definição de espiritismo. Pode ser considerado uma religião?


Resposta de Jáder Sampaio:

“Doutrina que trata da natureza, origem e destino dos espíritos, bem como de sua relação com o mundo corporal” (Allan Kardec em O que é o espiritismo).


Kardec concebeu o espiritismo como ciência de observação e filosofia com consequências morais. Ele entendia que as pessoas de qualquer religião poderiam ser espíritas, por se tratar de uma ciência da vida após a morte.


Como o espiritismo tivesse propostas distintas dos dogmas da Igreja Católica, não tardou que os livros espíritas fossem colocados no Index Prohibitorum, apreendidos em Barcelona e queimados em praça pública sob a ordem de um bispo. 


Kardec, então, em dezembro de 1863 publicou um artigo em que divide o tempo em que vinha trabalhando em períodos, defendendo que o espiritismo entraria em seu período religioso. Meses depois ele publica “O evangelho segundo o espiritismo”.


Meses antes de falecer, ele publica uma conferência que fez na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, no qual defende que o espiritismo era uma religião no seu sentido filosófico, como laço ou comunhão entre os homens ligados por “sentimentos, princípios e crenças” mas não era uma religião no sentido de ter hierarquias, dogmas, culto, casta sacerdotal e cerimônias.


Diversos autores espíritas retomaram essa questão. Carlos Imbassahy propõe que o espiritismo é uma religião por admitir os ensinos de Jesus e os interpretar coerentemente com a Doutrina Espírita. Emmanuel, através da mediunidade de Chico Xavier explica em seu livro “O Consolador” que o espiritismo é ciência e filosofia com fins religiosos. Essa é a visão da maioria dos espíritas brasileiros quanto ao caráter do espiritismo.


Há, no entanto, uma minoria de espíritas que defende a tese do espiritismo laico, um espiritismo que seria apenas ciência e filosofia.

29.10.20

KARDEC E O ENSINO MORAL DE BASE CRISTÃ



Principais cidades visitadas por Kardec em 1862

Com as cartas de Kardec talvez possamos ter uma noção mais próxima de algumas decisões que ele tomou quando adotou o pseudônimo e o encargo de estruturar os ensinos dos espíritos.

Depois de ler e reler durante anos a obra dele, há mais de uma década me chamou a atenção o texto publicado na Revista Espírita em dezembro de 1863 (Período de luta), no qual ele propõe uma sequência de períodos para o espiritismo, que ele se encontra no período de luta e que ele entrará no período religioso. Em abril do ano seguinte Kardec publica “O evangelho segundo o espiritismo”, sua obra mais influente e mais vendida no Brasil.

Um dos fatores para essa decisão parece-me ser o chamado “auto de fé” de Barcelona. Mais do que divulgar a doutrina na Espanha, ele tem um significado simbólico. Até a queima dos livros espíritas em praça pública, a linha de pensamento de Kardec era a de que o espiritismo não seria uma religião, que cada espírita teria a sua, e que, como o conhecimento espírita era uma ciência e uma filosofia, ele contribuiria com o avanço das religiões e sua relação com o mundo das ciências, muito debilitada na França de sua época. A partir do auto de fé ele percebe que o caminho dos espíritas não seria o da aceitação pelos núcleos religiosos então estabelecidos.

Hoje penso que há mais um fator a se considerar. As viagens espíritas que ele fez nos anos anteriores ao texto Período de luta.

O cristianismo na França do século 19 foi muito fustigado pelo iluminismo e pelas ciências, por consequência, pela literatura, mas continuava sendo uma espécie de referência moral que regia as relações sociais e influenciava as leis. A educação, tão cara a Kardec, tinha em sua tessitura uma enormidade de instituições cristãs, que não conseguiram ser substituídas pelo ensino leigo, senão no final do século 19, quando se criou o ensino público leigo.

Bem ou mal, os professores religiosos trabalhavam a moral cristã com seus alunos. Seja qual for sua orientação pedagógica, eles seriam uma “segunda linha” a mostrar às crianças e jovens uma série de valores. Na época de Kardec, as ideias do ensino leigo avançavam, e aos poucos, a ética e a moral eram condenadas ao interior das igrejas e ao seio da família.

Em 1860-1862, Kardec, que já se correspondia com espíritas de diversos lugares da França e do mundo ocidental, aceita os convites para fazer viagens de divulgação do espiritismo. Os leitores de suas obras queriam conhecê-lo e ouvir orientações para seus núcleos recém-formados. 

Se me permitem fazer uma hipótese, penso que esse contato pessoal de Kardec com os grupos, e a hostilidade das religiões cristãs (umas mais, outras menos) com o espiritismo, fez com que ele pensasse em formalizar melhor a questão da ética e da moral. Se as igrejas não acolhiam os espíritas em seu seio, através dos mecanismos de estigmatização dos livros espíritas e dos que se aproximavam de seus núcleos, seria importante que os núcleos espíritas desenvolvessem também um ensino moral, derivado da ética cristã e das reflexões feitas a partir das consequências dos atos praticados em vida após a morte, obtidos pacientemente com a análise dos relatos dos espíritos. 

Penso que o contato direto com os espíritas de toda a França, a percepção mais próxima de suas dificuldades, suas lutas, e talvez até de sua intimidade familiar influenciou o professor a entalhar um de seus mais luminosos brilhantes. Ele se deteve no ensino moral de Jesus, comentado à luz dos ensinos espíritas, e consolidou nas sociedades espíritas uma preocupação com a vida terrena, que não mais poderia ser delegada apenas à família, às igrejas e às escolas. Depois disso, os espíritas se preocupariam muito mais com a caridade e com a fraternidade, pensariam em instituições para acolher as pessoas vulneráveis e em outras ações sociais para o socorro do que hoje chamamos pessoas em situação de vulnerabilidade. O espiritismo refletiria ainda mais detidamente as relações entre as pessoas encarnadas, os deveres de família e muitos outros temas ligados à vida cotidiana. O espiritismo deixa de privilegiar a elaboração intelectual e científica dos fenômenos e dos ensinos espirituais, e dá atenção destacada ao convite de Cárita, que passeava pelas periferias de Paris e convocava as pessoas ao trabalho voluntário contra a fome, o frio e a ignorância.

Em fevereiro de 1862, Kardec comunica (Revista Espírita) que havia feito uma subscrição em favor dos operários de Lyon que passavam por alguma "aflição". Enviou 500 francos e publicou uma mensagem do espírito Cárita de agradecimento aos espíritas franceses que apoiaram a iniciativa.

É apenas, como diria o escriba, uma “hipótese de trabalho”. Quem sabe a correspondência nova que está sendo trazida à luz nos traga mais elementos para refletir sobre ela?


22.10.20

CINCO ESPÍRITOS ESCREVEM POR DOIS MÉDIUNS: CHICO XAVIER E DIVALDO FRANCO




Tem uns livros que compramos e lemos imediatamente, sem perder o fôlego. Há outros que nos chamam a atenção ao ponto de adquirirmos, mas que vão ficando na estante da biblioteca por muito e muito tempo, até que um dia surge a motivação inesperada para ler.

Tal é o caso do interessante “E o amor continua”, organizado por Nilson de Souza Pereira, amigo de Divaldo Franco, mas composto de mensagens psicografadas por Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco, além de depoimentos das famílias e identificação de algumas das informações objetivas fornecidas pelos espíritos desencarnados, como nomes de parentes citados, eventos, datas, informações sobre a desencarnação, etc.

O livro tem outras curiosidades. Ele documenta a visita de Divaldo Franco ao Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, em 15 de maio de 1982 (quando fez palestra, enquanto Chico Xavier psicografava e psicografou uma das mensagens do livro) e comentando o evangelho no culto de assistência aos necessitados (em 29/07/1981), na mesma instituição. Ele documenta que Chico acolheu e trabalhou conjuntamente com Divaldo Franco já nos anos 1980, em Uberaba-MG.

Outra coisa que me chamou a atenção no livro, foi o que fizemos no último Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo: uma coletânea que nos mostra o mesmo espírito se comunicando por dois médiuns diferentes, no caso, dirigindo-se à família. As mensagens, sempre acompanhadas dos comentários e informações das famílias, que às vezes explicam não conhecer Divaldo, fornecem redações de seus afetos comunicantes ainda encarnados, tornam o livro ainda mais rico, embora contenha apenas as comunicações de cinco espíritos; seis, se compararmos também as mensagens de capa ditadas por Bezerra de Menezes aos dois médiuns, que foi publicada com forma de letra escrita à mão.

Chamou-me a atenção o “sotaque mediúnico” dos dois médiuns. Falta-me o conhecimento que seria próprio da área de letras para explicar, mas há algo no texto dos diferentes espíritos psicografado pelo Chico que me faz, como leitor, dizer: há a mão de Chico Xavier por detrás dos ditados, e o mesmo acontece com Divaldo Franco. A linguagem dos médiuns, por mais que façam um esforço de anulação da sua personalidade para serem mais fiéis ao ditado dos espíritos, trazem algumas de suas características. Talvez, se embaralhássemos as mensagens e as entregássemos a um leitor que conhece bem os estilos dos dois médiuns, ele fosse capaz de identificar, pelas singularidades de cada um, quem foi o escritor do ditado do além. 

Independente das singularidades ou idiossincrasias mediúnicas, as famílias reconhecem seus afetos que se foram, identificam os nomes de outros familiares (ou, às vezes, são surpreendidos com familiares já esquecidos aqui, mas ainda atenciosos no mundo espiritual com seus parentes).

O título parece sugerir um duplo significado: fala da continuidade do amor das pessoas que desencarnaram por seus afetos que continuam jornadeando no mundo, mas também sugere o amor entre Chico Xavier e Divaldo Franco, apesar das turbulências do passado, coisa muito comum na trajetória dos relacionamentos humanos.

Não sei se o livro teve uma segunda edição (na verdade, ao pesquisar a capa, encontrei-o disponível como e-book), nem se está esgotado ou se é de fácil acesso aos que se interessarem por ele, mas se tiverem acesso a ele, não percam a oportunidade de conferi-lo por si mesmos.