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30.6.12

O ESPIRITISMO EM BELO HORIZONTE: MOVIMENTO OU MOVIMENTAÇÃO?


Foto: Vista Aérea de Belo Horizonte - MG

Lendo sobre a história da FEB e o papel de Bezerra de Menezes no movimento espírita, que foi muito descaracterizada sob a imagem mítica do filantropo (que não tenho dúvida que ele foi) e do apaziguador, fiquei a meditar sobre um ponto sobre o qual ele fundou sua ação no movimento: a organização da divulgação do Espiritismo. Dispersas, as poucas sociedades formais disputavam entre si por pontos menores, entrando em conflito interno por assuntos até relevantes, mas deixando que as diferenças entre si transformassem em um obstáculo para uma tarefa claramente superior: levar à sociedade brasileira uma visão mais clara do espiritismo, que vinha sendo atacado por segmentos organizados, como os médicos, os católicos e algumas elites conservadoras, através de legislações e ações de governo. Os conflitos também impediam algo fundamental: a ação coordenada e conjunta das instituições espíritas.

Quando reflito sobre o movimento belorizontino de hoje, continuo surpreso com a conformação que ele tomou com o passar dos anos. A política geral dos órgãos federativos no Brasil sempre preservou a necessária autonomia das sociedades espíritas. Houve tempos de orientações mais diretivas, mas desconheço qualquer ação no sentido da fiscalização das atividades realizadas intramuros de cada casa, tão fantasiosamente temidas pelos desinformados. Apesar disso, são poucas as ações organizadas no sentido de aproximarem-se as associações, apesar da quantidade imensa de eventos, ações de captação de recursos para as obras, iniciativas ligadas à arte, palestras, seminários e outros.

Parece que as iniciativas dos grupos concorrem com as iniciativas do movimento espírita. Batem cabeça. Fazem mais do mesmo, sem qualquer diferença. E a falta de uma limitação clara do público-alvo, assim como de compromissos entre lideranças, concorre para esta transformação do movimento em movimentação. As iniciativas são, geralmente, individuais, projetos de pessoas e não projetos coletivos. Há sempre uma liderança com um sonho pessoal, e escasseiam lideranças e trabalhadores para iniciativas articuladas das casas espíritas, o verdadeiro papel dos órgãos federativos e das casas de grande porte.

Penso que a iniciativa mais próxima desta integração das casas, não através de códigos de funcionamento, mas através de atividades conjuntas organizadas, com objetivos traçados com base nas necessidades e interesses comuns, na capital mineira é a realização das Confraternizações de Mocidades Espíritas de Belo Horizonte - COMEBHs, cuja separação setorial comprometeu a capacidade de aproximar trabalhadores jovens, futuras lideranças de sociedades espíritas diferenciadas. Vejo também um esforço organizado no movimento de evangelização infantil, mas os eventos são mais de formação que de aperfeiçoamento e reflexão. Espero não estar sendo injusto com outras iniciativas.

Um sintoma da fragilidade federativa é a falta de órgãos de comunicações que atinjam ao movimento. Pergunte aos frequentadores, trabalhadores e dirigentes de sua casa: qual é a revista, ou mídia eletrônica voltada à divulgação do que acontece em BH que eles lêem? Mesmo os mais estudiosos parecem focalizar seus interesses em livros de conteúdo doutrinário (ou nem tanto), mas desconhecem as iniciativas coletivas (será que existem ou são apenas uma teimosia de pequenos grupos organizados nos órgãos que tentam atender e organizar as necessidades das associações como um todo?)

Esta multiplicidade de eventos abertos a todos, mas não voltados a ninguém, fez desaparecer pequenos gestos que encontramos ainda nos grupos do interior mineiro: o envio de representantes das casas espíritas em encontros de sociedades espíritas, a realização de atividades conjuntas para o fortalecimento das casas locais, o envio de correspondências formais das lideranças justificando ausências, ou seja, estas pequenas considerações e o diálogo que faz o todo ser mais que a justaposição das partes. Estas pequenas gentilezas, em meu tempo, eram uma espécie de obrigação, que parece ter ficado fora de moda com o tempo.

Outro fenômeno que incomoda muito é a banalização da figura do expositor. Talvez seja um efeito indesejado do planejamento tipo “rolo compressor” dos estudos nas associações. Perguntemos aos associados: quem gostaríamos de assistir nas casas espíritas, porque trarão contribuições originais, incentivarão as atividades, nos trarão conhecimentos úteis e relevantes? Quem nos faria sair da rotina semanal da reunião, passe, tarefa, que incentivaria o encontro dos trabalhadores de grupos diferentes, que nos faria sair motivados e reflexivos da casa espírita? Quem é um estudioso com domínio diferenciado de um determinado tema ou atividade? Isto parece estar desaparecendo. Lembro dos tempos de juventude, quando receber Divaldo Franco, Raul Teixeira, Honório Abreu, Jorge Andréa dos Santos, era um desejo e uma alegria. Lembro de ter viajado para o interior em busca dos estudos de Deolindo Amorim, que após muitos anos pôde vir a Minas Gerais. Recordo-me das propostas instigantes de revisão da assistência social apresentadas pelo Dr. Mário Barbosa. Eram nomes de primeira linha que não apenas ouvíamos, mas líamos com avidez e interesse.

Esta autonomia individualista e a falta de cuidado com os órgãos federativos e representativos do movimento geram eleições esvaziadas, grupos de trabalho sem respaldo, e, o pior, a falta de significado real do esforço de construção coletiva do espiritismo na mente dos frequentadores. Ouvi de uma liderança importante da casa que frequento que os órgãos federativos são “sopas de letrinhas”. E não posso ficar irritado com tamanha franqueza, tenho que refletir como foi que a casa que frequento e os órgãos que a representam deixaram de ser membros de um trabalho conjunto para se transformar no “lugar da missa”, um espaço geográfico que acostumamos a frequentar semanalmente, tomar o passe, ouvir uma palestra ou participar de uma reunião mediúnica, fazer uma tarefa assistencial e voltar para casa.

27.6.12

PUBLICADO UM NOVO LIVRO SOBRE A VIDA DE ANNA PRADO

Foto: Capa do Livro

Há muitos anos temos contato com o Samuel Magalhães, autor dedicado à recuperação da memória espírita, participante da Liga de Pesquisadores do Espiritismo. 

A FEB agora lança o livro "Anna Prado: a mulher que falava com os mortos", de sua autoria. São oito anos de pesquisas, dedicadas à memória do amigo comum, Eduardo Carvalho Monteiro.

Como estou recebendo a boa notícia de antemão, ainda não li o livro, mas pelos livros que já li do autor, alguns deles já resenhados no Espiritismo Comentado, não espero pouco da obra. Convido os interessados na história do espiritismo e nos fenômenos de efeitos físicos a ler e comentar.


26.6.12

OS NOVOS AUTORES ESPÍRITAS: UMA ENQUETE

Foto: Sala de leitura do congresso norte-americano


Muito já se escreveu e falou sobre novos autores de livros espíritas. Cada vez mais se consegue imprimir livros com qualidade e lançá-los no mercado de leitores espíritas e espiritualistas. Este aluvião de novas obras modifica a cultura do movimento espírita com relação ao estudo e escolha de livros.

Ainda temos uma preocupação com o estudo de Allan Kardec, talvez com menos ênfase que o movimento de décadas atrás. Livros com linguagem mais contemporânea e com estilos narrativos ou com artifícios de livros-texto estão disponíveis, e muitas vezes a leitura fácil atrai as pessoas, mesmo que não estejam ainda bem seguras quanto à estrutura das ideias espíritas. 

Este estado de coisas faculta a criação de um caldo de ideias soltas e de sincretismos entre as teorias e teses espíritas e as propostas do movimento new age, dos espiritualismos, dos misticismos e outros.

Pergunta-se aqui, entretanto, qual é a posição interna de cada um de nós ante os novos livros. Como nos sentimos quando encontramos um livro novo de autores desconhecidos nas prateleiras da livraria espírita? Montei uma enquete para avaliarmos como o leitor do Espiritismo Comentado reage aos novos títulos. Está na coluna à direita do blog e expira daqui a alguns dias. Vamos participar? 

14.6.12

NOTÍCIAS DE RAUL TEIXEIRA

Fonte: Site da AME-Lavras, retirado do site da SEF de Maio de 2012


Muitos leitores têm pedido notícias da recuperação de Raul Teixeira. Como não encontrei mais comunicados oficiais no site da Sociedade Espírita Fraternidade (casa espírita onde Raul mantém suas atividades), encontramos o site da Associação Municipal Espírita de Lavras-MG, que tem notícias mais recentes. Basta entrar no link http://amelavras.webnode.com.br/news/j-raul-teixeira-tem-quadro-estavel-apos-sofrer-um-avc/

12.6.12

A ENFERMEIRA DOS ESPÍRITOS



Dona Odete

Extremo Sul da Bahia, década de 90. Convidado a fazer uma palestra em no Centro Espírita Semente de Luz, em Mucuri, fiquei conhecendo Dona Odete.

Ela havia sido fundadora desta sociedade espírita, mas tinha uma longa trajetória anterior na participação em casas espíritas. Sua experiência mais interessante foi com uma médium de efeitos físicos que durante anos trabalhou em reuniões de materialização e tratamento em Teófilo Otoni, Minas Gerais, chamada de Sinhá, segundo sua filha Vera.

Os doentes participavam da reunião. Dona Odete assumia a frente dos trabalhos como se fosse uma enfermeira. Organizava, preparava o material que seria utilizado, agendava os presentes, entre outros cuidados. Um de seus cuidados mais especiais era com os vidrinhos de vacina que esterilizava, rotulava, enchia com água e colocava à vista dos membros da reunião. Ao longo da sessão, sob a ação espiritual, a água dos vidrinhos mudava sua constituição: uma nova cor, um novo odor e um sabor diferente. Cada vidrinho, destinado ao tratamento de uma pessoa diferente, podia apresentar uma coloração diferente dos demais. Um detalhe: eles estavam fechados e lacrados.

Outra peculiaridade da reunião: os espíritos materializavam-se na penumbra e conversavam com os presentes. Dona Odete guardou consigo uma fita K7 na qual registrou de forma amadora as vozes dos seres que surgiam e se manifestavam. É, talvez, além da memória dos que participaram, o único registro que fizeram e que resistiu ao tempo.
Comentários, orientações, explicações, um humor leve, tudo isto se encontra nos muitos minutos de gravação. José Grosso e Palminha são alguns dos espíritos materializados que falaram ao público (e tiveram suas vozes registradas pelo gravador).

Ao terminarem-se as sessões, estavam escritas as prescrições e orientações de uso do conteúdo dos vidrinhos. Como não havia curiosidade científica, não tenho notícia de qualquer envio para análise das substâncias modificadas ao longo das sessões. Uma pena!

Odete informou-me que uma vez Chico Xavier foi assistir aos trabalhos. Ele advertiu aos organizadores que aquele tipo de mediunidade tornar-se-ia cada vez mais raro. De fato, hoje se contam nos dedos os grupos que trabalham com efeitos físicos, e são mais raros ainda aqueles que obtém fenômenos expressivos, com participação de ectoplasma tangível e visível. Será que na presente encarnação ainda assistirei um renascimento deste tipo de fenômeno para fins de estudos controlados? Espero que sim.

9.6.12

MEMÓRIAS DO LANÇAMENTO DO "CASOS E DESCASOS"

Participantes do lançamento do livro que se dispuseram a registrar o momento.

Sábado, 02 de junho. As reuniões de sábado  da casa de Célia Xavier uniram-se para confraternizar-se e lançar o livro "Casos e descasos na casa espírita", ditado por um espírito que identificamos apenas como Conselheiro.

Cinco ou seis reuniões foram criadas em agosto/setembro de 1986, oriundas de um grupo de mocidade que era composto de pessoas dos 18 aos 80. Com o tempo, alguns dos grupos se fundiram e hoje funcionam apenas três. Vinte e cinco anos, quase vinte e seis de atividades mediúnicas continuadas!

Muitas pessoas perguntaram: será apenas uma noite de autógrafos, regada a refrigerante? Claro que não! Era uma oportunidade ímpar de revermos juntos esta trajetória.

Durante a semana abrimos os álbuns de fotografias e conseguimos imagens da trajetória dos grupos. Cabelos fartos, penteados da moda, outros padrões de roupas, rostos lisos e sorridentes, colegas que já não mais participam conosco e membros que "mudaram de lado" na reunião e hoje são percebidos apenas pelos médiuns, tudo isso passou por nossos olhos em apenas 15 minutos de projeção de fotos e eventos que vivemos juntos.

Membros do grupo de sábado, no qual foram feitas as psicografias que compõem o "casos e descasos"

O poder da imagem é tão grande, que convidamos todos os presentes a registrarem esta hora tão especial, e logo, logo os três grupos se predispuseram a tirar fotos para marcar o encontro e, quem sabe, poder recordar no futuro que estivemos juntos comemorando uma realização coletiva.


Amigos-irmãos da casa, como o nosso eterno diretor Humberto Cerqueira, filho do histórico movimento espírita de Três Rios - MG.

Enquanto confraternizavam, o médium autografava os livros, o que é um momento igualmente de emoção. Encontram-se amigos que há muito não víamos, companheiros de jornada, membros da parentela espiritual, pessoas que vimos chegar jovens na casa espírita e hoje fazem parte da comunidade espírita local.


Autografando...

Foi como uma ventania! Após uma profusão de encontros e emoções, as pessoas se vão e ficam as memórias, nosso mais rico patrimônio.

8.6.12

O CONFLITO DOS PESQUISADORES RUSSOS

Mendeleev
Fonte: Blog engenharia química na rede

Aos poucos, a história do espiritismo e do espiritualismo vai saindo de baixo do tapete e tornando-se conhecida no mundo, aceita como relevante para diversas disciplinas acadêmicas.

Encontrei no Periódicos Capes o interessante artigo de Richard Rice, intitulado "Mendeleev's public oposition to spiritualism" (A oposição pública de Mendeleev ao espiritualismo), publicado na revista acadêmica Ambix, em julho de 1998.

Nele o autor mostra o interesse e simpatia pública pelo espiritualismo por Alexander Aksakof e A. M. Butlerov.

Alexander Butlerov
Fonte: European Association for Chemical and Molecular Sciences


Butlerov promoveu conferências e sessões públicas com Daniel Dunglas Home (1871), que atraíram cientistas famosos em seu país, como o matemático P. L. Chebschev. As sessões não foram bem sucedidas, o que deixou um clima de desconfiança em meio a muitos cientistas russos, e Home retornou à Inglaterra. Rice mostrou que o clima na Rússia era de desconfiança e rídículo contra Home e com relação à mediunidade, vista como diversão apenas. Não se sabia que ela era estudada seriamente por cientistas, o que causou surpresa.

Rice mostra que os estudos de Butlerov com o médium francês Camille Brédif fizeram com que a cortina de gelo e ceticismo se quebrasse e outro cientista russo famoso se afirmasse espiritualista: o zoólogo N. P. Vagner. As publicações em jornal em 1875 incomodaram a Mendeleev, que propôs a formação de uma comissão pela Physical Society para investigar fenômenos espiritualistas.

A comissão investigou dois médiuns ingleses, os irmãos Petty, de 17 e 14 anos, trazidos à Rússia por Aksakov. Em condições controladas, os supostos médiuns não apresentaram fenômenos e foram considerados fraudes.

Rice mostra os excertos dos debates públicos na imprensa entre Vagner e Mendeleev. O primeiro acusa a comissão de falta de imparcialidade e o último afirmou que não viu nada do que é ensinado pelos espiritualistas.

Um incidente com a comissão levou ao afastamento dos membros espiritualistas. Eles fizeram sessões com o médium Clayer, já estudado por Crookes na Inglaterra e eles desenvolveram mesas especiais (não se explica no artigo como foram construídas). Clay conseguiu movimentos com as mesas convencionais, mas não com as experimentais, e a comissão havia decidido que só as mesas especiais seriam utilizadas para fins de pesquisa, o que causou a indignação de Butlerov, Vagner e Aksakov e seu afastamento da comissão.

Mendeleev começou um mês depois a fazer conferências nas quais narrava os trabalhos da comissão e dava explicações com base em teorias naturalistas para os fenômenos alegados pelos pesquisadores espiritualistas. Para ele, o estudo espiritualista era uma superstição.

Rice mostra que a ciência russa desejava ser aceita internacionalmente e os céticos russos viam sua posição anti-espiritualista como uma vitória contra o misticismo em seu meio. Dostoievsky não acolheu bem a posição de Mendeleev, e questionava: "Talvez o comitê, neste caso, estivesse influenciado por alguma opinião alemão ou francesa, mas, se tal ocorreu, onde está sua própria experiência?"

Rice encontrou também o que ele considera como uma atitude preconceituosa, ou pré-concebida de Mendeleev em seus diários. "É necessário um professor para falar contra a autoridade de um outro professor." Ele escreveu. Ele se considera vitorioso em "varrer o espiritualismo da Rússia".

O texto de Rice, que tento resumir, é extremamente rico e detalhado, o autor mostra as posições opostas dos pesquisadores espiritualistas e céticos e merece ser melhor lido e conhecido por quem se interessa pela história do espiritualismo e do espiritismo.

Este trabalho lança mais elementos para os adeptos da tese da Conspiração do Silêncio, ou seja, os fenômenos espirituais foram estudados e discutidos amplamente pela inteligentsia européia e norte-americana no século XIX. Por que se conhece tão pouco sobre isso, nos dias de hoje?