Estava falando de aborto em um
grupo espírita de Belo Horizonte, quando apresentei um resultado de pesquisa de
revisão que mostrava a existência de uma síndrome pós-abortiva, na qual os
distúrbios psicológicos com mulheres aumentavam de 9 a 59% após o aborto, de
acordo com diversos estudos. Esta síndrome independia da crença no aborto como
algo ético ou não.
Foi levantada uma questão de
interpretação do fenômeno: a síndrome pós-abortiva não seria o mesmo que a
depressão pós-parto, e não poderia ser explicada a partir de categorias apenas
psicanalíticas? Ficamos em uma situação de impasse, porque eu não tinha informações
suficientes sobre o estado da arte para apresentar de pronto, sobre a distinção
entre depressão pós parto e síndrome pós-abortiva, embora a lógica me levasse a
crer que os pesquisadores e revisores não teriam deixado “passar batido” uma
questão como esta.
Há alguns dias, recebi um
trabalho de Priscilla Coleman, do Dr. Roberto Lúcio, intitulado “Aborto e saúde
mental: síntese quantitativa e análise das pesquisas publicadas entre 1995 e
2009”, publicado no British Journal of Psychiatry em 2011. (DOI: 10.1192/bjp.bp.110.077230)
É também um artigo de revisão
(metanálise) no qual ela procura medir associação entre aborto e indicadores
adversos de saúde mental, e mostrar a comparação com outros subgrupos, dentro
dos quais, mulheres que levaram a gravidez a termo.
As mulheres que passaram pela
experiência de aborto aumentaram o risco de ter problemas mentais em 81% e
quase 10% podem ser atribuídas ao aborto (ou seja, os resultados são superiores
aos de gravidez a termo, e quando se referem ao uso de substâncias e
comportamento suicida).
A tabela que sintetiza os
resultados utiliza um indicador epidemiológico denominado PAR. Ela pode ser
interpretada da seguinte forma: o quanto haveria redução do transtorno mental
da população feminina estudada se não houvesse praticado aborto?
Resultados
|
PAR (%)
|
Ansiedade
|
8,1
|
Depressão
|
8,5
|
Uso de álcool
|
10,7
|
Uso de maconha
|
26,5
|
Todos os comportamentos suicidas
|
20,9
|
Suicídio
|
34,9
|
Todos
|
9,9
|
Tabela 1: Percentuais do risco atribuível à população (PAR) baseados
nas medidas de resultados.
Interpretando o dado do suicídio,
a tabela informa que as mulheres cometeriam 34,9% menos suicídios se não realizassem
aborto. O mesmo serve para
ansiedade, depressão, uso de álcool e maconha, além dos demais comportamentos
suicidas (como a ideação suicida, por exemplo).
Um dos resultados de comparação
das mulheres que realizaram aborto com as que levaram a gravidez a termo, é o
seguinte:
“A descoberta que o aborto é
associado com riscos significativamente maiores de problemas de saúde mental,
comparados com levar a gravidez a termo, é consistente com a literatura,
demonstrando os efeitos protetores da gravidez a termo com relação a certas
respostas de saúde mental.” (p. 183-184)
Há
alguns resultados muito interessantes, como a referência ao estudo de Gissler e
outros que mostra que a razão das chances de suicídios de mulheres que abortaram
é 5,9, ou seja, muito maior que a da população que levou a gravidez a termo.
Considerando
as informações obtidas neste estudo, há diferenças significativas na saúde
mental de quem aborta e de quem leva a gravidez a termo. Neste caso, uma explicação psicanalítica precisaria ser capaz de explicar esta diferença entre sintomas de depressão pós-parto e síndrome pós-abortiva.
ATENÇÃO - O texto do British Journal of Psychiatry foi fortemente criticado e autores e editor reconheceram alguns erros com a composição da amostra. Em breve publico a retificação que fizeram. Agradeço ao Christiann Lavarini a disponibilização da informação.
ATENÇÃO - O texto do British Journal of Psychiatry foi fortemente criticado e autores e editor reconheceram alguns erros com a composição da amostra. Em breve publico a retificação que fizeram. Agradeço ao Christiann Lavarini a disponibilização da informação.
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