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30.11.13

AS RELIGIÕES SÃO APENAS MITOS?


Assisti ontem ao belíssimo filme "As Aventuras de Pi". Dei a sorte de fazê-lo como se estivesse no cinema, do início ao fim, com pouquíssimas interrupções. Como o suspense da trama é fundamental, a maioria dos comentaristas que li não falam sobre o filme e destacaram algumas características que são realmente notáveis, como a beleza das imagens criadas por Ang Lee e a profundidade dos personagens.

É um filme que pretende conversar sobre Deus, deuses e a religião, entre outras coisas. Ele sugere que o mito religioso (e não sei dizer até quando, a experiência religiosa) torna mais tolerável a vivência do homem na Terra. Ele fala do encantamento, da possibilidade deste mito provocar as forças mais profundas do ser humano, da sua utilidade em situações-limite, do seu poder de preservação da vida.

Deus como ser ou criador, fica em um segundo plano, quase como um item de cardápio a ser escolhido, a gosto do freguês. Tanto faz pedir um "deus Big Mac" ou um "deus croissant", ou mesmo um "deus espetinho de escorpião", todos satisfariam igualmente a fome humana do sentido da vida.

Não importa, também, a verdade, ou a busca dela. Se o sujeito está satisfeito com o mito, se ele tem um papel útil na vida, está valendo...

Quando analiso o filme como espírita, sinto um estranhamento e algum conforto. O estranhamento vem da tradição racional e empírica do espiritismo, que fica desprezada pelo autor da bela história. É como se ele desconfiasse da razão e do empirismo como caminhos para tornar a vida mais tolerável, diante da sua crueza e ferocidade. 

O conforto vem da possibilidade de se ouvir uma voz no mundo contemporâneo que contempla a religião como experiência humana e que advoga o respeito entre as muitas religiões. Menos preconceito, menos conflito em função de convicções de fé, mais respeito entre as pessoas.

21.11.13

"TIO NILSON" DA MANSÃO DO CAMINHO DESENCARNA - SALVADOR-BA



Recebemos a notícia da desencarnação de Nilson de Souza Pereira, um dos responsáveis pela imensa obra da Mansão do Caminho, que apresentamos há algumas semanas no EC. Transcrevemos abaixo a comunicação dada no site da Mansão:


"Divaldo Franco e a família da Mansão do Caminho, cumpre o dever de informar a todos os amigos que desencarnou hoje dia 21/11/2013 as 04:30h, nosso querido Tio Nilson, uma destacada e honorífica personalidade no cenário baiano, na área de Assistência Social e solidariedade humana. 

Uma vida dedicada ao Bem, que desenvolveu profícuo trabalho em prol da Mansão do Caminho ao longo de 67 anos de sacrifícios, persistência e sobretudo muito amor e respeito ao ser humano, como, aliás, advoga a Doutrina Espírita nos seus postulados iluminativos e consoladores, que ele soube honrar através do seu generoso coração e profundo amor pela Causa. 

Deixa-nos preciosa exemplificação de nobreza, de coragem, de magnanimidade e ações concretas no trabalho dinâmico a favor do semelhante, construindo, para que outros possam também trilhar os caminhos da retidão, da justiça e do amor. Um lídimo cristão e Homem de Bem. Até breve "Tio Nilson".

Enviamos-lhe, os que lhe amamos, nossa ternura e gratidão, rogando a Jesus o embale nas ondas da Sua paz.
Agradece as orações de todos os que compartilharam da vida exemplar do querido irmão, ao tempo em informa que o sepultamento dar-se-á às 16h30m no Cemitério Parque Bosque da Paz sito à Av. Aliomar Baleeiro bairro Nova Brasília (Estrada Velha do Aeroporto) "

20.11.13

SANDY E FAGUNDES EM FILME SOBRE ESPÍRITOS - JANEIRO 2014



Ainda não tenho outras informações, mas já está sendo divulgado um filme para a telona com a temática dos espíritos. Pareceu-me com Os Outros, mas a trama ainda está muito escondida neste teaser. Confiram.

19.11.13

CHICO SOB A ÓTICA DOS INTELECTUAIS DOS ANOS 30-40


Humberto de Campos com a farda da ABL

Com a desencarnação de Chico Xavier abriu-se um novo ciclo de exposição à mídia, e nos últimos anos muitos pesquisadores das universidades oriundos de diversos campos de conhecimento têm publicado sobre ele. 

Este "revival" vem acompanhado de velhas questões, algumas sobre a natureza de suas faculdades. Mesmo tendo sido discutidas no passado, a perda de contato com os debates antigos faz com que novos estudiosos voltem a fazer mais do mesmo, acreditando-se inéditos.

Alexandre Caroli Rocha, Doutor em Literatura Brasileira pela Universidade de Campinas, defendeu dissertação de mestrado e tese de doutorado analisando o Parnaso e a produção de Humberto de Campos antes e depois da morte. 

Ele acaba de publicar um artigo pela revista Ipotesi, da Universidade Federal de Juiz de Fora, intitulado "Complicações de uma estranha autoria (o que se comentou sobre textos que Chico Xavier atribuiu a Humberto de Campos". 

A revista é qualificada pela CAPES, como Qualis A1-Nacional, ou seja, é uma revista que se encontra no topo das categorias para o Brasil. 

O Dr. Alexandre apresenta em seu trabalho as mais diferentes opiniões de experts em literatura e outros intelectuais nos anos 30 e 40, quando o Chico ainda era um médium desconhecido para o grande público.

Caroli identificou dois níveis de análise da produção do médium mineiro. O nível 1 envolveria o próprio texto psicografado (se é semelhante ou diferente aos textos produzidos pelo "morto" em vida, por exemplo) e o nível 2 seriam considerações sobre "a gênese da criação literária de Chico Xavier" (se os textos seriam ditados pelo diabo, ou seriam fruto do inconsciente, por exemplo). Não vou tratar da análise de Alexandre Caroli, já que o leitor pode ele próprio ler e formar opinião ao acessar o texto completo no link: http://www.ufjf.br/revistaipotesi/files/2011/05/CAP02-25-36.pdf

Uma questão que incomoda a um psicólogo que estudou minimamente a psicanálise durante sua graduação, diz respeito ao uso inadequado do conceito de inconsciente como alternativa para explicar o fenômeno mediúnico. Esta discussão fica para outra publicação, por sua complexidade. Para que o leitor não fique no ar, este inconsciente como uma espécie de baú onde se acham guardadas informações esquecidas ou herdadas que são acessadas pelas pessoas, não é freudiano, nem junguiano.

Uma questão que é suscitada na leitura do trabalho que não deve passar despercebida é como os pastichadores precisam preparar-se para produzir suas imitações de estilo e conteúdo, e como é difícil a produção de conteúdo diverso e coerente, sem estudo profundo. Ao analisar-se o fenômeno Chico Xavier, o pastiche só se sustenta ante uma espécie de teoria da conspiração, aos moldes do que pesquisava Hodgson, quando colocava detetives atrás das médiuns que estudava, para saber se elas pesquisavam os assuntos sobre os quais produziriam.

Uma análise do conteúdo da obra do Chico assusta, porque ele faz metáforas com conceitos de física (Mecanismos da mediunidade), de biologia (Evolução em dois mundos), ele analisa casos psiquiátricos (No mundo maior), ele apresenta poetas de diferentes escolas e estilos (Parnaso de além túmulo), ele discute questões de diferentes áreas do conhecimento (O consolador), ele faz descrições meticulosas de fisiologia humana (Missionários da Luz) ele analisa o evangelho ("Caminho, verdade e vida" e outros livros). Chico não é um médium que apenas produziu conselhos morais e escreveu textos esparsos, como quis dizer um velho professor de psicopatologia que tive, mestre da oitiva e do esguelho, em matéria de espiritismo.

Acho que passeei. Leiam o trabalho do Dr. Alexandre e comentem!

17.11.13

EÇA, POR FERNANDO


Ilustração alusiva à proclamação da república portuguesa


Fernando de Lacerda é um médium português do início do século XIX que morou no Brasil e publicou seu trabalho pela Federação Espírita Brasileira. Sempre admirei a manutenção dos seus quatro livros “Do País da Luz”, nos catálogos desta editora. Escrevi há alguns anos sobre ele no Espiritismo Comentado http://espiritismocomentado.blogspot.com.br/2010/12/as-artes-mediunicas-de-fernando.html

Mais recentemente li um texto de Vianna de Carvalho, através da mediunidade de Divaldo Franco, que fala de como ele foi vítima de ironia e escárnio em sua época, mantendo-se firme. Retomei sua leitura e encontrei um trabalho de Eça de Queiroz que trata de um tema muito atual, recorrente, no movimento espírita: o ceticismo radical.

Silva Pinto escreveu introdução para o livro em 1911, um ano após a implantação da república portuguesa, de influência positivista.

Com o positivismo, veio a tendência de se identificar o pensamento cristão com a monarquia, e, ao mesmo tempo, uma crítica de princípios e valores que acompanha a crítica do regime político, além, é claro, da crítica contundente da crença em Deus. Eça, sem se alinhar à proposta política da monarquia, defende no texto psicografado por Fernando de Lacerda os valores cristãos e a crença em Deus, opondo-se ao espírito de época.

O estilo chama a atenção, pela ironia profunda e inteligente, pela construção do texto que desafia o leitor a pensar. Vou transcrever algumas passagens.

Sobre o ateísmo da política portuguesa da época:

“A ilustre pseudo sociedade pensante desta linda terra de mentecaptos proclamou sua emancipação.

Deus passou à história

Nem serve para se mostrar empalhado, em qualquer museu de raridades, porque tendo-se ausentado, há séculos para parte incerta, não cumpriu ainda o gracioso dever de cortesia de vir apreciar as generosas conquistas do mundo moderno.

Sobre a valorização do livre-pensar:

Eu sinto – e nós todos, certamente o sentimos por igual – que para sermos agradáveis à linda cocote, toucada de vermelho, que se divorciou para se casar em seguida com o cidadão Livre Pensamento, não saibamos perpetrar a delicada e encantadora hipocrisia de a felicitarmos, fingindo que também nos libertamos da tirania de Deus (já que ainda temos a imperdoável fraqueza de ainda lhe estarmos sujeitos); mas,  tristemente, desconsoladoramente o digo: - não o sabemos fazer.
...

Sobre a acolhida das mensagens pela intelectualidade portuguesa:

 Tu é que devias procurar libertar-te de nós, porque te somos companhia prejudicial. (Aqui, Eça fala ao médim)

Já te fizemos passar por maluco, por ignorante, por mistificador, por asno, por detestável escrevinhador de prosas bárbaras e de versos insulsos; e agora te arriscas a apanhar alguma sova de respeito, ou a seres tido e havido por agitador religioso, se continuas a deixar perceber a esse mundo emancipado e sábio que associas com companhias tão pouco recomendáveis , como são as dos mortos, e, de mais a mais , de mortos ignorantes, mortos que não se pejam de falar em Deus, nem de virem aconselhar a humildade, a caridade e a resignação, quando a moda obriga a renegar Deus, a praticar o Orgulho, proclamar a Fraternidade e aconselhar a Rebeldia. “

Sobre a Rebeldia como valor:

Que esplêndida coisa é a Rebeldia!

Pena é que ela seja, às vezes, como esses jogos de facas pontiagudas com que inábeis jongleurs exploram a basbaquice popular: - que se sucede cravarem-se no explorador, também arriscam o explorado a ser espetado por elas...

Desviei-me do meu fim.

Perdi-me na parlenga, e ia por si em fora, modulando ditirambos às modernas virtudes que enfloram o tálamo nupcial da Sociedade livre pensante portuguesa – anônima criatura, filha incestuosa da Ignorância e do Atrevimento, com o ilustre cidadão Livre Pensamento, filho adulterino da Vaidade e do Amor-Próprio; e esqueci-me que não foi para isso que vim.”


(Extraído de “Do País da Luz, cap. I, pág. 17-26)

14.11.13

O OBSERVADOR EM MONTES CLAROS






Quando cheguei em Montes Claros, Tom me acolheu satisfeito. Não podia chover, nem fazer calor, por causa do acabamento do pequeno salão do Paulo de Tarso. A chuva fica competindo com a voz do expositor, e o calor fica convidando as pessoas para sair.

Eram três tarefas, um simpósio sobre passes pela manhã, uma palestra sobre o atendimento aos espíritos desencarnados à noite e o autógrafo dos livros que os participantes adquirissem, da livraria da associação.

Cheio de amigos no meio do público, as duas primeiras tarefas foram fáceis e prazerosas. 




A última tarefa foi sendo cumprida aos poucos, antes e depois das exposições, para interessados de todas as idades...


e gêneros..


Os livros da LIHPE, especialmente "O Espiritismo na Atualidade", esgotaram-se. Ainda sobraram uns poucos Voluntários (que já se esgotaram na editora) e Casos e Descasos. A livraria ficou apenas com um exemplar de O Observador,


O depoimento espiritual que deu origem ao título do livro foi lido para todos por uma gentil voluntária. Ainda não consigo ler sem emocionar...

Ao final da exposição da noite, pessoas de branco começaram a recitar poemas sobre a morte retirados do livro Tão Fácil, psicografado por Chico Xavier. Ninguém sabia quantos seriam, e de onde sairiam. Pessoas de todas as idades, das diversas classes sociais, de todos os gêneros, iam aos poucos declamando os versos recebidos pelo Chico de autores diversos. Tão fácil, tão belo!



A visita foi memorável, fruto da disciplina, da inteligência, do voluntariado, do afeto entre as pessoas. O centro é pequenino, o amor não.

11.11.13

OS NOMES DE RIVAIL





Erros de grafia no registro de nomes não são um problema exclusivo do terceiro mundo, pois parece que eram bem comuns na França do século XIX. As variações nos registros oficiais de Rivail são tais, que Jorge Damas Martins e Stenio Monteiro de Barros publicaram pela Lachâtre, em 1999 o livro "Allan Kardec, análise de documentos biográficos."

Vou transcrever apenas o que se encontra nos registros de Rivail, que foram publicados fac-símile no livro:


1. Certidão de nascimento: 

Denisard, Hypolite Leon Rivail (isso mesmo, Denisard com a letra s, Hipolite com um ele apenas e Leon sem acento, uma vírgula para complicar nossa interpretação).

2.  Certidão de casamento:

Hippolyte Léon Denizard Rivail (agora o i troca de lugar com o y e se escreve com dois pês, o Hippolyte, o Léon ganha um acento e o Denizard é escrito com a letra zê)

3. Certidão de óbito:

Léon Hippolyte Denisart Rivail (Léon troca de lugar com Hippolyte, Denisart termina com tê e volta a ser escrito com esse). 

Não está no livro (ou não encontrei em minha milésima releitura), mas Rivail assinava seus livros como HLD Rivail, o que nos dá a entender que a grafia de sua preferência era a da certidão de casamento.

Com tantos e tão diversos nomes, se eu o encontrasse cumprimentaria-o como Sr. Rivail, já que este é indubitável.

9.11.13

EUTERPE E POLÍMNIA NO CENTRO ESPÍRITA





Os gregos contavam a história das nove musas filhas de Mnemozine e Zeus, capazes de inspirar as artes e as ciências. Jamais imaginei que encontraria duas delas no calor do cerrado, interior de Minas Gerais: Euterpe e Polímnia, duas inspiradoras de música, a que desperta o prazer e a que eleva a alma.



Esses pequenos jovens treinaram por muito tempo e se prepararam para apresentar para um público diferente do que estão acostumados a encontrar no Centro Espírita. Chegaram de van, vestiram a camisa do CEPA e soltaram a garganta. Um minuto inicial de ansiedade. Cinco minutos de celebridade. 



Duas músicas: Prece e Paz. Polímnia usou suas artimanhas no sertão brasileiro. Pão, educação e música, coisas que uma mulher, carinhosamente chamada de Da Paz, legou a uma comunidade distante da "princesa do norte".





Euterpe ficou mordida, afinal, ela também era filha de Zeus. E levou à noite o Grupo Camerata de Violões. Eles saíram da Unimontes, a Universidade Estadual de Montes Claros, direto para o povo. 

O Camerata é composto de professores e alunos de violão, ligados ao curso de música e à comunidade, capazes de interpretar seu instrumento a partir das partituras. E eles foram aonde o povo estava. O povo estava no CEPA. Levaram consigo a bela voz de uma professora e emocionaram a todos.






A beleza dos instrumentos uniu-se à voz trabalhada que executou músicas diversas. Eu me emocionei. Lembrei dos tempos em que a Unimontes era apenas uma Fundação Universitária, e vi que toda a região foi beneficiada com a estadualização e com o acentuado crescimento que a instituição sofreu nas duas últimas décadas. Lembrei das bolsas de pós-graduação que a Fapemig vem proporcionando a esta e a outras instituições de ensino e pesquisa do Estado, e vi que valeu a pena. Cada centavo, cada assinatura de processo, cada investimento que foi feito pensando no futuro. O futuro já começou a chegar.




A guerra das musas, ao contrário dos ciúmes dos deuses, beneficiou a todos os que estiveram presentes, para conversar sobre passes, sobre atendimento aos espíritos e conhecer O Observador. Mas este é assunto para outro post.

7.11.13

O KARDEC DE MARCEL



Marcel Souto Maior publicou há pouco uma biografia de Allan Kardec, e acabo de ler. No movimento espírita há muitos trabalhos biográficos sobre o pesquisador que desenvolveu a doutrina espírita, em uma época com muita experimentação e curiosidade, e pouca predisposição ao estudo, especialmente na Europa.

O trabalho de Marcel é diferente, por exemplo, da minuciosa biografia de Zêus Wantuil e outros, que dá luz a informações de pesquisa e focaliza questões polêmicas no movimento espírita.

“Kardec, a biografia”, publicado pela editora Record, tem algumas características distintivas. Foi escrito por um autor que não crê, nem descrê no Espiritismo, o que aparece nas entrelinhas do texto. Como Kardec não é visto como herói, nem como ingênuo ou mau caráter, ele o humaniza ao máximo. Humaniza ao ponto de imaginar reações que ele teria ante os muitos eventos que o atropelaram ao longo de sua “segunda vida”, a vida espírita.

Há muito fôlego na pesquisa do livro, que não se reduz à pessoa de Kardec, mas a sua época e às pessoas que o cercaram. Marcel faz algo que o movimento espírita deveria ter feito há muito: pesquisa na Revista Espírita os principais acontecimentos envolvendo, Gaby, os médiuns da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, os críticos e perseguidores, o ambiente social da França, compondo um quadro delicioso de se acompanhar.

O livro, com muitos capítulos curtos (três ou quatro páginas apenas), ganha um tom de roteiro ou de pré-roteiro, o que talvez venha a acontecer, considerando os comentários na introdução que reportam a uma encomenda de Wagner de Assis, diretor de Nosso Lar, se a memória não me engana.

Não entendi a fixação de Marcel com a questão financeira. Ele repete diversas vezes a frase de Kardec, quando responde à acusação leviana de ter ganhado milhões com o espiritismo. Ele explica que não é verdade, mas aceita que recebe dinheiro da venda da Revista Espírita e dos livros que ele escreveu, mas que entende como sendo trabalho dele próprio, e que parece ser dedicado aos projetos ligados à construção institucional do Espiritismo. Marcel repete mais de uma vez a frase “Ninguém tem nada com isso”, que é empregada pelo codificador quando se refere ao dinheiro auferido com seu próprio trabalho. Achei que Marcel se deteria mais, ao final do livro, na trajetória do patrimônio deixado por Kardec , mas ele fica apenas no relato do que se adquiriu, na comissão central do espiritismo e na gestão de Gabrielle Boudet após a desencarnação do marido.

Algumas pessoas tiveram uma participação apagada no livro, como é o caso de Camille Flammarion e Victorien Sardou. Alexandre Delanne aparece apenas como o homem  que socorreu Kardec no momento da desencarnação. Nenhuma citação a Léon Denis. Assim, os que deram continuidade ao movimento espírita francês ficam apagados na biografia de Kardec, “mas eu não devo ter nada com isso”.


Recomendo a leitura do livro, que, por sinal, é muito prazerosa. Marcel usa suas habilidades de roteirista e praticamente prende o leitor ao texto. Como grande parte dos episódios são pouco divulgados nas palestras sobre Kardec que assistimos no movimento espírita, penso que o leitor terá aquela impressão de aventura, de estar entrando em um mundo novo e pouco conhecido. Quanto às opiniões discretas que são depreendidas da narrativa, penso que vale a frase de Leopoldo Machado: “Julga, leitor, por ti mesmo.”

5.11.13

MATISSE NO CENTRO ESPÍRITA



Sábado de manhãzinha. A Associação Espírita Paulo de Tarso (CEPA), em Montes Claros-MG, está em pleno mês de comemoração do seu aniversário de criação. É uma sociedade espírita jovem em um movimento antigo. 

Fui convidado a fazer um simpósio sobre passes e uma palestra sobre o atendimento aos espíritos desencarnados. A CEPA é uma casinha alugada, cuidada com muito esmero, como dizia o poeta.



No mês de aniversário, muita arte, e o resultado da arte amadora estampava as paredes e atraía os olhos.


A associação promoveu uma oficina de artes, na qual uma das ações foi dar tinta acrílica e tela para os participantes poderem fazer uma releitura de Matisse. A imagem das telas do pintor francês foram mostradas aos participantes que criaram sua própria tela, inspirados no mestre.

A oficina é democrática. Qualquer pessoa que se inscrevesse podia participar. Trabalhadores, frequentadores e assistidos interessados compartilharam o mesmo espaço e o mesmo objetivo. Ao final, cada um assina seu trabalho, alguns deles retocados pela professora Angeline.



Tocado pela iniciativa e pelo trabalho do CEPA, o artista Sérgio Ferreira doou uma de suas pinturas, que poderia ter ido passear no primeiro mundo, onde ele expõe todos os anos. Generosidade.


Outra ação foram as galinhas decorativas, feitas a partir de cabaças. Os artistas deixaram suas assinaturas discretamente em suas criações.


As namoradeiras são "arte" da professora Mercilma, que auxiliou os participantes a fazer pintura barroca em arte popular.


Vejam os trabalhos em conjunto e...


outros trabalhos...


de arte anímica!


O burrinho decorava o jardim interno. Houve quem quisesse comprá-lo a todo custo, mas ele não estava à venda. As demais peças foram muito procuradas e adquiridas, o que seguramente vai ajudar o belo trabalho que o CEPA faz em diversas frentes.

Angeline comentou conosco que já havia feito este tipo de oficina em outros lugares, mas os resultados foram superiores. "Talvez por ser um centro espírita..." brincava. 

Mesmo com o autor original diante dos olhos não é fácil imitá-lo. Principalmente quando não se conhece pintura, não se entende de tintas, não se tem o material adequado, não se tem noção do significado dos traços, das cores... Nenhum de nós acredita que as telas pertencem a Matisse, mas tiramos o chapéu para a iniciativa de disseminação da cultura no Norte de Minas. O resultado final serviu aos seus propósitos: aproximar os membros da CEPA, difundir a arte, apoiar o trabalho através da venda com preços simbólicos e comemorar o aniversário da associação em grande estilo.