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12.11.19

ORIGEM DA RESTRIÇÃO ÀS EVOCAÇÕES DE ESPÍRITOS NO BRASIL



Foto de Frederico Júnior, médium do Grupo Ismael


É sabido que Kardec usava as evocações como uma forma de obter informações sobre casos específicos que lhe chegavam às mãos. Contudo, ele não as recomendava como técnica universal e infalível na prática mediúnica.

As evocações nominais, segundo Kardec, demandam médiuns especiais, identificados por ele como flexíveis e positivos. [1] Os médiuns positivos, apresentados no capítulo 16 de O Livro dos Médiuns, segundo o próprio Kardec, são muito raros. Os médiuns flexíveis, que Kardec menciona apenas no capítulo 16, item 191, parecem ser o mesmo que os maleáveis, definidos acima. São capazes de dar comunicações de “diversos gêneros”, e ditadas por “quase todos os espíritos”.

Atento para com suas limitações ele advertia os espíritas para o risco de fraude por parte dos espíritos: “evoca um rochedo e ela te responderá. Há sempre uma multidão de espíritos prontos a tomar a palavra sob qualquer pretexto”[2].

Alguns autores atribuem a censura da prática das evocações a Chico Xavier. Eles geralmente se lembram da frase: o telefone toca de lá para cá. Honestamente, acredito que não seja verdade. Chico participava de reuniões onde ocorriam evocações mentais, nas quais parentes de pessoas desencarnadas pediam à espiritualidade a sua comunicação. Havia apelos mentais[3]. Tantos, que no livro Missionários da Luz, os espíritos em uma sessão de materialização recomendam que as pessoas cantem, para que se desligassem do petitório mental (p. 118). Isso significa que mentalmente se solicitava da espiritualidade a presença dos familiares, entre outros desejos, embora não se pudesse assegurar que eles estariam em condições de se comunicar, como vemos no capítulo 25 de O Livro dos Médiuns na pena de Allan Kardec: há diversos motivos para que os espíritos evocados não possam se manifestar. A explicação do Chico aos familiares, referindo-se ao telefone, é mais um eufemismo, visando preservá-los da dor da perda, mais uma vez revivida.

Estudando as informações publicadas sobre o Grupo Ismael, do Rio de Janeiro, encontrei algumas orientações dadas pelo “espírito guia” do grupo pela mediunidade de Frederico Júnior. Ele dizia:

“Não se ofereçam para evocações. Quando um centro não lhes parecer homogêneo, neguem-se ao trabalho, porque assim pouparão elementos do seu cérebro e não darão ocasião a divertimentos, a que muitos estão acostumados.
A sua linguagem deve ser esta:
Eu só trabalho quando meu guia esteja a meu lado, e desde que meus companheiros não me proporcionem a satisfação desta vontade, eu não trabalho: porque serei uma máquina sem maquinista, serei uma bússola sem agulha, serei um navio sem leme, e o meu estado é perigoso.” – Ismael via Frederico Júnior[4]

Creio que a orientação de Ismael se deve à época e aos conhecimentos do grupo. No Brasil ainda era muito comum a prática da mediunidade (e a de efeitos físicos também) para atrair adeptos. O grupo de Ismael era um dos primeiros a se dedicar ao exercício sistemático da mediunidade.

Se o público participante, que ignorava o espiritismo e os cuidados com a mediunidade, fosse incentivado a ir, movido exclusivamente pela curiosidade, os médiuns ficariam expostos a vexames públicos, às reações psicológicas dos assistentes da reunião e de outras consequências desagradáveis, diante da prática pública e oral de evocações. A prática mediúnica se tornaria uma espécie de espetáculo, onde as pessoas iriam querer que seus desejos e exigências pessoais fossem atendidos pelo médium. Muito diferente do ambiente de estudo criado por Allan Kardec na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, em Paris. Talvez por isso tenhamos a orientação restritiva do espírito que se identificava como Ismael.

O cuidado intransigente da presença do "guia" sugere fragilidade da direção encarnada da reunião mediúnica. O médium se orienta preferencialmente através do espírito que reconhece como guia. Sabemos que é uma atitude arriscada, porque nem sempre o médium é capaz de identificar esse espírito e outro espírito pode se passar por ele. Seria um cuidado próprio para a época e específico para o Grupo Ismael? Penso que sim.

Não há como afirmar sem dúvida que essa é a origem da restrição às evocações verbais nas reuniões mediúnicas brasileiras, mas é o que encontrei de mais antigo, e Chico Xavier ainda usava calças curtas.




[1]KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 40 ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978. [Segunda parte - Das manifestações espíritas. Capítulo 25 - Das evocações » Considerações gerais, item 269]
[2] KARDEC, Allan. Evocações dos animais in: O Livro dos Médiuns. 40 ed. Rio de Janeiro: FEB, 1978. [Segunda parte Segunda parte - Das manifestações espíritas - Das evocações. Capítulo 25 - questão 283 - 36ª.]
[3] LUIZ, André. Materialização. in: Missionários da Luz. 13 ed. Rio de Janeiro: FEB, 1980.  p. 117-118
[4] RICHARD, Pedro. Frederico Pereira da Silva Júnior, Reformador, Rio de Janeiro, ano 32, n. 18, 16 set. 1914,  p. 319


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