11.10.23

O ESPIRITISMO É UMA FÉ RACIOCINADA?



Jáder Sampaio

Uma palestra estava sendo feita em uma sociedade espírita da região sudeste, e o expositor tratava de um tema à luz do pensamento de André Luiz, espírito que se manifestou principalmente a partir do lápis que se encontrava nas mãos de um médium extraordinário: Francisco Cândido Xavier e de seu colega e amigo Waldo Vieira.

Um dos participantes, estudioso paulista do espiritismo, perguntou-lhe: 

- O que Allan Kardec diz sobre isso?

O expositor, com franqueza, respondeu:

- Lamento, mas não me preparei para abordar a posição de Allan Kardec, vim apresentar a visão de André Luiz.

A história chegou aos meus ouvidos, e não tenho como afirmar que se deu exatamente assim, porque, afinal, diz a sabedoria popular que “quem conta um conto, aumenta um ponto”. Mesmo que ela não fosse exatamente assim, fica um reflexão: Se Kardec desenvolveu os alicerces do pensamento espírita, como o expositor não conhecia pelo menos suas ideias básicas, porque estudou o tema exclusivamente a partir da visão de um autor que erigiu suas paredes sobre o pensamento e as propostas de Allan Kardec? Por que ele não se sentiu seguro para responder em poucas palavras o que pensa o fundador do espiritismo e o que são ideias do espírito cuja contribuição estava sendo estudada?

Pessoalmente, não vejo nenhum problema em estudar com detalhes um autor espiritual que foi reconhecido por estudiosos do espiritismo, mas estamos abandonando as bases do pensamento espírita? 

Convido o leitor a examinar o risco do misticismo que é sempre real quando os assuntos são de ordem metafísica. Kardec abordou Deus, a vida espiritual e as informações que os espíritos davam sobre a vida após a morte com uma forte base racional. Na medida em que a razão é abandonada e prevalece a autoridade de um espírito, nos colocamos diante do que o professor Herculano Pires denunciava, que era a redução do espiritismo a um autor espiritual ou a um médium. Não teríamos assim, a doutrina dos espíritos, mas a doutrina de um espírito/médium só, perdendo o que distingue o espiritismo de outras designações religiosas e ficando bem próximos do culto de um espírito, problema que os espíritos que escreviam por Chico Xavier, tantas vezes nos advertiram.

"Quando a razão sai pela porta, ideias como a dos "reptilianos" entram pelo centro espírita". Mas essa é outra história.


5.10.23

"O ESPIRITISMO SERÁ CIENTÍFICO OU NÃO SUBSISTIRÁ" É UMA AFIRMAÇÃO DE LÉON DENIS?




Alguns autores têm atribuído a Léon Denis a seguinte frase: “O espiritismo será científico ou não subsistirá”. Esta frase se encontra no prefácio de 1911 do livro “No Invisível”. 

Como havíamos publicado em Reformador, uma frase deve ser entendida em seu contexto. No prefácio, Léon Denis estava tratando da mistificação de médiuns. Cinco anos antes ele havia lidado com o Caso Miller, um francês que morava nos Estados Unidos e estava na França fazendo demonstrações pagas de materialização. Denis assistia suas demonstrações e começou a suspeitar de fraude, o que conseguiu demonstrar, e expôs o médium em revista da sua época. Miller ludibriava os espíritas franceses.

Na nova edição de “No Invisível”, um livro no qual Denis trata de mediunidade, na introdução de 1911 ele estava tratando do caráter do espiritismo. Após citar autores que elogiavam o caráter religioso e moral do espiritismo, inclusive Flournoy, que vê o espiritismo como uma opção entre o catolicismo-protestantismo e o ateísmo. 

Denis, então, sugere um equilíbrio por parte dos espiritas entre a experimentação (ciência) e o ensino (filosofia e religião), na página 23. Ele mesmo se confessa atraído pelo ensino espírita e ter obtido base experimental após 15 anos de experimentação.

Ele distingue alguns pesquisadores de sua época e os cuidados que tomavam com a fraude. Cuidados que muitos espíritas e experimentadores sem perseverança, geralmente não adotavam. Então ele trata da fraude, no caso de um médium que ele não identifica ao leitor, na qual ele identificou fenômenos autênticos e simulações, e declarou a um juiz da “corte de apelação”.

E a frase surge como um dito de efeito à argumentação. Ele diz: 

“Os espíritas são homens de convicção e fé. Mas se a fé esclarecida nos atrai, nos planos espiritual e material, nobres e elevadas almas, a credulidade, no plano terrestre, atrai os charlatões, os exploradores de toda espécie, a chusma dos cavaleiros de indústria que só nos procuram ludibriar. Aí está o perigo para o espiritismo. Cumpre-nos, a todos os que em nosso coração zelamos a verdade e nobreza dessa coisa, conjurá-lo. De sobra se tem repetido: o espiritismo será científico ou não subsistirá. Ao que acrescentaremos: o espiritismo, deve ser antes de tudo, honesto!”. (Denis, p. 2-22)

O que está em questão não é a redução do espiritismo à ciência, que o espiritismo seja exclusivamente uma ciência, mas que os médiuns que compõem o meio espírita, sejam honestos, sem o que se exigirá um rigor incomum para a pesquisa dos fenômenos mediúnicos, e se confundirão as ideias dos médiuns às ideias dos espíritos e os fenômenos de efeitos físicos às fraudes. Essa era a preocupação do autor. 

Não é correto, portanto, atribuir à Léon Denis a frase isolada: “o espiritismo será científico ou não subsistirá”. Era uma frase falada à época por um segmento de espíritas e de estudiosos que cobravam estudos experimentais (como no IV Congresso Europeu de Psicologia) dos espíritas e inclusive de Denis e Delanne.