Lynn L. Sharp
Concluí a leitura de “Secular Spirituality: reincarnation and spiritism in nineteenth-century France” de Lynn L. Sharp há alguns meses. O livro foi publicado pela Lexington Books e trata da história do espiritismo na França no século 19.
Pelo que encontrei na internet, a autora é professora associada do Whitman College, com formação em história nas universidades do Colorado e pós-graduação (mestrado e doutorado) na Universidade da Califórnia. Ela é laureada com o prêmio Robert Y. Fluno de ensino em ciências sociais.
Ao contrário das outras histórias do espiritismo, Sharp começa com os reformadores sociais franceses. Alguns deles tinham uma ideia comum com o futuro espiritismo de Allan Kardec: a reencarnação. Alguns nomes pouco estudados no Brasil pelos espíritas surgem, como Jean Reynaud, o socialista Saint-Simon, o filósofo Pierre Leroux, Charles Fourier (que propunha a reencarnação interplanetária) e Pierre–Simon Ballanche. A autora explica a reencarnação em alguns dos socialistas utópicos como um caminho para “explicar a tensão entre indivíduo e sociedade”, e promover mudanças.
Ainda com essa visão social da história das ideias espiritualistas na França, Lynn Sharp trata dos sonâmbulos mesmerizados e das ideias mediúnicas de Swedenborg como uma forma de reconciliação entre os interesses individuais e sociais.
Outra influência incomum em nossos autores de história é o que Sharp denomina como o “renascimento oriental” que aconteceu na Europa no final do século 18 e ao longo do século 19, e destaca a publicação do Bhagavad Gita e do Ramayana. A Índia e a Pérsia foram vistas por Leroux e Reynaud como fontes de verdades antigas, e o leste em geral como “fonte das ideias religiosas”.
Reynaud trata da crença na reencarnação entre os Druidas. Não sei se entendi direito, mas Sharp o critica por supervalorizar a cultura gaulesa.
“... as verdades nucleares de suas idéias filosóficas, e de todas as religiões, podiam ser encontradas nos primeiros franceses, os gauleses, como expressão de sua intelligentsia, os druidas.”
Lynn Sharp segue mostrando que muitas pessoas foram influenciadas por Reynaud e passaram a incorporar seus dados sobre os celtas.
Ela considera que os espíritas incorporariam muito tarde, em torno da década de 1920, trabalhos promovendo a conexão entre “druidas e a metempsicose”. Deve estar referindo-se a dois livros importantes, “O gênio céltico e o mundo invisível” e “A reencarnação”. O primeiro de Denis e o segundo de Delanne.
Estranha que ela não citasse Allan Kardec, que em abril de 1858 publicou um artigo sobre o espiritismo entre os druidas. Nele, o fundador do espiritismo já apontava a questão da reencarnação:
“Se, pois, nos reportarmos aos preceitos contidos no Livro dos Espíritos, onde encontraremos formulado todo o seu ensino, ficaremos admirados ante a identidade de alguns princípios fundamentais com os da doutrina druídica, dentre os quais um dos mais notáveis é, incontestavelmente, o da reencarnação.”
O livro “Terre et Ciel” de Reynaud, foi publicado em 1854, muito próximo de O Livro dos Espíritos (1857). Kardec publicou um artigo em sua homenagem na Revue Spirite, em agosto de 1863, considerando-o um precursor do espiritismo. Ele publicou uma comunicação de Santo Agostinho que entende que os livros de Reynaud possibilitariam aos seus leitores uma conexão entre as ideias do filósofo e o espiritismo.
A proposta de Sharp nesse primeiro capítulo de seu livro é mostrar que há uma “rede de linhas de pensamento que se entrelaçam” com relação à reencarnação na França do século 19. A autora a remonta aos socialistas românticos. Como historiadora, a autora faz uma história do espiritismo analítica, articulada à política e às questões de gênero. Ela leu muitos autores, inclusive periódicos espíritas de duração breve na França do século 19. Aos espíritas brasileiros contemporâneos que ela não parece conhecer bem, vale a pena estudar seu livro.