Jáder Sampaio
Mais um ano letivo se iniciou
para a evangelização em uma das cidades satélite de Belo Horizonte, num bairro
de classe média baixa. A jovem professora ia trabalhar pela primeira vez com a
turma de alunos de 9 e 10 anos de idade. No primeiro dia, apenas duas crianças
na sala, o que fez com que a turma se unisse à de 11 e 12 anos.
As professoras encontraram três
crianças assentadas com a cabeça baixa, desviando o olhar em sinal de vergonha.
- Bom dia. Eu me chamo Antonina!
Qual é o seu nome?
As respostas eram como um
resmungo triste, um sussurro cheio de vergonha.
Preocupada, Antonina tirou sua
arma secreta. Uma bola vermelha, meio rosa, de plástico, comprada por dois
reais.
Os meninos ergueram o olhar e
perguntaram assombrados:
- Mas já??
A monótona organização das aulas
geralmente tem formato fixo. Prece, música, exposição dialogada e atividade de
fixação. Quanto maior a dificuldade na escola, maior a dificuldade com a
exposição, especialmente se não for interativa. Talvez uma história possa
chamar a atenção, mas nada pior para uma criança de nove anos que ser
confundida com uma de cinco.
O objetivo da aula era fazer uma
avaliação diagnóstica das crianças. O que elas eram capazes de fazer? Quem
eram? Onde moravam? O que gostavam/não gostavam de fazer? Com estas e muitas
outras respostas, poder-se-ia planejar melhor as atividades do futuro.
Antonina respondeu:
- Aqui é assim. Viemos para
brincar e aprender!
Fizeram uma rodinha, talvez um
pentágono, já que eram apenas cinco (três alunos e duas evangelizadoras). Feita uma pergunta, a pessoa que tinha a
bola respondia e escolhia outra para responder, para quem a lançava. Atividade
simples, mas os olhos brilhavam.
As informações foram surgindo.
Primeira descoberta bem verbalizada: eles não gostavam de ficar sentados
ouvindo! Sinal amarelo para uma exposição que não fosse dialogada. Moderação
com os slides de powerpoint.
Segunda descoberta: eles gostavam
de massinha! Achei meio extemporâneo, mas não é hora de psicologia do
desenvolvimento, e sim, de valorizar o interesse dos meninos.
A escolha das cores, como eram
todos meninos, já estava irremediavelmente associada às camisas dos seus times
de futebol preferidos. Quando se falou da família, outra vergonha apareceu; alguém
morava com os avós. Avós, irmãos mais velhos, apenas mãe e irmãos, não ter mãe
e pai faz com que se considerem pessoas menores. Sinal amarelo para as aulas
comemorativas da família, baseadas apenas na família nuclear. Talvez seja
preciso fazer um poema da gratidão, semelhante ao de Amélia Rodrigues, para se
valorizar que eles tenham um avô ou avó, um irmão mais velho que cuida, até um
vizinho.
As mais de quinze perguntas foram
se esgotando rapidamente, e veio a pergunta que não queria calar: podemos
brincar com a bola?
Assim terminou a história, ou
quase. Na outra semana, quando Antonina chegou, os meninos perguntaram:
- Hoje vai ter bola?
Bola não teve, mas teve massinha.
Esta história eu conto depois.
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