Charles Fourier foi fundador de um movimento que ganhou dimensões internacionais, no qual tentava organizar os interessados em falanstérios ou falanges, uma espécie de comunidade autônoma e autosuficiente, na qual as pessoas pudessem trabalhar segundo suas características pessoais e na qual não houvesse diferenças acentuadas. Esta comunidade seria ao mesmo tempo urbana e rural, na tentativa possível de não necessitar de trocas comerciais com a sociedade, mas Fourier era avesso à industrialização e às máquinas.
Familistério de Guise
Falanstério de Saí
Por falar em imigração, um dos precursores do Espiritismo Brasileiro, Benoit Jules Mure, tentou construir uma comunidade fourierista em Santa Catarina (Colônia Industrial de Saí), antes de voltar ao Rio de Janeiro e dedicar-se à homeopatia e ao magnetismo de Mesmer. Não consegui uma localização precisa do local, mas parece ficar nas cercanias de Joinville.
A Associação de Divulgadores Espíritas de Portugal realizou nos dias 1 e 2 de Maio do corrente, na Vila de Óbidos, a 5ª. Jornada de Cultura Espírita.
A programação contou com temas como Experiências de Quase-Morte (Dr. Manuel Domingos), Espiritismo e Internet (Dr. Vasco Marques), Fenômenos Espíritas e suas Consequências Morais (Ulisses Lopes), Relações Interpessoais (Jorge Gomes), Um Caso de Reencarnação (Eugénia Rodrigues), Fatos Espíritas em Portugal (José Lucas), Vida Além da Morte (Dr. Vítor Rodrigues – Psicólogo) e Fatos Espíritas em Regressão de Memória (Dra. Gláucia Lima – Psiquiatra).
O evento será disponibilizado pela internet futuramente. (http://www.adeportugal.org )
Parabéns à comunidade espírita portuguesa. Possamos ampliar o intercâmbio entre os dois países.
O menino de rua entrou portaria adentro e deu de cara com uma funcionária da Universidade. Na minha cidade costuma-se chamar de Zé, a quem não tem nome, embora este menino tenha também sobrenomes: pivete, vagabundo, moleque, sem mãe... Mirradinho, embora eu não fosse capaz de dizer qual era a sua idade, moreno, olhos brilhantes, cabelos crespos, ele perguntou, direto:
- O que é isto aqui?
A funcionária, em um final de tarde, olhou para o menino e com um ar maternal respondeu:
- Uma faculdade!
Se ela tivesse conversado em grego, não seria muito diferente. O olhar do menino denunciava claramente que ele não havia entendido do que se tratava. Acostumado a ser tocado daqui e dali, como se fora um cãozinho, mas não foi mal recebido, o que lhe deu coragem para respirar fundo e insistir:
- Mas como é que a gente entra aqui?
Um diálogo de surdos! Falam a mesma língua, mas não se entendem. A funcionária respondeu, com um certo ceticismo e algum desalento na voz:
- Ihh, não é fácil. Primeiro você tem que estudar oito anos no ensino fundamental, depois mais três anos de ensino médio, aí você faz o vestibular, que é muito difícil, e, se passar, pode entrar.
Se ela tivesse falado em dialeto maia ou inca não seria mais entendida. O diálogo cessou por aí, com o menino olhando por cima do balcão de entrada, um olhar curioso, enigmático, com apenas uma certeza: não dá para entrar aí, mas, o que é isto aí mesmo?
* * * *
Norte de Minas Gerais. Um calor seco, insuportável ao meio dia. Uma pequena metrópole no meio do nada. No centro da cidade circulam a pé e de ônibus uma população cujo salário-referência é a metade de um salário mínimo. Terra de contrastes, na qual alguns quilômetros separam um haras de cavalos importados de um acampamento de tendas de lona, sem esgotamento, sem água encanada, sem luz elétrica, aberto pelos tratores da prefeitura para quem quisesse sair da vida campesina e construir casas... Crianças às dezenas levadas para as portas de um hospital público, repletas de doenças que não deveriam mais existir no final do século XX. Clima desértico, a temperatura cai muitos graus à noite, o que propicia pneumonia ao lado de desidratação, doenças de pele juntamente com parasitoses, todo o tipo de doenças que têm mosquitos como vetor, combatidas com o irritante inseticida, aspergido pelas ruas através de máquinas barulhentas, em uma tentativa inócua de combater os insetos que teimam em se multiplicar em toda parte.
As escolas públicas, quando não obedecem à arquitetura homogêneas das escolas estaduais, são pequenos cômodos, casebres, que acolhem com escassez de recursos as crianças, o futuro da região.
Em um dos bairros situado no limite da classe média e da periferia, um núcleo espírita. Pequeno, para os padrões da capital, mas muito procurado pela população de diferentes segmentos sociais. No período da tarde algumas de suas salas se transformam em salas de aula e recebem dezenas de crianças da região. O dirigente do centro espírita se reúne com a secretária de educação, que, na escassez de recursos lhe assegura lanches para as crianças que passarão as tardes com um grupo de jovens voluntários. Estudantes secundaristas uns, estudantes universitários outros, o trabalho cheira a improviso e boa vontade, mas é continuado.
Aos pais se transmite a educação como valor. Uma das mães, faxineira, bonachona, se deixou entusiasmar com aquela mensagem de desenvolvimento pessoal e conseguiu uma vaga à noite em escola pública de ensino secundário e técnico.
Final de ano e a prefeitura quer um relatório. Sumário. Resumidíssimo. Quantas crianças foram aprovadas na escola? Uma conversa rápida com a jovem coordenadora e uma resposta ingênua, como se a pergunta fosse tola ou banal.
Quantas? (Estranheza) Todas.
Integrado à equipe de trabalhadores do então Grupo Emmanuel de Estudos Evangélicos, os trabalhos mediúnicos e os estudos evangélicos foram o grande espaço de experiências e aprendizagem de José Mário Sampaio.
O Grupo Emmanuel contava com trabalhadores dedicados, abertos ao estudo e à troca de idéias. Os três irmãos Abreu (Lúcio, Honório e Oswaldo), Manoel Alves, Damasceno Sobral, Leão, Tiana e muitos outros trabalhadores importantes do movimento espírita mineiro encontravam-se para os trabalhos costumeiros.
Casos intrincados envolvendo médiuns e problemas relacionados à mediunidade e à obsessão afluíam para o grupo.
- “No começo, levávamos a pessoa que apresentava problemas mediúnicos para a reunião mediúnica. Aos poucos, começamos a observar que ela se tornava um problema na reunião mediúnica.” Ele explicava aos participantes de sua reunião às segundas-feiras, na sala 24 da União Espírita Mineira.
Pessoas que desconheciam o Espiritismo e apresentavam problemas com a mediunidade, tornavam-se perturbadores potenciais nas reuniões. Sem qualquer conhecimento sobre suas faculdades, alguns médiuns, subjugados à influência obsessiva ou apenas incapazes de controlar a
Um terceiro grupo de pessoas que procuravam os trabalhos mediúnicos eram os curiosos. Em alguns lugares havia reuniões mediúnicas públicas, e algumas pessoas pululavam de grupo em grupo, interessadas em verem os médiuns em ação, da mesma forma que os aficionados em teatro ou cinema buscam seus atores favoritos ou o gênero de sua escolha. Eles se interessavam pelo espetáculo mediúnico, mas não estavam dispostos a submeterem-se à disciplina do trabalho. Uma vez na assistência, queriam apenas ver e comentar as reações de médiuns, doutrinadores e espíritos comunicantes.
Ao discutirem sobre estes problemas, os membros do Grupo Emmanuel foram experimentando, com o passar do tempo, ações diferenciadas para o trato com o neófito. Uma das ações, que acabou sendo adotada como política da União Espírita Mineira para com os seus freqüentadores foi a criação de ciclos de estudo para iniciantes, muito antes de se falar em Estudo Sistematizado da Doutrina Espírita. Já existia em São Paulo os Cursos de Médiuns, mas José Mário e seus colegas de Grupo Emmanuel eram avessos ao termo. “A palavra curso induz as pessoas pensarem que se formarão e se diplomarão médiuns, o que não é verdadeiro”, diziam. “Empreguemos o termo “ciclo de estudos”, que comunica bem a temporalidade da ação e não passa às pessoas a idéia de que, após concluído, não é mais necessário estudar.”
E assim foi feito. Três “ciclos de estudo” que se iniciavam e se concluíam continuadamente. Um sobre Doutrina Espírita, outro sobre Evangelho e um terceiro sobre Mediunidade.
O de Doutrina, durante anos a fio foi da responsabilidade de Honório Abreu, hoje presidente da União Espírita Mineira. Calcado em quinze princípios básicos que a equipe do Grupo Emmanuel identificou, aproximadamente um por semana, ele se completava com cerca de três meses.
O ciclo de estudos sobre o Evangelho foi da responsabilidade de Manoel Alves por anos a fio. O Grupo Emmanuel dedicava-se a estudar o texto evangélico e bíblico versículo a versículo, influenciado pela mediunidade de Chico Xavier e por alguns dos trabalhos de Emmanuel. Era uma espécie de ruptura com uma prática de estudos evangélicos calcada apenas na leitura e comentário de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, de Kardec. Por esta razão, em terras mineiras, este tipo de hermenêutica ficou conhecida, no meio espírita, pelo nome de “miudinho”.
O ciclo de estudos sobre mediunidade ficou, até a desencarnação, em 1988, sob a responsabilidade de José Mário e foi desenvolvido, pelo que sei, em parceria com Oswaldo Abreu. Durava cerca de oito meses, e era composto de palestras que tratavam de assuntos teóricos e práticos da mediunidade. Do conceito de mediunidade, aos diferentes tipos de médiuns, da sintonia aos mecanismos da mediunidade, da oração ao dia a dia das reuniões mediúnicas, diversos assuntos faziam parte desta preparação inicial dos médiuns.
Se alguém se apresentava com uma possível sensibilidade ou uma acentuada faculdade de perceber os espíritos, era orientado a passar por estes cursos antes de se integrar aos grupos de prática mediúnica. “Mais que aprender a dar comunicação, é importante que o médium aprenda a controlá-la”, dizia José Mário.
Mais de uma vez, após uma prece ou no meio de uma palestra, algum médium “incontinente” emendava uma comunicação no meio do público e a voz segura e firme de José Mário orientava: “Irmão, aqui não é a hora nem o lugar de dar comunicar-se.” Alguns assistentes, assustados, colocavam-se prestos para a aplicação de passes, o que ele não permitia naquele momento crítico. Geralmente, o médium, sem graça ou em estado de leve perturbação emocional interrompia seus impulsos e se controlava.
Quando iniciaram-se os ciclos, a freqüência era baixíssima, a ponto de desanimar. Damasceno Sobral, ao ouvir as lamúrias, dizia, profético, empregando aquele tom de voz de quem andou conversando com os espíritos mas não quer dizer: - “vai chegar o dia em que as salas não comportarão os interessados”. E aconteceu. A sala 24 da União Espírita Mineira cabia cerca de quarenta pessoas assentadas. Próximo da desencarnação, papai iniciava seus trabalhos às 19:30 horas. Às sete horas os mais motivados começavam a chegar, para disputar lugares nas cadeiras, depois para conseguir um lugar assentado. Impreterivelmente às 19:15 horas, Mário Sampaio já estava nas portas da União Espírita Mineira, e às 19:30 horas fazia-se a prece inicial dos trabalhos. Às 19:35 não era incomum amontoarem-se, de pé, as pessoas pelo corredor superior da União Espírita.
Muitas vezes a diretoria (e aqui cabe lembrar Martins Peralva) lhe ofereceu fazer os estudos no salão, que comportaria mais de cem pessoas. Ele recusava, com educação, preferindo a intimidade dialógica da sala pequena (era a maior das salas de estudo do antigo prédio da UEM).
Algumas pessoas assistiam ao ciclo diversas vezes. Quando eu lhes perguntava por que faziam isso, algumas diziam “ter a oportunidade de aprender mais”, outras não escondiam a admiração pela palavra clara e didática do expositor, outras tinham o interesse em levar a prática para seus centros espíritas de origem e queriam aprender bem, outras diziam que haviam perdido algum dos temas e não queriam ficar sem ver tudo.
Os esquemas de estudos foram anotados em cadernos, que depois viraram fichas e com a máquina de datilografar, pequenos bloquinhos com frases sintéticas.
Não demorou muito para que se fizessem apostilhas
Da apostilha veio um livreto, em 1983, que ele organizou conjuntamente com Oswaldo Abreu, publicado anonimamente, sob União Espírita Mineira e intitulado “Mediunidade”, que é o sexto livro da coleção “Evangelho e Espiritismo” e que foi distribuído gratuitamente aos interessados durante anos a fio.
Alguns centros espíritas convidavam-no para levar o ciclo de estudos em suas casas, o de mediunidade ou o de passes (sobre o qual nada disse neste texto), e não foram poucas as casas onde ele esteve, o Grupo da Fraternidade Irmã Scheilla, o Glacus e muitos outros.
Passados quase 17 anos da sua desencarnação, não é incomum eu chegar pela primeira vez em algum centro espírita da capital ou do interior e algum dos dirigentes ou freqüentador me perguntar em particular: - Sampaio, você é parente de José Mário? E ante a minha resposta afirmativa ele responder. “Eu aprendi muito sobre mediunidade com ele na União Espírita Mineira, na sala 24”.