A Revista Espírita (Revue Spirite) foi fundada por Allan Kardec e teve seu primeiro número publicado em janeiro de 1858. Ela foi concebida por Kardec e discutida com os espíritos antes de sua primeira edição (Obras Póstumas, pág. 294 e 295). Nesta discussão, Kardec, entre outras coisas, é incentivado a fazer um número que contemplasse os interesses de cientistas e do vulgo, e que não dependesse de recursos financeiros de terceiros.
Seu primeiro subtítulo foi "Jornal de estudos psicológicos". Ele se justifica na medida em que foi delimitado como abordagem de "tudo quanto se liga ao conhecimento da parte metafísica do homem." Allan Kardec antevia a fusão do pensamento espírita às ciências que estudam o homem, como a psicologia e a antropologia. (Fonte: Revista Espírita, jan. 1858, p. 5 - Edicel)
A primeira edição foi feita às expensas do fundador, e a Revista foi bem sucedida. Apesar do trabalho intenso e dos dois empregos que Kardec tinha à época de sua fundação, ela foi regularmente publicada até 1869, época da desencarnação de seu fundador.
Após a desencarnação de Kardec, a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas se recompôs sob a direção do Sr. Malet, com uma diretoria formada pelos Srs Levent, Canaguier, Ravan, Desliens, Delanne (pai) e Tailleur. O secretário gerente da Revue passou a ser o Sr. A. Desliens. A Sra. Allan Kardec cedeu os lucros do comércio das obras e da revista para a Caixa Geral do Espiritismo, mas passou a gerir todos os gastos gerais e a própria revista. (Fonte: Revista Espírita, mai. 1869, p. 152 - Edicel)
Há um período nebuloso, do qual não tenho fontes, que compreende os dois anos até a nomeação de Pierre-Gaëtan Laymarie à Sociedade (?) e ocupação dos cargos de redator-chefe e diretor da Revue Spirite. (Processo dos Espíritas, FEB, 1 ed. pág. 22) e que ocuparia por trinta anos, segundo J. Malgras (Os pioneiros do espiritismo, DPL Espírita, 2002). Neste período o subtítulo da Revue tornou-se "jornal de estudos psicológicos e do espiritualismo experimental", que condiz com a demanda de Flammarion pelo desenvolvimento da dimensão experimental do espiritismo, como se lê em seu discurso no túmulo de Kardec.
A Revue teve sua publicação contínua até a primeira guerra mundial, quando foi interrompida de 1914 a 1916. Neste ínterim, sabe-se que existiu uma Sociedade Científica do Espiritismo, dirigida por Leymarie, a quem Jean Guérin tentou doar sua fortuna após a morte, contudo, não logrou conseguir. "infelizmente essa sociedade, como todas as sociedades espíritas, não era reconhecida de utilidade pública, e caiu sob o golpe das leis sobre as associações, ela foi despojada no fim de alguns meses, por processos sucessivos, pouco mais ou menos completamente desse patrimônio, do mesmo modo que o de A. Kardec." (Malgras. Os pioneiros do espiritismo, DPL Espírita, 2002, p. 40). Houve também uma sociedade para a continuação das obras de Allan Kardec (antiga Sociedade anônima do espiritismo"), e a criação da União Espírita Francesa (1882), assim como de uma Sociedade Francesa de Estudo dos Fenômenos Psíquicos (1889). (Bodier, Paul e Regnault, H. Gabriel Delanne: vida e obra. CELD, 1990) Todas estas instituições, de alguma forma, pleiteavam centralidade do movimento espírita francês, algo muito semelhante ao que aconteceu neste período no Brasil.
O terceiro grande momento da Revue Spirite deve-se a Jean Meyer. Este comerciante bem sucedido, tornou-se espírita após a leitura de livros de Kardec e Denis. Apoiado por Denis, ele adquiriu o título da revista e tornou-se seu editor de 1916 a 1931, quando desencarnou. Meyer fez por sucessor a Hubert Forestier, que manteve a linha editorial da Revue até setembro de 1971. Neste período, a Revue foi interrompida apenas durante a segunda guerra mundial. O papel da Revue associou-se ao da União Espírita Francesa e posteriormente ao do Conselho Espírita Internacional, o que é demonstrado com a mudança de seu subtítulo: “Órgão oficial do Conselho Espírita Internacional e da União Espírita
Francesa e Francófona para o conhecimento dos valores morais e científicos da
doutrina espírita”
Meyer é o mecenas das duas instituições que coexistiram durante muitos anos no movimento francês, o Instituto Metapsíquico Internacional e a Maison des Spírites, onde funcionava a União Espírita Francesa, a Federação Espírita Internacional, a Revue Spírite e as Edições Jean Meyer (RAMOS,
Miguel La Revue Spirite. Hommage
a Jean Meyer: mecene du spiritisme français. Paris: 4o. Trimestre de 2003, p. 4
a 6)
Este equilíbrio entre uma instituição de pesquisas e outra instituição de divulgação doutrinária e filosófica se manteve até pouco depois da desencarnação de Forestier. Em 1971, Andre Dumas se torna redator-chefe da Revue, e cinco anos depois ele abandonaria seu título por "Renaître 2000". Este período acompanha uma tentativa de extinção da União Espírita Francesa, transformada em União científica francófona para a investigação psíquica e o estudo da sobrevivência (USFIPES). Dumas e o presidente eleito desta nova instituição eram ao mesmo tempo membros do Conselho dos organismos de pesquisas parapsicológicas. Não posso senão levantar hipóteses, na falta de documentos e de entrevistas da época, mas ambos parecem crer que esta instituição e as teorias em conflito que compõem o corpus da parapsicologia seriam um avanço em relação ao pensamento espírita. Ele não poupou hostilidades verbais à época contra a Federação Espírita Brasileira, que se posicionou contra as transformações empreendidas na França e às rupturas para com o movimento espírita internacional.
Após sua "morte" simbólica, a Revue ressurgiu de um movimento de reação às mudanças no seio do movimento espírita francês. Roger Perez começa a publicar em 1985 uma Nova Revista Espírita, e vai ao tribunais em julho de 1987 para obter o título da revista fundada por Kardec. Dois anos depois, o tribunal decide que Dumas não é mais o dono da Revue Spirite, uma vez que ele próprio não explorava seus direitos de propriedade. Venceu o caráter democrático da legislação francesa.
Não causa estranheza que tenha surgido, dentro do movimento francês, um ou mais grupos interessados nos estudos de fenômenos espirituais, psíquicos ou paranormais, mas o movimento que teve Dumas e Edmond Bernard como articuladores, visou uma espécie de expoliação dos bens do movimento espírita em causa própria, e, não bastasse, uma aquisição de revista para proibição da veiculação de suas ideias originais. Nem a santa inquisição teria feito algo mais nefasto à liberdade de crenças.
O movimento que teve Perez como um de seus expoentes conseguiu o título da Revista Espírita e passou a editá-la trimestralmente. Dialogando com representantes do movimento espírita de diversos países, criou-se um novo Conselho Espírita Internacional, que assegurou recursos para sua publicação no congresso de 1998 e que se tornou proprietária da Revue Spirite em 2007.
Desde 2010, a Revue Spirite tem como subtítulo "Órgão oficial do Conselho Espírita Internacional". Em seu novo período, findo o sparagmós dumasiano, a revista renasceu como órgão de divulgação do pensamento espírita.
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