Encontrei hoje no texto de Milton Torres, professor da Universidade Adventista de São Paulo, um bom conjunto de explicações, acessíveis a todos nós, interessados no estudo dos evangelhos. Vou retirar literalmente as explicações dele, e interpolo meus comentários entre colchetes:
1.“... ele [o evangelho de João] não faz nenhuma tentativa de se passar por uma biografia de Jesus.”
2.“[O evangelho de João] não demonstra interesse por uma cronologia exata dos feitos de Cristo.”
3.“... os longos discursos de Jesus ali registrados apresentam semelhanças formais com as preleções de Sócrates nos diálogos platônicos”
4.“... como no caso de Platão, seu método é determinado pelo propósito que persegue, pois lança as ideias de Jesus em metáforas surpreendentes, dramatizando os momentos históricos para que alcancem uma sugestibilidade supra-histórica, para isso empregando símbolos e analogias”.
5.“... o termo logos aparece, no prólogo de João, em íntima associação com outras expressões de longo pedigree filosófico: panta (“todas as coisas”, isto é, o “universo”); kosmos (“mundo”); sarx (“carne”); en archêi (“no princípio”), etc.
Com esses argumentos, ele tenta mostrar que o escritor de "O evangelho segundo João" produz um texto que é voltado não apenas aos hebreus e descendentes, mas também aos gregos e outros estrangeiros com acesso e influência da cultura helenista, e, dentro dela, de elementos da filosofia grega. É como se esse evangelho fosse uma produção em sintonia com a proposta de Paulo de levar a mensagem cristã para os gentios, através de um texto que é capaz de levar o cristianismo mais próximo à cultura dos membros das comunidades fundadas em cidades gregas e romanas.
Para quem desejar ler o texto todo, que se preocupa com o conceito de lógos, segue a fonte:
TORRES, Milton R. A retórica joanina do Logos, Revista Caminhando v. 21, n. 2, p. 147-167 jul./dez. 2016.
Ontem estudávamos, em nossa reunião mediúnica, o capitulo 2 da terceira parte do livro “Amor e Ódio”, de Yvonne Pereira. O capítulo trata de um plano para incriminação de um personagem importante do livro.
Na parte de comentários, alguns membros deixaram escapar sua impressão sobre a perversidade do malfeitor, causada por orgulho e egoísmo. Outro companheiro se incomodou com o mal que a influência pessoal pode causar em um processo jurídico, quando este não corre segundo as regras estritas do direito processual. Tocou-nos a impiedade do nobre, capaz de mobilizar influências e manipular pessoas para obter nada mais que uma vingança pessoal.
Passadas a leitura e os comentários, veio a parte mediúnica. Como a reunião se faz via um aplicativo, em decorrência dos cuidados com a COVID-19, não temos manifestação psicofônica, apenas psicográfica, preces em favor de terceiros e o relato das percepções mediúnicas (ou anímicas, quem vai saber?) na nossa terceira parte.
A médium “Carla” (nome fictício) relatou sua percepção. Viu um espírito de um indiano, com barbas, descreveu sua percepção com algum detalhe, que lhe dizia, apenas:
“Se o ódio pode tanto, imagine o amor!”
Ela percebia com os olhos da alma o espírito passando por um campo, com uma mão espalmada, e à medida em que passava sobre a vegetação, que chegava à altura do quadril, as flores se abriam. É uma espécie de "poesia visual" uma imagem que reforça a frase e lhe dá significado.
De fato, uma nova perspectiva da leitura vinda de um espírito superior a nós, despertando nossa atenção para outra ótica do texto.
As emoções não terminaram aí. O colega “Jacques” pesquisou no smartphone e perguntou à médium, mostrando uma fotografia:
- O espírito é esse aqui?
Com alguma dificuldade, por estar passando uma imagem digital por uma câmera de vídeo, sem nome, Carla, após analisar um pouco, disse:
- Parece-se com ele. É sim.
Era Rabindranath Tagore, que estava sendo estudado por Jacques no início do dia. A frase única lembra sua prosa como o espírito “Um Jardineiro”, psicografado por Dolores Bacelar e publicado pela editora Correio Fraterno.
Passada a reunião, encontrei o seguinte capítulo do livro, que passo a reproduzir:
RESUMO
- A Vida?
- É o Amor.
- E o Amor?
- Vida.
Um Jardineiro (Tagore), psicografia de Dolores Bacelar.
Uma aluna da PUC Minas nos entrevistou sobre o espiritismo. Foram feitas diversas questões básicas. Acho que as respostas podem ser úteis aos leitores. Vou começar a publicar a partir de agora. Confiram.
01-Qual a definição de espiritismo. Pode ser considerado uma religião?
Resposta de Jáder Sampaio:
“Doutrina que trata da natureza, origem e destino dos espíritos, bem como de sua relação com o mundo corporal” (Allan Kardec em O que é o espiritismo).
Kardec concebeu o espiritismo como ciência de observação e filosofia com consequências morais. Ele entendia que as pessoas de qualquer religião poderiam ser espíritas, por se tratar de uma ciência da vida após a morte.
Como o espiritismo tivesse propostas distintas dos dogmas da Igreja Católica, não tardou que os livros espíritas fossem colocados no Index Prohibitorum, apreendidos em Barcelona e queimados em praça pública sob a ordem de um bispo.
Kardec, então, em dezembro de 1863 publicou um artigo em que divide o tempo em que vinha trabalhando em períodos, defendendo que o espiritismo entraria em seu período religioso. Meses depois ele publica “O evangelho segundo o espiritismo”.
Meses antes de falecer, ele publica uma conferência que fez na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, no qual defende que o espiritismo era uma religião no seu sentido filosófico, como laço ou comunhão entre os homens ligados por “sentimentos, princípios e crenças” mas não era uma religião no sentido de ter hierarquias, dogmas, culto, casta sacerdotal e cerimônias.
Diversos autores espíritas retomaram essa questão. Carlos Imbassahy propõe que o espiritismo é uma religião por admitir os ensinos de Jesus e os interpretar coerentemente com a Doutrina Espírita. Emmanuel, através da mediunidade de Chico Xavier explica em seu livro “O Consolador” que o espiritismo é ciência e filosofia com fins religiosos. Essa é a visão da maioria dos espíritas brasileiros quanto ao caráter do espiritismo.
Há, no entanto, uma minoria de espíritas que defende a tese do espiritismo laico, um espiritismo que seria apenas ciência e filosofia.
Com as cartas de Kardec talvez possamos ter uma noção mais próxima de algumas decisões que ele tomou quando adotou o pseudônimo e o encargo de estruturar os ensinos dos espíritos.
Depois de ler e reler durante anos a obra dele, há mais de uma década me chamou a atenção o texto publicado na Revista Espírita em dezembro de 1863 (Período de luta), no qual ele propõe uma sequência de períodos para o espiritismo, que ele se encontra no período de luta e que ele entrará no período religioso. Em abril do ano seguinte Kardec publica “O evangelho segundo o espiritismo”, sua obra mais influente e mais vendida no Brasil.
Um dos fatores para essa decisão parece-me ser o chamado “auto de fé” de Barcelona. Mais do que divulgar a doutrina na Espanha, ele tem um significado simbólico. Até a queima dos livros espíritas em praça pública, a linha de pensamento de Kardec era a de que o espiritismo não seria uma religião, que cada espírita teria a sua, e que, como o conhecimento espírita era uma ciência e uma filosofia, ele contribuiria com o avanço das religiões e sua relação com o mundo das ciências, muito debilitada na França de sua época. A partir do auto de fé ele percebe que o caminho dos espíritas não seria o da aceitação pelos núcleos religiosos então estabelecidos.
Hoje penso que há mais um fator a se considerar. As viagens espíritas que ele fez nos anos anteriores ao texto Período de luta.
O cristianismo na França do século 19 foi muito fustigado pelo iluminismo e pelas ciências, por consequência, pela literatura, mas continuava sendo uma espécie de referência moral que regia as relações sociais e influenciava as leis. A educação, tão cara a Kardec, tinha em sua tessitura uma enormidade de instituições cristãs, que não conseguiram ser substituídas pelo ensino leigo, senão no final do século 19, quando se criou o ensino público leigo.
Bem ou mal, os professores religiosos trabalhavam a moral cristã com seus alunos. Seja qual for sua orientação pedagógica, eles seriam uma “segunda linha” a mostrar às crianças e jovens uma série de valores. Na época de Kardec, as ideias do ensino leigo avançavam, e aos poucos, a ética e a moral eram condenadas ao interior das igrejas e ao seio da família.
Em 1860-1862, Kardec, que já se correspondia com espíritas de diversos lugares da França e do mundo ocidental, aceita os convites para fazer viagens de divulgação do espiritismo. Os leitores de suas obras queriam conhecê-lo e ouvir orientações para seus núcleos recém-formados.
Se me permitem fazer uma hipótese, penso que esse contato pessoal de Kardec com os grupos, e a hostilidade das religiões cristãs (umas mais, outras menos) com o espiritismo, fez com que ele pensasse em formalizar melhor a questão da ética e da moral. Se as igrejas não acolhiam os espíritas em seu seio, através dos mecanismos de estigmatização dos livros espíritas e dos que se aproximavam de seus núcleos, seria importante que os núcleos espíritas desenvolvessem também um ensino moral, derivado da ética cristã e das reflexões feitas a partir das consequências dos atos praticados em vida após a morte, obtidos pacientemente com a análise dos relatos dos espíritos.
Penso que o contato direto com os espíritas de toda a França, a percepção mais próxima de suas dificuldades, suas lutas, e talvez até de sua intimidade familiar influenciou o professor a entalhar um de seus mais luminosos brilhantes. Ele se deteve no ensino moral de Jesus, comentado à luz dos ensinos espíritas, e consolidou nas sociedades espíritas uma preocupação com a vida terrena, que não mais poderia ser delegada apenas à família, às igrejas e às escolas. Depois disso, os espíritas se preocupariam muito mais com a caridade e com a fraternidade, pensariam em instituições para acolher as pessoas vulneráveis e em outras ações sociais para o socorro do que hoje chamamos pessoas em situação de vulnerabilidade. O espiritismo refletiria ainda mais detidamente as relações entre as pessoas encarnadas, os deveres de família e muitos outros temas ligados à vida cotidiana. O espiritismo deixa de privilegiar a elaboração intelectual e científica dos fenômenos e dos ensinos espirituais, e dá atenção destacada ao convite de Cárita, que passeava pelas periferias de Paris e convocava as pessoas ao trabalho voluntário contra a fome, o frio e a ignorância.
Em fevereiro de 1862, Kardec comunica (Revista Espírita) que havia feito uma subscrição em favor dos operários de Lyon que passavam por alguma "aflição". Enviou 500 francos e publicou uma mensagem do espírito Cárita de agradecimento aos espíritas franceses que apoiaram a iniciativa.
É apenas, como diria o escriba, uma “hipótese de trabalho”. Quem sabe a correspondência nova que está sendo trazida à luz nos traga mais elementos para refletir sobre ela?
Tem uns livros que compramos e lemos imediatamente, sem perder o fôlego. Há outros que nos chamam a atenção ao ponto de adquirirmos, mas que vão ficando na estante da biblioteca por muito e muito tempo, até que um dia surge a motivação inesperada para ler.
Tal é o caso do interessante “E o amor continua”, organizado por Nilson de Souza Pereira, amigo de Divaldo Franco, mas composto de mensagens psicografadas por Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco, além de depoimentos das famílias e identificação de algumas das informações objetivas fornecidas pelos espíritos desencarnados, como nomes de parentes citados, eventos, datas, informações sobre a desencarnação, etc.
O livro tem outras curiosidades. Ele documenta a visita de Divaldo Franco ao Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, em 15 de maio de 1982 (quando fez palestra, enquanto Chico Xavier psicografava e psicografou uma das mensagens do livro) e comentando o evangelho no culto de assistência aos necessitados (em 29/07/1981), na mesma instituição. Ele documenta que Chico acolheu e trabalhou conjuntamente com Divaldo Franco já nos anos 1980, em Uberaba-MG.
Outra coisa que me chamou a atenção no livro, foi o que fizemos no último Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo: uma coletânea que nos mostra o mesmo espírito se comunicando por dois médiuns diferentes, no caso, dirigindo-se à família. As mensagens, sempre acompanhadas dos comentários e informações das famílias, que às vezes explicam não conhecer Divaldo, fornecem redações de seus afetos comunicantes ainda encarnados, tornam o livro ainda mais rico, embora contenha apenas as comunicações de cinco espíritos; seis, se compararmos também as mensagens de capa ditadas por Bezerra de Menezes aos dois médiuns, que foi publicada com forma de letra escrita à mão.
Chamou-me a atenção o “sotaque mediúnico” dos dois médiuns. Falta-me o conhecimento que seria próprio da área de letras para explicar, mas há algo no texto dos diferentes espíritos psicografado pelo Chico que me faz, como leitor, dizer: há a mão de Chico Xavier por detrás dos ditados, e o mesmo acontece com Divaldo Franco. A linguagem dos médiuns, por mais que façam um esforço de anulação da sua personalidade para serem mais fiéis ao ditado dos espíritos, trazem algumas de suas características. Talvez, se embaralhássemos as mensagens e as entregássemos a um leitor que conhece bem os estilos dos dois médiuns, ele fosse capaz de identificar, pelas singularidades de cada um, quem foi o escritor do ditado do além.
Independente das singularidades ou idiossincrasias mediúnicas, as famílias reconhecem seus afetos que se foram, identificam os nomes de outros familiares (ou, às vezes, são surpreendidos com familiares já esquecidos aqui, mas ainda atenciosos no mundo espiritual com seus parentes).
O título parece sugerir um duplo significado: fala da continuidade do amor das pessoas que desencarnaram por seus afetos que continuam jornadeando no mundo, mas também sugere o amor entre Chico Xavier e Divaldo Franco, apesar das turbulências do passado, coisa muito comum na trajetória dos relacionamentos humanos.
Não sei se o livro teve uma segunda edição (na verdade, ao pesquisar a capa, encontrei-o disponível como e-book), nem se está esgotado ou se é de fácil acesso aos que se interessarem por ele, mas se tiverem acesso a ele, não percam a oportunidade de conferi-lo por si mesmos.
Mapa obtido no CSI do Espiritismo mostrando para onde se mudaram os principais médiuns que trabalharam com Allan Kardec na elaboração das obras básicas e na Revista Espírita.
No último sábado, 03 de outubro, fizemos uma palestra para a
TV Célia Xavier sobre as novas pesquisas realizadas em torno de Kardec. Seu
principal objetivo foi apresentar os pesquisadores que vieram à cena nos
últimos anos e onde se pode ler sobre eles.
Inicialmente discutimos um tema polêmico: afinal, por que
realizar uma busca nos cartórios, arquivos e bibliotecas por novas informações
sobre Kardec, sua família e seus colaboradores? Defendemos cinco objetivos
diferentes. (Estão no vídeo)
No conteúdo, pinçamos algumas informações novas sobre a
família de Allan Kardec, encontradas por Charles Kempf, Carlos Seth Bastos e
pelos estudiosos da correspondência de Allan Kardec, na FEAL (Fundação Espírita
Allan Kardec) e no NUPES (Núcleo de Pesquisas sobre Espiritualidade e Saúde da
Universidade Federal de Juiz de Fora).
Alguns dados que modificam a percepção que tínhamos das
médiuns que trabalharam com Kardec foram repassados rapidamente. Esse tipo de
estudo não tem impactona compreensão da
doutrina, mas no entendimento que temos sobre as pessoas que trabalharam em sua
elaboração. De forma geral, as percebemos mais humanas, especialmente os médiuns,
o que torna o papel de Kardec ainda mais importante.
Outra coisa que tratamos foram as publicações do período
pós-Kardec na França, em que se destacam os livros de Adriano Calsone (Em nome de Kardec, e, Madame Kardec) e Simoni Privato (O legado de Allan Kardec).
Nos estudos comparativos das edições das obras de Kardec,
além dos comentários do tradutor Evandro Noleto Bezerra nas novas publicações
das obras básicas, temos o trabalho de Luiz Jorge de Lira Neto, publicado no
livro “O espiritismo da França ao Brasil”,
que analisa as modificações das doze primeiras edições de O livro dos
espíritos, período em que Kardec ainda estava encarnado. Marco Milani vem
publicando os resultados dos estudos comparativos entre as primeiras e a quinta
edição de A Gênese no periódico Dirigente
Espírita.
Como tive que saltar a conclusão do Marco em função do
tempo, segue aqui:
“ ... análises comparativas já realizadas permitem afirmar
que, sob o aspecto da coerência doutrinária e clareza do texto, a 4ª edição de A
Gênese mostra-se mais adequada do que a 5ª edição em diferentes passagens,
fazendo com que o estudo comparativo seja fortemente indicado a todo adepto
espírita.” Marco Milani, Dirigente Espírita, set./out. 2020, p. 9.
Os últimos blocos saem do papel e entram por outras mídias
adentro. Primeiro temos as Cartas de Allan Kardec e outros documentos, que têm
sido transcritos (eles são escritos originalmente à mão), traduzidos e
digitalizados em francês e português, texto e imagem. Dos lugares em que podem
ser lidos temos:
Finalmente, falo do documentário “Em busca de Kardec”, cujo roteiro foi feito pelo seu apresentador,
Karim Akadiri Soumaila e por Dora Incontri. Ele dá uma panorâmica sobre os estudiosos de Kardec
na França e no Brasil, bem como do espiritismo e dos fenômenos espirituais em
geral. Infelizmente, ele havia sido disponibilizado no YouTube, no link abaixo,
mas foi retirado.
Os pesquisadores Elizabeth Schmitt Freire, Alexandre Caroli Rocha, Victor Scio Tasca, Mateus Moreira Marnet e Alexander Moreira-Almeida publicaram na revista Explore um artigo intitulado “Testando a escrita alegadamente mediúnica: um estudo experimental controlado” (Testing alleged mediumistic writing: na experimental controlled study).
Essencialmente, foram estudados oito médiuns psicógrafos cujo nome não foi divulgado, em função do anonimato previsto pela ética de pesquisa. Foram fornecidos a eles 98 fotos de pessoas desencarnadas, fornecidas pelos parentes à pesquisa, com uma média de 7 a 46 fotos por sessão (p. 3). Os médiuns só tinham acesso às fotos no início da sessão, e o pesquisador que as levava não teve contato com os familiares das pessoas. Os médiuns pegavam na mesa as fotografias das pessoas que eles julgavam perceber e psicografavam uma carta aos parentes. A grande maioria dos médiuns comentou espontaneamente “que se sentiu confortável durante as sessões e que se sentiu confiante que foi capaz de entrar em contato com o desencarnado”. Os pesquisadores gravaram os comentários que os médiuns fizeram acerca das comunicações e os transcreveram, criando o que chamaram de “descrições”.
Após a coleta de dados, produziram-se 78 cartas e 64 descrições a partir de 18 sessões mediúnicas. Cada consulente (sitter) recebeu um conjunto de seis cartas e seis descrições, sendo uma das cartas e uma das descrições atribuídas ao parente ou amigo do qual ele desejaria ter notícias. As cinco outras cartas e as cinco outras descrições eram de desencarnados com o mesmo gênero e idade aproximada.
Essencialmente os consulentes avaliaram as cartas e as descrições com uma escala que tem 4 itens que vão de “estou certo que esta carta não se refere ao meu parente ou amigo” a “estou certo de que esta carta se refere ao meu parente ou amigo”. O mesmo foi feito com as descrições. Há classificações intermediárias, como “possivelmente se refere” e “possivelmente não se refere”.
Havia também uma escala para avaliar os itens de informação, mas não houve muita informação objetiva (informação que pudesse ser verificada, como profissão, roupas que vestia, instituições que participou, qualquer coisa que pudesse identificar objetivamente o espírito ou não) no conteúdo das cartas em geral (p. 5).
A análise das cartas e descrições (apenas as que seriam referentes aos desencarnados em questão) apontam, em geral, para sua não identificação. Vinte cartas não foram consideradas dos desencarnados ou provavelmente não o seriam. 19 descrições também ficam nesse grupo. 4 cartas foram classificadas como provavelmente ou certamente escritas pelos desencarnados que se desejava contatar. 6 descrições provavelmente seriam dos desencarnados.
Os dados acima podem ser vistos no gráfico de colunas abaixo:
Figura 1: Escores obtidos dos consulentes referentes às cartas e descrições dos desencarnados que eles desejavam contatar, realizada a partir da Escala de Avaliação Global.
Os pesquisadores concluem pela incapacidade da maioria dos médiuns em fornecer “informação anômala” sobre os desencarnados em condições experimentais rigorosas. Três hipóteses explicativas são aventadas para a explicação desses resultados:
1.Os médiuns não são capazes de obter informações anômalas;
2.Alguns médiuns são capazes de obter informações anômalas, mas os que foram estudados não;
3.Os médiuns participantes do estudo não obtiveram informações anômalas porque as condições da pesquisa foram muito restritivas e artificiais.
Os autores levantaram algumas condições que poderiam ser observadas nos próximos estudos com médiuns psicógrafos em busca de melhores resultados.
Independente do resultado obtido, o estudo merece a leitura dos espíritas, especialmente os que praticam a mediunidade, no sentido de possibilitar debates e reflexões sobre as reuniões que mantemos, as capacidades reais de nossos médiuns e o que podemos ou não oferecer ao grande público com segurança, em matéria de informação.
Outros estudos com médiuns já mostraram resultados com informações objetivas fornecidas por médiuns que não poderiam tê-las obtido por aprendizagem ou mesmo fraude, mesmo em estudos experimentais controlados. Que possamos aprender com os fatos e desenvolver mais os cuidados que dispensamos na identificação, desenvolvimento e educação dos médiuns, bem como com a avaliação, confirmação e divulgação de informações obtidas pela via mediúnica.
Elizabeth Schmitt Freire, Alexandre Caroli Rocha, Victor Scio Tasca, Mateus Moreira Marnet e Alexander Moreira-Almeida, Testing alleged mediumistic writing: na experimental controlled study, Explore, New York, Elsevier, 2020 (article in press)
Ontem fizemos uma exposição sintética do livro “Revisão do cristianismo” a convite da Fundação Maria Virgínia e Herculano Pires (https://www.youtube.com/watch?v=eIB1YtN75gg). Dentre as muitas coisas que Herculano convida a rever no cristianismo, um grande conjunto delas tem um impacto muito grande sobre o nosso entendimento dos ensinamentos do mestre galileu: os mitos.
Influenciado pelo convite Kardequiano de analisar racional e historicamente os evangelhos e documentos dos primeiros cristãos, Herculano mergulhou nas reflexões que os autores do final do século 19 e início do século 20 fizeram a partir de uma mudança de atitude na pesquisa da história do cristianismo. Em vez de fazer uma história atrelada à teologia, autores como Guignebert trabalharam na desvinculação das duas e na construção de uma história baseada na historiografia da época, nas descobertas arqueológicas, na limitada documentação ainda existente, e na comparação do cristianismo com outras religiões, ou seja, concebendo-o como uma religião e não como a religião.
Na medida em que o cristianismo deixa de ser contado como uma “vinda de Deus à Terra” e passa a ser visto como um movimento dos homens, algumas ideias até então interditas ao historiador do cristianismo começam a ser percebidas.
Uma delas é bem simples: os evangelhos não foram feitos a partir do registro exato do que disse Jesus e de sua preservação para o futuro. Os discípulos de Jesus o conheceram e ouviram o que ele ensinava. Com a morte e a percepção de Jesus após a desencarnação, os discípulos entenderam que a mensagem dele deveria ser divulgada, e começaram a ensinar, primeiro aos judeus e depois a todos os que se interessassem, o que eles se recordavam ou entenderam que havia sido ensinado.
Dos evangelistas que eram alfabetizados, talvez Mateus tenha feito anotações de suas memórias, sob a forma de logia, frases ou pequenos períodos encadeados. Hoje os historiadores propõem que o evangelho de Marcos teria vindo da tradição de Pedro, ou seja, João Marcos, ou os hagiógrafos que escreveram o texto desse evangelho, teriam ouvido e escrito os ensinamentos cristãos cuja tradição remonta ao pescador de Cafarnaum.
Além de não serem registros históricos, de serem textos posteriores às cartas de Paulo, e de serem registros de ensinos orais dos discípulos, concluídos anos ou décadas após o episódio do Gólgota, é bem possível que estejam entremeados com mitos judaicos ou pagãos, é o que reflete Herculano Pires ao longo do seu livro.
O mito não é, em si, uma falsidade, uma irrealidade, como nos explica o filósofo paulistano, mas uma proto-explicação ou explicação não racional, que se origina no interior da alma humana. Enxergar Jesus como o messias, o “ungido”, aquele que veio salvar o povo hebreu da escravidão e associá-lo aos sinais entrevistos na leitura e interpretação dos profetas, seria uma primeira “tentação” dos apóstolos ou dos que participaram da redação dos textos que posteriormente foram escolhidos para compor o Novo Testamento.
Herculano não se propõe a separar o mito da narrativa nos evangelhos, mas faz algumas análises. Ele entende que boa parte da natividade pode ser mítica, porque apresenta eventos improváveis e que “ajustam” a figura de Jesus à do messias. O nascimento em Belém, por exemplo, o “censo” que exigiria que os habitantes saíssem de suas cidades para as cidades onde nasceram, a declaração de morte das crianças por Herodes, a estrela de Belém que guia os Reis magos e a fuga para o Egito fazem parte dessa mitologia tardia inserida nos evangelhos. Herculano busca mitologemas semelhantes em outras religiões da época para mostrar que é possível que tenha havido uma interpolação de mitos e histórias sagradas na história de Jesus para que ele pudesse ser considerado o messias dos Judeus ou um Deus para os gregos ou romanos. A partir do século quarto, muitos elementos do paganismo irão ser empregados pelas comunidades cristãs para que seus concidadãos aceitem mais facilmente o prestígio do cristianismo junto ao Imperador Constantino, até tornar-se religião oficial do império romano, décadas depois.
Não seria demérito que Jesus tivesse nascido em Nazaré, filho de Maria e José, com irmãos e tivesse vivido no lar de um carpinteiro. Mais humano, ele se torna mais extraordinário aos nossos olhos, porque nessas condições desfavoráveis ele se torna capaz de interlocução com os estudiosos de sua cultura e de sua época, e é capaz de elaborar uma proposta de ser humano, de vida e de sociedade completamente diferente daquilo que existia e que se vivia em seu tempo. Cercado por socidades que "naturalizaram" a instituição da escravidão, por exemplo, Jesus propõe tratarmos a todos como pessoas, filhos do pai. É uma concepção além do tempo e do lugar em que Jesus viveu, além das escrituras judaicas e, incomodamente possível.
Essa abordagem racional e histórica não nos leva a desvalorizar os evangelhos, as cartas dos apóstolos e os documentos que os cristãos produziram nos primeiros séculos, mas exige uma leitura crítica, um olhar histórico, capaz de entender que o texto, quando se aproxima do mito, não é um conjunto de “verdades ocultas” cujas alegorias devem ser descobertas pelo leitor, mas uma expressão vívida dos ensinos de Jesus, a par com o desejo de reconhecimento do mestre pela sociedade da época por seus apóstolos e discípulos.
A proposta de Herculano é intelectualmente corajosa, porque é revisionista não só do cristianismo das igrejas, mas por propor aos espíritas uma atitude mais racional no que tange ao estudo dos evangelhos. Concordando ou não com Herculano Pires, o livro merece ser estudado, debatido e entendido por nós sem a pretensão de verdade absoluta, mas com a pretensão de rigor e honestidade intelectuais.
Publicamos na revista Reformador de setembro de 2020 uma síntese breve de alguns resultados obtidos pela pesquisa recente da mediunidade, realizada pelos pesquisadores do Windbridge Institute, nos Estados Unidos.
Durante anos a pesquisa dos fenômenos de efeitos intelectuais, como os denomina Allan Kardec em O Livro dos Médiuns, esteve parada em função das escolhas feitas pela comunidade de pesquisadores. Muitos, como Rhine, optaram por interromper a pesquisa de fenômenos de efeitos físicos, por entenderem que sempre que um médium era pego em fraude, os demais resultados obtidos eram postos em questão, inviabilizando o avanço do conhecimento. O pesquisador resolveu estudar fenômenos mais simples, como a telepatia, empregando cartas e o método experimental, capaz de identificar probabilisticamente a obtenção de resultados superiores por determinados grupos de pessoas.
Muitas críticas e explicações alternativas foram levantadas por céticos, na explicação dos fenômenos mediúnicos:
1)Leitura a frio (cold reading), segundo a qual o médium percebia reações faciais mínimas dos seus consulentes, o que possibilitaria o direcionamento dos conteúdos das mensagens.
2)Fraude: ou seja, os médiuns “fabricariam” suas mensagens com a finalidade de manter seu “negócio” (nos países de língua anglo-saxã a mediunidade pode ser paga) ou sua reputação de médium.
3)Tendência dos consulentes a acreditarem em conteúdos genéricos escritos por médiuns. A fragilidade emocional da perda de entes queridos e do luto tornaria mais frágeis as análises dos familiares que desejam “ter notícias” de seus afetos, então eles tomariam como elementos de identificação dos seus familiares falecidos, frases e expressões genéricas.
Uma pesquisadora em especial, a Dra. Julie Beischel, com PhD em Farmacologia e Toxicologia pela Universidade do Arizona, após conhecer o trabalho de médiuns por razões pessoais, resolveu estudá-los, controlando todas essas possibilidades levantadas pelos críticos.
Beischel, então, montou experimentos com médiuns nos quais o consulente não tem acesso ao médium, e vice-versa. A pessoa que deseja uma mensagem repassa algumas informações para o pesquisador que chamaremos número 1. Ele repassa as informações para o pesquisador número 2. Os médiuns, previamente selecionados (certificados) por serem capazes de obter informações precisas sobre pessoas desencarnadas, só têm contato com o pesquisador número 3, que lhes repassa mínimas informações de duas ou mais pessoas. Esse pesquisador pede ao médium que identifique características objetivas, se possível, do respondente. Entre elas temos: aparência física, personalidade, hobbies, causa da morte e o que ele deseja dizer ao parente, por exemplo.
O médium, portanto, sem ter como identificar o espírito, e sem ter acesso ao familiar, psicografa e entrega seus resultados ao pesquisador número 3. Ele terá psicografado em uma sessão as mensagens de duas pessoas com o perfil semelhante. O pesquisador entrega seus resultados ao pesquisador 2, que irá dividir as mensagens em conjuntos de frases, cada uma contendo uma informação. Então ele entrega inicialmente essas mensagens “divididas” ao pesquisador 1, que as entregará ao consulente para avaliação.
Nessa fase da pesquisa, o consulente recebe duas mensagens. Uma atribuída pelo médium ao seu parente falecido e outra de algum espírito com perfil semelhante. Ele deve olhar frase a frase e identificar se a informação apresentada é verdadeira ou não. Ao final, tem-se uma pontuação para a mensagem do parente (que o consulente não sabe quem é) e para a mensagem do chamariz (o outro espírito com dados gerais semelhantes). Essa estratégia faz com que se evite a “tendência a acreditar”, porque os consulentes avaliam as mensagens sem saber qual delas foi atribuída ao seu parente.
O pesquisador 1, entrega então as duas avaliações para o pesquisador 2, que sabe qual mensagem é a do parente desencarnado. Ele verifica então o percentual de respostas certas, compara com o da mensagem chamariz e analisa com um teste estatístico se a diferença de pontuação sugere ou não que sejam espíritos diferentes. Com uma probabilidade de pelo menos 1 em 100 (mas geralmente maior), ele então conclui pela autenticidade ou não da mensagem atribuída ao parente desencarnado.
Dra. Beischel tem obtido muitos resultados favoráveis à mediunidade. Os médiuns não acertam 100% das informações, mas as diferenças entre a mensagem do parente e a mensagem chamariz têm sido favoráveis ao primeiro, ou seja, sugerem que os médiuns são capazes de obter informações verdadeiras e estatisticamente superiores às das mensagens chamariz.
Esse é apenas um dos diversos resultados que a pesquisadora tem conseguido, estudando mediunidade com o método experimental. Mais informações podem ser obtidas no artigo que escrevemos para o Reformador de setembro de 2020, nas páginas 50 a 53. Hoje a revista da Federação Espírita Brasileira pode ser assinada e acessada em computadores, notebooks, ipads e até smartphones. Importante que nós, espíritas, possamos acompanhar trabalhos de pesquisadores como Julie. Parte de suas pesquisas foi publicada em um livro escrito para o grande público com o nome Among mediuns, e pode ser comprado em inglês por pouco mais de dez reais nos sites da Amazon.
Outras publicações dos mesmos pesquisadores podem ser lidas no EC:
Clique na imagem acima e acesse a entrevista no YouTube
Lembro de Elaine ainda muito jovem no movimento espírita. Papai fazia algum dos seus estudos em um evento da região oeste de Minas Gerais e eu havia ido junto com ele. Lembro-me da quase xará de Elaine, a Eliane de Divinópolis conversando comigo sobre os autores de livros espíritas. Eliane me convidou para uma palestra e, de imediato, Elaine me convidou para ir a Pains-MG.
Foi uma palestra no Messe de Luz, com o Breno implicando porque eu havia escolhido um terno jeans e tinha deixado o cinto em Belo Horizonte. Lembro como hoje de falar de "O Livro dos Espíritos" e de discutir com os presentes sobre Deus, o espírito e a matéria. Lembro de acordar no outro dia bem cedo para poder pegar o ônibus que ia para Belo Horizonte. Eu estava acostumado a acordar às seis e tive que acordar ainda de noite para não perder a condução.
Depois foi um encontro regional sobre mediunidade, que tive o prazer de ir com a Telma Núbia, ainda encarnada. Conversamos sobre a prática e a teoria da mediunidade com os espíritas da região, e apresentamos algumas das analogias dos mecanismos da mediunidade apresentada por André Luiz em seu livro com o mesmo nome.
Elaine no C.E. Renascer, em Marabá - Pará
Após a Elaine, veio a Clícia, sua filha, e a relação com o movimento espírita da região oeste continuou nos mantendo na estrada, tratando de evangelização infantil, de sonhos, de mediunidade e de muitos outros temas.
Passados todos esses anos, tenho acompanhado à distância a Elaine e sua luta pela saúde. Toda a contribuição dela na região oeste não foi o suficiente. Ela mudou-se com a família para o sul do Pará e lá continuou seu trabalho de divulgação e estudo do espiritismo. Vejo as gerações novas surgindo no espiritismo, e sua história ficava apenas entre os muitos espíritas que a acompanharam em seu desejo de levar a quem fosse possível a doutrina de Allan Kardec, Bezerra de Menezes e Chico Xavier. Uma história de vida como essa não devia ser esquecida. Alguém deveria contá-la aos que hoje frequentam os centros espíritas que ela fundou, os que tiveram familiares acolhidos por ela, os que nasceram em família espírita porque os pais aceitaram seu convite de estudo e trabalho, os que tiveram parentes da roça trazidos às cidades "Deus sabe como" para serem ouvidos e cuidados da forma possível.
Então fizemos esse programa, com a Clícia, que hoje está em Arcos-MG, o Élcio Farnese, que hoje está em Uberlândia, o Mário Lúcio que está em Patos de Minas e a Marluce, de Uberaba, mas que está em Marabá, no Pará. Todos trabalharam com Elaine e têm algo a dizer sobre ela. Têm "causos" para contar. Têm eventos engraçados, outros admiráveis, outros curiosos. Têm o que agradecer e o que lembrar. Espero que vocês gostem.
“Esquina do Célia” é um programa mensal de “bate-papo” sobre temas doutrinários, que acontece no segundo sábado do mês. Em julho entrevistamos Luciano Klein, historiado, sobre suas pesquisas acerca de Bezerra de Menezes. https://www.youtube.com/watch?v=sUgHTF-0cRg&t=58s
Em agosto entrevistamos Izabel Vitusso, jornalista, sobre os livros e a vida de Dolores Bacelar, que tem seus livros publicados pelo Correio Fraterno. https://www.youtube.com/watch?v=9sGLKpFZWjs&t=41s
Agora em setembro, entrevistamos Samuel Magalhães, contador que trabalha voluntariamente na preservação da memória do movimento espírita. Samuel fala de sua iniciação no espiritismo, que é surpreendente, e da criação dos Centros de Documentação em quatro estados.
Ele dá detalhes da pesquisa e da elaboração de seus livros “Charles Richet: o apóstolo da ciência e o espiritismo”, e “Anna Prado: a mulher que falava com os mortos”. Os dois trabalhos se mostram ligados ao espiritismo no norte do Brasil (Pará e Amazonas), que tinha canal direto com a Europa no século 19, em decorrência das riquezas decorrentes do ciclo da borracha e de sua infraestrutura portuária e de transporte fluvial.
Samuel fala da trajetória da construção do conhecimento, seu encontro com familiares das pessoas estudadas, documentos, mudanças de concepções pré-existentes (Anna Prado é do Amazonas e não do Pará) e novas informações (a desencarnação de Anna Prado). O livro sobre Richet foi considerado por Gabriel Richet a melhor biografia já escrita sobre seu avô, Nobel de medicina, um dos fundadores da metapsíquica, esperantista e estudioso de fenômenos espíritas com Gabriel Delanne. O livro hoje se encontra na biblioteca da Universidade de Paris.
Assista a entrevista no YouTube com o seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=6HEBuEwuaQE
Ou acesse YouTube – TV Célia Xavier – Esquina do Célia e escolha a entrevista
Nesses livros, os voluntários de centros espíritas são estudados. O que motiva os voluntários espíritas? Qual é a relação entre trabalho voluntário e fé? Quais são os valores do espiritismo? O que dizem os antropólogos sobre o espiritismo? O trabalho voluntário pode ser fonte de prazer e sofrimento, como o trabalho profissional? Essas e outras questões são discutidas nos dois livros.
O Projeto Allan Kardec lançou ontem os cinquenta primeiros manuscritos (cartas e anotações) de Allan Kardec. É uma parceria entre a Fundação Espírita André Luiz (FEAL) e a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
As imagens dos documentos, suas transcrições (em alguns casos) e suas traduções para a língua portuguesa estão disponíveis ao público.
As que foram disponibilizadas são do arquivo Canuto Abreu.
Já li algumas, e elas nos mostram mais a pessoa de Kardec, interagindo com interessados no espiritismo de uma forma geral, até mesmo com espíritos. A primeira impressão foi de uma pessoa gentil e cuidadosa com os que o procuravam, com uma formalidade mínima, mas com franqueza na escolha das palavras.
Um tema que marcou profundamente a cultura brasileira e que podemos entender como uma “doença da sociedade” a ser tratada é a questão da escravidão. Como costuma acontecer, hoje nossa legislação proíbe o trabalho escravo, que vez por outra ainda sobrevive em rincões do país continental, mas a instituição da escravidão ainda está nas nossas mentes e é passada entre gerações.
Estou publicando esse texto no Espiritismo Comentado em homenagem a Bezerra de Menezes, que enquanto encarnado trabalhou pela abolição da escravatura, uma abolição que incluísse os escravos brasileiros na sociedade, e que após desencarnado continuou escrevendo sobre o tema. É uma questão muito cara ao cristianismo e ao espiritismo.
O Brasil é o país das Américas sem o “sonho americano”. Para a grande maioria dos brasileiros, o trabalho ainda não é a via promotora da ascensão e da independência do trabalhador. Um efetivo imenso de trabalhadores em nosso país recebe um salário tão ínfimo, e agora tão despido de garantias sociais, que não lhes permite manter uma família com um ou dois filhos, e quiçá até a si mesmo. O que causaria espanto nos países europeus ou na América do Norte, continua sendo visto como “natural” por um número majoritário dos brasileiros.
Ainda hoje há um grande efetivo de trabalhadores que são incapazes de se sustentar com seu próprio trabalho, legal e registrado e vivem em situação semelhante à vida nas senzalas. Com alimentação precária, sem instalações sanitárias mínimas, sem o direito à intimidade em função da precariedade do espaço, com acesso precário ao atendimento médico e dentário, muitos sem possibilidade de educação dos filhos ou acesso a instituições escolares tão aviltadas que são incapazes de assegurar a mínima formação cultural e profissional, sem direito efetivo à segurança e vivendo em relações de extrema violência.
A lei áurea data de 1888, mas a mentalidade escravagista, que acha natural que um trabalhador não se possa sustentar, não tenha capacidade de estudar, deva se contentar com um “bom patrão”, manteve diferenças absurdas em nossas leis, como uma espécie de trabalhador de “segunda linha”, os domésticos, que apenas em 2015 obtiveram direito a Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, adicional noturno, seguro-desemprego, entre outros direitos já assegurados a outras categorias de trabalhadores.
Uma grande massa de pessoas prefere as ruas das grandes cidades, lavando e “cuidando” de carros, vendendo objetos ou mesmo mendigando para viver e, talvez, recebam mais dinheiro que aqueles que trabalham.
Não bastasse esse país surreal, para não falar da criminalidade organizada e sua capacidade de recrutar jovens recém saídos da infância para as instituições do tráfico de entorpecentes e alucinantes, do furto e do roubo violento, ainda subsistem famílias e pequenas comunidades, em aglomerações sem acesso por estradas asfaltadas, em terras áridas ou improdutivas, em condições tão piores que as periferias e as ruas das grandes cidades, que alimentam continuamente os fluxos migratórios em busca, se bem sucedidos, da vida nas favelas ou nas ruas, que significa para eles algum avanço social. Esses têm ainda filhos sem acesso a postos de saúde, sem escolas, sem nada. Vivem sob o signo da esperança do socorro divino, quando têm o consolo de uma religião.
Enquanto tudo isso for visto como “normal” ou “natural” pelo brasileiro comum e, consequentemente, por seus representantes nos diversos órgãos de estado, continuaremos sendo escravagistas, mesmo depois da assinatura da lei áurea. Defenderemos a liberdade com as palavras, mas remuneraremos os que trabalham com valores tão mesquinhos que não assegurarão o mínimo: habitação, saúde, alimentação, educação e cultura. Enquanto não percebermos que toda pessoa humana tem direito a uma dignidade mínima e a viver com essa dignidade a partir de seu próprio trabalho, o tempo vai passar e continuaremos reproduzindo no Brasil a essência da antiga sociedade de senhores e escravos, considerada equivocadamente um mal do qual não se pode ficar livre em curto prazo, porque “as coisas sempre foram assim”.
O prof. Humberto Schubert fala do "lugar da filosofia".
O desconhecimento da filosofia pela grande maioria da população brasileira faz com que se misturem questões filosóficas com científicas e as pessoas considerem determinadas posições de cientistas como se fossem verdades.
Uma dessas confusões, por exemplo, é a resposta da questão "o que é a vida?", que implica na resposta de "quando a vida começa" e de "quando a vida termina".
A vida é um conceito filosófico, não científico, com implicações seríssimas para o dia-a-dia de todos nós. Vi, por exemplo, um argumento muito falacioso, ser tomado como "verdade científica", muito recentemente.
Um médico me disse que o critério utilizado para o "fim da vida" pela medicina é a morte encefálica. Então, argumentou, falaciosamente, que o funcionamento cerebral é a demarcação do fim da vida. Logo, conclui, a formação do cérebro deve ser usada como o critério do "início da vida", e ela se dá a partir de três meses (afirmou ele, eu não sei).
Uma jovem me disse que "cabe à ciência" e não à religião estabelecer o início da vida.
Pois bem, em uma ótica filosófica, há muitos erros de argumentação em todas as afirmações.
O estabelecimento da morte pela medicina, é um conceito operacional. A "morte" para os intensivistas é estabelecida a partir dos recursos técnicos disponíveis. Se não houver possibilidade de recuperação, considera-se a pessoa morta. Isso se tornou muito importante com o avanço da medicina e o desenvolvimento da tecnologia de medicina intensiva. Antes os médicos consideravam a parada cardiorrespiratória como o "critério" de morte. Eles assim o faziam, não porque o coração e os pulmões fossem considerados como órgãos da vida, mas porque sua parada denotava o fim dos recursos da medicina. Com o tempo, a medicina aprendeu a ressuscitar e manter as funções cardíacas e pulmonares, através de aparelhos. E constatou algo ainda pior: ela poderia manter um corpo funcionando mecanicamente por muito tempo, e se os aparelhos fossem desligados, toda a vida orgânica cessaria. Surgiu então um novo desafio: até quando o corpo pode ser considerado "vivo"? E mudou-se o critério graças às novas tecnologias, da seguinte forma: quando o encéfalo "parar de funcionar", estabelece-se a "morte encefálica", porque esse organismo não sobrevive sem o auxílio de equipamentos, e não há recursos para que volte a funcionar de forma autônoma e consciente. Se houver um avanço na medicina e surgirem recursos para a recuperação de algumas funções encefálicas que hoje não são recuperáveis, esse conceito irá mudar novamente.
Então, a medicina ou as ciências não definem o que é vida, nem o que é morte. Esse é um trabalho filosófico. Significa dizer que na filosofia de orientação materialista, definir-se-á vida com base no organismo, porque o filósofo materialista "definiu" vida a partir do funcionamento da matéria. Um filósofo espiritualista tem uma visão muito diferente, porque, por exemplo, aceita o conceito de alma. Um filósofo cético radical vai considerar impossível a definição de vida, porque o conhecimento não é possível. Não importa o quanto as ciências avancem, a concepção de vida e morte é uma questão filosófica, e não científica. Não é possível esperar de um cientista a solução de questões como "o que é a vida", de forma imparcial. Se ele tentar responder, o fará com base em uma posição filosófica, que não necessariamente é a única, nem a verdadeira.
Isso nos mostra como é importante saber discutir a questão ciência-religião, que o prof. Humberto apresenta muito rapidamente na apresentação acima. Além dessas duas formas de conhecimento, há o conhecimento filosófico. Isso é muito importante no momento de pandemia em que passamos, no qual perguntas legitimamente científicas, como "há um tratamento eficaz para o vírus da COVID", sai da esfera das ciências, e se torna dogma político. As pessoas escolhem um determinado medicamento, não com base nas evidências, mas na confiança que têm em um determinado líder, que se baseia em vozes não consensuais (mas minoritárias) no campo das ciências.
Outra conclusão que podemos tirar da questão acima, tratada de forma superficial, de "o que é a vida", é que se aplicarmos o mesmo critério da medicina intensiva para estabelecer um critério para o aborto, o início da vida é a fecundação. Parece paradoxal, mas não é. Se o critério para o estabelecimento da morte, é a "ausência de recursos para o restabelecimento do funcionamento do organismo humano", o mesmo critério aplicado à vida seria o ponto a partir do qual o organismo se desenvolve naturalmente, torna-se viável, desde que não haja algum impedimento técnico. Esse ponto, é o da fecundação do óvulo pelo espermatozóide.
Em uma abordagem filosófica, o argumento da formação inicial do encéfalo, como critério do surgimento da vida é falacioso. E isso traz muitas implicações éticas com as quais até mesmo os médicos não querem tratar, como, por exemplo, os óvulos que foram fertilizados "in vitro". Seriam eles seres de direito? Pode-se fertilizar e descartar os que não forem inseminados artificialmente? A concepção da vida a partir da fertilização dos óvulos incomoda a muitos interesses, não é mesmo?
Temos um conflito de propósitos no meio espírita que precisa ser bem refletido. De um lado, atitudes contra o orgulho e a bajulação, capazes de fazer "inchar o ego" de uma pessoa, fazê-la acreditar ser melhor do que realmente é. De outro, temos a importância do reconhecimento, do afeto e da memória.
Estava lendo uma área da fronteira entre psicologia e sociologia, chamada psicologia do trabalho, para um evento da ABRAPE (Associação Brasileira de Psicólogos Espíritas). Christophe Dejours, um de seus autores franaceses bem conhecido, teorizou sobre a importância do reconhecimento para se ter um trabalho prazeroso, reconhecimento pelos pares, pela coordenação, por aqueles que se beneficiam com o trabalho de alguma forma. Há muitos anos temos trabalhado pela preservação da memória do movimento espírita. A professora Míriam Hermeto nos lembra que:
"... todo grupo social tem o direito de produzir cultura e de se apropriar da cultura que ele próprio produz e daquela em que está inserido. Mas, muitas vezes, não se conhece a existência destes direitos e tampouco se reconhece a sua importância." (Motta, 2003).
Associando as duas coisas, com a finalidade de não esquecer as pessoas que fizeram nossa casa e nossa história, a TV Célia Xavier criou o programa "Papo das 10", que iniciou-se no último domingo às dez horas da manhã. No primeiro programa, Najla levou Pedro e Anésia Machado, que estão conosco na Associação Espírita Célia Xavier há muitas décadas. O programa trouxe muito afeto, mostrou como eles criaram uma tessitura de amigos, de companheiros de trabalhos, de memórias, envolvendo diversas cidades e grupos espíritas, ao redor do seu trabalho voluntário. Com certeza, o programa emociona a quem os conhece e a quem é trabalhador no Célia Xavier, de forma especial, mas todos poderão ver como é importante mostrar o afeto na telinha e lembrar juntos os caminhos por onde se passou.
Crianças pequenas sendo educadas (principalmente cuidadas) no Lar da Criança Emmanuel
Sábado passado foi noite de "Esquina do Célia", um programa de entrevistas da TV Célia Xavier. A convidada da noite foi a dinâmica Izabel Vitusso, da editora e jornal Correio Fraterno, e atual presidente do Lar da Criança Emmanuel. O assunto da noite foi a mediunidade de Dolores Bacelar.
O trabalho com as crianças, inicialmente um orfanato, atraiu Dolores Bacelar ao Lar da Criança Emmanuel, nos anos 1980. Ela se interessou tanto pela iniciativa, que doou os direitos autorais de toda a sua obra psicografada para eles.
Dolores era médium mecânica e iniciou sua educação mediúnica na Federação Espírita Brasileira, no Rio de Janeiro, cidade em que foi morar logo após o casamento, onde o marido havia conseguido um emprego.
O primeiro livro, atribuído ao espírito Alfredo (que depois se descobriu tratar-se do Visconde de Taunay) foi "A Mansão Renoir", um romance espírita de muita visibilidade.
Izabel nos conta na entrevista a vida da discreta médium, alguns eventos mediúnicos e cada um de seus livros publicados pelo Correio Fraterno. Poesias, contos e romances são algumas de suas produções.
Meu autor preferido usa o pseudônimo de "Um Jardineiro", e nos parece ser Rabindranath Tagore, que recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 1913. Na entrevista conversamos sobre as características do autor bengali no texto psicografado pela médium. Uma das características que permanece após a morte é a tentativa de mostrar as semelhanças das diferentes tradições religiosas do ocidente e do oriente.
Não vou falar muito mais para não dar spoiler. Deixo com vocês uma foto bem elegante da médium com seu marido.
Hoje o Lar da Criança Emmanuel atende a duzentas crianças em dois grandes projetos, mas os recursos públicos, como acontece na maioria dos casos, cobre apenas parte dos custos. No site do lar, os paulistas e paulistanos podem ajudar destinando os recursos da Nota Fiscal Paulista para o Lar.
Quem estiver mais interessado em ajudar, pode doar um teclado para as aulas de musicalização que estão fazendo com as crianças maiores.
Há uns treze anos participei de um congresso no Paraná e os organizadores compraram uma passagem Maringá - São Paulo, que chegava de manhã e partia para Belo Horizonte à tarde. Em vez de ficar horas a fio no aeroporto, resolvi fazer uma limonada do limão e entrei em contato com a Izabel Vitusso, do Correio Fraterno. Ela gentilmente se dispôs a me levar ao Centro de Cultura, Documentação e Pesquisa do Espiritismo para conhecer.
Chegando em São Paulo, mudança de planos. Izabel me levou no Lar da Criança Emmanuel, em São Bernardo do Campo, antes de irmos ao CCDPE-ECM. Fiquei conhecendo também, por dentro, o Correio Fraterno. Como não perco a oportunidade de fazer uma boa matéria, e na época tinha fôlego de sobra, fotografei e colhi as informações que se transformaram na matéria sobre a creche que saiu dia 02/10/2007 - https://espiritismocomentado.blogspot.com/search?q=Tia+Lol%C3%B4
Depois, Izabel levou-me para conhecer o CCDPE-ECM. Fiquei conhecendo pessoalmente a Júlia Nezu, e, no almoço, fui convidado a ajudar a reativar o Encontro Nacional da Liga de Pesquisadores do Espiritismo.
Desde então, tem sido uma troca muito intensa entre o Correio, o CCDPE-ECM e o Espiritismo Comentado. O quarto Enlihpe já está na sua décima sexta versão, suspensa pela pandemia. O Correio Fraterno, então, nem se fala.
Por todas essas histórias e mais uma, que será contada ao longo da entrevista com Izabel é que a convidamos com muita alegria para falar dos livros da médium Dolores Bacelar, que são editados pelo Correio. Dolores já está no plano espiritual, mas sua imensa discrição fez com que ela ficasse pouco conhecida enquanto estava encarnada, apesar da qualidade literária e doutrinária de seus livros, que vez por outra aparecem no EC.
Quem é o espírito "Um jardineiro", que tem dois livros psicografados?
Dolores tem o seu "Parnaso de Além Túmulo"?
Um romance de judeus, assírios e persas?
Contos de diversos autores brasileiros desencarnados?
No afã de ler novos romances, os grandes autores espíritas vão ficando esquecidos pelo público espírita em geral. A história do espiritismo na Espanha é um capítulo especial, e deveria ser conhecido por todos.
Talvez a "pedra preciosa" da coroa do espiritismo espanhol seja Amália Domingo Soler. Uma mulher solteira, em uma sociedade na qual se desejava que ela casasse ou se tornasse freira, intelectual (mesmo que sem acesso à escolaridade formal), pobre, mas imensamente dedicada. Hoje, Amália é reconhecida como grande escritora espanhola de sua época, e há teses acadêmicas dedicadas a ela, como escritora e mulher.
Ainda hoje, o livro "Memórias do Padre Germano", ditado psicofonicamente pelo médium Eudaldo Pagés e escrito por ela, inicialmente em forma de contos, depois em forma de romance, é um dos mais impressionantes livros da literatura espírita.
O que ela escreveu? Como era o espiritismo na Espanha do século 19? Com quem debateu em sua época? Como se tornou uma mulher tão iminente em uma sociedade católica e masculina? Como lutou com a cegueira? Como se tornou um ponto de conexão entre o espiritismo na península ibérica e o nascente movimento espírita latino-americano? Ela era membro da maçonaria, mesmo sendo mulher?
Essas e muitas outras perguntas foram respondidas por Débora Zambalde Vitorino, tradutora dos textos ainda inéditos em português por Amália. São mais de dez anos recuperando material em língua espanhola, estudando, traduzindo, escrevendo e falando sobre Amália. Uma aula de erudição e recuperação da memória da jovem Sevilhana, cuja admiração pelos europeus superou o século, a cultura e até mesmo a religião.
Assista abaixo a entrevista:
Segue abaixo o link para os anais do Congresso Espírita Internacional de 1888, na Espanha, citado no programa acima: