JOVENS JUDEUS NO PÃO DE AÇÚCAR CONFRATERNIZAM COM SEU BLOGUEIRO CRISTÃO-ESPÍRITA (Foto da Júlia)
Oito de dezembro. Feriado em BH, dia de resolver problemas no Rio de Janeiro, que parece ter sido invadido por mineiros. As marcas de Minas Gerais estão por todo lado, como a disputa leal e gutural entre atleticanos e cruzeirenses na porta da agência dos correios atrás da embaixada norte-americana.
Depois do constrangimento na embaixada a que se submetem os que desejam conhecer as terras do Tio Sam, tão necessitada de turistas quanto temerosa de imigrantes ilegais e atentados a bomba, fomos aproveitar a vista maravilhosa do Pão de Açúcar.
Subir de bondinho até ficar ao nível das nuvens, ver de um ponto o calçadão de Copacabana e de outro as embarcações mais diversas na baía de Guanabara. Ver as construções centenárias da antiga capital do país, e num golpe de vista esbarrar com as paredes de concreto e tijolos dos edifícios residenciais separados da água salgada por vias qualhadas de automóveis de todos os tipos.
Não dá para não notar nos barracões morro acima, no lixo que enfeia a bela água verde azul, no subemprego que transforma jovens promissores em "chamadores de táxi", "tomadores de conta de celular", "flanelinhas" e outras ocupações criativas que não geram riqueza, mas mitigam a miséria e perpetuam a ignorância sob o olhar complacente (ou indiferente?) das autoridades.
O Pão de Açúcar é um lugar alugado (e caro!) aos turistas. Com um pouco mais de cinquenta reais/cabeça se pode alçar os céus e conviver por um momento na torre moderna da Babilônia, onde convivem as línguas inglesa, espanhola, alemã, francesa, idiomas neo-eslavos e outros cuja sonoridade singular nos faz pensar de onde vieram e para onde irão.
Uma excursão de jovens de origem judaica, inconfundíveis por seus Kippah multicoloridos sobre as cabeças masculinas, mesmo as imberbes, encheu de alacridade e alegria adolescente o ponto de parada das compras e lanches.
Eu me deixava ficar gostosamente em uma mesinha, enquanto a família olhava os muitos objetos de compra e venda aos turistas, e acompanhava com os olhos e ouvidos o ir e vir dos muitos visitantes que transitavam pelos espaços cuidadosamente construídos e reconstruídos para se passar uma manhã ou tarde em meio às alturas e nuvens.
A filha menor fotografava, matreira, coisas, lugares e pessoas, com seu olhar ora curioso, ora furtivo.
Em um segundo me vi cercado de jovens, que estavam abordando os descuidados como eu, aparentemente disponíveis, e perguntando:
- Você sabe o que é um Kippah?
Meu conhecimento era o trivial, mas dava para o gasto.
- Sei, sim.
- Então, o que é?
No inusitado, lancei mão do meu apurado mineirês:
- Este "negócio" que os homens usam sobre a cabeça.
Negócio, assim como trem, significa coisa e pode muito bem significar peça de vestuário, mas surtiu bem o efeito de se fazer entender.
- Ele sabe o que é um Kippah! Disseram quase em coro, e me vi cercado de jovens de origem hebraica que brotaram de diversos lugares e me pediram uma foto. O momento parecia merecer um registro. Minha filha não se fez de rogada e alinhou sua câmera às demais. Ela não se preocupou muito com o foco, só com o clique mágico, e aí nasceu a foto desta matéria.
Como não podia perder a oportunidade, perguntei a uma quase adolescente, que aparentava seus quatorze ou quinze anos:
- E você, sabe o que significa um Kippah?
Ela me respondeu, sem respirar.
- É o negócio que se coloca sobre a cabeça! Reafirmando o conceito que eu acabara de criar, num ímpeto.
- Nâo! Disse. Quero saber o significado...
Ela não se constrangeu e voltou a responder com prontidão, com um certo ar de obviedade, muito respeitoso.
- Ora, significa que Deus está acima do alto da cabeça dos homens!
Agradeci, não sem surpresa. Certamente ela não falava da geografia de Deus, mas deixava seus lábios repetirem uma sabedoria milenar, que era comum a cristãos, judeus e muçulmanos, além de todas as variações que o espírito humano criou destas três sólidas raízes da religião.
Eles se foram, igualmente álacres e felizes com o passeio. Depois um jovem, talvez com algo de mineiro no sangue, retornou e mostrou-me um Kippah verde, dobrado duas vezes, e checou comigo:
- Você sabe o que é isso?
- Um Kippah, respondi.
Ele pareceu satisfeito com a resposta, mas meio contrafeito. Deve ter perdido uma disputa, mas aceitava a derrota como bom desportista.
Eles se foram, mas Deus ficou comigo, em minha mente, na sabedoria da resposta adolescente, herdada dos antepassados, nas minhas meditações.