Foto 1: Jáder no 4o. ENLIHPE
Um dos assuntos amplamente abordados durante o IV Encontro da LIHPE – Liga dos Historiadores e Pesquisadores Espíritas, realizado em São Paulo, nos dias 27 e 28 passados, foi a produção acadêmica brasileira com temática espírita.
Pesquisadores e historiadores presentes no evento destacaram os desafios e dificuldades enfrentadas ainda pela resistência acadêmica, advinda na grande maioria das vezes do preconceito e do desconhecimento do que seja realmente o Espiritismo, doutrina científica e filosófica de conseqüências religiosas, codificada pelo francês Allan Kardec, que em 1857 lançou a sua obra básica, O Livro dos Espíritos, contendo perguntas e respostas sobre assuntos que envolvem diretamente a existência e o destino do homem, a criação e a imortalidade da alma – a vida do Espírito.
Ao final do evento, o psicólogo Jáder dos Reis Sampaio, um dos moderadores do grupo que se comunica pela internet há pelo menos seis anos, concedeu a entrevista abaixo, na qual abordou com clareza a dificuldade da produção acadêmica sobre temas ligados ao Espiritismo.
Premiado pela Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração – ENANPAD, Jáder Sampaio concluiu o doutorado em Administração pela Universidade de São Paulo em 2004. Atualmente é professor-adjunto da Universidade Federal de Minas Gerais, tendo publicado 11 artigos em periódicos especializados e 19 trabalhos em anais de eventos, participando de 57 eventos no Brasil. Atua na área de Psicologia, com ênfase em psicologia do trabalho e organizacional Também é consultor da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG, do Programa de Capacitação de Recursos Humanos – PCRH.
Entrevistadoras - Como você analisa a produção acadêmica com relação ao Espiritismo?
Jáder Sampaio - O assunto é mesmo complicado. Sobre a pesquisa na universidade, se você se declara espírita, ganha antipatia dos que se dizem marxistas, socialistas, ou seja de outras vertentes políticas e religiosas, o que costuma gerar também retaliações nos pedidos de pesquisa, ou na aceitação de nossos programas de pós-graduação.
Entrevistadoras - Você acredita que isso aconteça por puro preconceito?
Jáder Sampaio - Muitos acreditam que se tem escondido o propósito de fazer proselitismo sobre a Doutrina Espírita dentro da universidade.
Entrevistadoras - Mas o pesquisador não tem liberdade de pesquisar o que lhe seja de interesse de estudo?
Jáder Sampaio - Há um engano sobre isso. As pessoas ficam achando que o pesquisador tem liberdade, mas ele não tem tanto como imaginam. Não consegue recursos, tem dificuldade de desenvolver o projeto, de encontrar orientador que aceite seu projeto de pesquisa e acaba encontrando tantas outras dificuldades no dia a dia da universidade. Ele precisa ser muito corajoso e persistente para defender algumas teses.
Entrevistadoras - Há orientadores preparados para coordenar os trabalhos de defesa de tese sobre Espiritismo?
Jáder Sampaio - Há sim, nas mais diversas áreas, mas se você chegar com um tema, muitas vezes o orientador diz que não interessa orientar. Quando o tema do mestrando envolve o nome do orientador, ele fica cioso. Se ele aceita um tema relacionado ao Espiritismo e não faz uma crítica contundente, pode ficar mal visto pelos colegas e comunidade acadêmica. É mais seguro você escolher um tema já consagrado, aceito internacionalmente, e ficar produzindo o que já é aceito.
Entrevistadoras - Você acha que nas universidades, os acadêmicos ainda têm receio de defender temas como o Espiritismo?
Jáder Sampaio - Sim, e de temas novos de uma forma geral, especialmente os que possam ser considerados pseudociências ou ideologias. A Universidade é conservadora, em matéria de conhecimento e gregária em matéria de captação de recursos. De qualquer forma este receio é menor que no passado.
Entrevistadoras - O que você sugere para gerar o conhecimento espírita no mundo acadêmico?
Jáder Sampaio - Não sei se a melhor expressão é conhecimento espírita. Um dos papéis da universidade é gerar conhecimento. Os professores precisam ficar mais abertos para o estudo de temas que permitam discutir a existência do espírito, como o fizeram os intelectuais do século XIX. Na Inglaterra, por exemplo, a SPR oferece bolsas de estudos para jovens pesquisadores que desejam estudar temas ligados às ciências psíquicas. É necessário que os professores orientadores construam redes e promovam eventos com os resultados de seus trabalhos, aproximando colegas e comunidade. A imprensa espírita e em geral poderia ter uma atenção maior para cobrir os trabalhos concluídos, para que não se percam no esquecimento. Um segundo momento é construir redes internacionais e trazer pesquisadores do exterior que trabalham temas de interesse ao movimento espírita.
Entrevistadoras - Podemos vislumbrar mudanças com relação a essas posturas para um futuro próximo? Por quê?
Jáder Sampaio - Sim, porque em uma sociedade mais democrática, há mais possibilidade de voz para as minorias. Tenho acompanhado pela LIHPE e por outros canais de informação muitas iniciativas interessantes, como o estudo à base de exame de imagens que o Júlio Perez fez com médiuns nos Estados Unidos e o exemplar temático da revista de Psiquiatria da USP sobre espiritualidade, organizado pelo Dr. Alexander Moreira Almeida. No exterior existem revistas técnicas especializadas em parapsicologia e CAM - medicina alternativa e complementar, que têm apresentado resultados de trabalhos sobre passes e curas espirituais.
Entrevistadoras - Você, como acadêmico, percebe algum avanço para aceitação do Espiritismo, considerando-se seu tríplice aspecto – ciência, filosofia e religião?
Jader Sampaio - O Brasil tem deixado de ser uma sociedade exclusivamente católica para ser uma sociedade plural em matéria de religião. Não bastasse a diferença, o respeito entre os membros de religiões é maior. Uma vez aceito pela sociedade, esta passa a demandar uma visão do mundo acadêmico sobre o Espiritismo.
Entrevistadoras - Espiritismo não combina com o mundo acadêmico? Que ciência é essa?
Jáder Sampaio - É a ciência dos homens, que desejariam estar em um lugar terceiro, o lugar da verdade ou, pelo menos, do conhecimento rigoroso, mas que não conseguem superar seus medos e preconceitos na hora de fazer pesquisa.
São Paulo, 27/29 de setembro de 2008