Recentemente veio à mídia o caso do estupro de uma criança de 9 anos pelo padrasto. A menina engravidou de gêmeos. A equipe médica que acompanhava o caso , por considerar a gravidez de alto risco para a pequena gestante e amparada pela lei brasileira que permite o aborto em caso risco de vida da mãe e em caso de estupro, optou pelo aborto dos fetos.
Não fosse polêmico suficiente o caso em si, ele ganhou novamente a mídia quando o arcebispo de Olinda e Recife excomungou a criança e a equipe médica, mas apenas advertiu o padrasto.
Hoje a imprensa noticia um novo caso de estupro de criança de 11 anos pelo pai adotivo no Rio Grande do Sul. Os casos de violência sexual em família no Brasil infelizmente acontecem, e têm sido objeto de preocupação das autoridades, que mantém programas de incentivo à denúncia, tanto de violência sexual quanto de prostituição infantil, mas em alguns lugares do país a população, que convive com situações cotidianas de exclusão social, não se preocupa em denunciar a prostituição infantil que às vezes acontece nas ruas e beiras de estrada.
Todos conhecem a posição contrária do Espiritismo com relação ao aborto. A Federação Espírita Brasileira tem mantido há anos uma campanha chamada "Em Defesa da Vida", na qual critica abertamente o aborto. Em entrevista ao jornal Espírita Mineiro do primeiro bimestre de 2009 ( http://www.uemmg.org.br/galeria.php?categoria=7&galeria=5&randf=0&randv=0&randa=0 ) critiquei o argumento "meu corpo, minha escolha" geralmente utilizado pelos defensores do aborto.
Este caso, no entanto, ganha um contorno um pouco diferente, uma vez que envolve o risco de vida da gestante. A opinião dos espíritos, ante o questionamento de Allan Kardec mostra-se coerente com o argumento da defesa da vida como valor:
"No caso em que o nascimento da criança pusesse em perigo a vida da mãe dela, haverá crime em sacrificar a criança para salvar a mãe?
- É preferível sacrificar o ser que ainda não existe a sacrificar o que já existe."
(O Livro dos Espíritos, questão 359, tradução de Evandro Noleto Bezerra)
A posição da equipe médica, que também foi posta em questão, parece-nos de acordo com a ética. Ela cumpriu a lei civil brasileira e tomou a difícil decisão de optar em conjunto com a responsável pela criança-gestante (no caso, a mãe dela) qual o melhor procedimento para preservar a vida e a integridade da menina. A criança foi ouvida, mas sua vontade está sempre atrelada às decisões de sua responsável legal. Precisamos levar em consideração que uma criança de nove anos é muito influenciável pelo que lhe dizem os adultos, neste caso, a mãe e os médicos.
Não me parece estranho, que em uma perspectiva de caridade, respeite-se os direitos do padrasto e invista-se na possibilidade de sua recuperação, apesar de todo o mal que ele causou às crianças sob sua responsabilidade.
Causa espanto que uma criança seja responsabilizada e, de certa forma punida (pela autoridade eclesiástica), por decisões que foram tomadas e certamente lhe foram informadas como necessárias para a preservação de sua vida e que uma equipe médica seja admoestada por dar cumprimento à premissa básica da lei brasileira.