Vivemos uma época curiosa, na
qual o avanço das ciências é visto como a derrocada das religiões. Nos
ambientes acadêmicos, muitas pessoas creem que a religião, em função da sua
fragilidade em tratar de temas próprios das ciências naturais, é algo a ser
banido do mundo. O visível avanço tecnológico do mundo trouxe uma imensa
credibilidade ao que se diz científico, mesmo ante os muitos problemas que
trouxe ao mundo. Alguns cientistas famosos usam do prestígio que obtiveram em
sua área de conhecimento para fazer uma espécie de ativismo contra as
religiões, argumentando geralmente que as religiões são um mal para a
humanidade e destacando alguns pontos realmente problemáticos.
As religiões e as instituições
religiosas certamente têm seus problemas, mas em tempos de um “individualismo
selvagem”, em que muitas pessoas não querem “abrir mão” de seus desejos
pessoais, há um discurso que valoriza a espiritualidade e desvaloriza as
religiões, a religiosidade e os grupos religiosos. Sempre achei que espiritualidade
sem grupo religioso é como empada sem azeitona, porque a espiritualidade não é
algo construído individualmente, mas aprendido ou desenvolvido coletivamente.
Estou lendo o livro “Religião,
psicopatologia e saúde mental”, escrito por Dalgalarrondo, professor titular de
psiquiatria da Unicamp. O livro foi publicado em 2008, mas a qualidade das
revisões de literatura é muito boa, até a data.
São muitos os estudos que estudam
a relação entre religião e saúde mental. Bergin (1993) não encontrou relação
entre psicopatologia e religiosidade (metanálise de 24 estudos). Payne e
colaboradores (1991) mostra que a religiosidade está associada a um menor uso
de álcool e drogas e melhores medidas de bem estar psicológico, auto-estima,
ajustamento familiar e social e menor permissividade sexual.
Koenig e Larson (2001) concluíram
existir uma associação positiva entre saúde mental e religião (sujeitos mais
religiosos são mais saudáveis e com menos transtornos mentais) e o impacto
positivo da religião fica mais evidente em situações de envelhecimento, doenças
físicas e perda de habilidades físicas e sociais. Koenig mostra que maior
frequência à igreja (ou comunidade religiosa) está associado a uma menor
prevalência de doença mental.
Kendler (1997). Muito elogiado
por Dalgalarrondo, estudou 1698 pares de gêmeas e mostrou que a “devoção
religiosa pessoal” protege as mulheres da depressão ante efeitos estressantes. Em um segundo estudo (2003) com 2616 gêmeos de ambos os sexos, ele mostrou que
a religiosidade geral e outras categorias da religião estão associadas a menor
prevalência de transtornos externalizantes (dependência de álcool e nicotina,
abuso e dependência de drogas ilícitas e comportamento anti-social).
O autor também fala dos aspectos
negativos da religião sobre a saúde mental, mas trataremos em outra matéria.