29.6.20

UM DIÁLOGO SOBRE CIÊNCIA E ESPIRITISMO





Quatro professores universitários com formações diferentes tratam da questão científica do espiritismo. Afinal, o que era considerado ciência na época de Kardec?  O espiritismo pode ser considerado ciência? Qual era a influência do positivismo na época de Allan Kardec? Por que Allan Kardec afirmou que o espiritismo e a ciência caminham lado a lado? Existem pesquisas sobre temas espíritas em curso?


Um diálogo entre Sílvio Chibeni, Marco Milani, Alexandre Fontes da Fonseca e Jáder Sampaio a partir de um convite da União das Sociedades Espíritas de São Paulo - Regional Campinas.


A partir dessas questões e das posições dos convidados, inicia-se um diálogo com os participantes do evento, que lançam luz em diversos pontos de ligação da ciência e das ciências com o espiritismo. 

Confiram!

26.6.20

VOCÊ JÁ ASSISTIU AO CANAL "ESPIRITISMO EM KARDEC"?


Logo do Canal Espiritismo em Kardec no YouTube


Tenho apreciado muito o trabalho realizado em um canal do YouTube denominado Espiritismo em Kardec, capitaneado pelo Eric Pacheco. Há décadas atrás o pessoal do cinema tinha uma expressão romântica: “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” era uma expressão usada para tratar do cinema novo no Brasil. 

No caso do trabalho do Eric, ele dá voz a estudiosos e trabalhadores do meio espírita que estão fazendo trabalhos interessantes, mas que não ganham as mídias espíritas ou a grande mídia brasileira, ficando na penumbra. 

Não entrem  no canal esperando uma imagem tipo “Rede Globo”, qualidade técnica impecável e recursos técnicos variados. O Eric fica ele próprio meio na “penumbra”, sem iluminação artificial, e faz uma fala com os olhos meio baixos, meio lendo, às vezes tropeçando nas palavras. Então, deve me perguntar o leitor, qual é o diferencial? Qual é o talento, ou como as gerações jovens dizem, o “superpoder” do Eric? Os roteiros.

O Eric é excelente na preparação das entrevistas. Ele parece ler, ouvir e pesquisar sobre os seus convidados. Ele é bom conhecedor da estrutura do espiritismo, que é Allan Kardec, então faz perguntas aos convidados sempre procedentes, centrais na compreensão do que ele tem a dizer, e que geram entrevistas originais e interessantes, que apresentam de forma geralmente clara e sintetizada, o que seu convidado tem a dizer.

Outro “superpoder” do Eric é a capacidade de encontrar convidados interessantes nos quatro cantos do mundo. Ele tem conseguido dar voz a espíritas em países que antes estavam atrás da cortina de ferro, da Europa e dos quatro cantos do Brasil. Ele encontra pessoas com conhecimento específico de um autor, questão ou característica do movimento espírita, e lhes dá voz.

No canal do Eric já assisti, agora no sofá da sala de estar, entrevistas com diversos pesquisadores da Liga de Pesquisadores do Espiritismo – LIHPE, nas mais diferentes áreas do conhecimento. Fiquei sabendo como o espiritismo chegou à Lituânia e à Estônia, o que fazem hoje e quais são suas lutas! Tive o prazer de conhecer o trabalho da Adriana Gomez, professora e pesquisadora de História, do Rio de Janeiro, que estudou o tempo em que o espiritismo foi criminalizado no Brasil. Via a Mary del Priori, do meio acadêmico, que notabilizou-se com um livro sobre o espiritismo, dar uns tropeções com dados e datas que são muito conhecidos pelos estudiosos espíritas (sem demérito ao trabalho dela). Vi o Tiago falando do Torterolli e da história do espiritismo. O Calsone falando de Dias da Cruz... E não vi nada. O Eric produz com qualidade e originalidade entrevistas deliciosas de se ouvir, e com uma produtividade que nos desafia a manter atualizados.

Outro ponto importante é a capacidade dele dar voz a pessoas com posições muito diferentes dentro do meio espírita. Ele encontra quem tem o que dizer, e deixa claro o que pensa e em que se fundamenta o pensamento do entrevistado. Não é um canal para quem não conhece Kardec e a fundamentação do espiritismo. Penso que um iniciante poderia ficar confuso diante de tanta informação. Ele produz para quem já conhece o espiritismo e gostaria de saber o que está acontecendo no meio espírita, polêmicas (de ideias), regionalismos,  história, filosofia...

Quem desejar ver por si mesmo, o canal dele pode ser acessado pela televisão ou smartphone no YouTube (Espiritismo em Kardec), ou ser acessado em notebooks e computadores via https://www.youtube.com/channel/UCb4RCch7vrsbPyO5x_0A3rw/videos
Vivemos uma época extraordinária. Não é mais necessário pedir aos grandes órgãos de comunicação que veiculem os trabalhos que nos interessam. Agora temos que sair em busca, na imensidade de opções disponíveis, o que vai de encontro às nossas preferências, gostos e cultura.

22.6.20

WALLACE FOI ESPIRITUALISTA?






Ontem falamos sobre os livros e a obra de Alfred Russel Wallace no Espiritismo.Net em rede com outros canais espíritas. Você sabia que o coautor da teoria da evolução das espécies era espiritualista? Quer saber mais? O vídeo está disponível acima, basta assistir.

20.6.20

ESTUDAR FILOSOFIA ESPÍRITA PELA INTERNET?




Minha geração estudou no Brasil em uma época na qual a filosofia e a sociologia não faziam parte do currículo do ensino médio. Talvez por isso tenhamos hoje membros do governo que confundem filosofia com ideologia e creem piamente que conhecimento verdadeiro está indissociavelmente ligado a matemática.

Essa lacuna de formação que se impôs a algumas gerações, tem um reflexo especular no meio espírita: a limitação de espaços para o conhecimento e o desenvolvimento da dimensão filosófica do espiritismo. Se considerarmos algumas exceções brasileiras  admiráveis, como boa parte do trabalho de Bezerra de Menezes, Herculano Pires, Deolindo Amorim e Carlos Imbassahy algumas iniciativas institucionais como os institutos de Cultura Espírita e o trabalho de Manuel São Marcos, os “flertes” de alguns oradores e escritores alguns trabalhos publicados pela Liga de Pesquisadores do Espiritismo na série “Pesquisas brasileiras sobre o espiritismo" e publicações/traduções de professores como Dora Incontri e Astrid Sayegh, as casas espíritas, de forma geral, não possuem espaços de formação ou debate com orientação filosófica. Perdoem-me aqueles que não foram citados, até por desconhecimento pessoal do autor dessas linhas.

Um dos riscos dessa omissão é lermos Kardec e as obras subsidiárias do espiritismo como textos religiosos, para se aprender e crer, ficando aquém da sua fundamentação filosófica, e apreendendo jargões para lidar com outras propostas religiosas e filosóficas. 

Um segundo risco, também presente em nossa sociedade, é a supervalorização das ciências, apreendendo-as como “verdade”.  e a tentativa de aproximar o conhecimento espírita ao conhecimento científico de forma apressada, desarticulada e hermética. Surgem espíritas usando o jargão da física, da psicologia, da medicina ou de outras áreas do conhecimento, baseado muitas vezes em textos de divulgação (ou seja, sem domínio das respectivas áreas) e tecendo ilações a um público leigo, incapaz de identificar ou criticar a impostura. Alguns respondem com mais hermetismo às justas críticas realizadas por quem entende, o que serve apenas como forma de impressionar os simpatizantes, que creem estar diante de um grande intelectual.

O terceiro risco, é o da construção de um discurso que só é reconhecido no contexto espírita, incapaz de dialogar com os autores do nosso tempo. Isso faz com que as próximas gerações de espíritas sejam facilmente influenciáveis por professores ateus ou agnósticos, ou ainda, incapazes de articular o conhecimento espírita com o que apreendem na universidade, passem a considerar o espiritismo como mera religião, fé de adeptos, baseada apenas nas relações sociais que os espíritas estabelecem entre si e na revelação de alguns ou de um espírito-médium“favorito”, ignorando o esforço de Allan Kardec.

Não foi com pouca satisfação que recebi o convite para participar de uma iniciativa de espíritas brasileiros (Sociedade Espírita Primavera) e ingleses (Spiritist Society of Bournemouth), capitaneada pelo competente professor Humberto Schubert, da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com sólida formação em filosofia e ciência da religião, como se pode ler em seu currículo (http://lattes.cnpq.br/5846607951367788), ele vem apresentando palestras de cerca de 40, 50 minutos sobre filosofia e espiritismo, seguidas de diálogo com os participantes. Na primeira conferência, Humberto advoga a tese da centralidade da filosofia para a compreensão do todo e da fundamentação filosófica do pensamento de Allan Kardec, ou seja, ele compreende o espiritismo como filosofia, coisa esquecida por muitos “advogados” e “críticos” do espiritismo que tratam dele como se houvesse um primado da religião para a apreensão da doutrina.

Quando o espiritismo chegou no Brasil, inexistia a universidade como entendemos hoje, com ensino, pesquisa e extensão, formadora de profissionais e técnicos de alto nível, mas também produtora de novos conhecimentos. O trabalho de Allan Kardec, que veio do meio acadêmico de sua época, chegou às mãos dos pioneiros, a quem admiramos, mas que tinham por instituições conhecidas no Brasil a Igreja Católica e faculdades independentes, de direito, medicina, engenharia e talvez educação, principalmente. Talvez por isso a leitura de Telles de Menezes e seu diálogo com Desliens, ao publicar o primeiro periódico espírita do Brasil, mostre um distanciamento da compreensão de franceses e brasileiros sobre o pensamento espírita, exposto nos livros de Allan Kardec. Entre Telles de Menezes e Bezerra de Menezes já se observa uma evolução do entendimento do espiritismo, e o “médico dos pobres” dava mostras de seu conhecimento filosófico na coleção intitulada “Estudos Filosóficos”, à época publicada em jornal de grande circulação, hoje encontrada em forma de livros organizados pela Edicel.

A iniciativa das duas sociedades espíritas aproxima pelo estudo grupos europeus e brasileiros, que passam a poder interagir mais pessoalmente, superando as distâncias geográficas e culturais. Ainda há a limitação do uso do português, o que dificulta a participação de espíritas europeus nativos de seus próprios países, sem domínio do idioma ibérico, mas quem pode prever o futuro?

Tendo sido levado a refletir bastante, após três sessões de “filosofia aplicada”, recomendo aos leitores do EC que se interessam pela área, essa iniciativa internacional, agradecendo ao impulso que o isolamento social deu para o desenvolvimento da educação à distância em nosso movimento.


5.6.20

A VISITANTE DESCONHECIDA

Madeleine Pelletier


O fim de tarde e início de noite de sábado, em época de pandemia, encontrou nosso grupo mediúnico reunido através de um aplicativo de internet, em respeito ao isolamento social. Resolvemos manter o encontro, o estudo, as preces e, caso algum dos três médiuns psicógrafos sentisse a influência espiritual, a escrita e leitura de textos ditados pelos espíritos.

Estamos estudando o livro “Memórias de um suicida”, atribuído a Camilo Cândido Botelho, pseudônimo de Camilo Castelo Branco. Uma vez por semana é atribuição de um dos membros preparar e apresentar uma síntese narrativa de um dos capítulos, e nessa semana a médium Ana iria fazer o estudo. Já estamos no capítulo 17, “Vinde a mim”, que narra as instruções de Aníbal de Silas na Cidade Universitária para Camilo e seus colegas, já bem recuperados das impressões iniciais após o ato violento contra a própria vida.

Ana lembrou-se do estudo do livro feito há 25 anos atrás, um quarto de século, quando outros membros de nossa reunião ainda estavam encarnados. Ela havia guardado pequenos cartazes com um esquema visual do Instituto Maria de Nazaré, suas seções e coordenadores.

Terminada a apresentação, inseriu-se uma música suave, “Meditação de Taís”, de Massenet, seguida da “Ave Maria” de Gounot, ambas instrumentais. Uma prece inicial, e os lápis correram sobre o papel em uma das nove residências participantes. Nossa coordenadora desencarnada enviou-nos uma mensagem, emocionada com os cartazes e as lembranças do grupo de estudos que houvera participado enquanto encarnada.

Ainda na terceira parte, a dirigente perguntou um a um sobre as percepções mediúnicas e imagens mentais dos participantes durante a prece e a música. O médium Gamaliel descreveu um espírito, denominado Pelletier, que ele percebia junto à médium Ana, durante a exposição. Para a mediunidade, a distância e o espaço diferem dos que percebemos com nossos cinco ou mais sentidos corporais. Pelletier se apresentou a ele como primeira médica do sexo feminino na França. Ela trabalhou como psiquiatra e Gamaliel lhe descreveu o cabelo curtinho, um corte quase masculino e uma espécie de casaca curta, roupa própria dos homens.

Ela acompanhava Ana durante a exposição, enquanto essa apresentava com clareza e concisão o capítulo de Yvonne. Ao final da narrativa, encontrou-se a imagem de Madeleine Pelletier, que temos acima, e o médium disse tê-la percebido como nessa imagem.

Madeleine Pelletier

Buscamos mais informações com Gamaliel após a reunião e, generosamente, ele nos informou que notou que ela atua “junto a profissionais que cuidam de crianças” como forma de reparação de alguma coisa. A impressão que a energia dela repassava era de compaixão e imensa entrega e dedicação ao trabalho, ou seja, causou uma boa impressão a ele. Ele igualmente percebeu um “séquito de enfermeiras por ela coordenada” que distribuía uma “chuva de luz prateada”, direcionada às cabeças dos doentes que se encontravam em uma possível enfermaria, com leitos lado a lado.

Como já vimos bastante na literatura espírita, e especialmente no livro que nos encontramos estudando, nossas reuniões não afetam apenas a nós, mas costumam ser úteis nas atividades espirituais de auxílio e recuperação de espíritos em estado de perturbação ou sofrendo efeitos negativos das escolhas que fizeram na última encarnação. O que falamos na reunião não fica apenas entre ouvidos humanos. Os estudos são úteis para um número indeterminado por nós de pessoas desencarnadas. Lembrei da expressão cunhada pelo autor materialista português: “Nossos amigos, os discípulos de Allan Kardec”.

Madeleine Pelletier (1874-1939), identificando-se, despertou nossa curiosidade usual. Buscando na internet, descobrimos que foi a primeira mulher a obter o diploma de psiquiatria na França.

Anne Pelletier teve uma vida complicada. Ficou órfã de pai aos dez anos de idade, sendo de família pobre, e abandonou os estudos na adolescência, época em que tinha muitos conflitos com a mãe cristã. Aproximou-se de grupos socialistas e anarquistas que a influenciaram a voltar a estudar aos vinte anos. Obteve o baccalauréat em 1896, equivalente ao nosso ensino médio, e inscreveu-se no PCN, um curso que certificava estudos químicos, físicos e naturais, pré-requisito para tornar-se médica. Não se sabe quando ao certo ela adotou o nome de Madeleine.

Achei curiosa a troca. Anne seria o nome da mãe de Maria, e Madeleine da apostola apostolorum, a mais reconhecida apóstola de Jesus. Haveria alguma relação na escolha do novo nome com a tradição cristã?

Depois do PCN, Madeleine se interessou pela antropologia, onde trabalhou com Letournou e Manouvrier nas teorias de Broca sobre o cérebro e o crânio. Observando que essas ideias eram usadas como forma de explicação da pretensa inferioridade intelectual da mulher, ela trocou seus estudos por um concurso para residência médica em asilos, para o qual teve que lutar, porque era necessário ter direitos políticos e mulheres não votavam na França, naquela época.

Ela conseguiu vencer as barreiras e, em 1903, defendeu a tese “A associação de ideias na mania aguda e no atraso mental”. Se a memória não me engana, o tema estava fervilhando na Europa, e foi estudado por Jung que fez publicações em psiquiatria com estudos experimentais de associação de ideias. O conceito de mania era diferente do atualmente empregado pelos psiquiatras.

Ela trabalhou então em dois “asilos” franceses, entrou na maçonaria e publicou artigos técnicos. Com um consultório pouco procurado, tornou-se médica de urgências, e passou a atender muitos pobres, acompanhada por um agente de polícia.

Na sua vida política, filiou-se a um movimento de mulheres (“Solidariedade das mulheres”), aproximou-se da Seção Francesa Internacional Operária (SIOF), mas os abandonou, desencantada, em 1910. Trabalhou na primeira guerra mundial pela cruz vermelha, auxiliando combatentes. Após mais um desencanto, tornou-se antimilitarista.

Ela teve uma incursão no Partido Comunista e viajou à Rússia pós-revolucionária, onde se desencantou das condições de vida da população e com a ação da polícia. De volta à França, suas publicações não agradavam muito ao partido, e ela acabou se afastando em 1926.

Ela se aproximou novamente de anarquistas e socialistas, vivendo como médica, e acompanhando a questão fascista que ganhava dimensão na Europa e mesmo na França. Em 1937, anos após ter sida acusada de praticar abortos (a acusação era sem comprovação) ela teve um AVC e ficou hemiplégica, tendo que aceitar a ajuda dos amigos. Dois anos depois, em um ambiente de “caça aos abortistas”, foi acusada de participar de um aborto de uma jovem de 13 anos, mas declarou-se inocente. Reconheceu-se que ela não poderia tê-lo realizado pela sua condição física, contudo, considerada um perigo “para si, para outrem e para a ordem pública”, foi internada em uma clínica psiquiátrica, onde desencarnou após um segundo acidente vascular cerebral. (A maioria das informações foi retirada da Wikipédia brasileira e francesa).

Ana é médica pediatra e intensivista, e atende a crianças pobres ou de classe média em um posto de saúde. Passados mais de oitenta anos da desencarnação de Pelletier, vê-la em uma reunião mediúnica, dedicando-se à infância e ao atendimento da pobreza não nos causa nenhum assombro. Sua dedicação aos pobres e à emancipação da mulher, assim como seu ideal de um mundo menos desigual, pesam na balança em seu favor.

Desnecessário dizer que Gamaliel não conhecia a história de Madeleine, que nos pôs a pensar bastante sobre nossas ações e sobre a sabedoria divina, sempre abrindo caminhos novos para seus filhos, mesmo os que não acreditam nEle. Madeleine Pelletier me fez lembrar também de outra mulher que teve passagem por organização comunista e que ficou famosa após a morte, através da mediunidade de Chico Xavier, dessa mesma época, só que brasileira e teosofista: Nina Arueira.