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8.10.16

PROPAGANDA POLÍTICA EM CENTRO ESPÍRITA?



Véspera de eleições municipais. Na saída da reunião matutina de sábado, quando se levam os filhos para a evangelização, uma situação constrangedora. Pessoas estranhas ao grupo estão distribuindo envelopes fechados na porta do centro espírita.

- Uma mensagem linda de Eurípedes Barsanulfo para você! Dizia a panfletista. Leia com atenção!

Não era apenas uma mensagem de Eurípedes, psicografada por Suely C. Schubert em 1983, mas também um “santinho” eleitoral e uma carta aos espíritas em geral, falando da “crise do campo político no Brasil”, e sugerindo que em vez de deixar um oportunista ou ladrão ocupar o cargo, que se votasse em um dirigente afastado de seu cargo em centro espírita, para fazer campanha eleitoral, por um partido minoritário.

A responsável pelos panfletos disse a uma frequentadora:

- Nós somos iguais, somos espíritas!

Não sou capaz de descrever com precisão o que aconteceu, mas um dos pais, após tentar inutilmente explicar a todos que aquele ato nada tinha a ver com nosso centro espírita, e ser recebido com ouvidos de mercador da parte dos panfletistas, alterou-se.

- Está obsediado, disse a senhora que distribuía os envelopes. Sou médium e percebo os espíritos próximos a ele. Deveria ser levado a uma reunião de desobsessão...

Uma das coordenadoras da reunião pediram que eles não ficassem na porta do centro, mas eles apenas se afastaram um pouco e continuaram panfletando.
O mais curioso foi o inusitado do acontecimento. Estou há décadas nesta casa espírita e não me recordo de um assédio desses em período eleitoral. Que pensar da situação?

A lei eleitoral proíbe a propaganda eleitoral em templos religiosos (Resolução nº 23.457, de 15 de dezembro de 2015) entendendo-os como bens de uso comum (Código Civil). Pelo que li nos jornais, os arredores de templos religiosos, como se configurou a propaganda, foram proibidos pelo Ministério Público de Minas Gerais até 05 de julho (http://coad.jusbrasil.com.br/noticias/2208071/igreja-evangelica-lei-proibe-propaganda-em-templos-religiosos) mas não encontrei proibição explícita após esta data e a lei é passível de interpretação.

Ficou claro que a distribuição visava às pessoas por serem espíritas, e que houve um mascaramento da propaganda política sob a forma de mensagem, ou seja, apresentava-se aos frequentadores da nossa casa a distribuição gratuita de um texto psicografado por médium e espírito respeitáveis, mas a intenção principal era apresentar um candidato a vereador e obter votos.

Na carta e no panfleto se vê que a plataforma do candidato a vereador apresenta apenas que ele é um espírita, boa pessoa, que pratica caridade. Qual é a proposta de trabalho dele? Como se posiciona ante os principais problemas e projetos em curso do legislativo municipal? Que exigências o partido faz de seus filiados e por que se filiou ao seu partido? Nem uma palavra.

A questão que mobiliza a candidatura é apenas que ele não se deixará corromper individualmente, o que parece importante, mas é muito pouco em matéria de política.


Penso que dizer-se espírita não qualifica um candidato, e ainda acho que trazer os problemas dos partidos políticos (o que não é o mesmo que problemas sociais) para a esfera dos centros espíritas, traz consigo o risco da manipulação, da divisão entre os membros a partir de ideias políticas, o conflito externo e apaixonado das legendas, o risco do assédio político na esfera individual das microrrelações nas sociedades espíritas e o jogo dos interesses que costumam atrair poderes econômicos e partidários, às vezes meramente instrumentais. 

1.8.12

HISTÓRIA DO CRISTIANISMO


Terminei a leitura do livro "Uma breve história do cristianismo", de Geoffrey Blainey. De fato, ele produziu um texto como historiador, embora seja uma narrativa corrida e sem a indicação de fontes, o que gera alguns pontos polêmicos e outros próprios da leitura do autor. Apesar da busca do lugar terceiro, o autor não consegue deixar de expor-se e posicionar-se, o que é esperado.

O livro é uma deliciosa leitura introdutória para quem se interessa pelo tema. De Jesus a João Paulo II, o autor dedica uma ou duas páginas para um grande número de designações e grupos cristãos e anticristãos, mundo afora. Surpresa agradável foi encontrar uma descrição das ideias de Emmanuel Swedenborg (médium sueco) e de Edward Irving, considerados antecessores do espiritismo por Arthur Conan Doyle.

Allan Kardec, o Evangelho Segundo o Espiritismo e o movimento espírita são uma grande omissão do autor, que chegou a inserir tendências atéias e de articulação entre o marxismo e o cristianismo em seu trabalho. A Teologia da Libertação brasileira é recordada, e os três milhões de espíritas esquecidos. Etnocentrismo do primeiro mundo?

Uma trajetória curiosa do autor é traçar a linha tênue entre o cristianismo e a política. A desconstrução do catolicismo pela revolução francesa, sua expoliação pelos revolucionários e o desrespeito a instituições cristãs como um todo, sem capacidade de distinguir os aliados da nobreza dos servidores do povo como um todo, causam quase indignação.

O autor também tem uma leitura muito diferente da historiografia brasileira com relação aos jesuítas. Foram perseguidos por serem competentes ou por interferirem nos bastidores do poder temporal?

Uma leitura interessante é a recuperação de cada uma das tendências oriundas do movimento protestantes que estão presentes no nosso dia-a-dia. Os Santos dos Últimos dias, a Assembléia de Deus, os Metodistas, os Batistas, o Exército da Salvação, os luteranos, a Torre de Vigia, a Ciência Cristã, os Quakers, todos têm suas origens, principais ideias e percurso esboçados no texto e contextualizados.

O cristianismo é um opositor do capitalismo democrático? Do comunismo? Do fascismo? O tema, apesar de tratado de forma breve, faz parte da proposta da obra. Muitos ativistas políticos ateus de hoje tratam as diversas designações cristãs como adversárias ou inimigas, com intolerância incomum.

Blainey trata também de um assunto curiosíssimo. A crença de ateus e agnósticos no conhecimento considerado científico e tecnológico e sua cegueira quanto às questões do humano, nestas estreitras abordagens epistemológicas do conhecimento. Ele aponta uma certa ingenuidade de propostas como a de Dawkins e a de Hawking e um esquecimento dos episódios negros das guerras mundiais e seu racionalismo anti-humanista.

O livro, apesar de expressar a leitura do autor, lança luz e questões sobre as representações do cristianismo na sociedade, hoje, talvez surpreendendo muitos dos que se encontram identificados com o movimento cristão e ignorantes das ações e concepções de ateus e políticos materialistas. Recomendo a leitura crítica do mesmo.