Mostrando postagens com marcador Yuri Elias Gaspar. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Yuri Elias Gaspar. Mostrar todas as postagens

9.10.13

SER VOLUNTÁRIO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS




Ontem à noite enfrentei o trânsito pesado de Belo Horizonte e a chuva contínua e fria para um compromisso no auditório Prof. Bicalho, na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG. O Dr. Miguel Mahfoud e os doutorandos Yuri e Roberta organizaram um seminário com noite de autógrafos para conversarmos sobre o livro Ser Voluntário, Ser Realizado.

Como membro da mesa, li o livro com mais cuidado (até onde consegui). O livro é uma investigação fenomenológica em uma grande casa espírita da capital mineira, com foco em voluntários, para a construção de um entendimento sobre a experiência de ser voluntário.

A parte inicial é uma revisão teórica sobre a fenomenologia, e tem como boa surpresa a filosofia de Karol Wojtyla (que se tornaria papa, futuramente) e de Edith Stein. O Prof Paulo, um dos membros da mesa, destacou a importância da recuperação do pensamento destes dois autores para a fenomenologia brasileira.

Eu conhecia a casa espírita estudada, e as descrições feitas por Yuri me fizeram recordar André Luiz. Cuidadoso e meticuloso ele vai visitando, em seu texto, os departamentos e tarefas da casa, que se organizou de forma diferenciada da estrutura organizacional que normalmente vemos nas casas em Minas Gerais. O autor vai falando com detalhes, e as imagens da sociedade espírita rapidamente povoaram minha mente, pois já estive lá duas dúzias de vezes, pelo menos.

Depois o texto mostra a que veio, e relata a experiência voluntária de quatro pessoas, que o autor selecionou entre os milhares que encontrou, e entre as onze que realmente entrevistou. Eu me pergunto quando ele terá uma disponibilidade íntima para se debruçar sobre este material ainda não explorado e publicá-lo em forma de artigos, para irmos compondo uma massa crítica sobre a experiência voluntária em casa espírita.

O público de voluntários desta casa não é apenas espírita, há católicos confessos que se identificaram com o caráter cristão e sério dos trabalhos realizados e lá realizam suas tarefas e realizam-se.

A leitura da experiência voluntária é muito desafiadora (Miguel e Yuri gostam de usar o termo provocadora), Se vista à distância, como gostam de fazer os materialistas, parece empobrecida. Uma senhora lava pratos, outra prepara e distribui salada de frutas, outra coordena aulas de evangelização infantil e outra é responsável por dar banho em crianças. Recordei-me dos comentários maldosos, feitos por revolucionários, que diziam ser esta uma atividade burguesa, pobre, sem capacidade de transformação do mundo.

Yuri vai além das aparências e pergunta às pessoas como é o seu trabalho, ou algo semelhante. As histórias se multiplicam. Entre alguns schematas, aprendidos na casa espírita e na vida, há uma riqueza textual de vivências interiores, dificuldades superadas, emoções, mudanças interiores, que possibilitam a compreensão da experiência vivida dos voluntários. Nós leitores, ora nos admiramos, ora nos emocionamos, ora somos arrebatados à reflexão. O texto de Yuri parece repetitivo às vezes, mas vai nos fazendo refletir quase frase a frase a comunicação do sujeito.

Ele nos explicou que selecionou os entrevistados. Nem todos os voluntários conseguem passar da concretude do ato e resignificar o que fazem, mas não há limites de idade, crença, ou classe social para o que fazem.

O Prof. Paulo nos chamou a atenção para algo importante. Ele foi apresentado ao espiritismo não pela doutrina, mas pela experiência dos que participam do trabalho. Eu diria que é um retrato da "vita activa" do movimento espírita, e não de sua "vita contemplativa", que li em São Tomás de Aquino esta semana, ou em um de seus comentaristas, referindo-se a Pedro e a João, apóstolos como suas referências. Eu não caracterizaria os pensamentos e vivências dos voluntários como exclusivamente espíritas, mas indiscutivelmente são cristãs, por isso tocaram tanto o público presente. Não quero dizer que uma é mais importante que a outra, o que considero tolice, mas temos necessidade de reflexões profundas no movimento espírita sobre a "vita activa" de seus membros. Este tipo de análise nos faz ter uma nova perspectiva sobre o significado de tudo o que fazemos, em uma época cheia de relações temporárias e análises à distância.

O Prof. Miguel encerrou o encontro, após muitas questões do público presente e tentativas de resposta dos membros da mesa. Questões muito seminais, eu diria. Ele falou algo como: nesse momento a universidade tornou-se universidade. E é verdade, em meio a muitas visões de mundo, todos buscaram a verdade, sem temer apresentarem sua escolha religiosa, sua área de conhecimento ou qualquer outro elemento de sua identidade. E o diálogo respeitoso se fez, respeitadas as diferenças.