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14.12.21

UM POUCO MAIS SOBRE DEÍSMO



 Jáder Sampaio

No estudo do Iluminismo francês, McNall Burns examinou rapidamente as concepções religiosas e destacou o deísmo. Já escrevi anteriormente sobre o deísmo no Espiritismo Comentado, ao tratar do texto de Allan Kardec, As cinco alternativas da humanidade e referir-me às descobertas de Charles Darwin que o fizeram abrir mão do cristianismo. https://espiritismocomentado.blogspot.com/2019/02/darwin-deista-kardec-cristao-espirita.html

Todavia, Burns amplia a visão de deísmo, que passamos a resumir. Ele aponta sua criação, com alguma incerteza para Lord Herbert de Cherbury (1583-1648) e sua propagação pelos iluministas franceses, por autores ingleses como Alexander Pope e Lord Shaftesbury na Inglaterra e Thomas Paine, Ben Franklin e Jefferson, na América. 

Os deístas não apenas condenavam as afirmações irracionais das  religiões, mas consideravam a fé organizada um instrumento de exploração para enganar os ignorantes. Esse tipo de ataque, que precisa ser contextualizado, já que boa parte dos cargos eclesiásticos era remunerado pelo Estado na França, por exemplo, embora, verdade seja dita, houvesse um papel social da Igreja, como no caso da educação. Quando o povo, contudo, estava insatisfeito, havia um sentimento de injustiça, porque se pagavam impostos que eram usados pelo Estado e pela Igreja para interesses próprios. 

O historiador norte-americano entende que os deístas queriam construir uma religião mais simples e “natural”, que propunha.

1. A existência de um Deus que criou as leis naturais;

2. seu afastamento do universo após a criação das leis, espécie de não-providencialismo, que emergia em função das “trocas e favores” que alguns religiosos tentavam conseguir com Deus;

3. orações, sacramentos e ritos são apenas atos exteriores, uma vez que não se consegue “subornar a Deus” para que ele derrogue as leis naturais em favor de uma pessoa; 

4. não existe predestinação para o bem ou o mal, que é fruto do livre-arbítrio do homem na Terra e influencia o bem ou o mal que acontecerá na vida futura.

Como se vê, há semelhanças e diferenças das concepções deístas para as concepções espíritas, o que fez com que Kardec considerasse o espiritismo outra alternativa para a humanidade. Há também uma conexão entre o deísmo e a teologia ou religião natural, sobre a qual tratarei em outra matéria.

Referência

BURNS, Edward McNall. História da civilização ocidental. 23ª. ed. Porto Alegre: Globo, 1979 


14.2.19

DARWIN, DEÍSTA; KARDEC, CRISTÃO-ESPÍRITA





Allan Kardec tem um texto publicado em Obras Póstumas que sempre me intrigou, denominado “As cinco alternativas da humanidade”. Confesso que nunca entendi direito os deístas e porque Kardec denominou “doutrina dogmática” à dos católicos e protestantes, sem menção ao cristianismo.

Ele coloca em uma posição diversa o espiritismo, confrontando-o com as demais doutrinas, nos aspectos que selecionou delas.

Já levantamos em outra publicação do Espiritismo Comentado, a questão do panteísmo e de sua relação com o pensamento de Baruch Spinoza.

Hoje eu estou lendo o livro “Dispelling the Darkness: Voyage in the Malay Archipelago and the Discovery of evolution by Wallace and Darwin”, de John Van Wyhe, que trata do tema de forma interessante.

Ele diz que Darwin também “pensava muito sobre religião” e que foi durante a pesquisa e teorização intensa que ele fez à bordo do Beagle que ele passou a desacreditar “na cristandade e divina revelação. Não havia simplesmente nenhuma evidência. Ele desceu um nível e se tornou um deísta. Ele ainda acreditava em um criador sobrenatural que estabeleceu as leis da natureza em primeiro lugar, mas tanto quanto Darwin pensava, a natureza trabalhava de acordo com as leis naturais.”

Os deístas entendem, em geral, que se pode estudar a divindade a partir do conhecimento da natureza, e não da teologia cristã. No caso de Darwin, ele fez uma ruptura com o pensamento cristão, após começar a perceber que existia a evolução das espécies a partir da seleção natural, que induziu, assim como Wallace, da leitura de Thomas Malthus, curiosamente.

Da mesma forma que Darwin, em sua autobiografia, Flammarion rompe com o cristianismo ainda na adolescência, após estudar os avanços da ciência e os erros da Bíblia no que concerne à idade do mundo, formação da humanidade e outros temas que emergiram nas ciência no final do século XVIII e início do século XIX.

Nesse ponto, há alguma relação entre Darwin e Kardec, porque Kardec entendia as leis naturais como criadas por Deus, e por isso as chamava de “Lei Divina ou Natural”, mas Kardec propõe leis que vão além de Darwin, e aceita um providencialismo que não é divino, mas espiritual.

Outra diferença entre o deísta Darwin e o espírita Allan Kardec, é que este se entendia como cristão espírita, ou seja, ele não abriu mão do cristianismo como base ética, nem do estudo histórico do cristianismo, nem da possibilidade de explicar passagens da vida de Jesus e dos apóstolos consideradas milagres com a nova perspectiva obtida a partir dos estudos dos fenômenos espirituais.

Na classificação de Kardec, Darwin seria um deísta independente, e não providencialista.

Considerando a classificação de Kardec de espírita-cristão, o espiritismo teria uma dimensão religiosa, como entendia Flammarion em seu livro "As Forças Naturais Desconhecidas".