Esperava receber este livro com
muita curiosidade. Jean Prieur é um espírita francês, centenário, nascido em
Lille, na França, ocupada pelos alemães. Quando Jean nasceu, o trio Flammarion,
Delanne e Denis ainda estava encarnado e publicando livros importantes.
Prieur viveu duas guerras
mundiais. Como francês, foi literalmente testemunha da história, acompanhou as
grandes transformações que sofreu o mundo nestes agitados últimos cem anos.
Seu texto é delicioso de ler. Ele
escreve lendo e comentando, fazendo pequenas paradas e viajando no tempo, fazendo
Kardec e o espiritismo conversarem com o mundo que vivemos. O autor não viveu
em uma redoma de vidro. Ele dá notícia das principais transformações do mundo,
às vezes com uma pitada de ironia, outras com uma lucidez profunda.
Sua relação com Kardec é
curiosíssima. O codificador (termo que ele defende) parece ser seu colega de
letras, seu companheiro, com quem ele não se importa de conversar, divergir às
vezes, admirar. Às vezes fiquei frustrado pela própria forma do texto, porque
Jean descreve passagens desconhecidas, sem se preocupar em citar as fontes.
Uma análise bem contemporânea, e
um tanto francesa, é o olhar que ele lança sobre Espiritismo e Feminismo. Ele é
um admirador do casal Rivail, de sua forma companheira de viver. No seu texto,
Amélie Boudet tem um papel de frente na elaboração do espiritismo. Ela
secretaria Kardec, revê seus textos, discute com ele. É uma Gabi que justifica
seu papel protagonista após a desencarnação do companheiro. O Espiritismo
Kardequiano é um precursor do feminismo moderno, e sua concepção de mulher na
sociedade é de vanguarda. A concepção de ser humano que reencarna alternando gêneros, é tão revolucionária
quanto a de pessoas que alternam classes sociais, que podem nascer em contextos
muito diferentes do que ora participam.
Uma parte genial do livro é um suposto diálogo feito entre Don Pantaleão, bispo de Barcelona, Allan Kardec e Jean Prieur. Recomendo.
Se você se interessou pelo livro, prepare-se para viajar no tempo e na história. Recolha-se em um cantinho onde possa fazer a leitura sem ser perturbado, para que sua mente possa ir recriando os cenários e situações que o autor resolveu compartilhar conosco. Para aproveitar o livro, faça uma "suspensão de juízo" e beba aos poucos a taça que Jean nos oferece. Deixe a análise e a crítica para depois da degustação.
Ainda não concluí a leitura, mas
não me contive de compartilhar minhas primeiras impressões com o leitor do
Espiritismo Comentado. Não sei como o Alexandre Rocha conseguiu este texto tão
oportuno, e agradeço a ele a leitura heroica, feita em parte dentro das paredes
de um hospital, sob cuidados médicos.
Allan Kardec e sua época
Jean Prieur
Tradução: Irène Gootjes
Revisão: Alexandre Caroli Rocha
366 páginas
Instituto Lachâtre
1a. Edição Brasileira - Setembro de 2015