Ainda estudando o hipnotismo com Manoel Philomeno de Miranda, o autor
espiritual fez um comentário muito breve sobre os estudos de Charles Richet, e
resolvi rever os dois livros do autor francês que tenho. Richet, como muitos
sabem, foi prêmio Nobel de medicina com seus estudos sobre anafilaxia em 1913.
Tenho dois livros de Richet sobre
a ciência que ele denominou como metapsíquica: o “Tratado de metapsíquica” e “O
sexto sentido”.
Como sabemos, a Metapsíquica não
nasceu do nada. Ela referencia-se nos estudos do magnetismo animal,
especialmente do sonambulismo provocado, depois hipnotismo, dos estudos espíritas e das pesquisas
posteriores, como as de Albert de Rochas, embora não tenha a sobrevivência da
alma como um de seus princípios.
No Tratado, Richet vai tentar
mostrar que existe evidência suficiente para mostrar a existência de um
fenômeno que ele denomina de “criptestesia”. O que se percebe, é que
influenciado pelo materialismo francês do século XIX, ele tenta se afastar da
hipótese espiritualista como explicação dos fenômenos que ele mesmo seleciona
de outras pesquisas ou observa.
Por “criptestesia”, Richet se
foca nos conhecimentos que se obtêm sem o uso, imediato ou original, dos cinco
sentidos. Ele diz tratar-se de “uma sensibilidade oculta, uma percepção das
coisas, desconhecida quanto ao mecanismo” (p. 100)
O médico francês parte dos estudos sobre lucidez, faculdade descrita pelos magnetizadores, que afirmam ter visto sonâmbulos descrevendo “objetos encerrados em caixas de construção opaca, ler em livros fechados, fazer viagens em lugares que lhes eram desconhecidos,quando então os descreviam exatamente, adivinhar o pensamento do magnetizador e dos assistentes.” (p. 101)
Ele considera a telepatia como “um
caso particular de lucidez, de que é parte inseparável”. (p. 108). A palavra telepatia
teria sido criada por Myers e seria empregada futuramente pela parapsicologia,
significando a capacidade de percepção de pensamentos alheios sem o uso dos
cinco sentidos.
No Tratado, Richet classifica a
criptestesia em acidental e experimental (que é provocada para estudo). A
criptestesia acidental, que acontece em indivíduos conscientes, pode ser denominada
de monições: o conhecimento do passado
(monição do passado) ou do presente (monição do presente) e as premonições (do
futuro). A criptestesia experimental, segundo o autor, é provocada e encontrada
em fenômenos mediúnicos, sonambúlicos ou hipnóticos.
Richet já usa o conceito de
transe, possivelmente obtido dos estudos sobre a hipnose, na qual há alteração
do estado de consciência, justificada pelos estudiosos desse campo através do “adormecimento”
de áreas do córtex cerebral.
Kardec trata da lucidez no
contexto do sonambulismo, como na passagem abaixo:
“Se a ação do
fluido magnético é hoje um ponto geralmente admitido, o mesmo não se dá em
relação às faculdades sonambúlicas, que ainda encontram muitos incrédulos no
mundo oficial, sobretudo no que toca às questões médicas. .... O mesmo se dará
em breve com a lucidez intuitiva...” (Emprego oficial do magnetismo animal. Revista
Espírita, outubro de 1858)
Sob a ótica
espírita, Richet deu um passo atrás, abandonando, por exemplo, a diferenciação
entre mediunidade e hipnotismo, preocupado que estava em colher evidências que
mostrassem a existência de conhecimentos não oriundos da aprendizagem, que ele deu
o nome de criptestesia, abrangendo uma fenomenologia extensa. Posteriormente,
na parapsicologia, Rhine iria fazer algo semelhante, estudando apenas a
telepatia, que como vimos, era considerada por Richet como um caso específico
dos fenômenos de lucidez.
No final do seu
livro “O sexto sentido”, Richet admite que uma “...ciência tem duas fases. A
primeira é a constatação de fenômenos. A segunda é a sua teoria explicativa.”
(p. 271) e ele admite que avançou apenas até a constatação de fenômenos, e que
a teoria explicativa viria depois. Ele admite que diversas explicações poderiam
ser válidas como “a telepatia ou ingerência dos espíritos, ou hiperestesia
anormal dos sentidos normais” (p. 271).
Sobre a hipnose, ele afirma que ela é capaz de aumentar a obtenção de fenômenos de criptestesia.
Richet parece
ter sido relegado à história da parapsicologia nos dias de hoje, e lido apenas
pelos espíritas mais estudiosos, capazes de valorizar seu projeto de pesquisa e
os resultados que obteve, sem se importarem com a questão da aceitação ou não
do pensamento e da teoria espíritas.
Fontes:
Richet, Charles.
Tratado de metapsíquica (tomo I). 2 ed. São Paulo: LAKE, 2008.
Richet, Charles.
O sexto sentido. São Paulo: Sociedade Metapsíquica de São Paulo, 1940.