Esta história aconteceu há muito tempo, mas tem histórias
que se repetem, nem sempre com o mesmo fim. Eu era um dos evangelizadores da
turma com 11 e 12 anos, na Associação Espírita Célia Xavier. Era novo, não
devia ter feito 18 anos ainda.
Um dia, uma mãe me procurou. Ela desejava que sua filha
fosse para a mocidade (grupo de jovens, que começava com 13 anos), que ela era
muito madura e inteligente e que aproveitaria melhor o outro grupo.
Quando se dividem turmas por idade, em um período tão
marcante como a pré-adolescência e a adolescência, não se tem em vista a
capacidade intelectual, especialmente em um centro espírita. Um ano de
diferença parece uma eternidade para um adolescente. Fico vendo as filhas dos
amigos dizendo que dois anos de diferença fazem com que se sintam deslocadas
nas festas.
Outro problema, muito encontrado nas escolas, é quando chega
um novo membro em uma turma já formada. Ele terá uma dificuldade a mais para se
“enturmar”, porque os demais já se conhecem, já têm suas preferências e
amizades estabelecidas, e pode ficar meio à parte, até que consiga amizades. Uma
adolescente que conheço mudou de escola no 6º. ano. Tímida, levou dois anos
para construir uma turma de amigos, daquelas que se relacionam além das salas
de aula e dos trabalhos em grupo.
Na pré-adolescência as mudanças corporais são acentuadas.
Minha esposa comentou que seus alunos entram ainda com corpo de menino/menina e
saem com corpo de rapaz e moça, com algumas variações. Não são apenas mudanças
físicas, mas também psicológicas, que se tornam um fator a mais no difícil
processo de integração dos jovens.
Certa vez fui falar para um grupo de mocidades em um centro
espírita de Belo Horizonte que tinha apenas 4 jovens no dia marcado. Dois
tinham entre 13 e 14 anos e os outros dois na faixa dos 18 anos. Foi um dia
difícil, porque os interesses eram imensamente divergentes.
Há também uma questão com os pais. Via de regra eles fazem
tudo por seus filhos, e às vezes se projetam neles. Os filhos podem ser uma
espécie de “segunda chance” de realização dos sonhos deles próprios, e passam a
sofrer (isso mesmo!) as expectativas dos pais. Os pais os consideram mais
inteligentes do que eles foram, e às vezes querem “corrigir” a educação que
tiveram com os avós nos filhos. Podem, por exemplo, tratar de forma mais “democrática”
seus filhos e costuma acontecer de exagerarem na mão e serem permissivos.
Passam a ter dificuldade de dizer “não”, uma palavra tão necessária para a
educação de um cidadão que vai viver em uma sociedade com direitos e deveres.
Outra questão envolve o próprio jovem. Passando as
transformações da adolescência, ficam hipersensíveis e às vezes “donos da
verdade”. Os pais não sabem muita coisa, aos olhos deles, porque vivem uma nova
época. Paradoxalmente, já li sobre isso no Império Romano... Com tanto “poder”
e expectativas, costumam ser frágeis, na verdade. Se ofendem ou magoam com
situações que um adulto nem percebe. E a fuga pode ser uma forma inadequada de
enfrentamento dos problemas.
Nesse caso, o pai percebe que o filho está incomodado, mas o
filho lhe dá uma resposta socialmente aceita: “eu já sei tudo o que me ensinam,
por isso não quero ir... “ E os pais menos atentos, acreditam, mesmo que os
programas de curso sejam bastante diferentes e preocupados com a variação dos
temas e das abordagens.
Há também uma questão meio narcísica. O
pré-adolescente/adolescente quer parecer algo que ele ainda não é. Não se
trata, portanto, de um conteúdo que ele já conhece, mas mostrar aos pais e aos
colegas o quão especial ele é. Fica claro que isso é fantasioso, e não se
atinge com uma mera mudança de turma. Ele vai continuar com esta “necessidade”
íntima.
Retornando à história original, eu conversei com a mãe.
Expliquei-lhe nas duas aulas que a filha participou, eu havia notado que ela
era realmente especial, mas que o interesse e a ligação com o grupo não podiam
ser esquecidos. Eu lhe expliquei que iríamos fazer um trabalho na turma de 11 e
12 anos para que eles se aproximassem, e pudessem ir, juntos, para a mocidade.
Isso lhes daria mais segurança e satisfação.
A mãe ouviu e entendeu. A pré-adolescente participou conosco
durante o ano todo, e no ano seguinte foi para a mocidade. Com o passar das
décadas eu perdi o contato com eles, e me lembro vagamente das duas. Não sei se
continuam no meio espírita, mas acho que foi uma experiência bem sucedida, e
uma decisão acertada.
Eu mesmo tinha interesses diferenciados quando tinha 13
anos. Eu participava de minha turma de mocidade, o antigo 1º. Ciclo, e depois
ficava para assistir os estudos do 3º. Ciclo. Conseguia acompanhar os estudos
sem dificuldade, mas eram duas experiências diferentes, e agradeço muito o
carinho e a compreensão dos meus amigos de idade mais avançada, porque era
claramente imaturo perto deles.
Creio que a opção para os jovens que desejam aprender mais,
é mantê-los nas turmas de sua idade e encaminhá-los para outros espaços das
casas espíritas, para ver como se saem. Cursos de estudo sistemático do
espiritismo, por exemplo, seriam uma boa opção. Outra boa opção é aproximá-los
a equipes de tarefas, onde poderão aprender e fazer algo. A realização e a
confiança obtida pelos demais, nessa idade, é muito motivadora e estruturadora.
Para terminar, há também um “lado negro”, no caso de nossa
casa, porque a evangelização é sábado de manhã e a mocidade no sábado à tarde,
então há pais que não querem levar seus filhos duas vezes ao dia no centro
espírita, e temem que eles ainda sejam muito jovens para andar de ônibus
sozinhos. Então para os pais seria mais cômodo levá-los uma vez só.
Como se pode ver, é um problema bem complexo, mas que
envolve a vida das pessoas mais queridas por nós, então vale a pena sair da “zona
de conforto”, pensar muito antes de colocar os filhos em uma turma de jovens de idade diferente.