O espiritismo é o grande reformador de almas. Tive certeza
disso quando embarcava de volta da viagem que fiz às terras do sul do Brasil.
O sul é quase outro país. Fronteiriço com os países do
prata, herdeiro das mais diferentes comunidades europeias, filho da
farroupilha...
Sapucaia do Sul é uma criança, se pensarmos nos anos de
tradição gaúcha. Cidade ainda horizontal, repleta de gente boa, honesta e
hospitaleira. Sei que se eu fosse escritor de jornais, não iria vender nada, porque
o reconhecimento do bem não desperta a curiosidade.
Visitei dois grupos espíritas, sob os auspícios do Conselho
Regional Espírita da segunda região. Fui quase carregado à rádio, para gravar
programas de conteúdo espírita.
Primeira lição: a falta de recursos nada pode ante a
colaboração e a união.
O CRE custeou as passagens aéreas e as pequenas despesas da
estada. Como os membros das sociedades espíritas não ostentassem nenhuma
riqueza, mas, ao contrário, aquela simplicidade operária e trabalhadora que a
aprendi a admirar com os exemplos da minha avó, perguntei-me: como?
Na abertura das palestras, os organizadores comunicaram a
todos que as despesas da iniciativa de trazer pessoas de fora para permutar sua
experiência se davam com a venda de livros. Eles montaram uma banca com o
“Casos e descasos” e com o “Diálogo com os céticos”. Quem levasse os dois,
ganhava, de brinde, o delicioso “Dr. March entre dois mundos”. Não preciso dizer
que fiquei com as mãos doendo, porque além de trazer os livros para autografar,
as pessoas queriam dar um abraço, trocar uma palavra, fazer uma pergunta,
aquelas coisas bem humanas, que me fizeram lembrar a fogueira que acendíamos na
fazenda de papai ao cair da noite para contar casos.
Segunda lição: Pequenos grupos unidos são tão ou mais
eficientes que os grandes grupos
Nas palestras, chegavam as pessoas de Esteio, de Canoas e de
outras cidades circunvizinhas. Nada de grandes auditórios, bastavam os
auditórios das sociedades espíritas, seus corredores e alguma sala com projetor
de imagens e alto-falantes para acomodar toda esta gente. Lembrei da minha
juventude, de uma viagem que fizemos na região da lagoa de Araruama, com o
expositor fluminense Luiz Flávio, hoje desencarnado. Entramos em uma estradinha
de terra e chegamos em uma fazenda. As pessoas chegavam aos poucos, em pequenos
grupos, vindas dos pastos, das picadas e da estrada. Elas acomodavam-se na
salinha da sede, separada para ser centro espírita rural...
Terceira lição: o entusiasmo operoso faz mais que as
organizações complexas
Mariela, nossa anfitriã, nos levou a uma casinha no meio de
uma região pacificada, se é que o termo é este. Casinha simples, com uma placa
na porta escrita Centro Espírita, fomos recebidos pelo entusiasmado locutor, o
Rubens. Não vou ficar escrevendo os sobrenomes de propósito, para que o leitor
possa sentir a informalidade da acolhida. Brincadeiras espíritas, piadas leves,
e brilho nos olhos na medida em que ia me mostrando a biblioteca, a livraria, a
sala com gêneros doados, o pequeno auditório com data-show, o estúdio de
rádio... Um momento, estúdio de rádio?
Isso mesmo, com mesa de edição, microfones, isolamento acústico, tudo simples,
mas montado aos poucos, incansavelmente, até gerar programas que ganham o mundo
através do encontro de mídias, a radiofônica e a internet. Mesa branca cheia de
fios e copos de água para ficarmos uma hora proseando sobre os temas mais
diversos, trocando experiências. Depois chegou o irmão-gêmeo do Rubens, aqueles
que não são filhos da mesma mãe, mas se reencontram na idade adulta quando
descobrem o significado da casa espírita que os acolhe.
Eu poderia falar das outras lições que recebi. Foram muitas
e profundas. Voltei para Minas com minha mineirice incorrigível, mas me
sentindo um pouco gaúcho, e me perdoem os colorados, mas com um par de camisas
do time do Grêmio.