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1.2.22

SE O ESPIRITISMO É FILOSOFIA, QUE FILOSOFIA É O ESPIRITISMO? COM A PALAVRA, DEOLINDO AMORIM

 


Capa antiga do livro Allan Kardec, de Deolindo Amorim

Vejamos abaixo a avaliação que Deolindo Amorim faz do pensamento de Allan Kardec, em um livro que hoje está esgotado: Allan Kardec: o homem, a época, o meio, as influências e a missão, publicado pelo Instituto Maria em 1981. É um livro que se originou de uma palestra do jornalista do "Jornal do Commercio" e sociólogo  baiano sobre o fundador do espiritismo em Juiz de Fora. Nesse trecho ele faz uma análise filosófica do pensamento de Kardec, identificando influências. É um texto muito denso, porque a análise que ele faz demanda o conhecimento de coisas como humanismo, racionalismo, universalismo, empirismo, religião, idealismo transcendental, entre outras questões, e por muitos anos o ensino de filosofia foi negligenciado em nossas escolas brasileiras.


"Há nele (Allan Kardec), bem conjugadas na estrutura do seu pensamento, três linhas de pensamento, bem definidas: humanismo, racionalismo e universalismo.

Se, realmente, encareceu a necessidade da prova dos fatos, e ele próprio julgou indispensável a experiência no campo fenomênico, não foi, contudo, um experimentalista radical, fechado no círculo exclusivo dos fenômenos, pois a visão global lhe permitia encarar a comunicação dos espíritos também pelo prisma filosófico e pelas suas consequências; se deu muita ênfase à razão, se acentuou bem a importância do raciocínio claro, não foi um racionalista ortodoxo, entronizado na supremacia intelectual, indiferente a outros aspectos da vida; se reconheceu o valor da fé, como necessidade do espírito, não chegou à beatice nem aprovou atitudes contemplativas, mas preconizou claramente a "fé raciocinada" em contraposição à fé cega ou passiva" (p. 31)




Acho que o livro foi esquecido por muitos intelectuais espíritas que escrevem sobre o assunto, hoje. O que Deolindo entrevê é um posicionamento singular do ponto de vista filosófico e teológico. Kardec emprega a razão, mas não é racionalista, observa os fatos, mas não é empirista radical, reconhece a fé, mas não é místico, propõe uma reunião de espíritas em torno dos ideais espíritas, mas não um conjunto de ritos, mitos, hierarquia e outros elementos exteriores. Propõe a fé, mas combate o dogma religioso ou teológico. Analisou os fatos produzidos pelos médiuns, mas também seu discurso, influenciado pelos espíritos, de forma racional, mas intersubjetiva, e finalmente, passou a vida buscando a essência do que ensinavam os espíritos, diferenciando das opiniões pessoais, com o auxílio da razão e do estudo do trabalho de diversos médiuns.

Ele curiosamente não fala diretamente do positivismo, talvez pela flagrante contradição entre a teoria dos três estados de Comte e a concepção racional de Deus, bem como a metafísica desenvolvida em diálogo com os espíritos. Mas ao distinguir o trabalho de Kardec do experimentalismo radical, ele aponta um ponto importante na diferenciação entre espiritismo e positivismo. 

21.7.21

DEUS CRIOU O VÍRUS DA COVID 19?

 


Jáder Sampaio


“Segue-se que devam negligenciar as precauções necessárias em casos semelhantes [epidemia de cólera] e baixar a cabeça ante o perigo? Absolutamente: tomarão todas [as precauções] aconselhadas pela prudência e uma higiene racional, porque não são fatalistas e porque, se não temem a morte, sabem que não a devem procurar.”  (Allan Kardec, O espiritismo e o cólera, Revista Espírita, novembro de 1865. P. 327)


Recentemente ouvi um expositor espírita buscando Kardec para analisar um capítulo de livro de Divaldo Franco sobre a pandemia. Iniciativa importante, uma vez que o pensamento kardequiano é a estrutura básica do pensamento espírita em geral.

Causa primeira de todas as coisas

Ao analisar sua argumentação, encontrei conclusões falaciosas com base em ideias colhidas no texto de Kardec, que criam uma interpretação muito singular do autor, contraditórias às vezes, com o próprio pensamento de Kardec.

Uma das afirmações que ele fez:

“Deus é a causa primária de tudo: tudo é tudo mesmo, não é de uma coisa e outra não. ”

Ele não considerou o termo primária (também traduzido como primeira), e mudou o sentido da frase. São frases diferentes: “Deus é a causa de todas as coisas” e “Deus é a causa primária de todas as coisas”. Na primeira frase, se eu sou infectado por um parasita, isso é causado por Deus. Tudo o que acontece ao homem é causado por Deus (inclusive o sofrimento). O universo e tudo o que acontece nele está determinado pela vontade divina, portanto, não existe livre-arbítrio. Ele é apenas uma ilusão.

Na segunda frase, as escolhas do homem são de responsabilidade humana. Isso é o chamado livre-arbítrio, ou liberdade de escolha. Deus criou o universo, ou seja, a natureza e os seres espirituais (entre eles o homem). Por ter criado o princípio inteligente, o princípio material e as leis que regem o universo, Deus é a causa primeira, ou primária. Ele não é a causa imediata de todas as coisas. Aquilo que o homem faz, as mudanças que ele, por exemplo, impõe à natureza com ações irrefletidas ou criminosas, são causadas imediatamente por ele[1].  Nessa visão, o vírus não foi diretamente criado por Deus. Sua mutação é consequência da ação do homem, seja modificando o meio ambiente ou manipulando microorganismos em laboratório. Sua negligência ou desconhecimento, associados às leis naturais, têm o Sars Cov 2 como resultado, e ele age no homem segundo sua natureza. Deus não o criou porque desejava punir os homens (isso é uma humanização divina), ou para fazer desencarnar em massa as pessoas da Terra, ele é uma consequência indesejada das ações do homem na natureza, no uso do seu livre arbítrio.

As leis universais são perfeitas, fruto de Deus. As ações humanas são imperfeitas, uma vez que esse ser conhece apenas parcialmente as leis universais ou as negligencia, fruto da ignorância e do livre-arbítrio, assim como do egoísmo e do orgulho. Sempre que um homem vai de encontro às leis universais (essas, sim, criadas por Deus), ele, com sua escolha, leva consigo “todo o pacote”, ou seja, suas consequências.

Causa, risco e COVID-19

O que causa a COVID-19? A infecção com o Sars-Cov-2. Por que somos infectados pelo Sars-Cov-2? Uns porque não usaram qualquer tipo de prevenção e tiveram o contato com o vírus, que se multiplicou em seus organismos. Outros porque usaram de meios de prevenção e mesmo assim foram infectados pelo vírus. Contudo, o risco dos primeiros é muito maior que o risco dos últimos, se analisarmos um grande número de casos.

O que acontece com os que não se preveniram? Desencarnam como o espírito André Luiz. Ele não desejava desencarnar mais cedo, mas não se cuidou, e acabou indo antes do tempo. Isso acontece também com os suicidas. Ninguém planeja encarnar para desencarnar através do suicídio.

O que acontece com os que se preveniram e desencarnaram? Ou passam por uma expiação ou por uma prova. Talvez seja o momento previsto para a desencarnação.

Cabe a nós, espíritas, diante dessa forma de entendimento, recomendar a todos que tomem os cuidados necessários contra a doença, que se vacinem, que tomem as medidas já estudadas e propostas pela medicina, para que não venham a desencarnar antes do tempo.


[1] Em “O evangelho segundo o espiritismo”, Kardec escreve que “há males nessa vida em que a causa primária é o homem...” ou seja, há coisas decorrentes da ação e das escolhas humanas. Dessas, Deus só pode ser considerado causa primeira ou primária por ter criado o universo e estabelecido as leis que o regem.

20.6.20

ESTUDAR FILOSOFIA ESPÍRITA PELA INTERNET?




Minha geração estudou no Brasil em uma época na qual a filosofia e a sociologia não faziam parte do currículo do ensino médio. Talvez por isso tenhamos hoje membros do governo que confundem filosofia com ideologia e creem piamente que conhecimento verdadeiro está indissociavelmente ligado a matemática.

Essa lacuna de formação que se impôs a algumas gerações, tem um reflexo especular no meio espírita: a limitação de espaços para o conhecimento e o desenvolvimento da dimensão filosófica do espiritismo. Se considerarmos algumas exceções brasileiras  admiráveis, como boa parte do trabalho de Bezerra de Menezes, Herculano Pires, Deolindo Amorim e Carlos Imbassahy algumas iniciativas institucionais como os institutos de Cultura Espírita e o trabalho de Manuel São Marcos, os “flertes” de alguns oradores e escritores alguns trabalhos publicados pela Liga de Pesquisadores do Espiritismo na série “Pesquisas brasileiras sobre o espiritismo" e publicações/traduções de professores como Dora Incontri e Astrid Sayegh, as casas espíritas, de forma geral, não possuem espaços de formação ou debate com orientação filosófica. Perdoem-me aqueles que não foram citados, até por desconhecimento pessoal do autor dessas linhas.

Um dos riscos dessa omissão é lermos Kardec e as obras subsidiárias do espiritismo como textos religiosos, para se aprender e crer, ficando aquém da sua fundamentação filosófica, e apreendendo jargões para lidar com outras propostas religiosas e filosóficas. 

Um segundo risco, também presente em nossa sociedade, é a supervalorização das ciências, apreendendo-as como “verdade”.  e a tentativa de aproximar o conhecimento espírita ao conhecimento científico de forma apressada, desarticulada e hermética. Surgem espíritas usando o jargão da física, da psicologia, da medicina ou de outras áreas do conhecimento, baseado muitas vezes em textos de divulgação (ou seja, sem domínio das respectivas áreas) e tecendo ilações a um público leigo, incapaz de identificar ou criticar a impostura. Alguns respondem com mais hermetismo às justas críticas realizadas por quem entende, o que serve apenas como forma de impressionar os simpatizantes, que creem estar diante de um grande intelectual.

O terceiro risco, é o da construção de um discurso que só é reconhecido no contexto espírita, incapaz de dialogar com os autores do nosso tempo. Isso faz com que as próximas gerações de espíritas sejam facilmente influenciáveis por professores ateus ou agnósticos, ou ainda, incapazes de articular o conhecimento espírita com o que apreendem na universidade, passem a considerar o espiritismo como mera religião, fé de adeptos, baseada apenas nas relações sociais que os espíritas estabelecem entre si e na revelação de alguns ou de um espírito-médium“favorito”, ignorando o esforço de Allan Kardec.

Não foi com pouca satisfação que recebi o convite para participar de uma iniciativa de espíritas brasileiros (Sociedade Espírita Primavera) e ingleses (Spiritist Society of Bournemouth), capitaneada pelo competente professor Humberto Schubert, da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com sólida formação em filosofia e ciência da religião, como se pode ler em seu currículo (http://lattes.cnpq.br/5846607951367788), ele vem apresentando palestras de cerca de 40, 50 minutos sobre filosofia e espiritismo, seguidas de diálogo com os participantes. Na primeira conferência, Humberto advoga a tese da centralidade da filosofia para a compreensão do todo e da fundamentação filosófica do pensamento de Allan Kardec, ou seja, ele compreende o espiritismo como filosofia, coisa esquecida por muitos “advogados” e “críticos” do espiritismo que tratam dele como se houvesse um primado da religião para a apreensão da doutrina.

Quando o espiritismo chegou no Brasil, inexistia a universidade como entendemos hoje, com ensino, pesquisa e extensão, formadora de profissionais e técnicos de alto nível, mas também produtora de novos conhecimentos. O trabalho de Allan Kardec, que veio do meio acadêmico de sua época, chegou às mãos dos pioneiros, a quem admiramos, mas que tinham por instituições conhecidas no Brasil a Igreja Católica e faculdades independentes, de direito, medicina, engenharia e talvez educação, principalmente. Talvez por isso a leitura de Telles de Menezes e seu diálogo com Desliens, ao publicar o primeiro periódico espírita do Brasil, mostre um distanciamento da compreensão de franceses e brasileiros sobre o pensamento espírita, exposto nos livros de Allan Kardec. Entre Telles de Menezes e Bezerra de Menezes já se observa uma evolução do entendimento do espiritismo, e o “médico dos pobres” dava mostras de seu conhecimento filosófico na coleção intitulada “Estudos Filosóficos”, à época publicada em jornal de grande circulação, hoje encontrada em forma de livros organizados pela Edicel.

A iniciativa das duas sociedades espíritas aproxima pelo estudo grupos europeus e brasileiros, que passam a poder interagir mais pessoalmente, superando as distâncias geográficas e culturais. Ainda há a limitação do uso do português, o que dificulta a participação de espíritas europeus nativos de seus próprios países, sem domínio do idioma ibérico, mas quem pode prever o futuro?

Tendo sido levado a refletir bastante, após três sessões de “filosofia aplicada”, recomendo aos leitores do EC que se interessam pela área, essa iniciativa internacional, agradecendo ao impulso que o isolamento social deu para o desenvolvimento da educação à distância em nosso movimento.


24.1.19

A COMUNICABILIDADE DOS ESPÍRITOS É UMA PREMISSA METAFÍSICA NO ESPIRITISMO?


Mais recentemente, com o retorno da filosofia ao ensino médio brasileiro e a ampla difusão das obras de Allan Kardec, com iniciativas como as da FEB e do Instituto de Pesquisas Espíritas Allan Kardec (IPEAK), têm surgido novos debates com base em leituras, não apenas das obras básicas do fundador, mas também da Revista Espírita, no período em que ele era o editor (1858-1869), que contém contribuições que deixam mais claros alguns pontos do pensamento espírita.


Vi por esses dias um debate sobre os princípios a partir dos quais o espiritismo foi elaborado. Na filosofia, esses princípios podem ser ideias consideradas corretas (premissas ou postulados) ou justificadas racionalmente. Já os dogmas, embora tenham o sentido original de premissas de sistemas filosóficos na antiguidade, acabaram por ser entendidos como pontos de vista indiscutíveis sobre os quais se fundam as religiões, especialmente a partir do cristianismo medieval.



Um ponto aparentemente óbvio, mas que foi e parece que continua sendo fonte de debates, diz respeito à existência e comunicabilidade dos espíritos. É uma premissa adotada por Kardec como verdadeira e indiscutível (dogma) ou é o resultado de uma cuidadosa observação de fatos?



Na Revista Espírita de abril de 1869, encontra-se um artigo curioso, intitulado "Profissão de fé espírita americana", onde possivelmente Allan Kardec comenta uma publicação do jornal Salut, de New Orleans, de 1867, no qual se divulgam os resultados de um congresso espiritualista norte americano. O evento gerou uma "profissão de fé" dos espiritualistas dos Estados Unidos, e Kardec destaca as muitas semelhanças entre pontos de vista e as muito poucas diferenças. Como foram movimentos desenvolvidos separadamente, Kardec argumenta como um ponto favorável ao espiritismo.



Uma questão que ele destaca em seus comentários é a da origem da proposição da comunicabilidade dos Espíritos no espiritualismo e no espiritismo. Lê-se abaixo:



"Essa crença não é mais o resultado de um sistema preconcebido nesse país do que o Espiritismo na França. Ninguém a imaginou; viu-se, observou-se e tiraram-se conclusões. Lá, como aqui, não se partiu da hipótese dos Espíritos para explicar os fenômenos, mas dos fenômenos, como efeito, chegou-se aos Espíritos como causa, pela observação. Eis uma circunstância capital que os detratores se obstinam em não levar em conta." (Revista Espírita, abril de 1869, p. 99. Tradução de Júlio Abreu Filho pela EDICEL)


Cabe lembrar também que não se trata de crença ingênua, porque Allan Kardec examinou as diferentes formas de explicação dos fenômenos estudados, como se pode ler no capítulo IV da primeira parte de O Livro dos Médiuns (Dos sistemas), verificando a capacidade explicativa de cada um deles e delimitando os fenômenos que só seriam devidamente explicados pelas comunicabilidade dos Espíritos.

Camille Flammarion não ficou satisfeito com este trabalho de Allan Kardec e continuou estudando empiricamente os fenômenos atribuídos aos Espíritos de forma geral. Publicou em 1865 o livro "As forças naturais desconhecidas", no qual analisa e considera verdadeiros diversos fenômenos estudados, mas ainda não conclui pela indubitabilidade da comunicação dos espíritos. Essa conclusão veio em 1922, quando publicou o terceiro livro de "A morte e seu mistério".

Vê-se, portanto, que seria um erro entender que o Espiritismo propõe a comunicabilidade dos Espíritos apenas como ideia ou princípio metafísico, mas que se trata do resultado de observações de fenômenos psicológicos (ou parapsicológicos, como queira o leitor) e que não nega a possibilidade de outras explicações, exigindo do seu observador uma análise cuidadosa para não levar "gato por lebre", ou seja, não confundir com as produções do inconsciente, com a imaginação ativa, com a fantasia, fraudes intencionais ou não e outras explicações possíveis.

8.11.18

ESPIRITISMO: CIÊNCIA NATURAL OU FILOSOFIA?




Em uma das palestras que fiz recentemente, surgiu uma questão interessante sobre o status epistemológico do espiritismo. Não dava para desenvolver a questão nas condições em que nos encontrávamos, então deixei para tratar aqui, no Espiritismo Comentado.

Meu interlocutor via, de um lado as ciências (entendidas como as ciências naturais) e de outro a filosofia (com suas subáreas tradicionais, menos a psicologia). Ele argumentava que o espiritismo devia tender, portanto, para a filosofia, que possivelmente teria um poder explicativo melhor. 

Contudo, na universidade contemporânea, entre a filosofia e as ciências naturais encontram-se as ciências humanas e sociais. São áreas de conhecimento desenvolvidas geralmente a partir do século XIX, que estudam o homem, sua cultura, suas organizações e sociedade. 

No princípio, as ciências humanas tentaram empregar métodos das ciências naturais para esses estudos, como se pode ver em Durkheim (ciências sociais), os autores estruturalistas e funcionalistas (psicologia), entre outros. Como os avanços fossem modestos e contraditórios, diferentemente da física, por exemplo, logo se viu que o objeto de estudo desses cientistas era capaz de se modificar, o que ele fazia através da linguagem.

Por esse motivo, as ciências humanas avançaram (para alguns cientistas não), e englobaram métodos de estudo de base hermenêutica e fenomenológica, que consideram a apreensão do significado da linguagem humana e suas consequências, entre outras contribuições que hoje se costuma chamar de métodos qualitativos, e que vão além da observação. Autores com De Bruyne, denominam essa abordagem como abordagem da compreensão (que envolve uma busca rigorosa do significado do que fala o sujeito e suas implicações), em oposição à abordagem da explicação, das ciências naturais (que envolvem, leis, descritas matematicamente, de forma exata ou probabilística, explicando eventos que seguem a regularidade matemática encontrada). 

Allan Kardec desde o princípio de seus estudos, percebeu que o método das ciências naturais era insuficiente para obter respostas para as questões investigativas que tinha a propor para as “inteligências desencarnadas”. Ele manteve o indutivismo das ciências naturais, mas percebeu que como os espíritos tinham diferentes capacidades de descrever o mundo em que viviam, era necessário classificá-los, o que fez com a escala espírita, para estudar apenas os relatos dos espíritos superiores.

Outra coisa que ele fez, muito semelhante à pesquisa fenomenológica, que só foi estabelecida anos depois, foi buscar na narrativa dos espíritos superiores, aquilo que lhes era comum. Ele denominou seu método, na introdução de O Evangelho Segundo o Espiritismo, de “controle universal do ensino dos espíritos”. Com isso, ele buscava conteúdos semelhantes através de médiuns diferentes, de preferência os que desconheciam as contribuições dadas pelos demais, como forma de controle da interferência do médium na comunicação. Em fenomenologia, isso se chama “redução fenomenológica”. Outro ponto do método de Kardec era evitar ideias pré-concebidas e ater-se aos conteúdos colhidos. Em fenomenologia isso se chama “suspensão de juízo”.

O mestre francês sempre analisava o conteúdo do que lhe era dito de forma compreensiva (o que significa o que o espírito disse? Está de acordo com os demais espíritos superiores? Faz sentido?) e utilizava a razão como forma de análise e comparação.

Em um artigo já publicado, desenvolvemos mais esse ponto de vista. Está no livro “O espiritismo, as ciências e a filosofia”, publicado pela parceria CCDPE-ECM e LIHPE, e é intitulado “Espiritismo e métodos de pesquisa em ciências hermenêuticas e fenomenológicas”.



Se aceita essa argumentação, entendemos que do ponto de vista metodológico e epistemológico, há conhecimentos no corpo da doutrina espírita que se desenvolveram com base na observação e experimentação (ciências naturais), há outros conhecimentos que são fruto da argumentação racional (filosofia), mas boas parte do corpo doutrinário repousa em uma análise fenomenológica daquilo que os espíritos disseram aos estudiosos do século XIX e que foi analisado por Allan Kardec (métodos qualitativos de ciências humanas). Boa parte da ética espírita tem uma dupla origem como conhecimento: os relatos da vida após a morte e das consequências das ações em vida (análise fenomenológica de Kardec), e a análise da ética cristã como referência ética para a humanidade (o que constitui parte do aspecto religioso do espiritismo, considerando-se, contudo, que Kardec busca uma fé raciocinada, ou seja, com contribuições dos métodos filosóficos, e não apenas uma “fé cega”)

10.7.11

A QUESTÃO DE DEUS: KARDEC, TOMÁS DE AQUINO E JOHN DUNS SCOTUS

Figura 1: John Duns Scotus

Uma das questões que sempre me intrigou em "O Livro dos Espíritos" é a de número três: pode-se dizer que Deus é o infinito?

Homem do século XX, infinito é um termo que sempre vi associado à matemática e às ciências naturais, nas infindáveis tentativas dos físicos mensurarem o tamanho do universo.

Com esta concepção estreita que tenho, a pergunta não fazia sentido, parecia-me própria do panteísmo, que Kardec distingue tão claramente da concepção espírita de Deus.

Ao ler História da Filosofia, especialmente os autores da patrística e da escolástica, esbarrei em um pensador cristão interessante: John Duns Scotus ou Scot (1266-1308).

Nos dilemas entre a fé e a razão, o conceito de ente infinito ocupa um papel importante no pensamento de Scotus. Reale e Antiseri (2011) apresentam a questão a partir dos sentidos e do intelecto. Se é mais ou menos fácil identificar a finalidade dos sentidos do homem, qual é a finalidade do intelecto? Scot afirma que o intelecto, essencialmente humano (ente unívoco), tem por finalidade o conhecimento.

Afirma Valverde (1987) que Scotus se opõe ao raciocínio de São Tomás de Aquino, que tenta demonstrar a existência de Deus a partir dos dados dos sentidos e que, por isso, tem uma concepção limitada dele.

"Desse modo, Deus ficaria reduzido à mera causa primeira do mundo físico". (pág. 179)

Scotus, portanto, segue outra trajetória dedutiva, a de considerar o ser a partir de suas propriedades intrínsecas, sem recorrer aos sentidos. Ele estabelece pares de "modos de ser" que Valverde cita: finito e infinito, possível e necessário, entre outros. Não é difícil para Scotus mostrar que o homem é um ente finito (unívoco, pelo que pude entender), que, portanto, dispensa a demonstração da existência. A questão se torna demonstrar a existência do ente infinito.

Scotus parte da premissa de que as coisas possivelmente existem (embora não seja necessário que existam). É contudo necessário que existam, partindo do fato que existem. Então, ensina Reale que Scotus pergunta qual é a causa ou fundamento da existência, e mostra que não pode ser o nada, porque o nada não é causa. Também não são as coisas, porque elas não podem dar a existência a si mesmas (Lembremos que nessa época ninguém cogitava da teoria da evolução de Darwin e Wallace). Então é necessário por a razão desta possibilidade em um ser diferente, que transcende a esfera do produtível e das coisas possíveis.

Reale e Antiseri continuam sua explicação mostrando que se as coisas são possíveis, o ente primeiro também é possível. E se ele é possível, ele existe em ato, já que nenhum outro o produziria. Por consequência, uma vez que nenhum outro o produziria, ele é real

Scotus supera Tomás de Aquino ao afirmar que este ente, que é causa primeira, tem por característica interna ser infinito "porque é supremo e ilimitado". A consequência deste raciocínio é que "o ser infinito é o Ser, ..., porque é o fundamento de todos os entes e, antes ainda, de sua possibilidade." (Reale e Antiseri)

Mesmo utilizando o conceito de ente infinito para demonstrar a existência de Deus, Scotus admite que o conceito é "em si mesmo pobre e insuficiente, porque não consegue nos introduzir na riqueza misteriosa de Deus".

As questões iniciais de "O Livro dos Espíritos" apontam, portanto, para as discussões da filosofia escolástica e situam-se no conflito entre fé, razão e empirismo, o que sugere a participação de espíritos que dão prova de um conhecimento cada vez mais limitado a um grupo menor de pessoas, com o avanço da centralidade das ciências empíricas em nossa cultura.

26.1.10

O DETERMINISMO DOS DEUSES GREGOS

Figura 1: As Moiras por Strudwick (1885)
Um dos elementos recorrentes do mito grego diz respeito ao determinismo dos acontecimentos da vida dos homens pelos deuses. Em uma análise política, poder-se-ia dizer que interessava às cidades gregas que os seus cidadãos e os seus escravos ocupassem seus lugares sociais sem questionar, especialmente quando o assunto era enviar as pessoas para a morte na guerra.
A vontade dos deuses seria uma explicação suficiente para tudo o que viesse a acontecer com os habitantes das cidades gregas, especialmente o que acontecesse de mal.
Um dos mitos criados pelos gregos é o das moiras (conhecidas como parcas pelos romanos), deusas que teciam o destino dos homens. Nascimento, acontecimentos da vida e morte eram representados pelo fio da vida. Este fio era fiado, enrolado e cortado, como simbologia da existência. Homero cita as moiras em seus épicos.
Uma das histórias gregas mais conhecidas na ocidentalidade sobre a inexistência da liberdade de escolha dos homens é a de Édipo (Sófocles), que tem revelado o seu destino pelo Oráculo de Delfos e que foge de casa para evitá-lo. Ele cumpre a trágica predição, de que mataria seu pai e casar-se-ia com sua mãe, Jocasta.
Esta crença tem sido passada de cultura a cultura, e as moiras têm equivalentes em diversos povos da Europa.
O mito grego assemelha-se às explicações dadas pelas pessoas de hoje, ante as dificuldades da vida, dizendo tratar-se da "vontade de deus" o que é muito diferente do pensamento espírita.
O Espiritismo, herdeiro de tradições filosóficas que vão dos pré-socráticos aos modernos, defende a existência de um livre-arbítrio limitado, no qual o Espírito se torna "Moira" de sua própria existência, limitada parcialmente pela sua biologia, pela sociedade em que vive, pelos impulsos psicológicos que traz e pelas relações espirituais que estabelece ao longo da existência. Este homem é herdeiro de seus próprios atos e escolhas, mas também é construtor de seu futuro individual e coletivo.
Para conhecer mais sobre o pensamento espírita, leia "A Escolha das Provas" e "A Lei de Liberdade" em O Livro dos Espíritos, assim como o capítulo "Bem Aventurados os Aflitos" em O Evangelho Segundo o Espiritismo, ambos de Allan Kardec.

30.5.09

ENTREVISTA COM ASTRID SAYEGH 5

Figura 1: Mais uma turma de Filosofia Espírita

EC - Dora Incontri fundamentou sua proposta teórica no Espiritismo Kardequiano e criticou o pensamento niilista de alguns autores existencialistas e pós-modernos. Como você analisa este projeto?
ASTRID (IEEF) - Considero esse projeto de um valor inestimável. Dora Incontri é um Espírito muito lúcido e bem atualizado; o niilismo que caracteriza o existencialismo materialista exerce grande influência no pensamento da sociedade pós-moderna, daí a necessidade de conhecermos essas tendências de forma a saber combatê-las com fundamentos sólidos . O Espiritismo não pode estar a parte do momento histórico, e justamente por ser uma filosofia racional, essa razão iluminista deve continuar a serviço de uma crítica do momento histórico, de modo a superá-lo.

EC - Kardec utilizava um proto-conceito de classes sociais? Em caso afirmativo, ele é partidário da luta de classes ou da colaboração de classes?

ASTRID (IEEF) - Sob hipótese nenhuma os Espíritos se colocam a favor da luta de classes, pelo contrário, segundo a Lei da Igualdade, em O Livro dos Espíritos, todos os homens são naturalmente iguais, e as diferenças de classe são convenções. Existe sim diversidade de aptidões e de graus de conquista,mas dia chegará em que os homens não mais se olharão como castas de sangue mais ou menos puro, mas como Espírito mais ou menos puro. Embora os Espíritos admitam que seja impossível a igualdade absoluta de riquezas, longe de afirmar que exaltem a luta de classes, pelo contrário, em essência somos todos da mesma natureza, e um dia viveremos com as diferenças de forma harmoniosa.

EC - Herculano entendia que o Espiritismo é uma doutrina existencialista? Como se pode conciliar esta proposta com o pressuposto existencialista de que a existência antecede a essência?

ASTRID (IEEF) - Segundo Jean Paul Sartre, o mais conhecido filósofo contemporâneo, o homem veio do nada e volta para o nada. Efetivamente, surgimos no mundo como existentes, em meio a uma situação dada, de modo a então elaborarmos a nossa essência no mundo. Do ponto de vista espírita, poderíamos afirmar que a essência é que antecede a existência, potencialmente, e que no mundo tornamos essa potência ato; em outros termos, é na existência que revelamos nossa essência e a ela nos ajustamos.

EC - Alguns antropólogos brasileiros têm defendido a idéia de que Chico Xavier aproximou o pensamento de Kardec ao Catolicismo no Brasil. O que você pensa disto?

ASTRID (IEEF) - Na verdade, não foi Chico Xavier, mas Emmanuel que, por ter sido padre, certamente tem esse religiosismo muito presente em seu Espírito. No entanto, não considero essa questão comprometedora absolutamente, pois a atitude de reverência a Deus, termos que denotam paixão e não apenas a frieza da razão, nos contagiam muito mais que conceitos e raciocínios. Não vejo nada de misticismo como comentam alguns, pelo contrário, sinto a expressão de um Espírito fervoroso que, acima da expressão conceitual, pela nobreza de sentimento que o caracteriza-se, necessita expressar o seu interior de forma metafórica. Linguagem metafórica é uma coisa, igrejismo e dogmatismo, com todo respeito, é outra. Alguns filósofos inclusive consideram atualmente a linguagem metafórica como recurso mais adequado de se dizer as coisas espirituais.
Defendo a idéia de que o racionalismo puro também acaba por ser dogmático e não nos torna espíritas de fato, mas ardor e entusiasmo são geradores de mensagens autenticamente evangélicas e de conduta nobre. Eu diria que a mensagem de Emmanuel é antes evangélica cristã e não católica; seus livros nos induzem a educar os sentimentos, e não consta, absolutamente, nenhuma evidência de formalismo religioso.

23.5.09

ENTREVISTA COM ASTRID SAYEGH 4


Foto 1 - Divulgação do Concepção Existencial de Deus
Continuação das entrevistas dos dias 2, 9 e 16 de Maio
EC - Ao distinguir o princípio espiritual do princípio material em “O Livro dos Espíritos”, os espíritos assumiram a proposição de uma segunda natureza, a natureza espiritual? Pode-se dizer que os espíritos são adeptos do paralelismo psicofísico?

ASTRID (IEEF) - Embora exalte a existência de duas substâncias e não uma só, como é o caso de Espinosa, não nos parece que os Espíritos sejam adeptos do paralelismo psicofísico, mas antes afirmam a existência de uma matéria ou corpo fluídico, mediador entre ao espírito e a matéria propriamente dita. Efetivamente a qualidade de pensamentos e sentimentos do espírito adere à matéria fluídica, mas não que se correspondam, em termos precisos.

EC - Alguns estudiosos de Kardec imputam uma influência do pensamento positivista em sua obra. O que você pensa disto?

ASTRID (IEEF) - Não considero o Espiritismo positivista. Talvez os fundamentos da Doutrina, a sua base seja positivista, mas sua essência é antes ética e metafísica, coisa que o positivismo, de um modo geral, nega. O positivismo lógico baseia-se nos fatos e aqui termina a ciência, porém o Espiritismo vai muito mais além; o fato é só o ponto de partida para a metafísica, que constitui a sua verdadeira natureza. Repito, Espiritismo é metafísica e não fenômenos, e isso precisa ser ensinado em nossas escolas, de modo a não destruirmos o próprio fundamento dos valores morais. Daí a importância da reflexão filosófica na casa espírita, de modo a exaltar a autoridade científica do Espiritismo, para não nos dogmatizarmos e reduzir o alcance e profundidade do Espiritismo ao assistencialismo.

EC - Quais são as grandes diferenças entre o pensamento do Agostinho de “Confissões” e “Cidade de Deus” para o Agostinho-espírito, interlocutor de Kardec? Quais as semelhanças?

ASTRID (IEEF) - Esta pergunta é um pouco difícil de ser respondida com precisão, pois se tratam de deduções apenas e não temos bases sólidas em que se apoiar para afirmar algo sobre o pensamento de Agostinho. Certamente, dado o fato de Agostinho fazer parte da Revelação Espírita nos leva a crer que tenha superado suas convicções como bispo. Através de suas mensagens, particularmente no que se refere ao autoconhecimento, em O Livro dos Espíritos, a necessidade de interrogar a consciência todos os dias faz lembrar o processo de Confissões, de modo a tornar possível uma conversão do Espírito. A Cidade de Deus hoje, talvez tenha outro signficado: embora devamos respeitar a Cidade Terrena, a vida pós-morte não é plena e nem tampouco dá-se o encontro definitivo com a eternidade. Muitos conceitos aqui entrarão em questão, o que merece uma reflexão detalhada senão quisermos ser imprecisos.

16.5.09

ENTREVISTA COM ASTRID SAYEGH 3

Figura 1: Turma no IEEF - 2008
(Continuação das entrevistas dos dias 02 e 09 de Maio)


EC - Qual é a influência de Descartes na codificação?

ASTRID (IEEF) - Essa questão é bastante extensa, mas poderíamos dizer que Descartes inaugurou a fase do Racionalismo e do Idealismo, abrindo as portas para o Espiritualismo. Podemos perceber ainda sua influência na Filosofia Espírita, particularmente por afirmar a trindade das substâncias, assim como seus atributos.

EC - A visão de Deus em Kardec, excetuando-se o mito da trindade, assemelha-se à de São Tomás de Aquino?

ASTRID (IEEF) - Tomás de Aquino buscou conciliar os ensinamentos cristãos com a Filosofia de Aristóteles, e foi assim um dos primeiros filósofos a buscar conciliar a fé com a razão. Nesse sentido ele, já à época, nos traz provas racionais sobre a existência de Deus, algumas das quais parecem identificar-se com o conceito espírita, particularmente no que tange a um Ser Inteligente.

EC - Qual é a diferença entre a concepção de Deus dos iluministas (especificamente o deísmo de Voltaire) e a dos espíritos da codificação?

ASTRID (IEEF) - Segundo Voltaire Deus existe porque existe a ordem do mundo, ou seja, o relógio é a prova de que existe o relojoeiro. Também a Filosofia Espírita, em O Livro dos Espíritos, afirma que a harmonia do universo pressupõe uma causa inteligente. Argumenta ainda Voltaire que no universo há seres inteligentes e que, portanto supõe-se uma causa inteligente que anima o universo. Por outro lado, Voltaire é deista no sentido de que a existência de Deus não é um artigo de fé, mas sim resultado da razão. Embora a Filosofia dos Espíritos exalte a provas racionais da existência e dos atributos de Deus, ela não nega a importância da fé.

9.5.09

ENTREVISTA COM ASTRID SAYEGH 2

Foto 1: Turma de Filosofia Espírita no IEEF
EC - Apesar de pleitear uma discussão filosófica e racional para seu pensamento, Kardec é praticamente desconhecido pelos docentes de Filosofia no Brasil. Por que isto aconteceu?

ASTRID (IEEF) - Sem dúvida, Kardec é pouco conhecido no meio acadêmico; acredito que isso se deva ao fato de, primeiramente haver um preconceito muito grande por parte dos docentes, certamente por falta de conhecimento dos fundamentos doutrinários e da rigorosa metodologia empregada por Kardec; mas por outro lado, poucos espíritas se aventuram a apresentar no meio acadêmico, de forma metódica e segundo os requisitos científicos, a autoridade do Espiritismo, particularmente no seu aspecto filosófico. O Espiritismo nada tem a temer perante a filosofia acadêmica, assim como a filosofia tradicional só tem a ganhar com os conceitos espíritas, pois esses trazem a sanção dos valores morais que ela sempre pregou.

EC - Há uma corrente contemporânea de céticos que defendem a inexistência de evidências favoráveis ao Espiritualismo. O que você tem a dizer sobre isto?

ASTRID (IEEF) - Sem dúvida, vivemos um século caracterizado por um ceticismo extremado, talvez herança do pensamento positivista, para o qual só é considerado científico o que é de natureza observável. Ao se exaltar apenas o lado fenomênico do real, nega-se a face invisível, e que é a mais autêntica.
Ora, as evidências favoráveis ao Espiritualismo não são fenomênicas, como o próprio Kardec afirma na conclusão de O Livro dos Espíritos, isso se explica pelo fato de os sentidos não se prestarem ao conhecimento da realidade metafísica. Os fariseus também exigiam sinais de Jesus, e este afirmou que jamais os teriam. É impossível ao anatomista conhecer a alma através da dissecação do corpo, assim como é impossível conhecer as substâncias ou princípios constitutivos do universo através da física e de outras ciências naturais. Essas podem oferecer indícios, mas jamais conhecer a natureza do objeto metafísico. Confesso, Jader, preocupa-me o fato de espíritas quererem trazer o Espiritismo para a Física Quântica, como se este necessitasse da autoridade desta para se impor. O Espiritualismo racional e lógico, e por isso se basta. Cabe aqueles que o negam apresentar uma prova contrária à lógica.
Com efeito, ao reduzir o conhecimento à realidade observável, ou fenomênica, jamais poderemos falar de espiritualismo, pois esse transcende ao mundo sensível, como diria Platão. Daí a importância de exaltar a metafísica, a ciência das causas e princípios, tão menosprezada em nossos dias — até mesmo nas escolas espíritas.

EC - Quem desenvolveu o curso de Filosofia que você tem dado no CCPDE? É possível explicar seu programa e metodologia de estudos?
ASTRID (IEEF) - O Instituto Espírita de Estudos Filosóficos desenvolve um curso intensivo de um ano junto ao Centro de Cultura, Pesquisa e Divulgação Eduardo Monteiro. No entanto, os cursos regulares possuem a duração de quatro anos, cuja programação consiste em:
1º ano: O Espiritismo e os Filósofos
2º ano: Temas Filosóficos Espíritas
3º ano: Evolução do Princípio Espiritual
4º ano: Gnosiologia e Ética Espírita
Cursos para formação de Expositores de Filosofia
Curso sobre a obra de Leon Denis: O problema do Ser
Cursos modulares sobre as obras de Herculano Pires
As aulas são expositivas, mas a pedagogia do IEEF é ativista. Filosofar é uma atitude de questionamento e buscar a verdade através da reflexão em conjunto é muito significativo.

3.5.09

ENTREVISTA COM ASTRID SAYEGH

Foto 1: Astrid Sayegh (Cortesia do Correio Fraterno)
Astrid Sayegh, espírita, Doutora em Filosofia, fundadora do Instituto Espírita de Estudos Filosóficos (IEEF). Uma simpatia em pessoa.
O IEEF funciona na Praça Florence Nightingale, 79 - Jardim da Glória, São Paulo.
O Espiritismo Comentado entrevistou-a e conversamos muito sobre Filosofia e Espiritismo. Vamos publicar o resultado do trabalho ao longo do mês de Maio.
EC - Com que autores da Filosofia Kardec dialoga em sua obra?

ASTRID (IEEF) - Em prolegômenos a O Livro dos Espíritos, estes afirmam ser o Espiritismo uma Filosofia Racional, livre do preconceito do espírito de sistemas. Por sistemas entende-se as várias escolas filosóficas, ou um conjunto de ideais de determinado autor organizadas logicamente. Os espíritos afirmam desta forma que o Espiritismo não se encaixa em nenhum sistema ou conceito de um autor particular. Isto não significa que a Filosofia Espírita venha a negar os sistemas filosóficos, mas antes que, como síntese de um processo, ela abarca questões que já foram abordadas pelos autores na história, porém mantém a sua conceituação particular, o que mantém a sua identidade na história da filosofia.
Herculano Pires, em Introdução À Filosofia Espírita, afirma que o Espiritismo é a síntese da tradição filosófica, e que nesta encontram-se as raízes da Filosofia Espírita. Isso significa que o pensamento dos filósofos culminou na Filosofia dos Espíritos, na época moderna, e que estes devem ser considerados de modo a entender a amplitude de conceitos doutrinários. Efetivamente, Kardec não dialoga com nenhum autor em particular, e ao mesmo tempo dialoga com todos os filósofos. No entanto, em todos os momentos, podemos dizer que Kardec dialoga contra os materialistas.

EC - A formação de um bacharel em Filosofia demanda quatro anos de ensino superior ou mais. Como inserir os estudos de Filosofia no movimento espírita?

ASTRID (IEEF) - Muito embora um curso superior de filosofia se estenda por anos, é possível abordar de forma sintética o pensamento dos filósofos. No IEEF estudamos os pensadores durante um ano, e estabelecemos sempre uma correlação com os conceitos da Filosofia Espírita. Essa parte é essencial, pois é através desta reflexão que podemos entender a origem e os princípios da Filosofa Espírita.

EC - Que obras de Filosofia você indicaria aos interessados em estudar as conexões da codificação com o pensamento europeu?

ASTRID (IEEF) - São poucos aqueles que se dedicam a um trabalho fecundo sobre esta relação entre os conceitos doutrinários e a tradição filosófica; podemos indicar toda a obra filosófica de Herculano Pires, pois ele percorre a evolução histórica do pensamento em quase todos os textos, assim como os livros do Professor Manoel P. São Marcos, Filosofia Espírita e seus Temas, o qual foi o primeiro a escrever estudos sistematizados de Filosofia Espírita. O IEEF em breve lançará a obra Princípios da Filosofia Espírita, como texto didático visando essa conexão.

24.1.09

Cursos de Filosofia Espírita em São Paulo


Figura 1: Platão e Aristóteles

IEEF — INSTITUTO ESPÍRITA DE ESTUDOS FILOSÓFICOS
Comunica a todos que já se encontram abertas as inscrições para os cursos de Filosofia:

PROGRAMAÇÃO - 2009
CURSOS REGULARES

1º ANO: O ESPIRITISMO E OS FILÓSOFOS
Horários: 5ª. Feira – 9h, 16h e 19h30 e sábado 18h

2º ANO: TEMAS FILOSÓFICOS ESPÍRITAS
Horários: 5a. feira - 9h, 16h e 19h30 e sábado 18 h

3º ANO: EVOLUÇÃO DO PRINCÍPIO ESPIRITUAL: DO FENÔMENO À ONTOLOGIA
Horários: 5ª. Feira – 9h, 16h e 19h30

4º ANO: CONHECIMENTO, ÉTICA E RELIGIÃO EM ESPÍRITO E VERDADE
Horários: 5ª. Feira – 9h e sábado - 18h

FORMAÇÃO DE EXPOSITORES DE FILOSOFIA PARA AS CASAS ESPÍRITAS
Horários: 5ª. Feira - 19h30 e sábado 16h

CURSOS MODULARES

CURSO INÉDITO DE FILOSOFIA TRADICIONAL: "FILOSOFIA E MODOS DE VIDA"
Expositor: Prof. Alfredo Fernandes (FFLCH - USP)
Horários: 6ª. Feira – 18h e sábado - 16h

CURSO SOBRE HERCULANO PIRES: "CONCEPÇÃO EXISTENCIAL DE DEUS"
Expositor: Prof. Astrid Sayegh
Horário: 5ª feira -18 h. Início em abril

CURSO SOBRE LEON DENIS: "O PROBLEMA DO SER, DO DESTINO E DA DOR"
Expositor: Prof. Walter Barreto de Almeida
Horário: 6ª feira 18 h – início em Agosto

*Para saber mais sobre os cursos, acesse o site:
www.institutodeestudosfilosoficos.com

INSCRIÇÕES:
Pelo site:
www.institutodeestudosfilosoficos.com
Por telefone: (11) 2215-2684 2215-2522
Por email:
institutodeestudosfilosoficos@gmail.com.

LOCAL: INSTITUIÇÃO BENEFICENTE NOSSO LAR
Praça Florence Nightingale, 79 - Jardim da Glória (Vila Mariana)

CURSOS REGULARES INTENSIVOS DE UM ANO
OUTROS LOCAIS:
CENTRO ESPÍRITA NOSSO LAR — CASAS ANDRÉ LUIS
Rua Duarte de Azevedo, 691
Santana — São Paulo — SP
CEP: 02036-022— Tel: 2973-6580
http://www.nossolar.org.br/end1.php
CENTRO DE CULTURA DOCUMENTAÇÃO, PESQUISA DO ESPIRITISMO EDUARDO DE CARVALHO MONTEIRO
Al. dos Guaiases, 16
Planalto Paulista - (Travessa da Av. Indianópolis na altura do 1435)
CEP: 04079-010—Tel: 3661-3028
http://www.ccdpe.org.br-- Instituto Espírita de Estudos FilosóficosPraça Florence Nightingale, nº 79Vila Mariana - São PauloFones: 2263-8681 - 2215-2522Site:http//www.institutodeestudosfilosoficos.com

22.6.08

Blog Filosofia Espírita Publica Allan Kardec

Figura 1: Blog Filosofia Espírita
Uma pessoa ou grupo que até o momento prefere manter-se no anonimato criou o belo blog intitulado Filosofia Espírita.
Ele(s) têm publicado textos instigantes escritos por Allan Kardec na Revista Espírita.
Na sua última publicação eles mostram a recusa de Kardec em ocupar um lugar federativo no movimento espírita e a sua valorização da independência e confraternidade dos centros espíritas.

7.2.08

Presciência Divina e Livre Arbítrio

Uma questão geralmente apresentada ao pensamento espírita baseia-se em uma suposta contradição entre a capacidade atribuída a Deus de predizer o futuro e o livre-arbítrio dos homens, concedido por Ele em suas leis universais.


Léon Denis, espírita francês e discípulo de Kardec, manifesta-se sobre este ponto em "O Problema do Ser, do Destino e da Dor", recém republicado pela Federação Espírita Brasileira, da seguinte forma:


"Notemos que não é a previsão de nossos atos que os provoca. Se Deus não pudesse prever nossas resoluções, não deixariam elas, por isso, de seguir seu livre curso" (O Problema do Ser, do Destino e da Dor, página 344, 11a. edição)